Correio Braziliense
O magnata da tecnologia acredita que seu
poder está acima das instituições brasileiras e que pode se relacionar
diretamente com a nossa sociedade
A presença de magnatas na política
norte-americana sempre teve forte influência na projeção de poder dos Estados
Unidos no mundo, seja por meio de sua política de Estado ou pela presença de
suas corporações nos outros países, principalmente onde há petróleo ou um
grande mercado consumidor. Historicamente, esse é o caso do Brasil.
Alguns desses magnatas foram “self-made man”, alcançaram sucesso, riqueza e prestígio por conta própria. Andrew Carnegie começou como um operário têxtil e se tornou um dos magnatas do aço mais ricos do século 19; Thomas Edison superou muitos obstáculos como inventor para se tornar um empresário de sucesso.
O “self-made man” é o mito do
empreendedorismo. John Davison Rockefeller (1839-1937) talvez seja o seu grande
ícone. Comprou sua primeira refinaria em 1870; dois anos depois, a National
Refiner´s Association era dona de 21 das 26 refinarias de Cleveland, dando
origem à indústria petrolífera. Em 1882, fundou a Standard Oil Company, que se
tornaria um monopólio tão poderoso que originou uma lei federal contra
monopólios.
Financiador do Partido Republicano,
Rockefeller apoiou fortemente Abraham Lincoln. Ganhou muito dinheiro durante e
após a Guerra Civil com petróleo e ferrovias. Membro militante da Igreja
Batista, atribuiu a fortuna primeiro a Deus e aos conselhos da mulher. Doou boa
parte dela a várias instituições, principalmente à Universidade de Chicago.
Fundado em 1901, em Nova York, o Instituto Rockefeller até hoje dedica-se a
pesquisas médicas. Morreu aos 97 anos.
Howard R. Hughes (1905-1976), personagem do
filme “O aviador”, de Martin Scorsese, era inventor, industrial, produtor de
cinema, excêntrico, hipocondríaco e viciado em drogas. Projetou e pilotou
aviões com os quais bateu recordes de aviação, inclusive em uma volta ao mundo.
Namorou Katharine Hepburn, Jean Harlow, Gingers Rogers, Jane Russell e Bette
Davis; segundo o biógrafo Charles Higham, era bisexual e teria casos com
Randolph Scott e Cary Grant.
Além de ter mania por limpeza e o medo de
germes, Hughes era racista e antissemita. Anticomunista, foi informante de J.
Edgar Woover, que dirigiu o FBI de 1924 a 1972, durante o macartismo. Ligou-se
à máfia e a políticos corruptos, entre os quais os ditadores de Cuba, Fulgêncio
Batista, e da Nicarágua, Anastasio Somoza. Era financiador de Richard Nixon,
que presidiu os Estados Unidos de 1969 a 1974, quando foi afastado por
impeachment.
Sujeito pós-moderno
O magnata sul-africano Elon Reeve Musk tem
cidadania canadense e norte-americana. É dono das empresas de alta tecnologia
SpaceX, Tesla, Hyperloop, Neuralink, Startlink, The Boring Company e, mais
recentemente, da X, antigo Twitter, que comprou por US$ 44 bilhões. Começou sua
fortuna aos 12 anos, em Pretoria, quando vendeu seu primeiro jogo virtual por
US$ 500. Nos Estados Unidos desde os 17 anos, criou a Zip 2, plataforma de
jornais vendida por US$ 300 milhões. Depois, a Paypal, vendida para a Ebay em 2003.
Segundo homem mais rico do mundo, lidera um
grupo de empresários do Vale do Silício, na Califórnia, que apoia o
ex-presidente Donald Trump e pretende doar US$ 45 milhões (R$ 246 milhões) por
mês ao “America PAC”, um “comitê de ação política” do candidato republicano. Os
“Super PAC” são entidades jurídicas que não podem financiar diretamente um
candidato, mas podem gastar com publicidade e outras ações.
Os apoiadores de Trump no Vale do Silício são
homens brancos de ideologia “woke”, conservadores, que acusam os democratas de
complacência com as reivindicações das minorias. Acham que a diversidade e a
igualdade jogam contra a excelência e a eficácia. Esperam que Trump promova as
criptomoedas e a tecnologia de defesa, e desregulamente as aquisições de
startups. Esse grupo é conhecido como a “Máfia PayPal”.
Musk comprou o antigo Twitter para ampliar
sua influência política nos Estados Unidos e nos países onde atua, com
propósito de alavancar seus negócios. Tornou-se um ator político. Aqui no
Brasil, é aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, o que está por trás de sua
queda de braços com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de
Moraes. Musk se recusa a tirar do ar perfis de acusados de participar da
tentativa de golpe de estado de 8 de janeiro de 2023.
Na sexta-feira (30), Moraes mandou a Anatel
tirar do ar e proibiu o acesso por VPN à plataforma X, porque Musk retirou e,
agora, se recusa a indicar um representante legal da plataforma no Brasil; na
quinta, Moraes havia bloqueado os ativos financeiros da Starlink, empresa que
fornece sinais de satélite a regiões remotas do Brasil, por causa do não
pagamento de US$ 18 milhões em multas pela X. Em resposta, o magnata anunciou
que fornecerá os sinais gratuitamente. Na queda de braços, ainda ameaçou divulgar
“longa lista de crimes” que, segundo ele, foram cometidos por Moraes,
“juntamente com as leis brasileiras específicas que ele violou”.
Musk acredita que seu poder está acima das
instituições brasileiras e que pode se relacionar diretamente com a nossa
sociedade. Moraes é um “sujeito iluminista”, centrado, autônomo, focado na
razão, cujas decisões são solitárias, lidando com um magnata cujo público-alvo
é o “sujeito pós-moderno”, deslocado, descentrado e sem certezas, que assume
diferentes identidades e se utiliza das suas redes sociais. É um embate para o
qual o Supremo Tribunal Federal foi desafiado por um ator exógeno, porém,
conectado com a polarização política existente no país. Não é uma briga de
peito aberto ou que se resolva com uma canetada, em meio a mudanças
estruturais, institucionais e culturais complexas.
Abaixo o censor psicopata Moraes
ResponderExcluirMuito bom o artigo.
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