Folha de S. Paulo
Para parlamentar que não é parte da base, o
principal problema da democracia é o poder excessivo dos presidentes
Consistente com minha expectativa, a insatisfação com a democracia, entre eleitores, no Brasil subiu 5 pontos percentuais de um ano para cá (passou de 54% para 59% na nova pesquisa Pew). De 2023 para 2024, a insatisfação havia diminuído. Estamos abaixo de EUA (62%), França (66%), Espanha (69%) e Itália (67%) e acima de Alemanha (39%) e Suécia (25%). As evidências confirmam a importância do hiato vencedores x perdedores (o eleitorado que apoia o incumbente melhora sua avaliação, e vice-versa). Os dados para o Brasil não estão disponíveis, mas em 2024 o hiato era de 25%.
Nos EUA, a satisfação com a democracia
aumentou entre republicanos após
a eleição de Donald Trump e
desabou entre democratas. Na Alemanha, ela melhorou após o CDU/CSU ganhar as
eleições em fevereiro de 2025. O mesmo aconteceu entre eleitores do Partido Trabalhista Britânico, que chegou ao poder após 14
anos. E na África do Sul também com a oposição mais satisfeita após o ANC
perder a maioria do parlamento pela primeira vez.
Por outro lado, quando se observa queda no
apoio em geral —casos da Polônia e da Coreia do Sul—, o aumento da insatisfação
é preditor de derrota para o incumbente. O PIS elegeu o presidente na Polônia e
o presidente sul-coreano sofreu impeachment.
Há também um hiato vencedor-perdedor na
percepção pelos representantes eleitos (e não na opinião pública) sobre o
funcionamento da democracia, como mostra pesquisa com 2.445 deputados e
senadores de 17 países latino-americanos publicada na Swiss
Political Science Review. Nela o principal fator negativo na avaliação da
democracia para os perdedores (os que declararam não apoiar o governo,
independentemente de partido) são os poderes legislativos dos presidentes.
Entre os ganhadores, o lamento é em relação à fragmentação legislativa. No
Brasil, declaram-se independentes 27%, segundo a Quaest; 9% não sabem
responder!.
Os autores concluem que presidentes
constitucionalmente fortes causam insatisfação com a democracia para
independentes e oposição. Parece mantra de Motta e Alcolumbre. O inverso é verdadeiro: parceiros da coalizão
queixam-se de presidentes fracos. Singh
e Carlyn, em outra pesquisa, concluíram que a satisfação com a democracia é
maior quando um presidente tem poderes médios, nem fortes nem fracos.
Nossa situação é insólita porque nossas instituições são perversamente consensualistas, para
usar o jargão. O presidencialismo hiperminoritário produz falsos ganhadores:
presidentes sem suporte parlamentar. Ganha, mas não leva tudo. E também falsos
perdedores: a perda nunca é total. A agenda pública é dominada por itens de
apoio geral. Mas o risco permanente aqui é a inação ou paralisia. O Executivo
quase nunca logra impor sua agenda unilateralmente.
Parte da opinião pública deu "graças a
Deus" pelo fato de que sob Bolsonaro o Executivo era débil e vulnerável. Da mesma
forma que os perdedores de hoje festejam a fraqueza do
presidente sob Lula 3.
A teoria democrática empírica sustenta que
essa alternância gera aprendizado coletivo e moderação.
Desconfio de que somos "não
bayesianos", ou seja: os cidadãos e elites não revisam suas crenças em
função de novas informações e experiência. As crenças permanecem e até
recrudescem.
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