terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

Militares cá, golpistas lá - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

A credibilidade das Forças Armadas e o julgamento do golpe, de Bolsonaro e de generais

No ano do julgamento da tentativa de golpe, a dias do parecer da PGR sobre os golpistas e na véspera da ida do presidente Lula a uma cerimônia da Marinha no Rio, nesta segunda-feira, pesquisa Atlas apontou que 72% dos ouvidos não confiam nas Forças Armadas. Mesmo militares que consideram esse porcentual exagerado admitem que a imagem da instituição vem sofrendo desgaste e que nenhum outro presidente foi tão pernicioso para as FA do que o capitão insubordinado Jair Bolsonaro.

“Quando a política entra por uma porta no quartel, a ordem e a disciplina saem pela outra”, diz a máxima jogada no lixo por Bolsonaro, que entupiu o Planalto de generais e acentuou privilégios da carreira que um dia foi a sua. Enquanto “comprava” militares no varejo, ele infiltrava a política nos comandos e nas tropas de uma forma jamais vista após a redemocratização.

O presidente Lula, que não tinha motivo para ser amigão de generais, brigadeiros e almirantes, soube conviver muito bem com eles nos seus dois primeiros mandatos e investiu no atacado: renovação dos caças da FAB, dos submarinos da Marinha e dos tanques do Exército, além de estabelecer a Estratégia Nacional de Defesa.

O que se tem depois de Bolsonaro são 28 militares, inclusive de altas patentes, entre os 40 indiciados na tentativa de golpe. Não há dúvida de que o procurador-geral, Paulo Gonet, vai deixar muito clara a responsabilidade de cada um, com base na minuciosa investigação da PF, mensagens de internet, planos impressos, reuniões, delações e depoimentos, inclusive de excomandantes.

Gonet foi implacável com sete ex-integrantes do comando da PM do Distrito Federal que já foram para a Praça dos Três Poderes no 8/1 dispostos a lavar as mãos. Se foi assim com PMs, como o PGR será com o ex-presidente e os generais que articularam o golpe a partir do Planalto?

A área militar considera a pesquisa Atlas muito triste, mas previsível, com uma ressalva: Datafolha e Ipec de dezembro de 2024 detectaram perda de aprovação das FA, mas elas se mantinham como instituição mais bem avaliada do País. Isso pode continuar se, como diz o ministro da Defesa, José Múcio, houver separação entre CPFs (culpados) e CNPJ (FA).

Não depende de Supremo, governo e mídia, mas, sim, do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, que não devem, jamais, defender qualquer um que tenha imaginado, discutido e articulado o assassinato de um presidente legitimamente eleito, seu vice e o então presidente do TSE. Quanto mais distantes desse tipo de gente e quanto mais baterem a porta para a política nos quartéis, melhor para as Forças Armadas. •

 

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