Valor Econômico
Governo Bolsonaro foi o que mais colocou recursos públicos em programas de combate ao desmatamento na última década, porém gasto foi pouco eficiente
Com uma pauta contrária à preservação
ambiental, o governo de Jair Bolsonaro (2019 a 2022) foi, paradoxalmente, o que
mais colocou recursos públicos em programas de combate ao desmatamento na
última década. Porém, o gasto foi pouco eficiente: naquele período, a perda de
cobertura florestal na Amazônia aumentou e o número de autos de infração por
crimes ambientais caiu.
Essa é uma das constatações da avaliação sobre a política de prevenção e combate ao desmatamento conduzida pelo Conselho de Monitoramento e Avaliações de Políticas Públicas (Cmap), do Ministério do Planejamento. O trabalho analisou todos os aspectos dessa política e trouxe uma lista de recomendações de melhoria, cuja implementação é discutida com o Ministério do Meio Ambiente.
O que os dados mostram é que não há uma
correlação direta entre verbas e redução do desmatamento. Tudo depende da
eficiência com que o gasto é realizado, disseram à coluna o subsecretário de
Gestão, Formulação e Uso de Avaliação de Políticas Públicas, Rodrigo de Castro
Luz, e o especialista em políticas públicas e gestão governamental Marcelo
Prudente de Assis.
Durante o governo Bolsonaro, a coordenação do
programa de combate ao desmatamento foi transferida para a Forças Armadas, em
três operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO): Verde Brasil I (2019),
Verde Brasil II (2020) e Samaúma (2021).
Naquele período, o número de fiscalizações
realizadas pelo Ibama caiu. Em 2018, foram lavrados 22,9 autos de infração por
fiscal. No período de 2019 a 2021, essa média caiu para 15,6 autos. Em 2022 e
2023, a média subiu para 18,9 autos por fiscal.
“Cabe destacar que as Forças Armadas são
essenciais para garantir a segurança dos fiscais e oferecer suporte logístico
durante as ações de fiscalização”, observam. “Entretanto, órgãos ambientais
como Ibama e ICMBio possuem reconhecido e robusto histórico de coordenação das
ações de combate ao desmatamento, que podem ser aprimorados.”
Eles ressalvam, também, que o desempenho pode
ter sido influenciado pela pandemia.
Aos números: na média anual, foram gastos R$
273,5 milhões em prevenção e combate ao desmatamento no período Bolsonaro. Em
contraste, a média no período de Michel Temer (2017 e 2018) foi de R$ 128,5
milhões. Nos anos sob Dilma Rousseff incluídos no levantamento, 2012 a 2015, o
gasto médio foi de R$ 176,8 milhões.
No governo Bolsonaro, o desmatamento da
Amazônia foi em média de 11,5 mil quilômetros quadrados por ano. É mais do que
o dobro dos 5,5 mil quilômetros quadrados observados na média do período Dilma
Rousseff.
O quadro é diferente no Cerrado. As perdas
durante o governo Bolsonaro foram de 8,5 mil quilômetros quadrados na média
anual. Sob Dilma, o bioma encolheu 11 mil quilômetros quadrados ao ano, em
média.
Há uma diferença fundamental nos processos de
desmatamento da Amazônia e do Cerrado, informam os técnicos do Planejamento. No
primeiro caso, a perda de cobertura ocorre em terras públicas, onde
recorrentemente há disputa fundiária. Em geral, trata-se de crime ambiental. No
Cerrado, o desmatamento nem sempre é ilegal, pois muitas vezes é autorizado
pelo governo local.
Por isso, uma das recomendações do Cmap é o
governo federal buscar mais articulação com Estados e municípios. A ideia
coincide com os recentes esforços do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da
ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, no sentido de buscar coordenação com
governadores em meio à crise das queimadas.
Há metas de redução do desmatamento, mas
essas precisariam ser detalhadas por Estado, com o estabelecimento de medidas
de contingência para o caso de descumprimento, disse o gestor
A primeira recomendação do Cmap, porém, diz
respeito às dificuldades no trabalho dos fiscais. Os técnicos do Planejamento
constataram que não há incentivos para quem atua na linha de frente. Além
disso, as jornadas de trabalho são de oito horas diárias, incompatíveis com
ações de fiscalização.
Outra recomendação é facilitar o
acompanhamento e monitoramento do programa. Há problemas como a adoção de
indicadores diferentes em documentos como o Plano Plurianual (PPA), que
estabelece metas do governo, e os adotados pelo Ibama. Dessa forma, fica difícil
saber qual indicador deve ser priorizado, observou o gestor.
A coluna procurou o Ministério do Meio
Ambiente para comentar as conclusões da avaliação do Cmap, mas não obteve
resposta.
Mais conhecida pelo pente-fino em benefícios
sociais com o qual se pretende economizar R$ 25,9 bilhões em 2025, a revisão de
gastos tem um caráter bem mais abrangente. Neste ano, foram concluídas
avaliações de seis políticas públicas com o intuito de melhorar a qualidade do
gasto público.
É um trabalho de formiguinha que,
silenciosamente, passou a fazer parte do ciclo de elaboração do Orçamento da
União. Se for bem compreendido na Esplanada dos Ministérios, será possível sair
do discurso à prática de fazer mais com menos recursos orçamentários.
Muito interessante! Parabéns à colunista, e ao blog por divulgar seu trabalho.
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