Correio Braziliense
Temos uma comunidade de 5 milhões de sírios e
libaneses, plenamente integrada e concentrada em São Paulo, Paraná, Minas
Gerais e Rio de Janeiro
Depois que rebeldes derrubaram o ditador
Bashar al-Assad e tomaram o controle do país, o governo federal decidiu retirar
as equipes técnicas e diplomatas que estavam em Damasco, que se deslocaram para
o Líbano, onde deverão embarcar para o Brasil num avião da Força Aérea
Brasileira (FAB). Cerca de 3,5 mil brasileiros vivem na Síria e foram
aconselhados a deixar o país.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanha a situação com cautela, como as demais chancelarias do mundo. Estados Unidos, Turquia, Israel, Rússia e Irã estão envolvidos diretamente na crise síria. A ditadura al-Assad foi implantada logo após a Guerra dos Seis Dias, com apoio da antiga União Soviética, quando a Síria, Egito e Jordânia, entre outros países árabes, foram derrotados por Israel. Durante a guerra civil do Líbano, chegaram a ocupar grande parte do país.
Enquanto exporta açúcar, carnes, milho, café,
produtos químicos e manufaturas leves para a Síria, o Brasil compra
principalmente azeite de oliva, tecidos, artesanatos e frutas. É um comércio
superavitário, porém, que soma apenas US$ 69 milhões. Houve uma época, durante
o regime militar, em que o Brasil foi um dos principais fornecedores de armas,
inclusive blindados ligeiros, para a Síria e outros países árabes.
Temos uma comunidade de 5 milhões de sírios e
libaneses, plenamente integrada à vida nacional, concentrada em São Paulo, no
Paraná, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Os sírios chegaram ao Brasil com o
colapso do Império Otomano e, depois, por causa das guerras e conflitos no
Levante.
Chamados de “turcos”, devido aos passaportes
de origem, são famílias cristãs melquitas, maronitas e ortodoxos, além de
muçulmanas e, também, must’arabis e sefarditas (judeus sírios). Influenciaram o
pequeno comércio, a gastronomia e a nossa cultura, inclusive a literatura e o
carnaval.
A guerra civil na Síria, a partir de 2011,
trouxe para o Brasil novas gerações de refugiados. Embora esteja muito longe do
Oriente Médio e não tenha projeção de poder na região, o Brasil é um dos países
mais procurados pelos refugiados sírios, por causa dos seus laços familiares e
por não sofrerem discriminações.
Futuro incerto
O colapso do governo de Bashar al-Assad,
resguardada as devidas proporções, pode resultar num novo Afeganistão, para a
Rússia e os EUA. E mais uma dor de cabeça para a Turquia e Israel, que são
protagonistas da volatilização do regime. Embora não seja um grande produtor de
petróleo, como o Iraque e a Arábia Saudita, por exemplo, a Síria ocupa uma
posição crucial no Oriente Médio, entre a Ásia, a África e a Europa.
Para a China, é um corredor estratégico da
Rota da Seda, à qual o regime deposto havia aderido, e passagem de gasodutos
que liguem o Golfo Pérsico à Europa, para o Ocidente. Todos os países vizinhos
— Turquia ao norte, Iraque a leste, Jordânia ao sul, Líbano e Israel a oeste —
temem a desestabilização da Síria e reforçaram suas fronteiras com tropas e
armamentos.
A situação é tão confusa que o Conselho de
Segurança da ONU realizou uma reunião fechada, solicitada pela Rússia, que tem
em Tartus sua única base naval do Mediterrâneo, na faixa costeira Síria, além
de uma base aérea em Khmeimim. Como o Irã, os russos são grandes perdedores com
a queda de Bashar al-Assad, ao passo que EUA, Turquia e Israel, até agora, são
os ganhadores.
Mosaico étnico-religioso (árabes sunitas,
alauítas, curdos, cristãos, drusos, entre outros), o maior risco para o futuro
da Síria é a consolidação de um regime fundamentalista jihadista, em
substituição ao Estado laico que havia, apesar da ditadura. Não à toa, Israel
já está ocupando militarmente as Colinas de Golan e os EUA bombardeiam
instalações militares e industriais que possam servir a aos grupos armados.
O poder está nãos mãos das milicias do Hay’at
Tahrir al -Sham (HTS), liderada por Abu Mohammad al-Golani, uma coalizão de
grupos islâmicos formada em 2017, incluindo antigos membros da Frente al-Nusra,
anteriormente afiliada à Al- Qaeda. O HTS partiu da província de Idlib e, em
duas semanas, tomou Aleppo, Homs e, depois, Damasco.
Os demais grupos armados são o Exército Livre
da Síria (ELS), fundado em 2011 por desertores das Forças Armadas sírias e
apoiado pela Turquia. E as Forças Democráticas Sírias (FDS), liderada por
curdos, apoiada pelos EUA, que controla áreas no norte e no leste da Síria.
Somaram-se aos rebeldes a Coalizão Nacional
para as Forças Revolucionárias e de Oposição Sírias (CNFROS), que representa a
oposição síria no cenário internacional, e o Conselho Nacional Sírio (CNS), uma
coalizão de grupos de oposição que visa estabelecer um estado democrático na
Síria, sem nenhum poder militar para se impor aos demais grupos rebeldes.
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