domingo, 20 de outubro de 2024

Eliane Cantanhêde - Ao centro, mas que centro?

O Estado de S. Paulo

Eleições municipais projetam a volta ao centro, o que favorece Tarcísio de Freitas e Fernando Haddad

Eleições municipais não definem as presidenciais, mas revelam o ambiente político e projetam – ou minam – partidos, lideranças e candidaturas. Com o racha na “nova direita” bolsonarista e o envelhecimento da esquerda, particularmente do PT, emergem ao palco o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ambos fazendo movimentos ao centro. Tarcísio desliza para a centro-direita, e Haddad, até pelo cargo, para a centro-esquerda.

Dizem que “Deus escreve certo por linhas tortas”. A eleição municipal, de forma tortuosa, complexa, parece empurrar a política brasileira para seu velho eixo, nem tanto à direita, nem tanto à esquerda. Que centro é esse, ainda não está claro, até pelo asfixiamento do centro não apenas no Brasil, mas nas Américas, na Europa, pelo mundo afora. O momento é de radicalização, mas há sinais da volta ao prumo no Brasil.

Um Pablo Marçal não surge à toa, do nada, mas ele mostrou resultados antagônicos: a força de atração de uma parcela significativa da sociedade para o discurso e o gestual estúpidos, agressivos, absurdos, mas também a repulsa e a resistência da maioria. Como foi em São Paulo.

A busca do equilíbrio não é nada fácil. Tarcísio precisa, ao mesmo tempo, da marca Jair Bolsonaro e de se livrar da acidez bolsonarista. Haddad só tem chance se batizado de novo pelo presidente Lula, mas se desvencilhando dos erros, cicatrizes e falta de rumo e de estratégia do PT.

Nessa equação, os primeiros obstáculos a ultrapassar na corrida para 2026 estão dentro de casa. Os maiores inimigos de Tarcísio já põem as manguinhas de fora: Bolsonaro, os filhos, os aliados raiz. E os de Haddad são os que já puxam o tapete do ministro da Fazenda, imaginem do eventual candidato a presidente? Quais? Os petistas, inclusive, ou principalmente, os do comando do partido.

Para os bolsonaristas e parte do petismo, Tarcísio e Haddad têm, vejam só, o mesmo “defeito”: são “liberais demais”. A questão é que, apesar da explosão bolsonarista e do apelo das velhas ideias petistas para a economia, por exemplo, a maioria do eleitorado brasileiro ainda é exatamente assim: liberal, moderado ou... centrista.

Os tempos extraordinários de mensalão, petrolão e do strike da política e dos políticos tradicionais, que empurrou para o fundo do poço a polarização entre PSDB e PT e arranhou gravemente os próprios PSDB e PT, aparentemente estão passando. O grande problema, agora, é como distinguir centro de Centrão; direita de bolsonarismo e esquerda de PT. Há vida política para além do fisiologismo do Centrão, da boçalidade do bolsonarismo e do oportunismo petista.

 

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