Valor Econômico
Saúde fragilizada do presidente coincide com
oposição encurralada para 2026 e mostra que as saídas para a crise sinalizarão
o rumo da sucessão
Até Roberto Kalil descer para a portaria do
Sírio-Libanês para falar com os jornalistas sobre o novo procedimento a que o
presidente da República será submetido, os únicos sobressaltos do ambiente eram
as provocações dos pacientes e visitantes que, no entra e sai, soltavam
provocações sobre a saúde do paciente mais ilustre.
Uma senhora aparentando mais de 80 anos,
impecavelmente vestida, maquiada e penteada, abordou um fotógrafo para saber da
saúde de Lula. Ao ser informada, soltou: “Tomara que morra logo”. Indagada se
era cristã, dobrou a aposta: “Ele é um demônio que fez mal ao país”. Além dos
transeuntes, motoristas que passam pela rua do hospital abaixam o vidro dos
carros para gritar seus votos pela piora da saúde do presidente.
A hostilidade não é novidade na família Lula da Silva. Quando dona Marisa foi internada no Sírio para tratar o AVC que acabaria por matá-la, em 2017, a República baixou no Sírio para prestar solidariedade a Lula - do então presidente Michel Temer ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Chegavam e saíam sob vaias de manifestantes que torciam pela morte da ex-primeira-dama.
Tampouco é a primeira vez que Lula enfrenta
um problema de saúde grave. Em 2011, no ano seguinte ao fim de seu segundo
mandato na Presidência, Lula descobriu um tumor de três centímetros na laringe.
Além de uma cirurgia, precisou passar por mais de 30 sessões de quimioterapia.
A novidade é que Lula esteja enfrentando um
problema grave de saúde no poder. E não apenas. É obrigado a se ausentar no
exercício de um cargo que exerce como o único fator de equilíbrio na frágil
equação dos Três Poderes. Se havia alguma dúvida disso, os acontecimentos da
semana se encarregaram de dissipá-la. Não que seu governo estivesse em céu de
brigadeiro enquanto a pressão de seu crânio permanecia sob controle, mas sua
saída de cena convulsionou os tumultos cotidianos.
O presidente convocou a reunião com os
presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), na tarde da segunda, a despeito de já estar com dor de cabeça e
mal-estar, logo depois de ser informado que o impasse das emendas parlamentares
ameaçava a reforma tributária, primeiro item da pauta de uma semana decisiva
para seu segundo biênio. Saiu antes do término da reunião e foi direto para o
hospital. De lá para cá, o ambiente só se deteriorou.
Lira, que, oito dias antes, havia ligado para
o ministro Fernando Haddad para consultá-lo sobre o que dizer sobre o ajuste
fiscal para acalmar o rebuliço do mercado decorrente do anúncio da isenção de
IR dos salários até R$ 5 mil, desatou a falar mal do ajuste e a duvidar que a
regulamentação tributária pudesse vir a ser concluída.
Ao recuperar a metralhadora giratória às
vésperas de uma reforma ministerial em que espera ser contemplado, Lira
escancara a ausência de interlocutor capaz de traçar a linha mediana entre os
dois governos que estão em operação - o da Advocacia-Geral da União e o da
Controladoria-Geral da União. Uma brinca de esconde-esconde com os ditames do
Supremo Tribunal Federal para a execução orçamentária e a outra fornece os
insumos para o ministro Flávio Dino apertar o torniquete.
Depois do chilique da terça-feira, Lira
nomeou um deputado do União para a relatoria do ajuste fiscal, sugerindo que o
inferno astral do partido com o qual toca de ouvido é parte da tensão. Naquela
manhã, uma operação iniciada na CGU havia começado a desmontar o esquema de
desvio de emendas do União, alvejando, além de um aliado de ACM Neto que
integra a executiva nacional do partido, um primo de Elmar Nascimento
(União-BA). Por isso, era natural que Elmar, mais importante operador de Lira
na Câmara até ser preterido para sua sucessão, estivesse em busca de um
ventilador para jogar seus escaninhos.
Ao contrário do que aconteceu com o próprio
Lira no ano passado, quando eclodiu a operação que flagrou indícios de
envolvimento de assessores seus no desvio de emendas do “kit robótica”, não
parece haver hoje um ministro que, a exemplo do que Gilmar Mendes fez àquela
época, invalide o processo. Seu arquivamento no ano passado abriu caminho para
a aprovação da reforma tributária no mesmo dia. Sua regulamentação terá que se
dar sem a mãozinha da Corte.
A insegurança governista sobre 2026 é
potencializada pela doença do presidente num momento em que as opções da
oposição se enredam e se inviabilizam. Não bastasse um Jair Bolsonaro fora do
jogo, o governador Tarcísio de Freitas (SP) se desmoraliza como opção do
bolsonarismo cheiroso ao manter Guilherme Derrite no cargo, e o de Goiás,
Ronaldo Caiado, descolou oito anos de inelegibilidade por ter transformado o
Palácio das Esmeraldas em comitê de campanha de Sandro Mabel à prefeitura da
capital.
Tamanho enrosco da oposição não deixa dúvida
de que este é o momento para o governo sair das cordas e enfrentar a pauta
legislativa, o atrevimento da reação militar à mudança na sua previdência, e a
reação do Congresso ao freio de arrumação nas emendas.
Ante a notícia de que Lula passará pelo
segundo procedimento, o dólar recuou para aquém de R$ 6 pela primeira vez em
dezembro. As próximas pesquisas mostrarão que talvez seja cedo para celebrar o
ocaso governista em 2026, desde que o Planalto Central também faça uma sutura
das pautas em curso e sinalize o rumo da sucessão.
Eu jamais votaria em Bolsonaro,mas todas as vezes que ele ficou internado,eu fiz orações pra ele e sua família,cada cristão com o seu cristianismo particular.
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