O Globo
“A política é fascinante, mas a literatura é
mais saudável”, disse gestor que dirigia o próprio Fusca e decretou a falência
do município em 1988
A três dias da eleição municipal, o Rio
perdeu seu primeiro prefeito escolhido nas urnas. Roberto Saturnino Braga
morreu ontem aos 93 anos. Era um político à moda antiga, que acreditava no
debate de ideias e na convivência civilizada com os adversários.
Saturnino se elegeu deputado em 1962, pelo
velho PSB. Depois do golpe militar, entrou na mira da ditadura e foi impedido
de concorrer à reeleição. Em 1974, candidatou-se ao Senado pelo MDB.
Contrariando as próprias expectativas, venceu com folga e se juntou à linha de
frente da oposição ao regime.
Com a redemocratização, filiou-se ao PDT de Leonel Brizola e se elegeu prefeito do Rio em 1985. O mandato foi breve e tumultuado. Ele rompeu com o governador, enfrentou uma crise financeira e teve que decretar a falência da cidade. Conhecido como um gestor honesto, que dirigia o próprio Fusca, deixou o cargo com os servidores em greve, sem receber salários. No Jornal do Brasil, Millôr Fernandes cunhou uma frase que o perseguiria até o fim da vida: “O homem que desmoralizou a honradez”.
“A experiência na prefeitura foi uma paulada
na cabeça. Não sei como não tive um infarto”, comentou anos depois, em
depoimento à Fundação Perseu Abramo. “Sofri o chamado linchamento político.
Isso eu senti nitidamente: o desprezo das pessoas”, relembrou.
Em 1996, Saturnino não teve votos para se
eleger vereador. Parecia o fim da linha, mas ele deu outra volta por cima e
retornou ao Senado dois anos depois. Ao fim do mandato, um acordo político o
deixou sem legenda para tentar a reeleição pelo PT. Aos 74 anos,
recém-recuperado de um câncer, ele me disse que havia chegado a hora de dar
adeus às urnas. “É melhor sair numa boa do que derrotado”, justificou.
O ex-prefeito desceu do palanque, mas não
deixou a arena pública. Escreveu livros, organizou seminários, ajudou a formar
novos militantes socialistas. Em 2011, confessou que preferia ter escolhido a
carreira de escritor. “A política é excitante, fascinante, mas a literatura é
mais saudável e compatível com a felicidade. Essa é que é a verdade: a política
suga a felicidade”, explicou.
Questionado se sentia falta do Senado, ele
disse que sofria ao ter que acompanhar tantas sessões “chatas e idiotas”. “O
nível baixou muito”, lamentou. E isso foi antes da chegada dos pastores,
ex-jogadores de futebol e generais de pijama eleitos nos últimos anos.
Muito bom!
ResponderExcluirÉ,a coisa degringolou.
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