O Estado de S. Paulo
A anistia está para negócio. Com Bolsonaro,
por ora, sobrando. Ele já sacou o que vai em curso. É sujeito transparente. Só
aceita a anistia “ampla, geral e irrestrita”. Anistia para si, pois. Os casos
de Débora e de outros condenados a sanções desproporcionais lhe servindo de
escada à própria impunidade. Já não lhe servem mais. Não exclusivamente.
Bandeira doravante disputada.
Bolsonaro sacou que a escada agora é outra: a própria anistia. Escada àquilo – o justo – que não quer de jeito algum: a redução das penas dos agentes depredadores do 8 de Janeiro. Acomodação – com o Supremo, com tudo – que não o contemplaria. (Não com vistas a 2026.)
A negociação, liderada pelo presidente da
Câmara, está deflagrada – e é a isso que Bolsonaro reage. O discurso é
autoexplicativo: “Agora, tivemos um ponto de inflexão. Enchendo a bola da minha
esposa aqui, que falou muito bem na Paulista, dirigindo-se ao ministro Fux.
Ali, no meu entender, foi uma fissura que apareceu. Um outro lado que parecia
impossível. A modulação não nos interessa. Redução de penas não nos interessa.
O que nos interessa, sim, é anistia ampla, geral e irrestrita”.
Acione-se a tecla de tradução do blá-blá-blá:
“Não estou instrumentalizando o flagelo desses sorveteiros-pipoqueiros,
gastando meus domingos em manifestações, para ficar de fora do arranjo”.
O arranjo foi encaminhado. Não há fissura. Um
suposto racha no tribunal sendo mera expressão do desejo de Bolsonaro. Xandão
não deixa. Não está autorizada a divergência na Corte constitucional – para que
não se arrisque a unidade da bancada. Ponto de inflexão, sim. Arma-se um
acordo: em vez do perdão geral, o ajuste da dosimetria conforme os crimes
cometidos.
A intervenção de Fux ensejou as tratativas
entre STF, Parlamento e governo. Pela “modulação” que não interessa a
Bolsonaro; que perdeu o controle da manipulação da injustiça encarnada em
Débora. A inflexão de Fux abrindo terreno ao esvaziamento da carga pela
anistia, em troca da revisão de penas. Tem jogo.
Gleisi Hoffmann, articuladora política de
Lula, lê os ventos e já disse que toparia discutir a possibilidade, desde que
os líderes do movimento golpista – Bolsonaro e seus helenos – não fossem
perdoados. Recuaria mais tarde. Recado dado: a bola – para reduzir as punições
– está com o Supremo e não haveria grandes resistências.
Teatro dos tarcísios à parte, também a
direita – boa parte dos governadores que lhe sobem aos palanques – projeta um
porvir sem o ex-presidente na urnas. Ninguém morrerá abraçado à causa impopular
– a da anistia – percebida como fachada a agenda egoística, em prol de
Bolsonaro, o inelegível. A inelegibilidade do cara dá mais futuro à turma, hoje
oposição engessada, que perde tempo em pauta descolada das aflições do povo,
que não explora politicamente nem a violência nem a inflação, enquanto Lula,
grato, reorganiza-se.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.