Folha de S. Paulo
O racismo à brasileira se perpetua porque foi
naturalizado sob a maquiagem barata do 'mal-entendido' ou do 'ato não
intencional'
Não há credencial, talento, fama,
reconhecimento ou fortuna capazes de blindar uma pessoa negra contra o racismo e
o preconceito étnico-racial no Brasil. Há alguns dias, a advogada baiana Vera
Lúcia Santana Araújo, ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral,
foi barrada ao tentar ingressar no prédio onde funciona a Advocacia-Geral da
União para participar de um evento promovido pela AGU, onde seria
palestrante.
O que aconteceu com ela ocorre todos os dias com milhões de pessoas pretas e pardas no Brasil e, em geral, "não dá nada" além da humilhação e da dor suportados por uma massa negra. A discriminação contra a ministra Vera Lúcia veio a público e passou a integrar o rol cada vez maior de escândalos de natureza étnico-racial porque ela é uma figura pública —ou seja, não se trata de uma "negra qualquer".
Afinal de contas, o racismo à
brasileira se perpetua porque foi naturalizado sob a maquiagem barata
do "mal-entendido" ou do "ato não intencional". Mas estamos
falando de um crime inafiançável e imprescritível, previsto na Constituição
Federal.
Isso é incontestável.
Recentemente foram divulgados dados de uma
pesquisa nacional que mapeou, pela primeira vez, a frequência
com que os brasileiros se sentem discriminados no cotidiano. O
resultado evidenciou o que qualquer pessoa com um pingo de consciência e senso
de percepção da realidade já sabia: raça é o principal fator de discriminação
neste país.
A discriminação racial, uma das muitas
facetas do racismo, manifesta-se pela imposição de tratamento desigual e
injusto a um determinado grupo de pessoas. Tudo por conta de crenças e
preconceitos que perpetuam a opressão de uns em favor do privilégio de outros.
Não há desculpa cabível que justifique passar
pano para um crime que afeta milhões de cidadãos e, a despeito disso, é
naturalizado pelo Estado. Como observou a ministra Vera Lúcia, "o
preconceito de cor é uma construção do Estado e o racismo permeia todos os
espaços." Pergunto: Até quando?
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