O Estado de S. Paulo
Guinada populista de Lula mira menos 2026 e mais a manutenção da hegemonia do PT sobre a esquerda
É uma máxima do jogo eleitoral: diante da
perspectiva de derrota, radicaliza-se o discurso para fidelizar a base –
mirando a próxima rodada.
A guinada à esquerda de Lula, reeditando a
narrativa “ricos contra pobres”, sinaliza que o PT já considera difícil vencer
em 2026. Mais que estratégia para vencer, parece tentativa de manter o PT como
protagonista da esquerda. Para vencer, Lula teria que repetir a tática de 2022:
moderar o discurso e buscar votos no centro. Mas isso colocaria em risco o
domínio do PT sobre o campo progressista no caso de derrota.
O lema é claro: entrega-se o Planalto para salvar a hegemonia do PT.
Essa guinada ajuda a reorganizar uma esquerda
que vinha dispersa e sem rumo diante de um governo sem uma marca clara. A
retórica populista pode ser vazia, mas oferece uma aparência de autenticidade,
um norte ideológico para a militância. Politicamente, fortalece o PT como
referência da esquerda. Mas, eleitoralmente, esse discurso tem um teto: sem o
centro, Lula não vence.
O discurso da justiça tributária, moldado em
termos de “ricos x pobres”, não ressoa com o eleitor de centro – grupo que
representa 15% a 25% do eleitorado e tende a decidir eleições. Esse eleitor não
é lulista nem bolsonarista e rejeita narrativas simplistas de luta de classes.
Com Bolsonaro fora do jogo, Lula tenta criar
um novo inimigo para manter viva a polarização.
Diferentemente da hipótese de que o voto dos
mais pobres bastaria, o PT sabe que precisa do centro. O risco é perder esses
votos para manter o monopólio da esquerda. A pergunta que fica é: os demais
partidos progressistas vão cair de novo nessa armadilha e continuar a ser
satélites do PT?
Curiosamente, o governo conseguiu inserir o
debate sobre justiça tributária na agenda pública – mas o fez de forma
populista, com slogans como “rico não paga imposto”. É uma narrativa eficaz
para animar a base, mas ineficaz para ampliar apoio.
A decisão do ministro do STF Alexandre de
Moraes, ao referendar a posição do Congresso contra o aumento do IOF, ajuda a
esvaziar essa pauta. Moraes, com precisão cirúrgica, atendeu às preferências do
Legislativo e, de quebra, pode ter diminuído a pressão política sobre o STF.
Se o objetivo fosse atrair o centro, haveria
estratégias mais eficazes. Vetar o aumento de salários de parlamentares e do
número de cadeiras na Câmara dos Deputados, por exemplo, teria alto impacto
simbólico. Certamente seria impopular no Congresso, mas popular entre o
eleitorado moderado – aquele que deve decidir as eleições de 2026. •
*Cientista político, professor titular da FGV
Ebape e sênior fellow do Cebri
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