Folha de S. Paulo
A guerra contra universidades é mais uma
prova de que o americano pretende destruir a democracia
Na última semana, Trump proibiu
a Universidade Harvard, a melhor do mundo, de receber
estudantes estrangeiros. A decisão foi uma escalada dramática da
guerra trumpista contra as universidades americanas, que já tinha atingido
outras grandes escolas, como Columbia.
A decisão veio após Harvard se recusar a aceitar uma lista de demandas contida em uma carta do governo Trump de 11 de abril. Trata-se de um documento histórico importante para a análise do trumpismo.
A carta começa com a ideia de que Harvard
recebe bilhões de dólares em financiamento e que precisa, por isso, dar um
retorno para o governo. Todos os governos americanos anteriores entendiam que o
retorno devido por Harvard era entregar pesquisa acadêmica de vanguarda, o que
Harvard sempre fez. Para Trump, em troca de financiamento, Harvard deve
promover a ideologia do partido do presidente.
A essência da carta para Harvard é
a exigência de que se acabe com a ação afirmativa para pretos e se estabeleça
uma ação afirmativa incomparavelmente mais ampla para direitistas. Trump exige
que Harvard dê poder e dinheiro a tudo que for de acordo com a ideologia
trumpista e tire poder e dinheiro de tudo que for contra.
As políticas de promoção de diversidade são
criticadas por, supostamente, violarem o princípio do mérito acadêmico, mas,
assim que as minorias terminam de ser expulsas do argumento, Trump esquece o
mérito e exige sua própria política de diversidade, voltada à promoção de
conservadores na administração, entre os professores e entre os alunos. Tudo
imposto de cima para baixo, sob controle rígido do partido que está no poder.
No caso dos militantes dos direitos
palestinos, Trump foi bem mais longe e exigiu exclusão e repressão severa, pois
eles atrapalham seu projeto de matar Gaza de
fome e construir um resort em cima.
O populismo trumpista é profundamente
anti-intelectual e anticientífico, profundamente ressentido com a elite
artística e acadêmica, o que, em parte, compensa no imaginário de seus
militantes sua covardia diante da elite econômica.
O secretário de Saúde de Trump é um militante
antivacina. Sua chefe do Departamento de Segurança Interna declarou, em
audiência no Senado, que
habeas corpus quer dizer "o direito do presidente expulsar quem
quiser do país".
O ataque a Harvard, além do evidente
propósito de aparelhamento, é uma manifestação desse anti-intelectualismo. Com
um bônus: o fim da inclusão racial em Harvard livraria eleitores de Trump que
são brancos, pobres e racistas de terem que assistir a negros e negras
ultrapassando-os na hierarquia de status.
As universidades americanas são as melhores
do mundo. Junto com as relações diplomáticas com o Canadá, estavam
entre as poucas coisas nos Estados
Unidos que não precisavam de conserto. Agora estão entre as muitas
coisas que Trump quebrou.
A guerra contra as universidades, enfim, é
mais uma prova de que Trump pretende destruir a democracia americana. Ou vocês
acham que Donald pretende estabelecer o direito do presidente aparelhar as
universidades e, daqui a quatro ou oito anos, entregar esse poder para seus
adversários? A Presidência imperial que Trump está construindo no terceiro
mandato só faz sentido para quem não pretende deixar de ser governo nunca.
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