sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Luiz Carlos Azedo - Mineradoras querem distância do garimpo

Correio Braziliense

A Corte de Justiça britânica, os tribunais europeus e dos Estados Unidos estão se considerando competentes para julgar desastres ecológicos em terceiros países

O CB Debate desta quinta-feira (05/09) traz como tema Segurança Jurídica e a Competitividade da Mineração Brasileira. Raul Jungmann, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), participou do painel Desafios Tributários e Regulatórios que Ameaçam a Competitividade da Mineração Brasileira. - (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

"Nós não temos absolutamente nada a ver com o garimpo ilegal e somos radicais nesse sentido. Garimpo ilegal é caso de polícia, é caso de cadeia, quero frisar isso com muita clareza", disse o ex-ministro Raul Jugmann, diretor presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), durante o seminário Segurança Jurídica e Competitividade da Mineração Brasileira, promovido pelo Correio Braziliense, ontem, em parceria com a entidade.

O presidente do Correio Braziliense, Guilherme Machado, ressaltou a importância do evento para discutir o futuro do setor minerador no Brasil: "Só no primeiro semestre (deste ano), o setor de mineração representou 41% dos dados da balança comercial brasileira com faturamento de mais de R$ 120 bilhões", apontou.

"Mineração responsável, com função econômica, é absolutamente antípoda do que é o garimpo ilegal", disse Jungmann, que destacou as medidas práticas adotadas pelo setor junto a Receita Federal para a nota fiscal eletrônica, que visa coibir o ouro ilegal. O Ibram pediu ao Banco Central e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a fiscalização das DTVMs, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas responsáveis pela intermediação de ativos. "Elas são exatamente a lavanderia do ouro ilegal ", afirmou.

O ex-ministro da Reforma Agrária, da Defesa e da Segurança Pública disse que as mineradoras querem distância do garimpo ilegal após o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacar a gravidade da exploração ilegal de ouro em terras indígenas. As mineradoras, segundo Jungmann, são contra a presunção de boa-fé no comércio de ouro, regra que permitia que a legalidade do ouro adquirido fosse presumida com base nas informações fornecidas pelos vendedores. A regra foi suspensa pelo STF em abril de 2023, após duas ações diretas de inconstitucionalidade.

Gilmar havia destacado a tendência mundial de os países estabelecerem normas de longo prazo para a exploração mineral, porque essas atividades impactam diretamente a vida dos moradores e indígenas em locais de exploração. O magistrado disse que a atuação das mineradoras tem potencial de causar danos sérios ao meio ambiente e impactar a vida dos moradores e povos tradicionais nas áreas de exploração.

A Vale e a Samarco, ainda hoje, respondem a processos por causa das tragédias de Brumadinho e Mariana, em Minas Gerais. Este é o "xis" da questão: a atividade mineradora, para transitar da economia do carbono para a economia limpa, precisa ter uma forte política de redução de danos, prevenção de desastres ecológicos e compensação ambiental. A sua segurança jurídica agora tem esse paradigma.

Transição energética

Para Ana Sanches, presidente do Conselho Diretor do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), as tecnologias verdes são indispensáveis para combater os efeitos das mudanças climáticas. "Investindo na agenda de energia limpa, nós podemos nos consolidar como um dos maiores fornecedores globais de minerais críticos e estratégicos", disse. O Brasil tem um subsolo abundante em minerais essenciais para a transição energética: minério de ferro de alta qualidade, níquel, nióbio, lítio, grafite, terras raras, fundamentais para a fabricação de baterias, bobinas eólicas e novas tecnologias verdes.

Também participaram do evento o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco; o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Márcio Elias Rosa; o diretor de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Roberto Muniz; e o embaixador Rubens Barbosa.

Gonet destacou que não se pode fazer nenhuma análise da mineração sem segurança jurídica. Esse tema foi muito abordado pelo ex-presidente do STF Nelson Jobim e pelo embaixador Barbosa.

Jobim criticou a atuação do STF: "Nós não temos segurança jurídica na medida em que se atribui ao Poder Judiciário a possibilidade de dar soluções de conveniência do problema em vez de soluções na sentença em relação à aplicação da lei".

Entretanto, atribuiu a "extrapolação" à judicialização da política. Para Rubem Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e em Washington, o gerenciamento de risco das empresas de mineração é imperativo. A Corte de Justiça britânica, os tribunais europeus e dos Estados Unidos estão se considerando competentes para julgar desastres ecológicos em terceiros países.

Muniz atribui à insegurança jurídica um dos problemas que contribuíram para a desindustrialização do país, "que fez o Brasil e vários países perderem espaço para a China nas últimas décadas". A propósito, Elias Rosa disse que o cenário atual exige mais do que a modernização — demanda um novo modelo de indústria: "O ambiente regulatório de negócios no Brasil não favorece nem a segurança jurídica, nem a competitividade".

A mineração ocupa, hoje, cerca de 2,2 milhões de pessoas, de forma direta ou indireta, e representa 4% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional, segundo dados de 2023. Seu faturamento chega a R$ 248 bilhões, sendo US$ 43 bilhões em exportações, que representam 32% do saldo positivo da balança comercial. Gera R$ 80 bilhões em impostos e quase R$ 7 bilhões em royalties.

 

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