sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Jornais devem apoiar candidatos? – Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Washington Post e Los Angeles Times enfrentam revolta de assinantes por decisão editorial de não chancelar nome de Kamala Harris

Contrariando prática adotada desde 1976, o jornal The Washington Post decidiu que nestas eleições não apoiará nenhum candidato presidencial. Ato contínuo, perdeu 250 mil assinantes, 10% de sua carteira. O Los Angeles Times, pela mesma decisão, enfrentou a mesma fúria, mas com perdas menores: 2% das assinaturas.

Jornais devem apoiar candidatos? Não importa qual posição o veículo abrace, ele terá problemas. A opção pelo apoio, o "endorsement" como dizem os periódicos da anglosfera, onde a prática é mais disseminada, gera desconfianças. Embora órgãos da chamada "quality press" se esforcem para separar textos noticiosos dos opinativos, isso nem sempre é percebido pelo leitor, que pode achar que, se o jornal prefere o candidato X, então tudo o que ele publica visa a beneficiar esse postulante. Assim, nada do que sai em suas páginas é digno de crédito.

A opção por neutralidade leva ao mesmo lugar. A prática pode ser descrita como uma recusa ao paternalismo e uma aposta na autonomia, mas especialmente em pleitos em que um dos candidatos é objetivamente pior ou mais perigoso que o outro, não declará-lo pode ser interpretado como uma tentativa de ludibriar o leitor. O veículo teria uma posição, que não é difícil de inferir por seus editoriais, mas se recusa a partilhá-la com os leitores. E, se está tentando enganar nisso, por que não o faria em outros assuntos?

A moral da história é que, não importa qual posição de princípio o jornal adote (ambas legítimas, embora eu prefira o "endorsement"), parte do público vai interpretá-la como sinal inequívoco de que o veículo tenta manipulá-lo. É do jogo. Num mundo em que todos tivessem o dom da clarividência e sempre compreendessem tudo corretamente, a política nem seria uma preocupação.

O Post e o Times erraram no timing. Se você vai mudar sua política editorial, escolha uma eleição bem morna para fazê-lo. O fato de os jornais não terem chancelado Harris, como esperava seu público, foi, de modo previsível, lido como apoio tácito a Trump, motivo da revolta

 

5 comentários:

  1. Para equilibrar, sugiro a leitura da coluna de Mário Sabino, no Metrópoles, na qual aborda a mesma temática.

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  2. The Economist não teve dúvidas, decidiu apoiar Kamala! Por coerência ou pra não perder leitores?

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  3. Candidato X ou candidato do X?

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