Valor Econômico
Governo atropelou compromisso assumido de
convergência com dois códigos obrigatórios da entidade
O governo Lula vai ser certamente questionado
por países na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
sobre o aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeira (IOF),
mesmo com o recuo parcial da medida ontem à noite.
O que o governo fez agora foi atropelar o
compromisso feito com a OCDE de eliminar progressivamente até 2029 a incidência
do IOF. A promessa foi feita para tentar aderir aos Códigos de Liberalização de
Movimento de Capital e de Transações Invisíveis. São os dois principais
instrumentos da OCDE na área econômica e obrigatórios para uma futura adesão de
qualquer país como membro da entidade.
O primeiro documento leva a uma liberalização gradual do fluxo financeiro internacional, incluindo pagamentos, transferências, empréstimos, investimentos, compra e venda de moeda estrangeira.
O segundo trata de liberalização de
transações que não envolvem bens, a prestação de serviços de forma
transfronteiriça, incluindo consultoria, advocacia e arquitetura.
A estrutura dos dois códigos é a de regras
gerais e listagem anexa de exceções (reservas) por país. Essas reservas, porém,
não são declarações unilaterais, como muitos outros tratados internacionais,
mas sim o resultado de um processo negociador onde elas tem que ser aceitas
pelos países que já são aderentes aos códigos.
Para aderir aos códigos, o governo Bolsonaro
tomou medidas de convergência com as regras da OCDE, como mudança na lei
cambial e o compromisso de zerar IOF em operações com moeda estrangeira até
2029.
As negociações estavam praticamente
concluidas em 2022. A adesão aos dois códigos, com forte sinalização a
parceiros internacionais, deveria ter sido feita por troca de cartas em
dezembro daquele ano. Em seguida, o governo enviaria o projeto ao Congresso. Só
que isso não foi feito a tempo nos últimos momentos do governo Bolsonaro.
Em 2023, o governo Lula chegou a revalidar o
acordo. Mas a instrução do Palácio do Planalto para a adesão aos códigos nunca
foi dada.
Agora, como as coisas estão indo, essa
discussão sobre se incorporar aos dois instrumentos só ocorrerá quando o Brasil
retomar o processo de acessão na OCDE - que justamente o governo Lula não quer
fazer andar.
O movimento ontem de aumentar o IOF confirma
que não há vontade de o governo entrar na OCDE, onde poderia ter um papel de
peso inclusive como ponte com outros países do Brics, por exemplo.
Um país adere aos códigos de liberalização da
OCDE normalmente porque vê lógica, racionalidade, nisso. Em 2022, quando
anunciou medidas de convergência para a adesão, a nota do governo dizia que as
mudanças iriam melhorar o cenário para as transações internacionais, pagamentos
de serviços e de comércio exterior, e transações de investimentos.
— Foto: Marcelo Andreguetti (IF)
Em geral, os países acabam aderindo aos
códigos no pacote final do processo de acessão à OCDE. A entidade sempre
trabalhou assim. Mas a partir de um certo momento passou a facultar o ingresso
aos instrumentos mesmo antes de o país completar o processo de acessão. Foi
nesse contexto, como no caso de muitos instrumentos, que o Brasil queria então
já selar a convergência via adesão, por troca de notas, em 2022.
Como país candidato, o Brasil vem
participando do ‘Advisory task force’ dos códigos via Banco Central. Desde que
iniciou o processo de acessão à OCDE, em 2022, pode participar de qualquer
comitê da entidade. Assim, o Banco Central do Brasil acompanha diretamente as
reuniões do ‘task force’’ dos dois códidos de liberalização, não mais como
convidado.
Ao mesmo tempo, enquanto o governo Lula se
desvia cada vez mais de acessão à OCDE, outros países correm para entrar na
entidade. Em meio a mais incertezas sobre o estado do mundo em termos
econômicos, políticos e ecológicos do que em qualquer outro momento nas últimas
décadas, uma série de países tenta acelerar sua entrada na OCDE, como Indonésia
e Tailândia na Ásia; Bulgária, Croácia e Romenia na Europa; Argentina e Peru na
América do Sul.
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