Na revista se traz à baila Treze: A
política de rua de Lula a Dilma (2023), de Angela Alonso. Este título
apresenta sua pesquisa desse decênio que compara as avaliações dos eventos de
Junho de 2013, da década e de hoje.
Para se ter a dimensão dos achados duas
produções audiovisuais em 2022 foram lançadas: a série documental de seis
episódios, Junho, o começo do avesso, com subsídio do Fundo Setorial
Audiovisual, e o longa Ecos de junho, apoiado por Agência Nacional do
Cinema (ANCINE) e Rede Globo.
Para quem viu os documentários e depois lê o
livro percebe que a maioria dos inquiridos considera difícil avaliar as
consequências, mas condenam a violência que os cercou. No entanto, julgam que
as suas causas foram justas e que revelou o descontentamento generalizado.
Apesar do tempo que passou, ainda são
lembradas as frases de autoridades referentes ao “gigante acordou”, “o
despertar social”, entre outras imagens. Mas neles está encarnado o olhar
crítico a uma tecnocracia impermeável aos graus de igualdade (se não material,
pelo menos simbólica) alcançados pela sociedade brasileira na década de 1980
com a expansão da democracia, da educação e das redes sociais.
2013 e depois vimos a ação coletiva e anônima
de indignação acumulada contra uma cultura elitista egocêntrica, indiferente à
situação e angústia da população. Esta crise de representação não era nova:
vinha fermentando desde Collor. Nas palavras de Angela Alonso: Tanto em
São Paulo como no Rio, onde se julgava que as prefeituras eram o alvo,
instalou-se o impasse. Noutras partes do país, onde nem havia aumento de
tarifa, ficava claro que as demandas eram outras, com destaque para as disputas
em torno de terra e moralidade. Indicação de que as razões não eram municipais.
A presidente, contudo, permanecia impávida, como se nada tivesse com isso,
embora a vaia do dia 15 já desse pista de seu ledo engano.
As ruas, então, serviram de megafone através
do qual milhões de compatriotas saíram para expressar algo muito básico:
“estamos aqui”. Não aceitamos viver marginalizados na periferia atravessada por
uma modernização que não utilizamos. Se para ser ouvido era preciso sair às
ruas e participar de marchas e manifestações, faremos como se fizera em 1984,
ainda que essa história não nos tenha sido contada.
Os custos de 2013 e depois não foram iguais
para todos. Nos bairros dos eventos era um espetáculo dantesco visto pela
televisão, e não vivido diretamente. Os eventos visavam atingir e conscientizar
aqueles que teriam o controle sobre uma ordem que girava sobre si mesma sem dar
sentido à vida; um sentido como aquele que outrora surgiu da história da
modernização (prosperidade e igualdade) e, ainda mais profundamente, da
salvação que a fé promete.
Comovidas e assustadas, as elites políticas e
econômicas abriram-se ao clamor, mas isto só durou até que as mobilizações
cessassem. No final tudo parecia permanecer igual; ou pior, devido aos custos
políticos. Aí veio o que o Marco Aurélio Nogueira mencionou na entrevista acima
citada, onde a ela devemos adicionar 2014, 2016, 2018, a pandemia e, acima de
tudo, um mundo com guerra.
Apesar de tudo 2013 e depois foram atos da
sociedade e de esperança. Mas aparentemente em vão, pois a vida desde então
ficou mais difícil, como indicam os resultados preliminares do Censo
Demográfico 2022.
Daí que a explosão pública foi
transformisticamente dando lugar então à implosão individual. A 2013 e depois
foi privatizada, o que certamente contribui para as atuais pandemias de
Influencers, Tiktokers, Youtubers, OnlyFans e afins e de saúde mental. Mas
ontem e hoje a exigência da população é a mesma: seguridade; seguridade para a
velhice, contra as doenças e pró saúde, o desemprego e, hoje, como prioridade,
pró segurança pública. Se as instituições não agirem para responder a este
apelo, que ninguém volte a dizer que não previu que isso aconteceria, pois isto
não se entende com as lentes ditas sociológicas da demofobia.
*Presidente do Conselho Deliberativo da CEDAE Saúde e professor da Faculdade Unyleya, da UniverCEDAE, da Teia de Saberes e do Instituto Devecchi.
Interessante! "Comovidas e assustadas, as elites políticas e econômicas abriram-se ao clamor, mas isto só durou até que as mobilizações cessassem."
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