O Globo
Há convergência de pensamento e objetivos com
Trump que isola a esquerda, mesmo a não radical
Já foi ultrapassada a era de desarmamento que
prenunciava um mundo menos antagonizado. A invasão da Ucrânia pela Rússia
iniciada em 2022 — combinada à volta de Donald Trump ao poder nos Estados
Unidos, obstinado em não investir na Otan como sistema de proteção do Ocidente
— fez com que os países europeus, que se sentiam protegidos pelo tratado
nascido na Segunda Guerra Mundial para prevenir ataques desse tipo, retornassem
à política armamentista de autodefesa que se expande pelo mundo. A Otan foi
peça fundamental para que a Guerra Fria entre União Soviética e Estados Unidos
não esquentasse.
A nova escalada da guerra com o ataque surpresa da Ucrânia devastando boa parte da Força Aérea russa e a previsível retaliação só fazem aumentar a insegurança. Essa é uma doença que se espalha com facilidade, baseada no receio bem fundamentado de que um país como a Rússia possa repetir a Alemanha de Hitler e invadir seus vizinhos, transformados em zonas de influência, com a anuência de um líder autocrata como Trump, que “entende” a importância da força militar na geopolítica internacional e aceita um mundo não mais dividido entre Ocidente e Oriente, mas em três áreas dominadas por Estados Unidos, China e Rússia.
A perspectiva agressiva, com os Estados
Unidos ameaçando sistematicamente anexar o Canadá ou a Groenlândia, faz com que
a Europa se incline a uma política armamentista, como compensação à negação da
Otan como arma defensiva. Ao mesmo tempo, o clima hostil leva conservadores a
prevalecer na maioria das eleições realizadas no mundo, mesmo que os Estados
Unidos não sejam mais um aliado tão confiável. Ainda que rejeitados por um
governo autoritário, os antigos aliados ocidentais dos americanos preferem a segurança
de governos conservadores à esquerda, que anos atrás chegou a dominar os
governos europeus e latino-americanos.
O espírito do tempo é conservador. A direita
toma conta da política europeia. Há convergência de pensamento e objetivos com
Trump nos Estados Unidos isolando a esquerda, mesmo a não radical. A direita
cresce na Europa inteira, obtendo os resultados mais acachapantes desde a
fundação da União Europeia: Grécia — Nova Democracia (centro-direita); Bulgária
— GERB (direita); Hungria — Fidesz (direita); Finlândia — KOK (direita); França
— RN (direita); Áustria — FPO (direita); Alemanha — CDU (centro-direita). Anteriormente,
já ganhara na Polônia, na Hungria e na Itália.
Ontem a direita radical ganhou a nova eleição
na Polônia, levando ao poder o conservador Karol Nawrocki, um historiador
contrário à União Europeia e apoiado por Trump durante a eleição. A base do
movimento parece ser o aparente declínio econômico do Ocidente. Com a exaustão
do establishment e os prejudicados pela decadência econômica em busca de saída,
a disputa volta a se dar entre uma base de precarizados e a elite. Forma-se um
ambiente político propício ao populismo de direita.
A visão da direita brasileira é que o
ambiente internacional, especialmente com a administração Trump demonstrando
interesse real em ajudar o ex-presidente Bolsonaro, favorece a vitória em 2026
de um representante do grupo. Hoje, tende a ter o sobrenome Bolsonaro, mesmo
que como vice — hipótese que já foi mais forte, mas vem sendo superada pela
insistência de Eduardo Bolsonaro em ser candidato a presidente. A definição do
quadro pode ser feita com a seguinte equação: civilização ocidental em modo de
sobrevivência; conservadores dirigindo, liberais no banco de trás, socialistas
fora; a geopolítica guiando a sociedade; política econômica substituindo a
economia política.
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