domingo, 1 de setembro de 2024

Eliane Cantanhêde - Xandão x rei do universo

O Estado de S. Paulo

Brasil não é ‘casa da mãe Joana’, mas Xandão não pode fazer o jogo do inimigo

Assim como o ditador Nicolás Maduro confrontou e pôs o presidente Lula contra a parede, sem saída, o bilionário Elon Musk peitou o ministro do Supremo Alexandre de Moraes e transformou o Brasil num teste para seu poder mundo afora. A posição de Lula ficou mais complexa, tortuosa, mas a reação de Moraes foi rápida, direta e implacável: a suspensão das operações do X, exTwitter, no Brasil. Uma forma de dizer, interna e internacionalmente, que o País tem Constituição, leis e instituições, não é uma “terra de ninguém” ou “uma casa da mãe Joana”.

No seu voluntarismo, Moraes teve de rever em poucas horas a decisão de vetar o uso de VPN para driblar a suspensão do X e há uma intensa discussão jurídica sobretudo sobre a intimação de Musk pela própria plataforma e a cobrança das multas do X à Starlink de Musk que tem, inclusive, contratos com as Forças Armadas. Usar o X para intimar Musk está de acordo com a realidade e os avanços tecnológicos e com a falta de alternativa, mas a cobrança à Starlink é questionável.

A guerra é muito maior do que só jurídica. Musk é um ativo jogador político a favor da extrema direita internacional e, na avaliação de amplos setores, testa forças no Brasil, tentando desestabilizar o Supremo e o governo Lula. Agora amigão do argentino Javier Milei, Musk se encontrou com o então presidente e candidato Jair Bolsonaro em maio de 2022, em São Paulo. O que conversaram? Nunca se soube exatamente.

A intimação de Moraes a Musk faz sentido, ao exigir um representante legal do X no Brasil, respeito às leis brasileiras e pagamento de multas por descumprimento de decisão judicial, mantendo no ar perfis e posts dedicados a ataques, ameaças e mentiras, no que Moraes resume como “atentados à democracia”. A embaixada americana em Brasília, a quem Musk agradeceu, defendeu que “a liberdade de expressão é um pilar fundamental em uma democracia saudável”. Na decisão contra o X, Moraes rebateu: “Não se confunde liberdade de expressão com impunidade para agressão”.

A crise com Musk e X terá novos lances, com a possibilidade, inclusive, de negociações de uma saída nos bastidores. Moraes precisa ter mais frieza, o que não é o seu forte, porque a cobrança da Starlink, a ida e vinda do VPN e a multa a usuários mobilizam não só os meios jurídicos, mas o bolsonarismo e a opinião pública. Para dar um basta no X e no uso das redes contra a imagem e a democracia do Brasil, Xandão pode estar fazendo justamente o jogo de Musk e da extrema direita interna e internacional.

 

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