O Estado de S. Paulo
A proposta de redução da jornada de trabalho
a 36 horas semanais vai produzindo um montão de espuma com pouca possibilidade
de substância.
A ideia da deputada federal Erika Hilton
(PSOL/SP) é aprovar Projeto de Emenda da Constituição (PEC), que já contaria
com 194 assinaturas (apoio de mais de 1/3 da Casa Legislativa) para protocolar
a proposta. Instituiria o regime obrigatório de duração do trabalho normal não
superior a oito horas diárias por quatro dias por semana, sem redução dos
salários.
Hoje, a Constituição define uma jornada de trabalho não superior a oito horas diárias por seis dias na semana. É a escala 6X1, ou seis dias trabalhados com um de descanso, que seria revogada pela PEC, se aprovada.
Essa PEC prevê uma jornada de 36 horas
semanais. Mas não explica como se pode chegar a essas 36 horas com o
equivalente a não mais que 8 horas diárias e a não mais que quatro dias de
trabalho por semana, o que dá 32 horas, e não as 36. Nenhum país europeu,
continente mais avançado na legislação trabalhista, prevê jornada tão baixa. A
Holanda, país mais à frente, adotou jornada de 32,2 horas semanais.
A proposta pressupõe que mão de obra com mais
qualidade de vida propiciaria tal melhora da produtividade que compensaria o
aumento de custos das folhas de pagamentos.
Os sindicatos adoraram a proposta, não só
porque pouparia esforço ao trabalhador, mas, também, porque obrigaria muitos
setores da economia a aumentar as contratações.
É possível que grandes empresas tivessem
certa facilidade para se ajustar a essa mudança, como já vem acontecendo em
experimentações. Poderiam, também, aumentar a automatização e terceirizar boa
parte de sua produção. Outro desdobramento provável é que o segmento dos
trabalhadores por aplicativos passe a ter novas e rentáveis oportunidades que
substituiriam a mão de obra demitida.
Mas, para alguns setores, a substituição do
regime 6X1 seria proibitiva. Comércio varejista, construção civil, o ramo dos
hotéis, bares e restaurantes, mais a grande maioria das pequenas e médias
empresas passariam a enfrentar enorme sobrecarga nos seus custos. Pode-se
prever impacto equivalente também no setor financeiro, mesmo depois que os
bancos transferiram para o cliente, via aplicativos, serviços que antes eram
feitos pelos seus funcionários. Parece inevitável o aumento das contratações
informais, fora do guardachuva da CLT, hoje equivalentes a 38% da força de
trabalho.
Outro efeito imediato seria o avanço da
inflação, inevitável diante do aumento dos custos de produção e
comercialização. Mais inflação exigiria nova bateria de alta dos juros e
sabe-se lá qual não seria o impacto sobre o câmbio, sobre a arrecadação e sobre
as receitas da Previdência Social.
Provavelmente, no futuro, cuja distância
ninguém hoje está em condições de avaliar, a realização dessa utopia venha a
ser possível. Mas hoje é coisa pra ir pro fundo de uma gaveta.
Uma experiência de diminuição da carga horária de trabalho feita pelo Metrô de SP no anos 1980, redundou em algo inesperado: os beneficiados - todos - arrumaram um segundo emprego. Com isso, aumentaram suas jornadas de trabalho, ao invés de diminuí-las.
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