O Globo
Em 2027, segundo as previsões oficiais, o
dinheiro acaba. Feitos os gastos obrigatórios, não sobra nem para o cafezinho
Quando o governo Lula criou
o arcabouço fiscal, muitos analistas e jornalistas, inclusive o autor desta
coluna, sustentaram que só funcionaria com expressivos aumentos de receita.
Como a carga tributária já era elevada, parecia tarefa impossível. Vá lá que se
conseguisse algum ganho inicial, mas imaginar que se poderia tirar mais
dinheiro do contribuinte por anos a fio era ilusão.
Do outro lado da conta, o arcabouço garantia
crescimento da despesa de 2,5% ao ano, acima da inflação. E esse era o
verdadeiro objetivo do governo Lula: voltar à velha política petista do aumento
permanente do gasto público. Como a dívida pública já estava em níveis muito
elevados, foi preciso criar o tal arcabouço, apresentado como sistema mais
sofisticado que o teto de gastos.
Havia aí um argumento: o teto de gastos havia sido furado no governo Bolsonaro. Mas o teto serviu muito bem durante o governo de Michel Temer, com Henrique Meirelles no Ministério da Fazenda. A regra, introduzida naquele mesmo governo, era de uma simplicidade brilhante, facilmente compreensível. Dizia: o gasto do governo de um ano será igual ao do ano anterior, mais a inflação do período. Não haveria aumento real da despesa.
Como a economia normalmente tem crescimento
real, com o tempo a despesa diminuiria em proporção do PIB. Assim, não era
preciso aumentar a carga tributária. O ganho com impostos, resultante de maior
produção econômica, formaria superávit primário, com que se poderia abater a
conta de juros e reduzir o endividamento do governo. Assim funcionou.
Incluídas as reformas — previdenciária
(encaminhada), trabalhista, introdução das Parcerias Público-Privadas e revisão
da Taxa de Juros de Longo Prazo, eliminando subsídios nos financiamentos
do BNDES —,
o governo Temer deixou uma herança extremamente positiva: um país preparado
para crescer em regime de estabilidade fiscal.
O governo Bolsonaro conseguiu concluir a
reforma da Previdência,
mas foi só. Verdade que houve a pandemia, que exigiu gastos enormes para apoiar
famílias e empresas, mas, em cima disso, o teto começou a ser furado com
diversas exceções — despesas feitas, mas não contabilizadas.
No governo Lula, o ministro Fernando Haddad
decretou a morte do teto de gastos e inventou o arcabouço fiscal, apresentado
como grande sacada: permitiria o aumento de gastos com equilíbrio fiscal.
Curioso: ele dizia que o teto de gastos não tinha como funcionar, pois
engessaria um governo que precisava gastar para atender os mais pobres. Mas, na
prática, o que fez o ministro? Criou um teto mais alto: a despesa de um ano
passou a ser igual à do ano anterior, mais a inflação, mais 2,5% reais.
Não deu certo. O arcabouço nasceu torto
porque o governo criou ou aumentou despesas que cresceram mais que 2,5% ao ano.
São os gastos obrigatórios com Previdência, funcionalismo e programas sociais
(Benefício de Prestação Continuada, abono e seguro-desemprego). Ora se a maior
parte da despesa cresce mais que os 2,5% permitidos, os demais gastos terão de
ser cortados. Como o governo não quer cortar, aumenta os impostos. Como mesmo o
aumento de impostos é insuficiente, volta-se à prática de excluir despesas do
teto. Não entram na conta, de modo que a meta de equilíbrio está cumprida
formalmente, mas a dívida pública aumenta — onde mora o problema maior.
Dá nisso: para equilibrar as contas deste
ano, o governo precisa aumentar receitas. Para o ano que vem, conforme o
Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias recém-enviado ao Congresso, o
governo precisará tirar mais R$ 118 bilhões dos contribuintes. Não há a menor
indicação plausível de como isso será feito. Em 2027, segundo as previsões
oficiais, o dinheiro acaba. Feitos os gastos obrigatórios, não sobra dinheiro
nem para o cafezinho do pessoal.
Esqueçam isso de equilíbrio ou arcabouço
fiscal. O governo aumentará o déficit e a dívida. Isso será igual a mais
inflação, juros mais altos e menos crescimento.
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