Valor Econômico
Cadeirada mostra que campanha em SP está contaminada pela estratégia de inocular a violência no debate para minar a política e abrir espaço ao judiciário
A campanha paulistana está irremediavelmente
contaminada pela estratégia de inocular a violência no debate para minar a
política. O sinal mais claro disso, depois da cadeirada de José Luiz Datena
(PSDB) em Pablo Marçal (PRTB), foi a pergunta de Ricardo Nunes (MDB) a
Guilherme Boulos (Psol) na retomada do debate do domingo na TV Cultura. “Você
cheirou?”, disse Nunes ao responder à indagação de Boulos sobre uma
investigação da Polícia Federal, a chamada “máfia das creches”, na Prefeitura
de São Paulo.
A aposta num pacto de civilidade parece fadada ao fracasso nos cinco debates que faltam até o fim da campanha. Marçal pautou a violência, impulsionou suas redes e segue disputando a hegemonia da extrema direita. Datena deu ânimo à sua combalida campanha ao partir pra cima do “ironman”. Tabata Amaral (PSB) exagera no discurso mulher-é-diferente mas, assim como Marçal, ainda que por razões opostas, só tem a ganhar nesta campanha. E, finalmente, Nunes e Boulos anteciparam o tom do embate que esperam ter no 2º turno de uma campanha que já parece interminável.
A ruína da política escancara as portas ao
Judiciário. O boletim de ocorrência de Marçal contra Datena vai resultar, no
máximo, numa cesta básica. O que ainda não se sabe é o que virá na mão inversa.
Hoje a ingerência está limitada aos direitos de resposta e bloqueio de perfis
nas redes. Advogados de várias campanhas, porém, duvidam que a Justiça
Eleitoral se mantenha contida ante os indícios de vinculação do candidato com o
crime organizado se a política não for capaz de segurar Marçal.
No resto do país, o compasso não é de espera.
A presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Carmen Lúcia, encontra,
nesta terça, os presidentes dos 27 Tribunais Regionais Eleitorais para mais uma
reunião sobre as evidências de que o crime organizado se vale dessas eleições
como porta de entrada dos serviços municipais, da economia formal e do Estado.
O presidente do Tribunal Regional Eleitoral
do Rio de Janeiro, Henrique Figueira, é a ponta de lança. Votou pela condenação
do governador Claudio Castro ainda que o julgamento já estivesse definido pela
absolvição. Na sexta-feira, a Corte que preside tomou, por unanimidade, uma
rara decisão. Indeferiu o registro de candidatura de um candidato a vereador de
Belford Roxo, na Baixada Fluminense, por não preencher os requisitos de
probidade e moralidade, ainda que não estivesse incurso na Lei da Ficha Limpa,
que prevê condenação em duas instâncias.
O candidato, Sergio Accioly dos Santos
(Republicanos), está preso preventivamente. Operação do Ministério Público do
Rio flagrou um pacto que o candidato fez com lideranças do narcotráfico para
ter acesso a uma comunidade. Revelou-lhes sua intenção de “ganhar a eleição
para estar dentro”, numa referência à divisão do bolo de verbas públicas.
Numa reunião no TSE, dois meses atrás,
Figueira disse que não ficaria quieto ante a barbárie que haviam se
transformado as disputas eleitorais do seu Estado. Não foi o único. Outros
presidentes de tribunal também demonstraram a intenção de reagir, ainda que o
do Rio tenha tido a primazia nesta eleição, em confirmar a negativa de registro
de um candidato sem condenação em duas instâncias.
Pelo menos outros 19 estão na fila do TRE-RJ.
Kaio Brazão (Republicanos), candidato a vereador e enteado de Domingos Brazão,
preso como mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco, teve seu
registro indeferido por abuso de poder econômico. O deputado estadual Rodrigo
Amorim (União), candidato à Prefeitura do Rio, foi barrado por violência
política de gênero contra uma vereadora trans. E Anthony Garotinho (União),
candidato a vereador, teve sua candidatura indeferida por improbidade
administrativa.
Na reunião desta terça-feira, testemunhos de
outros presidentes de tribunais são aguardados no TSE, não apenas sobre
condutas em relação a candidaturas vinculadas ao crime organizado quanto de
ameaças de criminosos. Na semana passada, a presidente da Corte recebeu
telefonema da ex-vice-governadora e ex-secretária-executiva do Ministério da
Educação, Izolda Cela, candidata a prefeita de Sobral (CE). Como tentou entrar
em comunidades sem pactuar com o crime organizado recebeu ameaça de morte e viu
seu marido ser agredido numa passeata. A ministra recebeu a mesma queixa da
deputada federal Talíria Petrone (PSol), candidata à Prefeitura de Niterói.
As candidaturas barradas pelo novo
entendimento da Justiça Eleitoral cujos recursos chegarem ao TSE não terão vida
fácil. O entendimento que se espraia na Corte é o de que as vedações baseadas
na vida pregressa dos candidatos estão abrigadas no artigo 14 da Constituição,
que se sobrepõe à Lei da Ficha Limpa.
A Justiça Eleitoral avança nesta direção num
momento em que o Congresso se prepara para afrouxar a Lei da Ficha Limpa,
movimento que arrisca findar na suspensão da inelegibilidade do ex-presidente
Jair Bolsonaro em 2026. É a crônica de um embate anunciado. Candidatos veem
mais discricionariedade da Justiça Eleitoral com a vedação de candidaturas com
base na “vida pregressa”, requisito hoje aplicado apenas para nomeações de
concursados na área de segurança. Magistrados não dão sinais de que estão
dispostos a recuar. E na campanha de Pablo Marçal a única certeza é de que sua
retirada da disputa pela Justiça Eleitoral seria um passe para a disputa
presidencial de 2026. Quem quiser esperar sentado que segure sua cadeira.
Muito bom! O crime organizado se armou muito mais com a política armamentista implantada pelo DESgoverno Bolsonaro. Agora, a bandidagem quer eleger seus próprios candidatos, como Marçal em SP, e vereadores em muitas cidades, especialmente no RJ, onde Bolsonaro fez sua carreira com apoio de militares golpistas e milicianos de todos os tipos.
ResponderExcluirPois é.
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