Folha de S. Paulo
Podemos ter soluções reais, ou mais
complacência
Na última terça-feira (15) foi apresentado
o PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2026. Ele estima
receitas e despesas até 2029, explicitando uma realidade inconveniente: a
partir de 2027, depois de pagas as emendas parlamentares e cumprido o gasto
mínimo em saúde e educação, não restará um tostão para financiar outras
despesas discricionárias.
Vamos aos números. O total de despesas
discricionárias previstas para 2027 é de R$ 122 bilhões. Porém, as emendas
parlamentares obrigatórias serão de, no mínimo, R$ 55 bilhões.
Além disso, aproximadamente R$ 70 bilhões serão gastos para complementar a despesa mínima em saúde e educação, pois o gasto obrigatório nessas rubricas não é suficiente para cumprir o mínimo exigido pela Constituição.
Não sobraria nada para outras despesas
discricionárias, pois 122 – 55 – 70 = -3. Nos anos seguintes, só piora.
Esta falta aguda de recursos ocorrerá a
partir de 2027 porque é neste ano que deixa de valer a colher de chá dada pelo
STF (Supremo Tribunal Federal), que tirou da conta do déficit e do teto de
gastos parte das despesas com precatórios até 2026.
Ou seja, não fosse esta intervenção da
Suprema Corte, as metas do arcabouço já não estariam sendo cumpridas desde
2024.
O PLDO 2026 explicitou o problema, mas o
governo não apresentou qualquer proposta para resolvê-lo.
O caminho mais responsável seria propor
reformas para controlar o crescimento da despesa: desvinculação de gastos em
relação ao salário mínimo e à receita, extinção de programas e benefícios
tributários ineficientes, redução de emendas parlamentares, reforma
da Previdência, medidas para prevenir judicialização de despesas, entre
outras.
Afinal, se temos um arcabouço para controlar
despesas, há que se tomar providências para controlá-la.
Contudo, o fraco pacote fiscal apresentado no
final de 2024 já mostrou que não há predisposição política para essa agenda.
O segundo caminho seria simplesmente entregar
os pontos: abrir mais exceções na regra do arcabouço fiscal, permitindo um
nível de despesa mais alto, de modo a que volte o espaço para gastos
discricionários.
Por exemplo, excepcionalizando
permanentemente os precatórios do teto de despesas e do resultado primário.
Esta é a opção da conveniência política. Até
porque a sua tramitação no Congresso abriria espaço para parlamentares
incluírem mais gastos de seu interesse, em véspera de eleições. Uma nova
"PEC [proposta de emenda à Constituição] da Transição".
E agora nem precisa de PEC. Basta uma lei
complementar alterando a lei do arcabouço. O resultado seria mais inflação,
mais juros e menos crescimento.
É provável que haja problemas antes de 2027.
Os números para 2026 são preocupantes. Nas projeções oficiais, o cumprimento da
meta de resultado primário de 2026 (0,25% do PIB, com margem de tolerância até
zero) se baseia em superestimativa da receita.
Nas minhas contas, não considerando as
exclusões permitidas pela lei, teremos um déficit de entre 0,8% e 1% do PIB. O
cumprimento do limite inferior da meta (0% do PIB), após os abatimentos legais,
requererá receitas adicionais ou corte de despesas entre R$ 50 e R$ 80 bilhões.
Este risco de descumprimento da meta já em
2026 abre uma terceira opção: não sucumbir à tentação de flexibilizar ou
contornar as metas e levar a sério a letra da Lei do Arcabouço, acionando os
gatilhos ali previstos em caso de descumprimento.
São basicamente medidas de contenção do
crescimento da folha de pagamento, que não resolveriam o problema. Mas criariam
mal-estar suficiente para abrir a discussão sobre as reformas necessárias.
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