O Globo
Ao atacar Irã sem aval da ONU, americano
ajuda a demolir o que resta da ordem mundial
Em setembro de 1990, George Bush, o pai,
anunciou o início de uma “nova ordem mundial”. A Guerra Fria e a ameaça de
hecatombe nuclear haviam ficado para trás. Com o declínio da União Soviética, o
caminho estava livre para a hegemonia americana.
Sem rivais à altura, os EUA prometiam fortalecer as Nações Unidas, buscar a paz e liderar pelo exemplo. Na nova ordem, disse o presidente, os fortes respeitariam os fracos e o Estado de Direito prevaleceria sobre a lei da selva. Se o discurso lido no Capitólio chegou a ser levado a sério, foi rasgado de vez por Donald Trump.
Desde que voltou ao poder, o republicano
busca se impor pelo medo e pela força. Já ameaçou anexar o Canadá, invadir a
Groenlândia, tomar o Canal do Panamá. Sabotou o acordo do clima, abandonou a
Organização Mundial da Saúde, tumultuou o comércio global com um tarifaço.
Agora seu objetivo é apagar a fogueira do Oriente Médio com gasolina.
Na semana passada, Trump ameaçou assassinar o
aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã. “Não vamos matá-lo, pelo menos não
por enquanto”, provocou, como se estivesse num filme de faroeste. Dias depois,
ele ordenou um bombardeio maciço a instalações nucleares do país. O ataque foi
festejado pelo premiê israelense, Benjamin Netanyahu, que iniciou o conflito
com a alegação não comprovada de que os iranianos estariam construindo uma
bomba atômica.
Horas após entrar na guerra, o americano foi
às redes sociais e anunciou um cessar-fogo “total e completo”. Para surpresa de
ninguém, o tuíte foi ignorado por israelenses e iranianos, e os mísseis
voltaram a zunir nos céus do Oriente Médio. Restou a Trump esbravejar nos
jardins da Casa Branca. “Não estou feliz com Israel. Não estou feliz com o Irã
também”, vociferou.
Ao ignorar a ONU e intervir unilateralmente
num conflito que já era explosivo, o republicano deu mais um passo para demolir
o pouco que resta da nova ordem proclamada por Bush. A trégua foi restabelecida
ontem, mas ainda é cedo para decretar que o conflito entre Israel e Irã acabou.
Se isso ocorrer, será por desinteresse das duas partes numa guerra prolongada —
e não pelos gritos de Trump.
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