sábado, 7 de setembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ataques à imprensa põem em risco a democracia

O Globo

Publisher do New York Times descreve roteiro de perseguição adotado por populistas autoritários no mundo todo

A liberdade de expressão entrou em foco no debate brasileiro com a suspensão da rede social X. Mas, apesar dos desafios inerentes às plataformas digitais, as ameaças à imprensa profissional mundo afora continuam a representar riscos mais preocupantes para a democracia. As investidas têm vindo de governos populistas cujas inclinações autocráticas se manifestam num roteiro comum a vários países, como HungriaÍndia, Brasil ou mesmo Estados Unidos.

“As ameaças mais perniciosas à liberdade de imprensa tomam uma forma prosaica: um ambiente de assédio, litigância financeira punitiva, burocracia atuando como arma, aliados montando operações de ataque — tudo com o objetivo de diminuir uma imprensa enfraquecida por anos de luta financeira”, escreveu A.G. Sulzberger, publisher do jornal The New York Times, em artigo publicado pelo principal concorrente, o Washington Post.

Diante da possibilidade de Donald Trump voltar à Casa Branca — Trump chama jornalistas de “inimigos do povo” e não esconde seu desejo de cerceá-los —, Sulzberger conta que passou meses estudando ataques à liberdade de imprensa em regimes democráticos, como a Hungria de Viktor Orbán, a Índia de Narendra Modi e o Brasil, quando governado por Jair Bolsonaro.

Com pequenas variações, diz Sulzberger, o modus operandi desses governantes segue um roteiro comum: 1) discurso para desacreditar o jornalismo e assédio corriqueiro, com o objetivo de criar clima favorável à repressão; 2) uso de leis e regras regulatórias para perseguir desafetos; 3) incentivo para apoiadores abrirem processos em diferentes jurisdições, com a intenção de provocar prejuízo; 4) apoio para simpatizantes poderosos adotarem táticas de ataque à imprensa; 5) punição a jornalistas independentes e recompensa a quem é fiel ao governo.

Na Hungria, Orbán usou leis tributárias, licenciamento do espectro e verbas do governo para asfixiar veículos críticos e favorecer os dóceis. Seus aliados controlam hoje 80% da imprensa húngara. Na Índia, o regime de Modi tem bloqueado reportagens sobre protestos contra sua política econômica e a repressão à minoria muçulmana. No ano passado, a pretexto de realizar uma auditoria tributária, autoridades invadiram redações para capturar computadores e celulares de jornalistas.

“No Brasil”, escreve Sulzberger, “Bolsonaro foi incapaz de solapar completamente os freios e contrapesos do país e perdeu a eleição. Embora a maior parte do dano tenha sido revertido, normas que cercam as liberdades de imprensa e de expressão continuam enfraquecidas.” Como exemplo de abusos, ele cita casos de assédio judicial promovido por políticos contra jornalistas profissionais.

É preciso ouvir o alerta de Sulzberger: “O enfraquecimento de uma imprensa livre e independente importa qualquer que seja seu partido ou ideologia. O fluxo de notícias e informações confiáveis é crítico para uma nação próspera, livre e segura”. A imprensa livre, diz ele, “instila a compreensão mútua e o engajamento cívico; desenterra a corrupção e a incompetência para garantir que o bem da nação está acima do interesse de qualquer líder”. Diante das mentiras propagadas pelo populismo autoritário, a missão da imprensa continua a mesma: contar a verdade. Sem ela, não há democracia.

Trabalho da Justiça Eleitoral não se esgota com o fim da apuração

O Globo

A cada 12 dias, um prefeito é cassado no Brasil. Enfraquecer Lei da Ficha Limpa deixará país mais exposto

Em outubro, um colégio eleitoral de 155 milhões de eleitores escolherá prefeitos para 5.569 municípios entre pouco mais de 15 mil candidatos. O trabalho do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não se esgotará na votação. Desde 2007, foram realizadas 548 eleições suplementares para substituir prefeitos eleitos cassados ou cuja candidatura foi impugnada. Nesse período, a cada 12 dias um prefeito perdeu o cargo. Não é pouca coisa. A depuração da vida pública precisa ser parte do cotidiano institucional. E, pelo menos no nível municipal, tem havido novas eleições com frequência.

Candidatos costumam concorrer sub judice, por força de alguma liminar, quando há processo em andamento, e é comum a Justiça Eleitoral depois cassar o mandato do prefeito, forçando nova eleição no município. Em junho, três cidades de Minas Gerais, Pará e Roraima foram às urnas para escolher prefeitos que cumprirão mandato-tampão com a cassação dos antecessores.

Entre as principais irregularidades estão compra de votos, abuso de poder político ou econômico. “A razão dessas cassações é a lisura do pleito. Em tese, ele [o candidato] ganha pelo voto, mas, a bem da verdade, ele ganhou pelo voto que comprou”, diz Stephany dos Santos, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).

A tecnologia também tem ajudado, por meio do aplicativo TSE Pardal, lançado em 2014 e aperfeiçoado para o pleito deste ano. Ele recebe denúncias de irregularidades. Nos primeiros dez dias de funcionamento, foram mais de 14 mil referentes a propaganda irregular.

Ao mesmo tempo, a Justiça começa, acertadamente, a cobrar multas dos cassados para compensar o custo adicional das novas eleições. Em fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região condenou ex-prefeitos a ressarcir despesas de R$ 95,6 mil em Parobé e R$ 24,7 mil em Bom Jesus, no interior do Rio Grande do Sul.

O filtro mais importante para evitar a entrada de criminosos em Casas Legislativas e no Executivo é a Lei da Ficha Limpa, que torna inelegíveis por oito anos condenados em segunda instância, por organismos colegiados, mesmo que na esfera administrativa. O projeto que desidrata os critérios da lei, facilitando a presença de criminosos condenados em cargos eletivos, foi aprovado na Câmara e está no Senado, onde deverá ir a votação depois das eleições. A esperança é que seja rejeitado pelos senadores.

Do contrário, o Brasil perderá um dos mais eficazes mecanismos para coibir a corrupção e a gestão temerária do patrimônio público. Em qualquer situação, a Justiça Eleitoral precisará continuar a acompanhar com afinco as denúncias que chegam a ela. Trabalho não faltará para fiscais, promotores, juízes e policiais, mesmo depois da totalização dos votos.

Datafolha traz más notícias para Marçal

Folha de S. Paulo

Candidato do PRTB tem alta rejeição e perderia no 2º turno para Nunes e Boulos, com quem se mantém empatado na liderança

A pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira (5) teve sabor agridoce para os três candidatos que lideram as intenções de voto na disputa pela Prefeitura de São Paulo.

O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o influenciador Pablo Marçal (PRTB) repetiram o empate triplo de 15 dias atrás, agora com números ainda mais próximos do que antes: 23%, 22% e 22%, respectivamente.

Para Boulos, a manutenção de um mesmo patamar ao longo de seguidas pesquisas pode ser motivo de otimismo, se o percentual for visto como um piso sólido, ou de preocupação, caso seja considerado um teto muito baixo.

Nunes, por sua vez, viu a consolidação de um concorrente direto pelos eleitores bolsonaristas, mas pode celebrar seu desempenho em um eventual segundo turno. De acordo com a pesquisa, o prefeito venceria, com relativa folga, tanto Marçal (53% a 31%) quanto Boulos (49% a 37%).

Marçal, por fim, estabeleceu-se de vez no pelotão da frente, mas não repetiu a ascensão registrada no levantamento anterior, quando tinha passado de 14% para 21% das preferências. Além disso, caracterizando-se por uma conduta abjeta, o influenciador causa repulsa a cada vez mais gente conforme se torna mais conhecido.

Mais atrás na pesquisa, Tabata Amaral (PSB), com 9%, surge pela primeira vez numericamente à frente de José Luiz Datena (PSDB), que tem 7%. Se a candidatura do apresentador dá poucos sinais de que possa empolgar os paulistanos, a da deputada ainda pode nutrir esperança por ter registrado uma oscilação positiva.

Tudo somado, o quadro pintado pelo Datafolha há duas semanas sofreu pouca alteração —fato digno de nota quando se leva em conta que, nesse período, começou a campanha de rádio e TV.

Ou seja, a propaganda eleitoral, ao menos por ora, não provocou grande novidade. Assim como a participação mais intensa dos principais padrinhos: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao lado de Boulos, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com Nunes.

Diante desse cenário, é de esperar que Nunes invista na polarização esquerda X direita e se apresente como nome mais forte do que Marçal para enfrentar, no segundo turno, a chapa PSOL-PT. Ao menos em tese, esse discurso tem potencial de atrair bolsonaristas ora entusiasmados com o autointitulado ex-coach.

Marçal, de seu lado, tem bons motivos para fazer do atual prefeito seu principal alvo na disputa. É que, embora ele esteja em desvantagem nos dois cenários de segundo turno, seu desempenho contra Boulos (45% a 39% para o candidato do PSOL) é melhor do que contra Nunes.

Boulos, por fim, também há de querer evitar Nunes no segundo turno —de modo que ninguém se surpreenda se o líder de esquerda fizer uma dobradinha improvável com o influenciador de direita para desidratar o prefeito.

Preconceito contra bolsistas vem à tona

Folha de S. Paulo

Discriminação de alunos de baixa renda em colégios de elite deve ser enfrentada por ações nas escolas, mais que por leis

A concessão de bolsas em colégios de elite para alunos de baixa renda é importante ferramenta para a diminuição de desigualdades.

Mas a conquista dessa oportunidade é só o primeiro obstáculo a ser superado. Após a matrícula, surgem outros, baseados em diferenças sociais. O suicídio de um bolsista que havia contado sofrer discriminação numa escola paulistana, em agosto, acendeu o debate sobre o tema.

A Folha ouviu relatos em outras escolas que incluem desde manifestações indiretas de preconceito até as mais explícitas.

Alunos que não pagam mensalidade apontam limitações na socialização, como não serem convidados para festas ou terem sua vestimenta criticada. O problema se agrava com piadas e apelidos discriminatórios sobre a situação econômica dos bolsistas, e até sobre raça e sexualidade.

Além do bullying, presencial e online, há reclamações sobre sobre a estrutura de ensino.

Algumas instituições ofertam aulas apenas à noite para os bolsistas —que não podem entrar na escola antes do horário das aulas— ou em prédios separados. Uma aluna contou que até competições esportivas eram separadas entre os que pagavam e os que não pagavam mensalidade.

Por óbvio, disputas e formações de "tribos" de jovens por afinidades são naturais nessa fase da vida, mas o comportamento preconceituoso e agressivo contumaz é mal que precisa ser combatido —e a mera criação de leis não é o caminho mais eficaz.

O bullying é crime no Brasil desde janeiro deste ano. Ademais, escolas que oferecem bolsas recebem abatimento de impostos por terem o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, do Ministério da Educação, que é regulado por uma lei que veda "discriminação ou diferença de tratamento entre alunos bolsistas e pagantes".

Como se vê, não é o bastante para impedir a profusão de relatos de práticas discriminatórias.

Pesquisa da FGV num colégio particular mostra que a diversidade social no ambiente escolar é benéfica para não bolsistas, que têm notas melhores quando estudam com não pagantes.

Ações pedagógicas contínuas de esclarecimento, para pais e alunos, sobre a importância do pluralismo na educação, os males causados pelo bullying e formas de se proteger no ambiente online por meio da educação midiática são algumas medidas.

Além disso, capacitação de professores e funcionários para reconhecer práticas abusivas e a criação de uma rede de apoio para as vítimas são fundamentais.

A Independência deve iluminar o futuro

O Estado de S. Paulo

O 7 de Setembro será uma data como outra qualquer se não servir para profunda reflexão sobre o bom uso da liberdade da Nação como única via para um país mais auspicioso para todos

O Brasil celebra hoje 202 anos como país soberano. A Independência do então Reino de Portugal marcou a ruptura com o passado colonial e a afirmação de um povo que almejava traçar o próprio destino. É de um anseio por liberdade e progresso que se trata. O 7 de Setembro, portanto, será apenas uma data qualquer no calendário se não servir para que os cidadãos reflitam sobre as experiências coletivas acumuladas nestes mais de dois séculos e, principalmente, decidam que passos hão de ser dados pela Nação brasileira em direção a um futuro mais auspicioso para todos.

Esse salto verdadeiramente libertador jamais poderá ser dado em sua plenitude enquanto os cidadãos não enxergarem uns nos outros os traços de união que os fazem brasileiros acima de tudo. Nos últimos anos, como tristemente se constata, os atributos que os separam têm sido os mais realçados. O estímulo à cizânia foi covardemente instrumentalizado como um ativo político-eleitoral. Soluções de consenso para problemas graves que ainda mantêm o País aferrado ao atraso não raro sofrem sérias interdições em decorrência de animosidades fabricadas por quem, ao contrário, deveria pregar a união nacional em prol do bem comum.

Todo dia é dia de pensar no significado de ser independente, mas hoje particularmente. Ser independente não se restringe a uma mera declaração de autonomia, como aquela de 1822. É um exercício contínuo, diário, muitas vezes árduo e frustrante. Escolhas coletivas exigem da sociedade – de qualquer sociedade, não só a brasileira – maturidade política, social e econômica. A Independência que hoje se celebra significa, antes de tudo, a capacidade do povo de se autodeterminar com responsabilidade, vale dizer, com respeito às leis e à Constituição pactuadas em conjunto e, sobretudo, com respeito aos seus concidadãos.

Não se constrói um país genuinamente livre sem respeito às liberdades individuais e aos direitos e garantias fundamentais assegurados a todos pela Lei Maior. Isso se materializa em instituições sólidas e confiáveis, comprometidas com o Estado Democrático de Direito, e numa sociedade civil engajada na defesa dos valores republicanos. Contudo, o que se vê com frequência maior do que seria suportável são autoridades que se julgam acima das instituições que representam e uma sociedade cindida, incapaz de concertar consensos mínimos para o desenvolvimento do Brasil por nem sequer compreender que a miséria de uns é a falência de todos como nação.

É inescapável constatar que esse estado de coisas está instalado no País por força dos estímulos que as desavenças entre os cidadãos, inclusive entre familiares, têm recebido para que projetos políticos individuais – mesquinhos, portanto – se sobreponham aos grandes projetos nacionais. O nome de cada um desses patriotas de fancaria é sobejamente conhecido, de modo que para este jornal, nesta data nacional, interessa mais apelar à consciência cívica dos cidadãos para que examinem como suas ações públicas se coadunam com as necessidades de uma sociedade que precisa urgentemente se reconciliar – o que não significa, em absoluto, calar as eventuais dissonâncias que caracterizam qualquer sociedade democrática e vibrante.

A união nacional não se confunde com homogeneidade de pensamento. Ao contrário. Foi na construção de acordos em torno da pluralidade de ideias e da diversidade de pensamentos e visões que o Brasil encontrou forças para realizar conquistas coletivas inimagináveis. Aí estão a redemocratização do País, a volta das eleições diretas, o Plano Real, a criação do Sistema Único de Saúde, entre tantas outras. A sociedade já foi capaz de mostrar que suas divisões não são insuperáveis, ao contrário do que pregam e estimulam os arautos do caos.

Tendo a Constituição como norte incontornável, cabe a todos os cidadãos, hoje e sempre, desarmar os espíritos e reconhecer que adversários políticos não são inimigos a serem eliminados. O Brasil são muitos. Só a partir dessa compreensão que há de triunfar o verdadeiro espírito da Independência.

Urgência de novas regras para planos de saúde

O Estado de S. Paulo

ANS deve liderar debate sobre um marco regulatório da saúde suplementar. Com tantas queixas de usuários e operadoras, é papel da agência propor modelo mais adequado para o setor

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) vai abrir uma audiência pública para discutir mudanças nas regras de planos de saúde coletivos e individuais. A ideia é garantir transparência aos reajustes das operadoras e preços mais baixos aos usuários, segundo relato do presidente do órgão, Paulo Rebello, à Coluna do Broadcast.

Não é de hoje que o marco regulatório do setor precisa de uma atualização. Em vigor desde 1998, a legislação não tem sido capaz de atender às demandas dos beneficiários e das empresas que atuam no setor. Enquanto clientes demonstram enorme insatisfação com os serviços prestados, operadoras alegam que as mensalidades cobradas não cobrem seus custos.

Os planos individuais e familiares têm reajustes calculados e regulados pela ANS. Os aumentos costumam ficar mais próximos da inflação e, segundo as empresas, são insuficientes para arcar com a variação das despesas médico-hospitalares. Os cancelamentos unilaterais só podem ser feitos mediante inadimplência ou fraude. Quem tem esse tipo de plano não abre mão, mas quem não tem não encontra o produto no mercado a preços acessíveis.

A grande maioria dos beneficiários tem planos coletivos, ou seja, empresariais ou por adesão a entidades de classe. Para esse tipo de contrato, os reajustes são livres, e não são raros os casos em que os índices superam os 200%. As operadoras também podem rescindir os contratos unilateralmente, o que tem gerado uma onda de reclamações e de ações judiciais.

A minuta que a ANS pretende colocar em discussão prevê o agrupamento de planos de saúde coletivos em um mesmo contrato, uma forma de diluir riscos e custos entre um maior número de beneficiários. Os planos também deverão ser mais transparentes em relação a reajustes para que os consumidores possam compará-los e migrar caso encontrem outro que ofereça condições melhores.

Para planos individuais e familiares, a proposta é rever as regras para a chamada revisão técnica. O instrumento permite reajustes extraordinários em caso de desequilíbrio econômico-financeiro, mas a ideia é atrelá-lo à obrigação de retomada da venda desse tipo de produto. Reajustes mais elevados que os calculados pela ANS também poderão ser autorizados, desde que o aumento seja distribuído ao longo dos anos.

A ANS pretende concluir a discussão sobre as novas normas até o fim deste ano para colocá-las em prática em 2025. O debate é urgente, e cabe à agência reguladora conduzi-lo de maneira técnica na busca de um modelo mais adequado para o setor.

À exceção da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), o governo federal tem sido omisso nessa discussão, enquanto o Legislativo tem assumido um protagonismo que não lhe cabe. Em maio, as operadoras fizeram um acordo verbal com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e se comprometeram a suspender os cancelamentos unilaterais, mas as queixas voltaram a subir nas últimas semanas.

Sensíveis às pressões de um lado e de outro, parlamentares oscilam entre abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as operadoras e pautar o projeto de lei defendido pelo setor, que cria planos segmentados – com cobertura para consultas, exames e terapias, mas não internações. Trata-se de um modelo que carece de mais debates e que não está maduro para ser submetido à Câmara.

Em um esforço de combate a fraudes, os planos de saúde tiveram o primeiro resultado operacional positivo desde 2021, segundo a ANS. No primeiro semestre deste ano, o setor registrou lucro líquido de R$ 5,6 bilhões, um aumento de 180% em relação aos seis primeiros meses do ano passado.

Já a carteira dos planos de saúde tem hoje 51,2 milhões de beneficiários, alta de 1,74% ante julho do ano passado. Cada um desses clientes contribui para reduzir a sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS).

São números superlativos, que reforçam a necessidade de a ANS discutir a atualização do modelo do setor de saúde suplementar e de trazer mais equilíbrio na relação entre operadoras e usuários, para garantir um atendimento adequado dos beneficiários e a sustentabilidade econômica do setor.

A sinuca do identitarismo

O Estado de S. Paulo

Ruidoso caso do ministro dos Direitos Humanos coloca o governo das minorias numa saia-justa

Até o momento em que esta nota estava sendo escrita, o sr. Silvio Almeida ainda era ministro dos Direitos Humanos e Cidadania. Na verdade, é irrelevante se o presidente Lula da Silva resolveu manter ou demitir o referido ministro depois que vieram a público denúncias de que Almeida esteve envolvido em assédio sexual dentro do governo. O que importa, neste caso, é a sinuca que o episódio criou para os militantes da causa identitária.

O ainda ministro, como ele próprio fez questão de lembrar, é negro. E desde logo tratou de sugerir que as acusações que sofre fazem parte de uma ofensiva racista. Sem dar os nomes de seus detratores, Almeida afirmou que “há um grupo” que o persegue e “uma campanha” para afetar sua “imagem enquanto homem negro”.

Do outro lado da trincheira se encontra uma ONG chamada Me Too Brasil, em referência ao movimento internacional que apoia mulheres que denunciam assédio sexual de homens. Foi essa organização feminista que denunciou Almeida, sem dar os nomes de quem teriam sido as vítimas, a título de preservá-las.

É um caso sob medida para testar os compromissos de um governo que se elegeu prometendo proteger minorias. Dá para imaginar o grau de constrangimento nos corredores do Palácio do Planalto diante desse dilema, que ganha dimensão ainda maior – e mais espinhosa – porque envolve não só o titular do Ministério dos Direitos Humanos, como a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, supostamente uma das vítimas do sr. Almeida. Qualquer que seja o desfecho, vai deixar a turma identitária indignada, criando atritos justamente numa parte da sociedade em que os petistas se julgam soberanos.

A bem da verdade, já há muitos motivos para indignação, a começar pelo fato, agora conhecido, de que o governo sabia das denúncias há bastante tempo, e que só resolveu agir depois que o caso veio à tona, no dia 5, por meio do site Metrópoles. Também é digno de nota o fato lamentável de que o sr. Almeida escolheu usar os canais oficiais do Ministério dos Direitos Humanos para se defender num caso obviamente privado. Nas suas redes sociais, o Ministério afirmou ainda que a ONG Me Too Brasil teria tentado “mudanças indevidas no formato da licitação” do Disque 100, canal de recebimento de denúncias da pasta. É um assunto que nada tem a ver com as graves denúncias que pesam sobre Almeida, mas a nota claramente visa a desqualificar a ONG – que se queixou de que “esse tipo de reação é comumente adotada por acusados de assédio, que recorrem a campanhas de desmoralização das vítimas, buscando desqualificá-las, na tentativa de desviar o foco e atacar o mensageiro”.

Tem razão o sr. Almeida ao exigir que “qualquer denúncia deve ser investigada com todo o rigor da lei”, além de cobrar que os fatos sejam expostos para que possam ser apurados e processados. O direito de ampla defesa, o devido processo legal e a presunção de inocência ainda estão vigentes neste país. Mas a primeira-dama Janja da Silva já sentenciou Almeida, ao postar em suas redes sociais uma foto em que demonstra apoio à ministra Anielle Franco, numa imagem sem legenda – de resto, desnecessária.

É preciso investir em segurança ambiental

Correio Braziliense

Não basta ter e preservar a melhor legislação ambiental do planeta, é preciso ter investimentos

O Distrito Federal, onde a umidade relativa do ar chegou a 7%, e mais 15 estados estão em alerta de perigo devido ao calor e à seca, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet): Goiás, Tocantins, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além de partes de Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Paraíba, Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rondônia. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), o limite ideal é em torno de 60%.

Nesses estados, há também uma onda de incêndios provocada pela clima seco e por ações criminosas, motivadas por interesses políticos e econômicos. Além do negacionismo em relação ao aquecimento global, de parte da maioria dos políticos, carvoeiros, pecuaristas e grileiros, aproveitam-se da ocasião para "limpar o terreno".

Os incêndios ocorrem não apenas no Pantanal e na Amazônia e regiões de proteção ambiental próximas desses estados. Em Minas Gerais, as autoridades ambientais alertam que as regiões do Triângulo, noroeste, oeste e sul do estado estão em situação de perigo. No Mato Grosso do Sul, a umidade deve baixar a até 8%, e grandes incêndios florestais ainda ocorrem. Um alerta de risco elevado em São Paulo foi renovado pela Defesa Civil do estado, principalmente nas regiões norte, noroeste e oeste, que continuarão com o tempo seco e sem chuvas.

As autoridades recomendam à população tomar muito líquido, evitar atividades físicas e não ficar em exposição ao sol nos horários mais quentes. A hidratação da pele, dos lábios e dos olhos também é muito importante. Em muitas cidades, a fuligem provocada pela fumaça dos incêndios agrava as condições sanitárias decorrentes da baixa umidade. Nesses casos, recomenda-se ainda o uso de máscaras.

Entretanto, essas são providências individuais, capazes de mitigar os efeitos da baixa umidade e do calor, mas que não enfrentam as causas do aquecimento global e dos incêndios. Mesmo as louváveis providências locais para amenizar o sofrimento da população, como a distribuição de água, são insuficientes diante da escala adquirida pelo problema. O desmatamento e a emissão de gases de efeito estufa precisam ser enfrentados efetivamente, no Brasil e no mundo. É uma questão de sobrevivência e segurança.

A COP30, prevista para 2025, em Belém do Pará, será uma oportunidade de voltar a debater a estratégia global de combate ao aquecimento global e a transição da economia do carbono para a economia verde. O Brasil é protagonista desse debate, mas não pode liderar apenas pela palavra da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que, recentemente, advertiu que o Pantanal, daqui a 100 anos, poderá não mais existir se tudo continuar sendo feito como até agora.

É preciso liderar pelo exemplo, pela prática. Nesse aspecto, os governos federal e estaduais ainda são insuficientes. Não basta ter e preservar a melhor legislação ambiental do planeta, que sofre permanente ataque dos negacionistas no Congresso. Precisa-se ter investimentos na área ambiental e planos de contingência  com capacidade de pronta resposta para coibir o desmatamento, enfrentar os desastres naturais e combater as ações de grupos criminosos. Muito vem sendo feito, mas os fatos mostram que é preciso mais.  

 

 


 



 

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