Valor Econômico
Em meio às especulações sobre seu destino, governador de São Paulo avança tentando conciliar imagem de herdeiro do bolsonarismo com a de político moderado
“Quantos Napoleões a França teve?”,
questionou o interlocutor, em conversa com a coluna, a propósito de um dos
possíveis cenários para a eleição
presidencial de 2026.
O mote era a estratégia pela qual o nome “Bolsonaro” poderia despontar na
urna eletrônica na sucessão presidencial, mesmo com o ex-presidente inelegível.
Para a hipótese se consumar, Jair Bolsonaro (PL) teria de reverter a
inelegibilidade junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ao Supremo Tribunal
Federal (STF).
Nos bastidores, ele tem afirmado a aliados que considera factível uma vitória na Justiça Eleitoral, mas reconhece a possibilidade de derrota no STF. Ele se tornou inelegível até 2030 por decisão do TSE, por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação por ter realizado uma reunião no Palácio da Alvorada, com embaixadores, quando atacou o sistema eleitoral, em ato transmitido pela TV Brasil.
Outro caminho para Bolsonaro viabilizar a
candidatura seria a aprovação, nas duas Casas legislativas, do projeto de lei
(PL) que concede anistia aos
envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. O ex-presidente é réu na ação penal, em tramitação no STF, que
visa à punição dos responsáveis pela tentativa de golpe contra o Estado
Democrático de Direito em 2022. Mesmo se o PL for aprovado, pode ter a
constitucionalidade questionada no Supremo.
Se nenhuma dessas alternativas prosperar,
Bolsonaro, segundo interlocutores, cogita repetir a estratégia do presidente
Luiz Inácio Lula da
Silva no pleito de 2018. Mesmo preso em Curitiba (PR), e inelegível, o petista
lançou a candidatura, e liderou as pesquisas até o fim de agosto, quando o TSE
revogou o registro. Com isso, ele indicou Fernando Haddad para substituí-lo nas
urnas.
A percepção de aliados do ex-presidente é de
que a vantagem dele em relação a Lula é que uma de suas armas é o sobrenome. Ele poderia indicar um dos filhos, Flávio ou Eduardo, ou a
ex-primeira-dama Michelle, e em qualquer dessas alternativas, o nome que iria
para a urna seria o mesmo: “Bolsonaro”.
A se materializar a estratégia, não haveria
ineditismo. Como lembrou o interlocutor da coluna, no século XIX, a França teve
três “Bonapartes”: Napoleão I, II e III.
Em um salto para a história mais recente, e
para a política nacional, em 2010, a eleição para governador do Distrito
Federal não ficou sem o sobrenome “Roriz” na urna. Declarado inelegível pela
Justiça Eleitoral, o ex-governador Joaquim Roriz (morto em 2018) indicou a
esposa, Weslian, para substituí-lo na disputa para o governo a uma semana do
pleito. Pela inexperiência da escolhida, a troca rendeu fatos pitorescos.
Durante um debate, ela declarou, com ênfase: “Quero defender toda aquela
corrupção!”
Em meio à inesgotável discussão de cenários
para 2026, um desenho descartado desde o início seria o governador de São
Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos),
figurar como vice em chapa encabeçada por Bolsonaro, para adiante substituí-lo.
Em contrapartida, um cenário desejado por todos os caciques do Centrão seria
Tarcísio emergir como candidato único da direita à Presidência da República,
com apoio de Bolsonaro.
Essa hipótese, contudo, esbarra em inúmeros
empecilhos, a começar pela desorganização da direita, que, até agora, não deu
sinais de que poderá se unir em torno de um único candidato para enfrentar
Lula. O segundo obstáculo é Bolsonaro e sua obsessão
para viabilizar a própria candidatura em 2026.
Em paralelo, registre-se que o projeto
pessoal de Tarcísio,
segundo pessoas próximas dele, é concorrer à reeleição. “Tarcísio
é cerebral”, definiu à coluna um político experiente, que transita no entorno
do governador. “Se ele pode chegar em 2030 como um líder político, duas vezes
governador de São Paulo, por que aceitaria ser um episódio do bolsonarismo em
2026?”, questionou.
Uma pesquisa
Datafolha divulgada nessa quinta-feira (10) revelou que Tarcísio
sairia vitorioso de uma campanha à reeleição se a disputa fosse hoje em todos
os cenários testados pelo instituto, com vantagem ampla sobre os adversários.
Porém, o levantamento também mostrou que o governador não pode se descuidar do
seu quintal: 22% avaliam sua gestão como ruim ou péssima, índice que dobrou em
dois anos.
Em meio às especulações sobre seu destino,
Tarcísio avança, tentando conciliar a imagem de herdeiro do bolsonarismo com a
de político moderado. No domingo (6), no palanque ao lado de Bolsonaro, desfiou
críticas ao governo federal. “Por que a inflação está tão cara, por que vocês
estão pagando caro no ovo, e se está tudo caro, volta Bolsonaro”, exortou.
Meses antes, em fevereiro, Tarcísio subiu em outro palanque, daquela vez, ao lado de Lula, no lançamento do edital para construção do túnel Santos-Guarujá. “Tem gente do lado do Tarcísio que não gosta de vê-lo do meu lado, e tem gente do meu lado que não gosta de me ver do teu lado", provocou Lula. Por sua vez, Tarcísio exaltou o diálogo. “É o dia que a gente mostra e dá um exemplo de que é possível sentar na mesa, que é possível construir”, afirmou. “Diferenças têm que ser deixadas de lado para que a gente chegue num consenso, pra que a gente possa atender a população, é o dia de pensar no futuro", completou. Atualmente, é só o que move o mundo político: pensar no futuro.
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