sexta-feira, 23 de maio de 2025

Anúncio do governo mira queda dos juros e mostra que arcabouço ainda vive - Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Anúncio se harmoniza com o BC de duas formas, pontuou o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron

Normalmente delegada aos técnicos, e entrevista coletiva para divulgar o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas, mais conhecido como “bimestral”, contou desta vez com as presenças dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet. Foi para dar peso político ao que seria anunciado.

E o que foi anunciado foi uma contenção “significativa”, como qualificou Tebet, de R$ 31,3 bilhões nas despesas este ano.

É mais do que o dobro do esperado por analistas do mercado, que apostavam em um ajuste mais gradual. Depois do embate entre as alas política e econômica do governo no fim do ano passado, que resultou em cortes de despesa menos ambiciosos do que o necessário, essa parecia uma estratégia mais provável.

Mas havia, dentro do governo, quem advogasse um choque de credibilidade na política fiscal que, inclusive, surpreendesse o mercado. O propósito seria melhorar as expectativas, fortalecer a indicação de cumprimento da meta fiscal e, assim, ajudar o BC na tarefa de combater a inflação - derivada, em parte, da desconfiança em relação aos rumos da política fiscal.

Sem ser questionado a respeito, Haddad contou que, na reunião em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu sobre o bimestral, houve consenso. “Todo mundo compreendeu essa necessidade.” É desejo comum da equipe de governo que o cenário macroeconômico melhore, explicou.

Há um recado no tamanho da contenção, reforçou o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Guimarães, para responder sobre eventual choque entre a redução nas despesas e a busca pela melhoria da popularidade de Lula. A decisão que estava sendo anunciada, disse, tem relação com a inflação e a política monetária. Uma política fiscal em ordem ajuda na avaliação do governo por esse lado, argumentou.

A necessidade de conter despesas em R$ 31,3 bilhões decorre, em grande parte, de uma “limpa” feita pela área econômica nas previsões de arrecadação extraordinária. Foram cortados perto de R$ 90 bilhões em receitas cujo ingresso no caixa não é certo.

Com isso, a projeção do resultado primário das contas públicas piorou e foi necessário contingenciar R$ 20,7 bilhões. Os outros R$ 10,6 bilhões foram alvo de bloqueio, porque as despesas, lideradas por Previdência e Benefícios de Prestação Continuada, iriam estourar o limite permitido no arcabouço fiscal.

Ainda assim, a contenção de despesas mira déficit de R$ 31 bilhões, que é o limite inferior da margem de tolerância da meta fiscal. O que não quer dizer que não se busque, do ponto de vista gerencial, resultado melhor. Haddad insistiu que, no dia a dia, a equipe tenta chegar ao centro da meta.

A contenção será deste tamanho apesar das receitas adicionais de R$ 20,5 bilhões que o governo espera obter com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em algumas operações específicas. Essas mudanças arrecadarão R$ 41 bilhões em 2026. Outras medidas estão em avaliação por Lula, disse Haddad.

A medida se harmoniza com o BC de duas formas, pontuou o secretário do Tesouro, Rogério Ceron. Primeiro, porque reforça a expectativa de cumprimento das metas fiscais. Segundo, porque encarece operações de crédito das empresas, o que colabora com a acomodação na dinâmica de novas concessões, outro ponto de preocupação do BC. Com isso, disse, contribui-se para um ambiente favorável para a redução dos juros.

Haddad repetiu que o ajuste fiscal não é tarefa de uma só pessoa ou de um só Poder. “Dependemos da compreensão de mais atores para atingir a meta.”

Ele lembrou que este é um ano não eleitoral, portanto propício para aprovação de medidas no Legislativo. Em seguida, informou que a conta de gastos tributários está em alta e que o Congresso seria o “mais interessado” em conhecer esses números.

O bimestral mostrou que o arcabouço não está morto, mas depende de muita coisa para se manter em pé. Mostra também que a equipe econômica não deixou de lutar por ele. É um bom sinal, mas outubro de 2026 está longe.

 

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