O Globo
O Brasil não está pegando sozinho. Criminosos
incendeiam o país na certeza da impunidade e de penas brandas
O fogo se espalhava por toda a beira da rodovia, na BR-010, numa propriedade em Conceição do Tocantins, perto da Chapada dos Veadeiros, quando uma equipe do Ibama, com uma viatura descaracterizada, parou e flagrou o dono da fazenda. Era ele mesmo incendiando. Admitiu que havia iniciado o incêndio: “Eu não vou mentir”. Alegou que era um “fogo controlado” para fazer um aceiro. Aceiros são uma faixa sem vegetação feita exatamente para proteger do fogo, e isso não se faz ateando fogo desta forma. O flagrante aconteceu na noite de domingo, quando a equipe do Ibama voltava de uma operação.
O homem foi autuado e responderá pelo crime
ambiental, mas isso tem acontecido ao longo de todo o país. Viaturas do Ibama
sem identificação têm circulado e visto cenas assim. Eu tive acesso ao vídeo e
postei no meu blog. Curioso é que o fazendeiro fala o tempo todo que teve
prejuízos ambientais e econômicos por causa de fogo que outros colocam. E
insiste que tudo era feito de forma controlada. O responsável pela equipe do
Ibama reage.
— Não é nessa época que o senhor faz isso,
não é sem autorização, não é desta forma, não é no auge da crise do fogo do
Brasil e da seca que o senhor vai botar fogo aí.
O Brasil não pegou fogo sozinho. Bandidos,
com motivação diversa, estão fazendo “dias do fogo” sucessivos em pontos
diferentes do país. O crime encontra um meio ambiente ressequido e propenso ao
alastramento das chamas por uma seca severa. Na Amazônia,
são dois anos sucessivos de estiagem que fizeram sumir a água de rios
caudalosos. A impunidade os incentivará a continuar, as penas brandas para os
crimes ambientais são igualmente um estímulo.
A Polícia
Federal já abriu 52 inquéritos. Uma fonte da PF me conta que já
foram feitas várias prisões, mas muitas foram relaxadas pela Justiça.
—Nas investigações tanto da PF, quanto das
polícias civis dos estados, há o tempo necessário da investigação. Além disso,
a pena é baixa, há dificuldade em fundamentar pedido de prisão cautelar. E não
podemos atropelar o processo. E temos muitas medidas pendentes de apreciação
pelo Judiciário.
O olho arde, o cheiro de queimado ocupa o
nariz, que aspira o ar com dificuldade, a fumaça encobre os prédios e deixa
entrever um sol avermelhado e quente em pleno inverno. Era esse o cenário visto
por quem saiu à rua em Brasília,
ontem, às seis e meia da manhã. Ao longo das horas, a fumaça parecia se
dissipar, ajudada pelo vento. Mas, perto do meio-dia, moradores começaram a
trocar vídeos com as imagens de ondas de fumaça varrendo áreas diferentes da
cidade que é o símbolo do poder no Brasil. Não chove há 146 dias e contando. O
fogo que queima o país, enche de fumaça também a cidade onde moram os
representantes da cúpula dos três poderes.
O ministro Flávio Dino,
do STF,
quer que o governo emita, com autorização do Congresso, créditos
extraordinários, que seriam contabilizados fora do teto de gastos estabelecido
pelo arcabouço. Quer mobilizar os esforços necessários para apagar o fogo que
se alastra pelo Brasil. Créditos extraordinários são para emergência. E essa é
uma emergência.
O problema não é apenas como encontrar
recursos para o momento dramático que vivemos, mas o que fazer para lutar
contra esse cenário distópico e apocalítico que atingiu o Brasil. Queimadas
acontecem em outras partes do mundo, secas ocorrem em regiões diversas, mas o
que nós estamos vivendo no Brasil tem razões bem específicas.
O país tem atentado contra o seu patrimônio
natural há muito tempo, mas houve uma aceleração dos ataques nos últimos anos.
E agora há uma escalada de crimes por razões e atores diversos. É o grileiro na
Amazônia e criminosos de diversos tipos no Brasil inteiro. Como entender os
fogos ateados simultaneamente contra usinas de açúcar e álcool em São Paulo?
Isso numa época em que as usinas não usam mais o fogo, porque todo o resíduo da
produção é usado na geração de energia.
No Rio, há 20 pessoas investigadas. Nos
últimos dias, o fogo tem atingido áreas verdes perto de favelas, como aconteceu
na Serra da Misericórdia, no Complexo do Alemão. Pelo Brasil inteiro há
flagrantes, autuações e prisões. O presidente do STF, Luís Roberto
Barroso, relatou que recebeu um telefonema do presidente Lula
pedindo para que a Justiça ajude na punição dos responsáveis. O fato é que o
Brasil está exposto e vulnerável à ação dos incendiários.
Não existem respostas e soluções simples para problemas ( altamente ) complexos. Mas, digamos que parcela considerável da elite econômica, social e política do Brasil é xucra. Nada muito mais que isso. Simples assim.
ResponderExcluir😏😏😏
Xucros são os cavalos de boa parte dos fazendeiros que ainda usam estes animais pra manejar os rebanhos ou pra se deslocar dentro da propriedade. E eles (os equinos) são domados, de forma branda ou forçada. Eles (os fazendeiros do agronegócio) também devem ser domados...
ResponderExcluirO Brasil e nossos ambientes naturais SEMPRE ESTIVERAM expostos e vulneráveis à ação dos incendiários! O livro de Warren Dean, "A ferro e fogo", demonstra isto magnificamente, principalmente para a nossa mata atlântica. O "fogo" do título não é mera figura de linguagem.
ResponderExcluirAlguns ateiam fogo para culpar o governo de desmazelo com o meio ambiente,pode ser isso.
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