segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Irapuã Santana - A urna fala

O Globo

Eleitor busca pragmatismo, algo que tenha impacto na vida dele, concreto, palpável

Depois dos resultados do primeiro turno das eleições municipais, é preciso entender a foto do eleitorado brasileiro a fim de projetar não apenas o que ocorrerá no segundo, mas também a corrida de 2026.

De 155.912.680 aptos a votar, 21,71% não compareceram às urnas, número muito maior que em 2016, quando houve 17,58% de abstenção, e pouco menor que em 2020 na pandemia (23,15%). Em 2022, a abstenção também foi alta e chamou a atenção, mas, ainda assim, mais baixa, 20,9%. É um recado claro da população, expondo sua desesperança nas instituições políticas, entendendo que seu voto não tem poder algum.

Só no município de São Paulo, mais de 2,5 milhões de eleitores deixaram de votar, soma que supera os votos obtidos por Ricardo Nunes (1,8 milhão) e Guilherme Boulos (1,77 milhão).

Olhando para quem foi às urnas, vemos que o Centrão domina o país. Juntos, PSDMDBPP e União Brasil elegeram mais de 3 mil prefeitos no primeiro turno — o equivalente a 54% das cidades do país. Mas não é só. Todos eles aumentaram suas conquistas, com o PSD crescendo 35%, de 650 prefeituras para 878. Os quatro partidos juntos também foram os que mais elegeram vereadores, um total de 27.168, correspondentes a 46,5% das vagas.

O jornalista André Shalders fez um levantamento publicado em sua rede social demonstrando que as cidades menos populosas, onde as prefeituras são as maiores empregadoras, são justamente os locais em que o Centrão vai melhor. A dinâmica identificada é a seguinte:

— O [deputado] federal ganha apoio do prefeito levando verbas federais à cidade; o prefeito ganha apoio da população porque a Prefeitura é o grande poder econômico numa cidade-dormitório de menos de 10 mil habitantes.

Uma das primeiras reflexões a respeito desses números é, na verdade, um questionamento. Se o país está polarizado entre comunistas e fascistas, por que os maiores vencedores das eleições nos municípios, onde se decide a respeito do dia a dia do cidadão, não estão em nenhum dos dois espectros?

Com a maior proporção do eleitorado, os partidos de centro são responsáveis pela governabilidade do país, determinando se um governo conseguirá implementar seus planos. Acabam atuando como moderadores políticos, de forma que faz sentido o resultado em que Lula e Bolsonaro não foram determinantes.

Em São Paulo, o cenário não foi diferente. Marçal ganhou em boa parte da Zona Leste, nos bairros de Itaquera e São Miguel, e Nunes na maioria dos distritos da periferia da Zona Sul, como Parelheiros. E, embora o apagão do dia 11 tenha feito Nunes oscilar de 55% para 51% no Datafolha, a diferença não foi para Boulos, mas para branco/nulo/nenhum.

Apesar do descontentamento com a política atual, as urnas falam que o eleitor busca pragmatismo, algo que tenha impacto na sua vida, concreto, que possa ser palpável. Qualquer coisa fora dessa proposta é logicamente descartada.

 

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