O Globo
O PT deve fugir de explicações fáceis para o
seu fraco desempenho eleitoral, e evitar a volta às velhas poções mágicas
A derrota da esquerda nas eleições ficará mais evidente caso se confirme o cenário mais provável em São Paulo, que é a vitória do atual prefeito. A cidade tem tamanho e relevância para separar derrotados de vencedores. Mas o entendimento dessa derrota talvez se perca nos clichês de sempre. Um deles é o de que o PT não teria entendido o impulso ao empreendedorismo que atraiu os eleitores de Pablo Marçal. Há alguns erros nessa ideia. A lei do Microempreendedor Individual (MEI) foi criada por Lula no seu segundo mandato. O que levou eleitores a Marçal ainda nem foi entendido, e não pode ser simplificado.
O mercado de trabalho brasileiro
historicamente teve altos níveis de informalidade, portanto o sindicalismo —
que produziu uma força política de esquerda — sempre falou com apenas uma parte
dos trabalhadores. A precarização do trabalho não nasceu com a uberização.
Sempre houve precarizados no Brasil. Nos momentos de grande desemprego, viraram
trabalhadores por conta própria. Alguns viram a chance de realização de velhos
sonhos e tiveram sucesso. Outros permaneceram em situação precária. Não é um
fenômeno novo na economia, e para ele, o PT até deu uma resposta.
A lei do MEI é de 2008. Em 2013, havia 13,5
trabalhadores na CLT para cada MEI. Hoje são 2,4 trabalhadores com CLT para
cada microempreendedor. Esses números indicam que sim, o projeto de dar
formalidade aos trabalhadores individuais funcionou. Eles pagam apenas 6% de
encargo social e isso aponta para outros problemas, como a queda do
financiamento da previdência.
Aqui o ponto é político. A ideia de que a
esquerda não consegue falar com os novos empreendedores tem fundamento? Talvez.
Contudo, o que aconteceu nessa eleição pode ter outra natureza. A montanha de
votos que teve Pablo Marçal mostra que o fenômeno precisa ser estudado, mas o
que ele vendia não era a prosperidade viável através do empreendedorismo. Era a
ilusão de um milagre a ser feito com truques e golpes. O enganador sempre foi
muito atraente.
A eleição municipal ainda nem terminou e já
mostrou que sua análise é um imenso desafio. Se está claro que o PT teve um
desempenho pífio, o vencedor está menos evidente. O PSD é apontado como grande
vitorioso. Perguntei a
Gilberto Kassab como o partido faria para atrair a esquerda em Curitiba e em
Belo Horizonte, cidades nas quais está traçando armas com candidatos
bolsonaristas.
— Acho que mais do que a esquerda, o PSD está
conseguindo conquistar o centro. As candidaturas opostas às nossas são de
direita, têm o nosso respeito, mas vamos ganhar porque os eleitores de centro
em Curitiba e em Belo Horizonte querem moderação e são o que o Eduardo (
Pimentel) e o Fuad (Noman) representam.
Kassab explicou a métrica que usa para
concluir que o centro venceu.
—Comparando os votos que tiveram PSD, MDB e
União Brasil verá que a somatória de votos para prefeito no primeiro turno é
bem maior do que os votos da direita, que são PL, o PP e o Republicanos, ou da
esquerda, com PT, PSOL, PDT e PSB.
Só que, em São Paulo, o candidato do MDB,
apoiado pelo PSD, tem como grande defensor o governador do Republicanos, Tarcísio de
Freitas, que diz que seu líder é Jair
Bolsonaro, do PL. Quando perguntei sobre essa contradição, Kassab
respondeu que não há contradição, que o nome disso é “composição”.
Na verdade, o que não falta nessa eleição é
contradição. O PDT do Ceará fortalecer, por ação ou omissão, o candidato
bolsonarista, em vez de apoiar o PT é total incoerência. Em Fortaleza, o campo
progressista unido faria a diferença. Pelo
Datafolha, André Fernandes, do PL, está com 45% e Evandro Leitão, do PT, com
43%. Na Quaest é empate numérico: 43% a 43%.
Se existem nuances na vitória, é certo que o
partido que está no governo federal conseguiu apenas magros resultados no país,
e precisa se repensar sim, de preferência fugindo das explicações fáceis.
Uma parte do PT sempre defendeu o aumento de gastos públicos para levar o país ao crescimento acelerado e às vitórias políticas. É nesse ponto que mora o perigo. Isso foi usado pelo partido no passado e acabou em inflação, recessão e derrota. Portanto, antes que voltem a essa confusão, o que ocorre recorrentemente, é bom lembrar que a atual política econômica trouxe o país a um crescimento mais forte do que o previsto, com desemprego baixo e inflação relativamente baixa. Não é culpa da economia.
O Centro venceu,que bom,o caminho do meio é sempre o mais sensato,já dizia o filósofo.
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