O Globo
Políticos como Trump e Bolsonaro conseguem
catalisar as atenções da imprensa e das demais instituições com base em agendas
personalistas
Enquanto o governo Lula abre a caixa de
ferramentas de políticas públicas e lança uma nova campanha publicitária, tudo
para tentar estancar a sua queda de popularidade, o espetáculo promovido por
Donald Trump e o showzinho de Jair Bolsonaro para pressionar pela anistia aos
condenados do 8 de Janeiro são os assuntos que mais mobilizam a imprensa e as
instituições aqui e no mundo.
Em outras palavras: nos tempos atuais, é o
espalhafato, o estardalhaço que gera engajamento e, muitas vezes, continua
vencendo eleições, a despeito das evidências de quanto essa maneira de fazer
política é deletéria para a democracia e para a economia.
Como sair da armadilha e retomar algum grau de previsibilidade em governos e relações entre países é uma pergunta cada vez mais difícil de responder de forma taxativa e aceita pela maioria de populações cada vez mais divididas e intolerantes.
Não há ganhadores com a destruição que Trump
promove em ritmo alucinante nos Estados Unidos. Aqueles que o elegeram colherão
em igual medida dos que votaram em Kamala Harris os efeitos de suas
arbitrariedades em rigorosamente todas as frentes em que um governo pode atuar.
Sobretudo no bolso, uma vez que, caso ele em
algum momento resolva realmente implementar sua guerra tarifária nos moldes que
anunciou, o céu é o limite para a inflação, e haverá uma reconfiguração
completa no próprio modo de vida do americano médio — a prova disso são os
vídeos mostrando a correria por compras de tudo que ninguém de fato precisa, só
pelo medo do preço a que chegarão amanhã ou depois.
Como já tinha acontecido em Trump 1, os
jornais, as TVs, as revistas, os portais, todo o ecossistema informativo não só
dos Estados Unidos, mas dos quatro cantos do mundo, estão com seus recursos
mobilizados para tentar explicar o que muitas vezes não tem lógica nem
explicação razoável.
O frenesi vem depois de uma modorra de quatro
anos do governo Biden, em que jornais tiveram de apostar em toda sorte de
produtos não jornalísticos e nem assim obtinham os números de audiência que
alcançaram durante o primeiro mandato do republicano, nem de longe tão
imprevisível quanto o atual. A normalidade não vende, não gera clique, não
engaja.
Por aqui, a comparação entre o esforço de
Lula para voltar à crista da onda pelas vias normais e o furdunço que Bolsonaro
provoca mesmo às raias da condenação é nossa comprovação de que a barulheira
egoica de líderes populistas ainda atrai as atenções de quem deveria se ocupar
de outros assuntos, de jornalistas a deputados.
Hugo Motta engrossou a voz e disse que não
via prioridade no projeto que propõe anistia aos condenados do 8 de Janeiro,
que é, todo mundo sabe, apenas um cavalo de Troia para o perdão que realmente
interessa a Bolsonaro: o dele próprio, lá na frente, e quem sabe de alguns dos
que arrastou para a micareta golpista que tentou patrocinar.
Mal sabia o presidente da Câmara que sua vida
se transformaria num inferno e que não teria um dia de paz, porque o
ex-presidente colocaria a máquina do PL e se empenharia pessoalmente em lembrar
a ele todos os dias as conversas que teve para obter o apoio do partido a sua
eleição para o lugar de Arthur Lira.
Tudo indica que, com todo esse barulho, a tal
anistia, caso passe, será brecada pelo Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, o
Legislativo para tudo que está fazendo, e todo mundo cai na cilada de ficar
contando quantas assinaturas faltam para a urgência do tal projeto. Ponto para
quem aposta no fuzuê para sequestrar a agenda nacional.
O papel coadjuvante do governo, que não
consegue desarmar a arapuca, evidencia quanto o estilo Lula de fazer política,
em que o país vive de solavanco em solavanco, está distante desse caos que
temos perigosamente normalizado, que produz muito calor e nenhuma luz.
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