quarta-feira, 25 de junho de 2025

Fora da ordem - Bernardo Mello Franco

O Globo

Ao atacar Irã sem aval da ONU, americano ajuda a demolir o que resta da ordem mundial

Em setembro de 1990, George Bush, o pai, anunciou o início de uma “nova ordem mundial”. A Guerra Fria e a ameaça de hecatombe nuclear haviam ficado para trás. Com o declínio da União Soviética, o caminho estava livre para a hegemonia americana.

Sem rivais à altura, os EUA prometiam fortalecer as Nações Unidas, buscar a paz e liderar pelo exemplo. Na nova ordem, disse o presidente, os fortes respeitariam os fracos e o Estado de Direito prevaleceria sobre a lei da selva. Se o discurso lido no Capitólio chegou a ser levado a sério, foi rasgado de vez por Donald Trump.

Desde que voltou ao poder, o republicano busca se impor pelo medo e pela força. Já ameaçou anexar o Canadá, invadir a Groenlândia, tomar o Canal do Panamá. Sabotou o acordo do clima, abandonou a Organização Mundial da Saúde, tumultuou o comércio global com um tarifaço. Agora seu objetivo é apagar a fogueira do Oriente Médio com gasolina.

Na semana passada, Trump ameaçou assassinar o aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã. “Não vamos matá-lo, pelo menos não por enquanto”, provocou, como se estivesse num filme de faroeste. Dias depois, ele ordenou um bombardeio maciço a instalações nucleares do país. O ataque foi festejado pelo premiê israelense, Benjamin Netanyahu, que iniciou o conflito com a alegação não comprovada de que os iranianos estariam construindo uma bomba atômica.

Horas após entrar na guerra, o americano foi às redes sociais e anunciou um cessar-fogo “total e completo”. Para surpresa de ninguém, o tuíte foi ignorado por israelenses e iranianos, e os mísseis voltaram a zunir nos céus do Oriente Médio. Restou a Trump esbravejar nos jardins da Casa Branca. “Não estou feliz com Israel. Não estou feliz com o Irã também”, vociferou.

Ao ignorar a ONU e intervir unilateralmente num conflito que já era explosivo, o republicano deu mais um passo para demolir o pouco que resta da nova ordem proclamada por Bush. A trégua foi restabelecida ontem, mas ainda é cedo para decretar que o conflito entre Israel e Irã acabou. Se isso ocorrer, será por desinteresse das duas partes numa guerra prolongada — e não pelos gritos de Trump.

 

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