Valor Econômico
Animosidade da bancada da bala não é aposta em dobro, mas esperneio ao cerco. Quanto mais pressionada, mais exaltada a extrema-direita fica. Por isso, o momento parece oportuno para a PEC da Segurança Pública
“Um policial jogou um cabra de uma ponte. Por
quê? Porque o cara chega à conclusão de que não vai adiantar merda nenhuma
levar aquele cara para a delegacia”. Gilson Cardoso Fahur tem 61 anos, é
sargento reformado da Polícia Militar e deputado federal pelo PSD do Paraná,
filiado, portanto, às hostes do presidente do partido, Gilberto Kassab, do
governador do Estado, Ratinho Jr., e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco
(MG).
Tinha diante de si o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, convocado para uma audiência pública na Câmara dos Deputados na tarde de terça-feira. Fahur não se limitou a justificar o ato de barbárie da PM paulista, que jogou de uma ponte um entregador de aplicativo, sem passagem pela polícia, que estava numa moto e não obedeceu a uma ordem policial para parar. Comentou ainda a morte de Gabriel Renan Soares, de 26 anos, atingido pelas costas.
“Outro noia vai roubar um mercado, furta três
pacotes de sabão, já tinha furtado bolachas de manhã, infernizando o
comerciante, porque não é só um (...) são vários, furtando dia e noite, cagando
e mijando em frente da casa dos outros, do comércio dos outros. O policial está
no local fazendo compras, vê o ladrão, todo espalhafatoso, escorregando e dá
onze tirinhos nele [sim, usou o diminutivo]. Depois é responsabilizado e
afastado. Vão acabar com a polícia no Brasil se afastarem os policiais, pelo
amor de Deus”.
Fahur está no segundo mandato como deputado
federal. No primeiro, foi o mais votado de seu Estado, com 314 mil votos. Do
seu discurso de estreia na tribuna da Câmara, destacou um trecho para fixar
como o cartão de visitas de seu perfil no X: “Não tem que investigar nada não.
Tem que arquivar e acabou (...) bandido bom é bandido morto. Preso só dá
despesa, solto, só da prejuízo pra sociedade”.
Na recondução à Câmara, em 2022, Fahur teve
pouco mais da metade dos votos, sendo o sétimo da bancada paranaense, perdendo
para Gleisi Hoffmann (PT). O discurso de Fahur não é um ponto fora da curva na
extrema-direita. A sucessão de barbaridades da PM paulista é concomitante à
conclusão do relatório da Polícia Federal mostrando a violência bolsonarista
contra a democracia.
Tome-se outro parlamentar da comissão, Marcel
Van Hatten (Novo-SP), que foi indiciado pela PF por ter chamado Fabio Shor,
delegado que atua nos inquéritos bolsonaristas e foi fartamente ameaçado de
morte, de “bandido”. Na audiência, Van Hatten chamou o diretor-geral da PF,
Andrei Rodrigues, que acompanhava Lewandowski, de “prevaricador”.
O grau de animosidade da sessão da Comissão
de Segurança da Câmara não é aposta em dobro, mas esperneio ao cerco. Quanto
mais pressionada, mais exaltada a extrema-direita fica. Por isso, o momento
parece oportuno para o governo emplacar a PEC da Segurança Pública. Os próprios
parlamentares da bancada da bala já o reconhecem. O deputado Marcos Pollon
(PL-MS), fundador do Pro-Armas, reconheceu que uma das principais ideias da
PEC, a transformação da PRF numa Polícia Ostensiva Federal que, além das
rodovias, atue em portos, aeroportos e ferrovias, é bandeira que sempre
defendeu como professor de processo civil: “Dou o braço a torcer”.
A crise da segurança pública em São Paulo, um
dos principais polos de resistência à PEC, é outro indício de que o momento é
de avanço civilizatório sobre uma agenda que lastreia a extrema-direita no
país. A proposta que cria o Sistema Único de Segurança Pública estancou na Casa
Civil da Presidência.
O entregador jogado da ponte e os 11
“tirinhos” pelas costas num ladrão de sabão são apenas os últimos eventos de
uma barbaridade autorizada pelo governador Tarcísio de Freitas, quando disse
não estar “nem aí” para a denúncia no Conselho de Direitos Humanos da ONU
contra a explosão da letalidade policial na Baixada Santista.
Continua a fazê-lo ao se recusar a demitir o
secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, que acumula extensa folha
corrida no descontrole sobre as polícias. A suspeição sobre o PCC, no atentado
que levou à morte de Vinícius Gritzbach, no aeroporto de Guarulhos, em
novembro, passou a ter um “C” sobrando desde que vieram à tona as imagens de
policiais civis usando relógios do empresário.
O sumiço dos relógios havia sido denunciado
por Gritzbach à corregedoria da Polícia Civil de São Paulo. A resposta padrão
da corporação tem sido a de que as investigações “prosseguem” sem que a
segurança paulista recue de suas políticas mais extremadas como a autonomia dos
policiais sobre o acionamento das câmeras corporais. Com isso, a letalidade
policial cresceu 20% no primeiro ano do governo Tarcísio e ruma para fechar com
indicadores muito mais alarmantes em 2024.
O governador de São Paulo não demite Derrite
porque teme perder a base bolsonarista no Estado. Por outro lado, teme-se que o
foco do PCC no tráfico internacional, que abriu a disputa pelos pontos de venda
de drogas domésticos, faça desandar os indicadores que têm sido mantidos sob
controle, em grande parte, pelo monopólio exercido pela gigante paulista do
crime organizado.
O momento, portanto, é de insegurança, tanto
em relação ao domínio da pauta quanto em relação ao discurso para sua base
eleitoral. O espaço para o avanço de um Susp, capaz de quebrar a
“milicianização” das polícias locais, não poderia ser mais evidente.
Estamos no mato sem cachorro.
ResponderExcluir" O governador de São Paulo não demite Derrite porque teme perder a base bolsonarista no Estado. Por outro lado, teme-se que o foco do PCC no tráfico internacional, que abriu a disputa pelos pontos de venda de drogas domésticos, faça desandar os indicadores que têm sido mantidos sob controle, em grande parte, pelo monopólio exercido pela gigante paulista do crime organizado.
ResponderExcluirO momento, portanto, é de insegurança, tanto em relação ao domínio da pauta quanto em relação ao discurso para sua base eleitoral. O espaço para o avanço de um Susp, capaz de quebrar a “milicianização” das polícias locais, não poderia ser mais evidente. "
Perfeito !