segunda-feira, 14 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Reação ao tarifaço deve proteger soberania e economia brasileiras

Valor Econômico

A resposta à agressão do presidente Trump deve, na medida do possível, sempre resguardando a nossa soberania, ser calibrada de forma a preservar nossas cadeias de valor

O Brasil é uma economia fechada, e nossas exportações para os Estados Unidos representam menos de 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas não há  engano: o conflito tarifário desencadeado pelo presidente Donald Trump pode ter repercussões negativas de curto, médio e longo prazos sobre nossa economia.

Por isso, as negociações e eventuais medidas de reciprocidade adotadas pelo Brasil devem ser, ao mesmo tempo, firmes na defesa da soberania nacional, diante da inaceitável carta do presidente dos EUA, Donald Trump, e inteligentes  para resguardar os interesses econômicos do país.

Reportagem publicada pelo Valor nesta sexta (11/7) mostra como, a essa altura, é difícil avaliar o prejuízo potencial ao Brasil. Do ponto de vista macroeconômico, as estimativas dos especialistas são muito amplas. De um lado,  indicam uma perda, em termos de crescimento do PIB, de até 0,3% em 2025 e de até 0,5% em 2026. De outro,  apontam  impacto mais moderado, de 0,05% do PIB em 2026.

É bem provável que, em grande medida, esses cálculos estejam  influenciados pelo que os analistas econômicos acreditam que seja o desfecho mais provável das negociações. Quem aposta que a racionalidade ao final vai prevalecer, em geral, tende a estimar um impacto mais contido. Uma escalada retaliatória, de outro lado, poderia levar a impactos ainda mais severos no PIB.

A inflação brasileira também tenderia a ser afetada, num período em que o Banco Central já está sendo obrigado a manter as taxas de juros nas alturas, em 15% ao ano,  para colocar o índice de preços na meta. O principal canal de contágio inflacionário seria  a taxa de câmbio, que está vulnerável a uma eventual redução das exportações, ao aumento da aversão a risco e à diminuição do fluxo de capitais entre os países.

Mesmo que, em termos macroeconômicos, o impacto se mostre limitado, pode haver repercussões severas na microeconomia — ou seja, na economia local, onde estão as empresas e os trabalhadores dos setores exportadores mais afetados.

Felizmente, a primeira reação dos mercados foi relativamente contida, com quedas pequenas e moderadas de ações de empresas que têm os Estados Unidos como destino importante de suas vendas. De novo, isso parece refletir a aposta de que haverá um encaminhamento sensato das negociações.

Tão ou mais preocupante é o impacto que o escabroso ataque de Trump ao sistema de regras do comércio internacional poderá ter nos fluxos de investimentos diretos dos Estados Unidos ao Brasil, e vice-versa. Esse é um dos motores mais importantes para o aumento da produtividade e para ampliar a  nossa capacidade de crescimento de longo prazo.

Segundo dados do Banco Central, os capitais americanos respondem por 27% do estoque de US$ 1,017 trilhão de investimento direto no país, pelo critério de participação no capital, na posição de 2023. O capital americano tem participação relevante em 3.879 empresas que operam no Brasil. Esse é um desdobramento das relações comerciais, que leva à integração das cadeias produtivas.

O exame detalhado dos fluxos de ingresso de investimento direto em 2024 aponta que, além de bens, esses capitais aprofundam as relações de serviços. Pelos dados do BC, entraram US$ 8,476 bilhões em investimentos diretos americanos, dos quais US$ 859 milhões para a agricultura, US$ 486 milhões para a indústria e US$ 6,997 bilhões para os serviços. Não é apenas o dinheiro — os investimentos ajudam a ampliar ganhos de eficiência em setores como comércio, serviços de informação e financeiros.

O setor industrial responde por 10% do estoque de investimento direto americano, na posição de 2023, e gera efeitos multiplicadores muito mais fortes por toda a economia. O tarifaço de Trump tende a provocar um desvio de pelo menos parte desses investimentos para os Estados Unidos.

No seu relatório anual, o Banco Internacional de Compensações (BIS, na sigla em inglês) publicou um estudo que mostra que as economias emergentes que foram punidas com aumentos de tarifas apresentaram, nos anos seguintes, redução no fluxo de investimento direto. O estudo desdobra as consequências e aponta que, mais adiante, esses países também apresentaram uma tendência de crescimento menor.

O BIS explora os impactos do lado dos países emergentes, mas está claro que, com o protecionismo, não há vencedores. O redirecionamento dos investimentos aos Estados Unidos é feito à custa da redução da produtividade em solo americano, o que significa produtos e serviços mais caros e de menor qualidade.

O Brasil, que perdeu décadas de crescimento com a sua política de substituição de importações, sabe bem por que isso não dá certo. Por isso, a resposta à agressão do presidente Trump deve, na medida do possível, sempre resguardando a nossa soberania, ser calibrada de forma a preservar nossas cadeias de valor. Não faz sentido taxar importações americanas se, no fim, as empresas brasileiras saírem prejudicadas. O diálogo com o setor empresarial será fundamental para dosar adequadamente a resposta.

Mais do que nunca, a estratégia brasileira deve envolver a maior abertura comercial, buscando diversificar mercados e a nossa pauta exportadora. A forma pouco responsável com que os Estados Unidos tratam seus parceiros históricos, como Europa, Japão e Canadá, abre oportunidades para o Brasil — sem prejuízo aos esforços empreendidos para ampliar os laços com outras partes do mundo.

Nessa jornada por maior abertura comercial,  é essencial que o governo cuide da economia doméstica para assegurar a competitividade das empresas brasileiras. A reforma tributária ajuda, mas não resolve o problema fundamental da alta carga tributária. O desequilíbrio fiscal segue como o grande nó que impede que o Banco Central pratique taxas de juros civilizadas, afetando as condições de financiamento do setor privado.

É um erro restaurar a reprovação no ensino fundamental

O Globo

Projeto que acaba com ‘progressão continuada’ desafia evidências científicas e estimula evasão escolar

Parecia superado o debate sobre a aprovação automática dos alunos nos primeiros anos do ensino fundamental, também conhecida como “progressão continuada”. Mas o tema voltou à tona depois que a Comissão de Educação da Câmara aprovou projeto de lei do deputado Bibo Nunes (PL-RS) a proibindo. Seria um equívoco gigantesco se, diante de tantas outras necessidades mais urgentes na educação brasileira, o Legislativo patrocinasse tamanho retrocesso.

Relatada pelo deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), a proposta atende àqueles que negam as evidências sobre o tema e ainda julgam a “progressão continuada”, prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), uma medida da leniência do sistema educacional, cuja consequência, nas palavras de Nunes, “é criar uma geração de inúteis, incompetentes que não vencerão na vida, mas gerarão estatística enganosa, como se o ensino no Brasil fosse excelente”. Ferreira diz apoiar o projeto por acabar com “aquele faz de conta que empurra alunos para a série seguinte, sem aprender o básico”.

Os dois deputados ignoram a opinião fundamentada de pesquisadores e educadores. “O foco tem que ser no aprendizado, e não na reprovação ou aprovação”, afirma Priscila Cruz, presidente do Todos pela Educação. Estimular a reprovação é levar o país a gastar duas, três vezes com o mesmo aluno, que fica estagnado na mesma série numa fase em que pode ter várias chances de permanecer na escola e absorver o mesmo conteúdo se não sofrer o baque de uma reprovação. Trata-se, segundo ela, de desperdício “do ponto de vista da gestão e no aspecto educacional”. “Ele não vai aprender só porque foi reprovado. A escola é a mesma, os professores são os mesmos, e a formação deles não mudou”, afirma. É essencial, obviamente, haver avaliações contínuas, para o aluno ter chance de se recuperar ao longo do tempo. Mas fazê-lo repetir de ano no início de sua formação de nada adianta — nem para o próprio aluno, nem para o projeto estratégico de melhorar a educação brasileira.

Há evidências inequívocas de que a reprovação nessa fase do ensino está associada à evasão escolar. Quase metade (48%) dos alunos enfrentou alguma intercorrência dessa natureza no ensino fundamental, constatou a pesquisa “A Permanência Escolar Importa: Indicador de Trajetórias Educacionais”, do Observatório da Fundação Itaú e do Itaú Social, que acompanha estudantes nascidos entre 2000 e 2005. Converter um aluno em repetente equivale a abrir a porta de saída da escola para ele.

O Projeto de Lei que tramita na Câmara deve ser confrontado com a experiência positiva de estados e prefeituras que adotam ciclos de educação sem reprovação, mas com avaliação contínua e reforço para o aprendizado. O Brasil, apesar dos avanços na educação, ainda precisa reter mais estudantes do ensino básico na escola. No ano passado, entre os jovens de 14 a 29 anos, ainda havia 8,7 milhões que não haviam completado o ensino médio por terem abandonado os estudos ou nunca frequentado a escola, segundo o IBGE. Considerando a população com mais de 25 anos, apenas 56% haviam concluído a educação básica, patamar que era de 46% em 2016. Mesmo que a proporção ainda esteja aquém da desejada, certamente seria pior sem o sistema de “progressão continuada”.

Crise fiscal prejudica fiscalização e qualidade dos serviços públicos

O Globo

Sem promover cortes estruturais de gastos, governo reduz em 25% orçamento de agências reguladoras

Os efeitos da crise fiscal já podem ser sentidos pelo cidadão. Enquanto Executivo e Legislativo se recusam a promover reformas estruturais capazes de reduzir a contínua expansão dos gastos obrigatórios, o engessamento das verbas orçamentárias tem obrigado diversos setores do governo a promover cortes, prejudicando a qualidade de serviços públicos fundamentais. A área mais preocupante são as agências reguladoras, responsáveis por fiscalizar atividades que vão da mineração à aviação civil. Elas sofreram corte de 25% no orçamento, com efeitos prejudiciais à população.

A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) reduziu a frequência da manutenção das estações de monitoramento, usadas para prever secas e enchentes. Foram suspensos repasses aos programas Qualiágua, de controle da qualidade da água dos rios, e Progestão, de auxílio aos governos estaduais na administração de seus recursos hídricos. A Rede Hidrometeorológica reduziu pela metade as manutenções anuais, com prejuízo da qualidade dos dados hidrológicos. Há limitações na fiscalização em açudes do Nordeste no início do período de seca.

Aneel, agência do setor elétrico, acaba de afastar mais de 140 funcionários terceirizados. A redução da fiscalização aumentará o risco de falhas no fornecimento de energia e o tempo para restabelecimento do serviço. A Anatel, de telecomunicações, informa que a “restrição orçamentária atingiu diversos projetos em andamento”. Entre eles, o bloqueio de bets ilegais e ações contra a desinformação junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A ANM, de mineração, afirma que opera “no limite”. A falta de recursos ameaça paralisar a fiscalização de barragens, rejeitos e lavra ilegal. A agência diz que poderá suspender contratos de tecnologia da informação, segurança patrimonial e interromper serviços administrativos.

Também não escapa da crise fiscal a Anac, agência de aviação civil. Ela pode ser obrigada a reduzir em até 60% a supervisão e inspeção dos sistemas de segurança das operações e oficinas de manutenção das companhias aéreas. Já foi suspenso o agendamento de exames teóricos exigidos para a concessão de licença a pilotos e mecânicos. Questões de segurança podem não ser detectadas e corrigidas a tempo, “elevando a possibilidade de incidentes ou acidentes aeronáuticos”, informa a agência.

As Forças Armadas também foram atingidas. A FAB tem deixado aviões no solo por falta de recursos para compra de combustível e manutenção. O Exército adiou a implantação do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), e a Marinha sente falta de R$ 20 bilhões, a curto prazo, para continuar a desenvolver projetos de submarinos, entre eles o nuclear.

Os exemplos poderiam continuar. Mas a conclusão já é cristalina: a inépcia do governo para enfrentar a crise fiscal com cortes onde gastos são desnecessários acaba por forçar tais cortes onde os recursos são necessários.

Proposta de novo Código Eleitoral traz risco de retrocessos

Folha de S. Paulo

Texto com dispositivos nefastos é debatido no Senado com poucas melhorias; seria ideal implementar mudanças incrementais

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado adiou a votação do novo Código Eleitoral, texto aprovado pela Câmara dos Deputados em 2021 e que estava parado desde então. Talvez tenha sido melhor assim.
Embora seja possível enxergar algum mérito na intenção de unificar todas as legislações eleitorais do país, a proposta padece de tantos males que seu saldo, inevitavelmente, seria negativo.

Há, de saída, um problema conceitual grave. Os congressistas não pretenderam, em nenhum momento, limitar-se a compilar as regras hoje existentes, eliminando possíveis contradições e incorporando teses pacificadas na doutrina e na jurisprudência.

Não se trata, portanto, de simples unificação, como às vezes pode parecer. Parlamentares aproveitaram o ensejo para instituir normas novas, modificando, sem justificativa plausível, diversos aspectos do sistema eleitoral. Basta notar que o código em tramitação soma quase 900 artigos.

A princípio, nada há de errado em tentar sanar falhas e distorções pontuais. Mudanças no atacado, contudo, deveriam ser reservadas, quando muito, a instituições disfuncionais; não sendo esse o caso das leis que regulam a disputa política no Brasil, faria melhor o Congresso Nacional se buscasse avanços incrementais.

Uma medida bem-vinda, por exemplo, seria a criação de uma quarentena para certos servidores públicos, como magistrados, membros dos Ministérios Públicos e agentes das forças de segurança. Em 2021, circulou uma proposta que visava impedi-los de disputar cargos eletivos antes de cinco anos de afastamento.

Nos debates parlamentares, entretanto, o período foi reduzido para dois anos e, agora, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) opõem-se inclusive a essa quarentena desidratada —barrando uma providência que amenizaria o risco de essas corporações se verem contaminadas pela lógica político-partidária.

E esse nem representa o maior desserviço dos bolsonaristas no debate. Como de praxe, eles querem usar o peso de sua bancada no Congresso para reavivar uma ideia fixa de Bolsonaro: a estapafúrdia tese do voto impresso.

Mas não se imagine que os demais parlamentares não patrocinem retrocessos nesse novo código. Um dos mais acintosos é o dispositivo que mira pesquisas de intenção de voto —ainda que a censura defendida na Câmara tenha sido recusada no Senado, o que ficou no lugar tampouco se coaduna com democracias.

Outros dizem respeito a mecanismos de fiscalização das contas partidárias e eleitorais, que restariam debilitados diante do necessário monitoramento dos recursos públicos empregados no pleito. Não custa lembrar, o montante passa de R$ 6 bilhões.

Pode-se imaginar, dessa forma, que o verdadeiro interesse dos congressistas não está no aperfeiçoamento do sistema, mas no seu enfraquecimento. Cabe à sociedade civil impedir que esse desatino avance nos termos atuais.

Debate estéril em segurança pública

Folha de S. Paulo

Exclusividade de legislação federal é retirada da PEC do governo, enquanto alguns gestores apoiam leis penais estaduais

Após mais de um ano de debates em torno da proposta de emenda constitucional (PEC) do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a segurança pública, ainda resta grande dúvida a real eficácia da medida. O Legislativo, ocupado com teses sensacionalistas nessa seara, não parece ter pressa em debater a fundo o texto.

Na quinta (9), sua votação foi adiada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados após pedido de vista coletivo. A proposta, que já tinha sido discutida em 2024 com representantes de gestões estaduais e da Justiça, agora recebeu mudanças que a transformam numa norma mais simbólica, com poucas boas ideias.

Uma das alterações atende demanda de governadores para conter maior protagonismo do governo federal. Foi retirado do texto o dispositivo que autorizava exclusivamente a União a legislar sobre normas gerais de segurança pública, defesa social e sistema penitenciário, mantendo assim o sistema de ação conjunta com estados e municípios.

Diante de resistências, seria sensato não tentar reinventar a roda. Gasta-se capital político escasso para poucas mudanças positivas por meio da PEC, cedendo espaço para a oposição que advoga uma visão linha dura no setor.

Mais vale esclarecer qual é de fato o modelo de política de segurança pública defendido pelo governo petista e qual resposta o Congresso Nacional tem a oferecer que não seja o populismo penal.

Algumas medidas mais radicais por enquanto não prosperaram. Governadores tentam reciclar a ideia temerária de que estados deveriam ter o poder de legislar em matéria penal, hoje privativo à União. Medida que, no limite, levaria à situação caótica de um país com 27 códigos penais.

O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD) já defendeu que "cada estado tenha a sua legislação penal"; Ronaldo Caiado (União Brasil), no comando da gestão de Goiás, também apoiou a ideia numa reunião com Lula em 2024.

É deplorável que um Congresso conservador concentre sua produção na segurança pública em propostas reacionárias ou populistas —como a ampliação do uso legítimo de armas de fogo ou a castração química de condenados em casos de violência sexual, que avançaram recentemente em comissões parlamentares.

A PEC, por si só, não mudará de fato a segurança pública no país. São necessárias políticas coordenadas, baseadas em dados técnicos. Mas tudo indica que o Congresso e o governo federal estão mais ocupados em vender remédios simples e ineficazes para problemas complexos.

Lula 3 é o triunfo da ineficiência

O Estado de S. Paulo

TCU mostra que, exceto pelo Bolsa Família, o governo não atingiu as metas de quase todos os programas inscritos no PPA 2024-2027, o que revela a incompetência administrativa do petista

O Tribunal de Contas da União (TCU) analisou os resultados de dez programas do governo federal no primeiro ano de vigência do Plano Plurianual (PPA) 2024-2027. O que se pode concluir do diagnóstico do TCU é alarmante: o governo Lula 3, naquilo que foi medido, é marcado por um quadro de ineficiência administrativa e desprezo por princípios elementares da boa administração. De todas as iniciativas escrutinadas pela Corte de Contas, apenas o Bolsa Família atingiu as metas estipuladas pelo Executivo. Os demais programas, concentrados em áreas fundamentais para o desenvolvimento do País, como saúde, educação, infraestrutura e Previdência, apresentaram desempenho insatisfatório, para dizer o mínimo. Juntos, eles representam nada menos do que 72,5% do Orçamento da União.

À parte o Bolsa Família, a grande estrela dos governos lulopetistas, em apenas dois dos nove programas remanescentes – atenção primária à saúde e educação superior – registrou-se cumprimento de metas acima do patamar de 50% (67% em ambos os casos). Todas os demais representam o triunfo da ineficiência sobre a boa governança.

A gravidade dos achados do TCU vai além da má alocação de recursos públicos, por si só problemática em um país de gritantes carências e, como se sabe, sem margem de tolerância para lambanças fiscais. O problema é estrutural: o governo Lula da Silva ainda deve à sociedade um plano estratégico e um compromisso com a eficiência – e não por boa vontade, mas por se tratar de um dos princípios da administração pública inscritos no artigo 37 da Constituição. Mais bem dito: o petista não sabe governar premido pela escassez de recursos e, portanto, é incapaz de fazer escolhas baseadas em critérios racionais. Move-se ao sabor dos indicadores de popularidade.

À luz do parecer do ministro Jhonatan de Jesus, relator das contas presidenciais no TCU, os problemas se repetem com uma frequência que desmoraliza qualquer esforço do Palácio do Planalto para transmitir uma mera ideia de planejamento. Foram observadas diversas obras paralisadas, metas simplesmente abandonadas, prazos vencidos e ausência de coordenação entre os entes federativos. As explicações dadas por alguns ministérios – escassez de pessoal qualificado, entraves orçamentários e falhas de articulação entre União, Estados e municípios – não devem ser descartadas a priori, mas tampouco podem servir de álibi para ineficiência de um governo que se encaminha para seu terço final sem dar sinais de mudança. Ao contrário. A má administração só evidencia a premência de uma guinada administrativa que só pode ser dada, por óbvio, pelo próprio Executivo.

Nesse sentido, é indispensável que o governo incorpore de forma sistemática à gestão dos recursos públicos o mecanismo de spending review, adotado com sucesso em países desenvolvidos. Trata-se de uma análise crítica e recorrente dos gastos públicos, com vistas a aferir sua efetividade, eliminar desperdícios e realocar recursos para áreas com melhor retorno social. Basicamente, trata-se de aprimorar a qualidade dos gastos públicos, preservando as políticas que dão bons resultados e corrigindo ou eliminando as que falham.

O País só tem a perder enquanto o presidente da República insistir no improviso e nessa busca frenética por popularidade a curto prazo. É sempre bom lembrar que planejamento, execução e avaliação de políticas públicas não são meras formalidades burocráticas – são condições indispensáveis para que o Estado cumpra suas atribuições com eficiência. O contribuinte, que sustenta a máquina pública com uma das mais altas cargas tributárias do mundo, tem o direito de esperar resultados mensuráveis das promessas supostamente feitas em nome do interesse público.

Se ainda quiser reverter a imagem de desorganização que tem marcado seu terceiro mandato, Lula da Silva precisará fazer mais do que gastar, o que é fácil: precisará gastar bem. E, para isso, deverá adotar mecanismos institucionais permanentes de avaliação, revisão e correção de rumos. Do contrário, continuará desperdiçando recursos públicos ao sabor de suas conveniências políticas, aprofundando a crise de credibilidade de seu governo.

Inflação não é brincadeira

O Estado de S. Paulo

Mais um estouro da meta de inflação desqualifica a pressão de Lula e do PT por queda de juros a qualquer custo. BC faz bem ao reafirmar que seu papel é resguardar o poder de compra da moeda

O avanço de 0,24% da inflação em junho elevou para 5,35% o acumulado em 12 meses e inaugurou o estouro inflacionário sob o sistema de meta contínua, em vigor desde janeiro. Por esse modelo, o comportamento da inflação apurado em um ano é observado mês a mês, e a meta é considerada descumprida quando o resultado ficar acima do intervalo de tolerância por seis meses consecutivos. Durante todo o primeiro semestre, o acumulado do IPCA ficou bem acima de 4,5%, o limite máximo permitido para a meta de 3% ao ano.

Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central (BC), teve de escrever ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mais uma carta detalhando que o banco não conseguiu conter a inflação em razão de fatores como o sobreaquecimento da economia, que roda com demanda acima da capacidade de produção. Até março do ano que vem, o banco espera trazer a inflação para dentro do limite máximo e, ao final de 2026, chegar aos 3%.

A carta é uma formalidade, mas carrega a importantíssima função de reafirmar o compromisso do BC com o controle da inflação, razão para o ciclo de aperto monetário iniciado em setembro do ano passado que incorporou, desde então, 4,5 pontos porcentuais à Selic. O pacto ratificado pelo BC ganha mais relevância diante da leviandade explícita do presidente Lula da Silva, que não perde a oportunidade de vaticinar uma iminente queda dos juros, insistindo que os preços estão “razoavelmente controlados”.

Não é o que mostra o aumento de preços em sete dos nove grupos do IPCA em junho. Em audiência na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, Galípolo destacou que mais de 70% dos itens que compõem o índice estão acima da meta e que essa é a principal justificativa para a taxa de juros de 15% ao ano. Não são altas pontuais, neste ou naquele produto ou serviço, e sim um encarecimento espalhado dos preços.

De quebra, o presidente do BC expôs aos deputados que, ao contrário de outros países, no Brasil os subsídios cruzados distorcem e barateiam o custo do crédito para as empresas e esvaziam a Selic como trava inflacionária. Seria essa a explicação para a demora nos efeitos dos juros sobre os preços.

Inflação não é brincadeira, e embora Lula tenha dito que os brasileiros levam a alta de preços “muito a sério”, o contínuo estouro da meta preocupa – e muito. O sistema atual, com aferição mês a mês, confirma que os juros não conseguem frear a inflação justamente porque outros fatores, inclusive incentivos do próprio governo, continuam empurrando os preços para cima.

Nas últimas semanas causou apreensão a retomada da pressão de Lula da Silva e do PT pelo corte dos juros a qualquer custo, sob pretexto de fomentar o desenvolvimento econômico mesmo com “um pouco de inflação”. Em junho, duas semanas antes de o Copom elevar de 14,75% para 15% a Selic, Lula chegou a dizer que “logo, logo” o Banco Central tomaria a “atitude correta” de começar a baixar os juros.

A pressão petista andava arrefecida desde a passagem de bastão na presidência do BC, em 1.º de janeiro. Indicado no governo Bolsonaro, Roberto Campos Neto continuou no cargo nos dois primeiros anos do governo atual, para só então ser substituído por Galípolo, indicado de Lula. A não coincidência dos mandatos, imposta pela lei da autonomia do banco, tem se revelado crucial para a política monetária.

Em sua ida à Câmara, em meio à pressão revigorada de parte do governo pela queda de juros, Galípolo reafirmou que o papel do Banco Central é o de defensor do poder de compra da moeda. Com todas as letras, o indicado de Lula declarou que o banco não vai se desviar desse objetivo nem mediar a busca por outra meta.

“Ninguém quer baixar os juros para ter uma inflação lá em cima. Você quer conviver com uma taxa de juros que produza o mesmo efeito, do ponto de vista de conter a inflação”, explicou aos deputados. Ou seja, se o governo quer que os juros caiam, precisa trabalhar para acabar com os fatores que fazem a inflação subir, sobretudo os gastos públicos em excesso.

Lira faz o que Lula queria

O Estado de S. Paulo

Ao manter a taxação mínima de 10% sobre os mais ricos, deputado preserva projeto do governo

O presidente Lula da Silva pode se gabar por ter conquistado um aliado de peso no Congresso. Relator do projeto de lei do Imposto de Renda (IR), o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) surpreendeu positivamente a todos na semana passada ao preservar, em seu parecer, a essência da proposta enviada pelo governo ao Legislativo, que prevê a isenção dos trabalhadores que ganham até R$ 5 mil por mês e o estabelecimento de uma tributação mínima de 10% para quem tem renda anual acima de R$ 1,2 milhão.

A proposta ainda poderá ser modificada por meio de emendas ao passar pela comissão especial e pelo plenário da Câmara e do Senado, mas o governo já tem muito a comemorar. Havia um risco considerável de que o relator, em seu parecer, mantivesse a benesse e retirasse a parte menos palatável do texto – sem a qual não seria possível bancar a isenção do IR.

E não se tratava de um assunto de menor importância, mas do cumprimento de uma promessa de campanha de Lula da Silva que dependia de um deputado conhecido por sua atitude combativa. Também é digna de nota a manutenção da cobrança de IR sobre lucros e dividendos, algo que nem Michel Temer nem Jair Bolsonaro conseguiram convencer o Congresso a aprovar.

Lira chegou a cogitar a possibilidade de reduzir a alíquota do imposto mínimo efetivo sobre as altas rendas de 10% para 8% ou 9%. Disse, no entanto, que sua ideia havia sido mal interpretada, e optou por usar uma sobra de arrecadação para compensar Estados e municípios e ampliar, de R$ 7 mil para R$ 7,350 mil, a faixa que terá direito a desconto no IR.

Há quem veja nesse recuo a eficácia do discurso do governo, que investiu na narrativa que opõe ricos e pobres após se ver acuado pelo Congresso no episódio do decreto do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Cortar a alíquota do imposto mínimo sobre a alta renda reforçaria essa tese.

Mas as disputas regionais também tiveram sua influência. No mesmo dia em que Lira apresentou o parecer, Lula indicou a procuradora de Justiça Marluce Caldas, tia do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o JHC, para o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Com a nomeação, JHC, que está em vias de trocar o PL pelo PSB, deve desistir de renunciar ao cargo para concorrer ao Senado, abrindo caminho para que Lira possa candidatar-se a uma das duas vagas por Alagoas em 2026 com mais tranquilidade.

Tudo indica que o Congresso deve aprovar a proposta neste ano, tempo suficiente para que ela possa entrar em vigor a partir de janeiro. Isentar os trabalhadores e taxar os mais ricos era tudo o que o governo precisava para ter uma bandeira eleitoral de peso em 2026, e o fato de que a medida será neutra sob o ponto de vista fiscal fortalece a equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

A proposta está longe de ser uma reforma tributária sobre a renda, como a sociedade merecia, e o correto teria sido reajustar a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física para alcançar todos os contribuintes. Mas o relatório, pelo menos, é um passo em direção a uma carga tributária um pouco mais progressiva em um país tão desigual.

Liderança ambiental e a pressão sobre o Brasil

Correio Braziliense

Os sinais deixados pelo encontro do Brics apontam que a jornada da COP30 será extremamente desafiadora

2ª - Floresta Amazônica – Maior floresta tropical do mundo. Com 7 milhões de km², se estende por partes do Amazonas, Amapá, Pará, Acre, Roraima, Rondônia, Mato Grosso e Maranhão. Também ocupa trechos da Venezuela, Colômbia, Bolívia, Equador, Suriname, Guiana e Guiana Francesa. - (crédito: Beyond the Ultimate wikimedia commons). 

O Brasil começou 2025 com compromissos na agenda de governança global, especialmente no que diz respeito ao meio ambiente. Em novembro, o país terá a responsabilidade de sediar a 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30). O evento de importância mundial será em Belém (PA), e a cada dia sua relevância aumenta diante do cenário de extremos do clima. No último dia 6, durante a 17ª Reunião de Cúpula do Brics, realizada no Rio de Janeiro, as lideranças reunidas destacaram, na Declaração Final, que os integrantes do grupo devem se unir em torno do tema e cooperar pela promoção de soluções aos desafios ambientais.

No documento chancelado pelos 11 membros permanentes, reforçou-se o reconhecimento de entendimentos como o Acordo de Paris — tratado internacional, adotado em 2015, na COP21, com o objetivo de combater as alterações climáticas por meio da redução de emissões de gases de efeito estufa — e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), que visa estabilizar as concentrações na atmosfera.

Mas um ponto fundamental neste momento, visto a urgência do avanço nas decisões internacionais, foi a manifestação de apoio do Brics à pauta brasileira no encontro em Belém. Os países endossaram o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), proposto pelo Brasil. "Saudamos os planos para lançar o Fundo Florestas Tropicais para Sempre em Belém, na COP30, e o reconhecemos como um mecanismo inovador concebido para mobilizar financiamento de longo prazo, baseado em resultados, para a conservação de florestas tropicais. Encorajamos potenciais países doadores a anunciarem contribuições ambiciosas, de modo a garantir a capitalização do fundo e sua operacionalização em tempo hábil", aponta o texto.

O Brics também cobrou que as nações mais ricas ampliem a participação nas metas de financiamento climático. A iniciativa de captação de recursos — chamada Mapa do Caminho de Baku a Belém US$ 1,3 trilhão — exalta a necessidade de atingir esse valor até a conferência, em novembro. Mais uma vez, a defesa de capacidades e responsabilidades diferenciadas entre os países ficou evidenciada. Ao mesmo tempo, a preocupação da Cúpula de Líderes refletiu o que o planeta vem enfrentando em escalada.

Com o alarmante aquecimento climático, o fim das discordâncias sobre o investimento para mitigar os efeitos de desastres consumados e evitar que novos aconteçam não pode mais esperar. Os sinais deixados pelo encontro do Brics apontam que a jornada da COP30 será extremamente desafiadora — principalmente com as diplomacias envolvidas em questões bélicas e conflitos econômicos —, exigindo uma condução eficiente para que o fracasso da edição anterior, no Azerbaijão, não se repita.

O embate em torno do dinheiro — assim como as discussões sobre o mercado de carbono, o uso de energia limpa e outras discordâncias históricas — não é novidade. Nesse campo, a defesa do emprego de capital privado, em um modelo de financiamento misto, ganha adeptos, porém tem de ser estabelecido com ampla transparência. Como anfitrião da COP30, o Brasil tem o papel de convocar governos e setores diversos para pensar a melhor maneira de se estabelecer um alinhamento capaz de oferecer à natureza respostas sustentáveis depois de tanta exploração indevida.

Celeridade para investigar prefeitos

O Povo (CE)

Deu no O POVO: apenas sete meses após as eleições, o Ceará contabilizava dois prefeitos presos, um foragido e mais cinco condenados à cassação. Dos 184 municípios cearenses, oito podem ter novas eleições.

Não é estatística trivial. Pelo contrário, demonstra que o dinamismo do crime, seja de que natureza for, precisa encontrar celeridade na resposta das autoridades do estado, sobretudo do Ministério Público (MPCE) e da Justiça Eleitoral, duas das principais frentes de combate.

Daí que seja bem-vindo o reconhecimento do atual procurador-Geral de Justiça, Haley de Carvalho Filho, para quem o MPCE tem de operar com mais eficiência e rapidez na condução de investigações de mandatários que comandam Executivos municipais.

É ponto pacífico que a instituição sob gerência do PGJ desempenha papel crucial nesse campo de batalha. Logo, dela se esperam inteligência e capacidade de aperfeiçoar as técnicas de apuração e de análise de dados para concluir em tempo hábil as demandas que lhe cabem cumprir nessa seara.

Naturalmente, nada disso se faz com atropelo dos trâmites e do devido processo legal. Não se trata, então, de recair no populismo penal, mas de exigir que o MPCE efetivamente leve a bom termo as ações cujo objeto implique prefeitos e prefeitas alvos de investigações.

Tanto para o gestor sob escrutínio quanto para a sociedade em geral, é sempre positivo, afinal, que esses casos se encerrem com presteza, quer para restituir a estabilidade para governar do administrador, quer para afastá-lo da esfera pública, levando-o à eventual punição por seus atos.

O que se nota, porém, é certa demora na apreciação de situações mais sensíveis e de forte repercussão, diante das quais o maior prejudicado é a coletividade. Também aí o MPCE carece de ter sensibilidade para saber delimitar bem seu quadrante de atuação, concentrando esforços e manejando seus limitados recursos quando necessário.

À frente da PGJ, Carvalho Filho está plenamente habilitado para a tarefa, tanto pelo perfil do procurador, com passagens por municípios cearenses, quanto pelas atividades que desempenhou dentro do próprio MPCE, notadamente aquelas que dizem respeito aos avanços tecnológicos.

Embora nada se realize sem investimentos maciços em recursos humanos, o ferramental técnico é de grande valia nesse trabalho, principalmente quando se considera que o esclarecimento das condutas de prefeitos tem de se defrontar com o exame e o cruzamento de um grande volume de dados.

A essa modernização e a esse avanço em suas estratégias, portanto, somem-se o investimento na capacitação e a ampliação do quadro de pessoal do MPCE, medidas sem as quais a intenção de oferecer mais velocidade no dia a dia do órgão pode ficar somente no território das pretensões.

Não custa observar que, a cada novo pleito eleitoral, a variedade de estratagemas criminosos se alarga, agora com a possibilidade de adição de um outro elemento que requer ainda mais preocupação: o crime organizado. É em face desse horizonte que os desafios do MPCE se apresentam. 

 

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