Correio Braziliense
Existe um caldo de cultura favorável ao
avanço desse tipo de proposta na opinião pública, por causa de decisões
polêmicas de ministros da Corte, sobretudo em processos criminais
O resultado geral das eleições municipais,
que mostram um inequívoco fortalecimento das forças de centro-direita e direita
do Congresso, na primeira semana após o primeiro turno, abriu caminho para uma
nova ofensiva dos deputados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro com
objetivo de limitar os poderes monocráticos dos seus ministros, aprovar o seu
impeachment e até mesmo suspender decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
Nesta quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados deu aval a duas propostas de emenda à Constituição (PECs) com esse objetivo. Presidida por Caroline de Toni (PL-SC), bolsonarista raiz, e sob relatoria de Filipe Barros (PL-PR), líder da oposição, a comissão atua como um rolo compressor contra o governo Lula e, agora, se volta contra o Supremo. PL, Novo, União Brasil, PP e Republicanos formam maioria na comissão, na qual os partidos de esquerda têm apenas 16 deputados.
A CCJ aprova a admissibilidade das matérias,
sem discutir seus conteúdos, mas isso abre espaço para o presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), encaminhar as propostas ao plenário para votação, tão logo
tenha um parecer da comissão especial que analisa o mérito das propostas. São
necessários 308 deputados para as PECs em plenário, em duas sessões. Lira está
com a faca e o queijo na mão, porque a decisão de pautar a matéria é
monocrática. Eventualmente, o atual presidente da Câmara maneja essa prerrogativa
como instrumento de barganha junto aos demais Poderes.
Há no Congresso um ambiente muito
desfavorável ao Supremo. Além de uma correlação de forças na qual a direita é
majoritária, existe o xadrez das articulações para a presidência da Câmara e do
Senado, nas quais as duas propostas viraram moeda de troca para a ala ligada ao
ex-presidente Bolsonaro apoiar Davi Alcolumbre (União-AP), no Senado, e Bruno
Mota (Republicanos-PB), candidato de Lira na Câmara. Neste fim de ano, após as
eleições, essas articulações serão ainda mais intensas.
A PEC das decisões monocráticas foi aprovada
pelo Senado em novembro de 2023. Estava empacada na Câmara, desde agosto, mas
agora voltou a tramitar, tendo recebido apoio de 39 deputados na CCJ, contra 18
contrários. A principal motivação dos deputados é impedir que ministros do
Supremo sustem a eficácia de leis; ou suspendam atos do presidente da República
ou dos presidentes da Câmara, do Senado e do Congresso.
Decisões individuais que suspendem leis
continuarão permitidas durante o recesso do Judiciário em casos de "grave
urgência ou risco de dano irreparável". Além do STF, as mudanças
promovidas pela PEC serão estendidas a outras instâncias do Judiciário.
Estabelece que, neste caso, caberá ao presidente do tribunal tomar a decisão
monocrática. E que, no retorno dos trabalhos, a medida precisará ser
referendada pelo plenário do tribunal em até 30 dias.
Usurpação
A PEC também muda o rito de análise de três
tipos de ações de competência do Supremo Tribunal Federal: as Ações
Declaratórias de Constitucionalidade (ADC), as Arguições de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) e as Ações Diretas de Inconstitucionalidade por
Omissão (ADO). Nesses casos, quando houver pedido de liminar, que antecipar
decisões para garantir direitos, os ministros do Supremo deverão seguir os
critérios estabelecidos para decisões monocráticas. O mérito da medida
precisará ser analisado em até seis meses. Depois desse prazo, o caso entrará
automaticamente na pauta do plenário do STF e terá prioridade sobre os demais
processos. A suspensão da análise de propostas no Legislativo e decisões que
afetem políticas públicas e criem despesas para qualquer Poder serão submetidas
aos mesmos critérios.
A proposta que permite ao Congresso Nacional
suspender decisões do STF, caso considere que as medidas avançaram a
"função jurisdicional" da Corte ou inovaram no ordenamento jurídico,
foi aprovada por 38 votos a 12. A derrubada de uma decisão seria aprovada com
os votos de dois terços dos membros da Câmara (342) e do Senado (54) e teria
validade por quatro anos. A proposta prevê a possibilidade de uma reação do
STF, que poderia revalidar a validade de decisões suspensas pelos
congressistas, desde que nove ministros do STF votem pela manutenção da medida.
A proposta é flagrantemente inconstitucional,
porque transforma o Congresso em Corte revisora das decisões do Supremo, cujo
nome já diz, é quem dá a palavra final. A proposta de revalidação é marota,
porque uma minoria de três ministros alinhados com o Congresso sufocaria a
maioria da Corte, o que rompe com o equilíbrio entre os Poderes. A oposição se
mobiliza também para aprovar uma anistia para o ex-presidente Jair Bolsonaro,
que está inelegível por crime eleitoral, e os envolvidos nos atos golpistas de
8 de janeiro de 2023.
Existe um caldo de cultura favorável ao
avanço desse tipo de proposta na opinião pública, por causa de decisões
polêmicas de ministros da Corte, sobretudo em processos criminais acerca de
grandes escândalos de corrupção e casos de contravenção. Ministros do Supremo
são acusados de exorbitar em suas atribuições, com decisões monocráticas que
tangenciariam o devido processo legal.
Que absurdo!
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