Reação ao tarifaço deve proteger soberania e economia brasileiras
Valor Econômico
A resposta à agressão do presidente Trump
deve, na medida do possível, sempre resguardando a nossa soberania, ser
calibrada de forma a preservar nossas cadeias de valor
O Brasil é uma economia fechada, e nossas
exportações para os Estados Unidos representam menos de 2% do Produto Interno
Bruto (PIB). Mas não há engano: o conflito tarifário desencadeado pelo
presidente Donald Trump pode ter repercussões negativas de curto, médio e longo
prazos sobre nossa economia.
Por isso, as negociações e eventuais medidas
de reciprocidade adotadas pelo Brasil devem ser, ao mesmo tempo, firmes na
defesa da soberania nacional, diante da inaceitável carta do presidente dos
EUA, Donald Trump, e inteligentes para resguardar os interesses
econômicos do país.
Reportagem publicada pelo Valor nesta sexta (11/7) mostra como, a essa altura, é difícil avaliar o prejuízo potencial ao Brasil. Do ponto de vista macroeconômico, as estimativas dos especialistas são muito amplas. De um lado, indicam uma perda, em termos de crescimento do PIB, de até 0,3% em 2025 e de até 0,5% em 2026. De outro, apontam impacto mais moderado, de 0,05% do PIB em 2026.
É bem provável que, em grande medida, esses
cálculos estejam influenciados pelo que os analistas econômicos acreditam
que seja o desfecho mais provável das negociações. Quem aposta que a
racionalidade ao final vai prevalecer, em geral, tende a estimar um impacto
mais contido. Uma escalada retaliatória, de outro lado, poderia levar a
impactos ainda mais severos no PIB.
A inflação brasileira também tenderia a ser
afetada, num período em que o Banco Central já está sendo obrigado a manter as
taxas de juros nas alturas, em 15% ao ano, para colocar o índice de
preços na meta. O principal canal de contágio inflacionário seria a taxa
de câmbio, que está vulnerável a uma eventual redução das exportações, ao
aumento da aversão a risco e à diminuição do fluxo de capitais entre os países.
Mesmo que, em termos macroeconômicos, o
impacto se mostre limitado, pode haver repercussões severas na microeconomia —
ou seja, na economia local, onde estão as empresas e os trabalhadores dos
setores exportadores mais afetados.
Felizmente, a primeira reação dos mercados
foi relativamente contida, com quedas pequenas e moderadas de ações de empresas
que têm os Estados Unidos como destino importante de suas vendas. De novo, isso
parece refletir a aposta de que haverá um encaminhamento sensato das
negociações.
Tão ou mais preocupante é o impacto que o
escabroso ataque de Trump ao sistema de regras do comércio internacional poderá
ter nos fluxos de investimentos diretos dos Estados Unidos ao Brasil, e
vice-versa. Esse é um dos motores mais importantes para o aumento da
produtividade e para ampliar a nossa capacidade de crescimento de longo
prazo.
Segundo dados do Banco Central, os capitais
americanos respondem por 27% do estoque de US$ 1,017 trilhão de investimento
direto no país, pelo critério de participação no capital, na posição de 2023. O
capital americano tem participação relevante em 3.879 empresas que operam no
Brasil. Esse é um desdobramento das relações comerciais, que leva à integração
das cadeias produtivas.
O exame detalhado dos fluxos de ingresso de
investimento direto em 2024 aponta que, além de bens, esses capitais aprofundam
as relações de serviços. Pelos dados do BC, entraram US$ 8,476 bilhões em
investimentos diretos americanos, dos quais US$ 859 milhões para a agricultura,
US$ 486 milhões para a indústria e US$ 6,997 bilhões para os serviços. Não é
apenas o dinheiro — os investimentos ajudam a ampliar ganhos de eficiência em
setores como comércio, serviços de informação e financeiros.
O setor industrial responde por 10% do
estoque de investimento direto americano, na posição de 2023, e gera efeitos
multiplicadores muito mais fortes por toda a economia. O tarifaço de Trump
tende a provocar um desvio de pelo menos parte desses investimentos para os
Estados Unidos.
No seu relatório anual, o Banco Internacional
de Compensações (BIS, na sigla em inglês) publicou um estudo que mostra que as
economias emergentes que foram punidas com aumentos de tarifas apresentaram,
nos anos seguintes, redução no fluxo de investimento direto. O estudo desdobra
as consequências e aponta que, mais adiante, esses países também apresentaram
uma tendência de crescimento menor.
O BIS explora os impactos do lado dos países
emergentes, mas está claro que, com o protecionismo, não há vencedores. O
redirecionamento dos investimentos aos Estados Unidos é feito à custa da
redução da produtividade em solo americano, o que significa produtos e serviços
mais caros e de menor qualidade.
O Brasil, que perdeu décadas de crescimento
com a sua política de substituição de importações, sabe bem por que isso não dá
certo. Por isso, a resposta à agressão do presidente Trump deve, na medida do
possível, sempre resguardando a nossa soberania, ser calibrada de forma a
preservar nossas cadeias de valor. Não faz sentido taxar importações americanas
se, no fim, as empresas brasileiras saírem prejudicadas. O diálogo com o setor
empresarial será fundamental para dosar adequadamente a resposta.
Mais do que nunca, a estratégia brasileira
deve envolver a maior abertura comercial, buscando diversificar mercados e a
nossa pauta exportadora. A forma pouco responsável com que os Estados Unidos
tratam seus parceiros históricos, como Europa, Japão e Canadá, abre
oportunidades para o Brasil — sem prejuízo aos esforços empreendidos para
ampliar os laços com outras partes do mundo.
Nessa jornada por maior abertura
comercial, é essencial que o governo cuide da economia doméstica para
assegurar a competitividade das empresas brasileiras. A reforma tributária
ajuda, mas não resolve o problema fundamental da alta carga tributária. O
desequilíbrio fiscal segue como o grande nó que impede que o Banco Central
pratique taxas de juros civilizadas, afetando as condições de financiamento do
setor privado.
É um erro restaurar a reprovação no ensino
fundamental
O Globo
Projeto que acaba com ‘progressão continuada’
desafia evidências científicas e estimula evasão escolar
Parecia superado o debate sobre a aprovação
automática dos alunos nos primeiros anos do ensino fundamental, também
conhecida como “progressão continuada”. Mas o tema voltou à tona depois que a
Comissão de Educação da
Câmara aprovou projeto de lei do deputado Bibo Nunes (PL-RS) a proibindo. Seria
um equívoco gigantesco se, diante de tantas outras necessidades mais urgentes
na educação brasileira, o Legislativo patrocinasse tamanho retrocesso.
Relatada pelo deputado Nikolas Ferreira
(PL-MG), a proposta atende àqueles que negam as evidências sobre o tema e ainda
julgam a “progressão continuada”, prevista na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), uma medida da leniência do sistema educacional, cuja
consequência, nas palavras de Nunes, “é criar uma geração de inúteis,
incompetentes que não vencerão na vida, mas gerarão estatística enganosa, como
se o ensino no Brasil fosse excelente”. Ferreira diz apoiar o projeto por
acabar com “aquele faz de conta que empurra alunos para a série seguinte, sem
aprender o básico”.
Os dois deputados ignoram a opinião
fundamentada de pesquisadores e educadores. “O foco tem que ser no aprendizado,
e não na reprovação ou aprovação”, afirma Priscila Cruz, presidente do Todos
pela Educação. Estimular a reprovação é levar o país a gastar duas, três vezes
com o mesmo aluno, que fica estagnado na mesma série numa fase em que pode ter
várias chances de permanecer na escola e absorver o mesmo conteúdo se não
sofrer o baque de uma reprovação. Trata-se, segundo ela, de desperdício “do
ponto de vista da gestão e no aspecto educacional”. “Ele não vai aprender só
porque foi reprovado. A escola é a mesma, os professores são os mesmos, e a
formação deles não mudou”, afirma. É essencial, obviamente, haver avaliações
contínuas, para o aluno ter chance de se recuperar ao longo do tempo. Mas
fazê-lo repetir de ano no início de sua formação de nada adianta — nem para o
próprio aluno, nem para o projeto estratégico de melhorar a educação
brasileira.
Há evidências inequívocas de que a reprovação
nessa fase do ensino está associada à evasão escolar. Quase metade (48%) dos
alunos enfrentou alguma intercorrência dessa natureza no ensino fundamental,
constatou a pesquisa “A Permanência Escolar Importa: Indicador de Trajetórias
Educacionais”, do Observatório da Fundação Itaú e do Itaú Social, que acompanha
estudantes nascidos entre 2000 e 2005. Converter um aluno em repetente equivale
a abrir a porta de saída da escola para ele.
O Projeto de Lei que tramita na Câmara deve
ser confrontado com a experiência positiva de estados e prefeituras que adotam
ciclos de educação sem reprovação, mas com avaliação contínua e reforço para o
aprendizado. O Brasil, apesar dos avanços na educação, ainda precisa reter mais
estudantes do ensino básico na escola. No ano passado, entre os jovens de 14 a
29 anos, ainda havia 8,7 milhões que não haviam completado o ensino médio por
terem abandonado os estudos ou nunca frequentado a escola, segundo o IBGE.
Considerando a população com mais de 25 anos, apenas 56% haviam concluído a
educação básica, patamar que era de 46% em 2016. Mesmo que a proporção ainda
esteja aquém da desejada, certamente seria pior sem o sistema de “progressão
continuada”.
Crise fiscal prejudica fiscalização e
qualidade dos serviços públicos
O Globo
Sem promover cortes estruturais de gastos,
governo reduz em 25% orçamento de agências reguladoras
Os efeitos da crise fiscal já podem ser
sentidos pelo cidadão. Enquanto Executivo e Legislativo se recusam a promover
reformas estruturais capazes de reduzir a contínua expansão dos gastos
obrigatórios, o engessamento das verbas orçamentárias tem obrigado diversos
setores do governo a promover cortes, prejudicando a qualidade de serviços
públicos fundamentais. A área mais preocupante são as agências reguladoras,
responsáveis por fiscalizar atividades que vão da mineração à aviação civil.
Elas sofreram corte de 25% no orçamento, com efeitos prejudiciais à população.
A Agência Nacional de Águas e Saneamento
Básico (ANA) reduziu a frequência da manutenção das estações de monitoramento,
usadas para prever secas e enchentes. Foram suspensos repasses aos programas
Qualiágua, de controle da qualidade da água dos rios, e Progestão, de auxílio
aos governos estaduais na administração de seus recursos hídricos. A Rede
Hidrometeorológica reduziu pela metade as manutenções anuais, com prejuízo da
qualidade dos dados hidrológicos. Há limitações na fiscalização em açudes do
Nordeste no início do período de seca.
A Aneel,
agência do setor elétrico, acaba de afastar mais de 140 funcionários
terceirizados. A redução da fiscalização aumentará o risco de falhas no
fornecimento de energia e o tempo para restabelecimento do serviço. A Anatel,
de telecomunicações, informa que a “restrição orçamentária atingiu diversos
projetos em andamento”. Entre eles, o bloqueio de bets ilegais e ações contra a
desinformação junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A ANM, de mineração,
afirma que opera “no limite”. A falta de recursos ameaça paralisar a
fiscalização de barragens, rejeitos e lavra ilegal. A agência diz que poderá
suspender contratos de tecnologia da informação, segurança patrimonial e
interromper serviços administrativos.
Também não escapa da crise fiscal a Anac,
agência de aviação civil. Ela pode ser obrigada a reduzir em até 60% a
supervisão e inspeção dos sistemas de segurança das operações e oficinas de
manutenção das companhias aéreas. Já foi suspenso o agendamento de exames
teóricos exigidos para a concessão de licença a pilotos e mecânicos. Questões
de segurança podem não ser detectadas e corrigidas a tempo, “elevando a
possibilidade de incidentes ou acidentes aeronáuticos”, informa a agência.
As Forças Armadas também foram atingidas. A
FAB tem deixado aviões no solo por falta de recursos para compra de combustível
e manutenção. O Exército adiou a implantação do Sistema Integrado de
Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), e a Marinha sente falta de R$ 20
bilhões, a curto prazo, para continuar a desenvolver projetos de submarinos,
entre eles o nuclear.
Os exemplos poderiam continuar. Mas a
conclusão já é cristalina: a inépcia do governo para enfrentar a crise fiscal
com cortes onde gastos são desnecessários acaba por forçar tais cortes onde os
recursos são necessários.
Proposta de novo Código Eleitoral traz risco
de retrocessos
Folha de S. Paulo
Texto com dispositivos nefastos é debatido no
Senado com poucas melhorias; seria ideal implementar mudanças incrementais
A Comissão de Constituição e
Justiça do Senado adiou
a votação do novo Código Eleitoral, texto aprovado pela Câmara
dos Deputados em 2021 e que estava parado desde então. Talvez tenha
sido melhor assim.
Embora seja possível enxergar algum mérito na intenção de unificar todas as
legislações eleitorais do país, a proposta padece de tantos males que seu
saldo, inevitavelmente, seria negativo.
Há, de saída, um problema conceitual grave.
Os congressistas não pretenderam, em nenhum momento, limitar-se a compilar as
regras hoje existentes, eliminando possíveis contradições e incorporando teses
pacificadas na doutrina e na jurisprudência.
Não se trata, portanto, de simples
unificação, como às vezes pode parecer. Parlamentares aproveitaram o ensejo
para instituir normas novas, modificando, sem justificativa plausível, diversos
aspectos do sistema eleitoral. Basta notar que o código em tramitação soma
quase 900 artigos.
A princípio, nada há de errado em tentar
sanar falhas e distorções pontuais. Mudanças no atacado, contudo, deveriam ser
reservadas, quando muito, a instituições disfuncionais; não sendo esse o caso
das leis que regulam a disputa política no Brasil, faria melhor o Congresso
Nacional se buscasse avanços incrementais.
Uma medida bem-vinda, por exemplo, seria a
criação de uma quarentena para certos servidores públicos, como magistrados,
membros dos Ministérios Públicos e
agentes das forças de segurança. Em 2021, circulou uma proposta que visava
impedi-los de disputar cargos eletivos antes de cinco anos de afastamento.
Nos debates parlamentares, entretanto, o
período foi reduzido para dois anos e, agora, aliados do ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL)
opõem-se inclusive a essa quarentena desidratada —barrando uma providência que
amenizaria o risco de essas corporações se verem contaminadas pela lógica
político-partidária.
E esse nem representa o maior desserviço dos
bolsonaristas no debate. Como de praxe, eles querem usar o peso de sua bancada
no Congresso para reavivar uma ideia fixa de Bolsonaro: a
estapafúrdia tese do voto impresso.
Mas não se imagine que os demais
parlamentares não patrocinem retrocessos nesse novo código. Um dos mais
acintosos é o dispositivo que mira pesquisas de intenção de voto —ainda que a
censura defendida na Câmara tenha sido recusada no Senado, o
que ficou no lugar tampouco se coaduna com democracias.
Outros dizem respeito a mecanismos de
fiscalização das contas partidárias e eleitorais, que restariam debilitados
diante do necessário monitoramento dos recursos públicos empregados no pleito.
Não custa lembrar, o montante passa de R$ 6 bilhões.
Pode-se imaginar, dessa forma, que o
verdadeiro interesse dos congressistas não está no aperfeiçoamento do sistema,
mas no seu enfraquecimento. Cabe à sociedade civil impedir que esse desatino
avance nos termos atuais.
Debate estéril em segurança pública
Folha de S. Paulo
Exclusividade de legislação federal é
retirada da PEC do governo, enquanto alguns gestores apoiam leis penais
estaduais
Após mais de um ano de debates em torno da
proposta de emenda constitucional (PEC) do governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) para a
segurança pública, ainda resta grande dúvida a real eficácia da medida. O
Legislativo, ocupado com teses sensacionalistas nessa seara, não parece ter
pressa em debater a fundo o texto.
Na quinta (9), sua votação
foi adiada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara
dos Deputados após pedido de vista coletivo. A proposta, que já tinha
sido discutida em 2024 com representantes de gestões estaduais e da Justiça,
agora recebeu mudanças que a transformam numa norma mais simbólica, com poucas
boas ideias.
Uma das alterações atende demanda de
governadores para conter maior protagonismo do governo federal. Foi retirado do
texto o dispositivo que autorizava exclusivamente a União a legislar sobre
normas gerais de segurança pública, defesa social e sistema penitenciário,
mantendo assim o sistema de ação conjunta com estados e municípios.
Diante de resistências, seria sensato não
tentar reinventar a roda. Gasta-se capital político escasso para poucas
mudanças positivas por meio da PEC, cedendo espaço para a oposição que advoga
uma visão linha dura no setor.
Mais vale esclarecer qual é de fato o
modelo de política de segurança pública defendido pelo governo petista
e qual resposta o Congresso
Nacional tem a oferecer que não seja o populismo penal.
Algumas medidas mais radicais por enquanto
não prosperaram. Governadores tentam reciclar a ideia temerária de que estados
deveriam ter o poder de legislar em matéria penal, hoje privativo à União.
Medida que, no limite, levaria à situação caótica de um país com 27 códigos
penais.
O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD) já defendeu
que "cada estado tenha a sua legislação penal"; Ronaldo
Caiado (União Brasil),
no comando da gestão de Goiás, também apoiou a ideia numa reunião com Lula em
2024.
É deplorável que um Congresso conservador
concentre sua produção na segurança pública em
propostas reacionárias ou populistas —como a ampliação do uso legítimo
de armas de fogo ou a castração química de condenados em casos de violência sexual,
que avançaram recentemente em comissões parlamentares.
A PEC, por si só, não mudará de fato a segurança pública no país. São necessárias políticas coordenadas, baseadas em dados técnicos. Mas tudo indica que o Congresso e o governo federal estão mais ocupados em vender remédios simples e ineficazes para problemas complexos.
Lula 3 é o triunfo da ineficiência
O Estado de S. Paulo
TCU mostra que, exceto pelo Bolsa Família, o
governo não atingiu as metas de quase todos os programas inscritos no PPA
2024-2027, o que revela a incompetência administrativa do petista
O Tribunal de Contas da União (TCU) analisou
os resultados de dez programas do governo federal no primeiro ano de vigência
do Plano Plurianual (PPA) 2024-2027. O que se pode concluir do diagnóstico do
TCU é alarmante: o governo Lula 3, naquilo que foi medido, é marcado por um
quadro de ineficiência administrativa e desprezo por princípios elementares da
boa administração. De todas as iniciativas escrutinadas pela Corte de Contas,
apenas o Bolsa Família atingiu as metas estipuladas pelo Executivo. Os demais programas,
concentrados em áreas fundamentais para o desenvolvimento do País, como saúde,
educação, infraestrutura e Previdência, apresentaram desempenho insatisfatório,
para dizer o mínimo. Juntos, eles representam nada menos do que 72,5% do
Orçamento da União.
À parte o Bolsa Família, a grande estrela dos
governos lulopetistas, em apenas dois dos nove programas remanescentes –
atenção primária à saúde e educação superior – registrou-se cumprimento de
metas acima do patamar de 50% (67% em ambos os casos). Todas os demais
representam o triunfo da ineficiência sobre a boa governança.
A gravidade dos achados do TCU vai além da má
alocação de recursos públicos, por si só problemática em um país de gritantes
carências e, como se sabe, sem margem de tolerância para lambanças fiscais. O
problema é estrutural: o governo Lula da Silva ainda deve à sociedade um plano
estratégico e um compromisso com a eficiência – e não por boa vontade, mas por
se tratar de um dos princípios da administração pública inscritos no artigo 37
da Constituição. Mais bem dito: o petista não sabe governar premido pela escassez
de recursos e, portanto, é incapaz de fazer escolhas baseadas em critérios
racionais. Move-se ao sabor dos indicadores de popularidade.
À luz do parecer do ministro Jhonatan de
Jesus, relator das contas presidenciais no TCU, os problemas se repetem com uma
frequência que desmoraliza qualquer esforço do Palácio do Planalto para
transmitir uma mera ideia de planejamento. Foram observadas diversas obras
paralisadas, metas simplesmente abandonadas, prazos vencidos e ausência de
coordenação entre os entes federativos. As explicações dadas por alguns
ministérios – escassez de pessoal qualificado, entraves orçamentários e falhas
de articulação entre União, Estados e municípios – não devem ser descartadas a
priori, mas tampouco podem servir de álibi para ineficiência de um governo que
se encaminha para seu terço final sem dar sinais de mudança. Ao contrário. A má
administração só evidencia a premência de uma guinada administrativa que só
pode ser dada, por óbvio, pelo próprio Executivo.
Nesse sentido, é indispensável que o governo
incorpore de forma sistemática à gestão dos recursos públicos o mecanismo
de spending review, adotado com sucesso em países desenvolvidos. Trata-se
de uma análise crítica e recorrente dos gastos públicos, com vistas a aferir
sua efetividade, eliminar desperdícios e realocar recursos para áreas com
melhor retorno social. Basicamente, trata-se de aprimorar a qualidade dos
gastos públicos, preservando as políticas que dão bons resultados e corrigindo
ou eliminando as que falham.
O País só tem a perder enquanto o presidente
da República insistir no improviso e nessa busca frenética por popularidade a
curto prazo. É sempre bom lembrar que planejamento, execução e avaliação de
políticas públicas não são meras formalidades burocráticas – são condições
indispensáveis para que o Estado cumpra suas atribuições com eficiência. O
contribuinte, que sustenta a máquina pública com uma das mais altas cargas
tributárias do mundo, tem o direito de esperar resultados mensuráveis das
promessas supostamente feitas em nome do interesse público.
Se ainda quiser reverter a imagem de
desorganização que tem marcado seu terceiro mandato, Lula da Silva precisará
fazer mais do que gastar, o que é fácil: precisará gastar bem. E, para isso,
deverá adotar mecanismos institucionais permanentes de avaliação, revisão e
correção de rumos. Do contrário, continuará desperdiçando recursos públicos ao
sabor de suas conveniências políticas, aprofundando a crise de credibilidade de
seu governo.
Inflação não é brincadeira
O Estado de S. Paulo
Mais um estouro da meta de inflação
desqualifica a pressão de Lula e do PT por queda de juros a qualquer custo. BC
faz bem ao reafirmar que seu papel é resguardar o poder de compra da moeda
O avanço de 0,24% da inflação em junho elevou
para 5,35% o acumulado em 12 meses e inaugurou o estouro inflacionário sob o
sistema de meta contínua, em vigor desde janeiro. Por esse modelo, o
comportamento da inflação apurado em um ano é observado mês a mês, e a meta é
considerada descumprida quando o resultado ficar acima do intervalo de
tolerância por seis meses consecutivos. Durante todo o primeiro semestre, o
acumulado do IPCA ficou bem acima de 4,5%, o limite máximo permitido para a
meta de 3% ao ano.
Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central
(BC), teve de escrever ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mais uma carta
detalhando que o banco não conseguiu conter a inflação em razão de fatores como
o sobreaquecimento da economia, que roda com demanda acima da capacidade de
produção. Até março do ano que vem, o banco espera trazer a inflação para
dentro do limite máximo e, ao final de 2026, chegar aos 3%.
A carta é uma formalidade, mas carrega a
importantíssima função de reafirmar o compromisso do BC com o controle da
inflação, razão para o ciclo de aperto monetário iniciado em setembro do ano
passado que incorporou, desde então, 4,5 pontos porcentuais à Selic. O pacto
ratificado pelo BC ganha mais relevância diante da leviandade explícita do
presidente Lula da Silva, que não perde a oportunidade de vaticinar uma
iminente queda dos juros, insistindo que os preços estão “razoavelmente
controlados”.
Não é o que mostra o aumento de preços em
sete dos nove grupos do IPCA em junho. Em audiência na Comissão de Finanças e
Tributação da Câmara dos Deputados, Galípolo destacou que mais de 70% dos itens
que compõem o índice estão acima da meta e que essa é a principal justificativa
para a taxa de juros de 15% ao ano. Não são altas pontuais, neste ou naquele
produto ou serviço, e sim um encarecimento espalhado dos preços.
De quebra, o presidente do BC expôs aos
deputados que, ao contrário de outros países, no Brasil os subsídios cruzados
distorcem e barateiam o custo do crédito para as empresas e esvaziam a Selic
como trava inflacionária. Seria essa a explicação para a demora nos efeitos dos
juros sobre os preços.
Inflação não é brincadeira, e embora Lula
tenha dito que os brasileiros levam a alta de preços “muito a sério”, o
contínuo estouro da meta preocupa – e muito. O sistema atual, com aferição mês
a mês, confirma que os juros não conseguem frear a inflação justamente porque
outros fatores, inclusive incentivos do próprio governo, continuam empurrando
os preços para cima.
Nas últimas semanas causou apreensão a
retomada da pressão de Lula da Silva e do PT pelo corte dos juros a qualquer
custo, sob pretexto de fomentar o desenvolvimento econômico mesmo com “um pouco
de inflação”. Em junho, duas semanas antes de o Copom elevar de 14,75% para 15%
a Selic, Lula chegou a dizer que “logo, logo” o Banco Central tomaria a
“atitude correta” de começar a baixar os juros.
A pressão petista andava arrefecida desde a
passagem de bastão na presidência do BC, em 1.º de janeiro. Indicado no governo
Bolsonaro, Roberto Campos Neto continuou no cargo nos dois primeiros anos do
governo atual, para só então ser substituído por Galípolo, indicado de Lula. A
não coincidência dos mandatos, imposta pela lei da autonomia do banco, tem se
revelado crucial para a política monetária.
Em sua ida à Câmara, em meio à pressão
revigorada de parte do governo pela queda de juros, Galípolo reafirmou que o
papel do Banco Central é o de defensor do poder de compra da moeda. Com todas
as letras, o indicado de Lula declarou que o banco não vai se desviar desse
objetivo nem mediar a busca por outra meta.
“Ninguém quer baixar os juros para ter uma
inflação lá em cima. Você quer conviver com uma taxa de juros que produza o
mesmo efeito, do ponto de vista de conter a inflação”, explicou aos deputados.
Ou seja, se o governo quer que os juros caiam, precisa trabalhar para acabar
com os fatores que fazem a inflação subir, sobretudo os gastos públicos em
excesso.
Lira faz o que Lula queria
O Estado de S. Paulo
Ao manter a taxação mínima de 10% sobre os
mais ricos, deputado preserva projeto do governo
O presidente Lula da Silva pode se gabar por
ter conquistado um aliado de peso no Congresso. Relator do projeto de lei do
Imposto de Renda (IR), o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL)
surpreendeu positivamente a todos na semana passada ao preservar, em seu
parecer, a essência da proposta enviada pelo governo ao Legislativo, que prevê
a isenção dos trabalhadores que ganham até R$ 5 mil por mês e o estabelecimento
de uma tributação mínima de 10% para quem tem renda anual acima de R$ 1,2
milhão.
A proposta ainda poderá ser modificada por
meio de emendas ao passar pela comissão especial e pelo plenário da Câmara e do
Senado, mas o governo já tem muito a comemorar. Havia um risco considerável de
que o relator, em seu parecer, mantivesse a benesse e retirasse a parte menos
palatável do texto – sem a qual não seria possível bancar a isenção do IR.
E não se tratava de um assunto de menor
importância, mas do cumprimento de uma promessa de campanha de Lula da Silva
que dependia de um deputado conhecido por sua atitude combativa. Também é digna
de nota a manutenção da cobrança de IR sobre lucros e dividendos, algo que nem
Michel Temer nem Jair Bolsonaro conseguiram convencer o Congresso a aprovar.
Lira chegou a cogitar a possibilidade de
reduzir a alíquota do imposto mínimo efetivo sobre as altas rendas de 10% para
8% ou 9%. Disse, no entanto, que sua ideia havia sido mal interpretada, e optou
por usar uma sobra de arrecadação para compensar Estados e municípios e
ampliar, de R$ 7 mil para R$ 7,350 mil, a faixa que terá direito a desconto no
IR.
Há quem veja nesse recuo a eficácia do
discurso do governo, que investiu na narrativa que opõe ricos e pobres após se
ver acuado pelo Congresso no episódio do decreto do Imposto sobre Operações
Financeiras (IOF). Cortar a alíquota do imposto mínimo sobre a alta renda
reforçaria essa tese.
Mas as disputas regionais também tiveram sua
influência. No mesmo dia em que Lira apresentou o parecer, Lula indicou a
procuradora de Justiça Marluce Caldas, tia do prefeito de Maceió, João Henrique
Caldas, o JHC, para o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Com a nomeação, JHC, que está em vias de trocar o PL pelo PSB, deve desistir de
renunciar ao cargo para concorrer ao Senado, abrindo caminho para que Lira
possa candidatar-se a uma das duas vagas por Alagoas em 2026 com mais tranquilidade.
Tudo indica que o Congresso deve aprovar a
proposta neste ano, tempo suficiente para que ela possa entrar em vigor a
partir de janeiro. Isentar os trabalhadores e taxar os mais ricos era tudo o
que o governo precisava para ter uma bandeira eleitoral de peso em 2026, e o
fato de que a medida será neutra sob o ponto de vista fiscal fortalece a equipe
do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
A proposta está longe de ser uma reforma tributária sobre a renda, como a sociedade merecia, e o correto teria sido reajustar a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física para alcançar todos os contribuintes. Mas o relatório, pelo menos, é um passo em direção a uma carga tributária um pouco mais progressiva em um país tão desigual.
Liderança ambiental e a pressão sobre o
Brasil
Correio Braziliense
Os sinais deixados pelo encontro do Brics
apontam que a jornada da COP30 será extremamente desafiadora
2ª - Floresta Amazônica – Maior floresta
tropical do mundo. Com 7 milhões de km², se estende por partes do Amazonas,
Amapá, Pará, Acre, Roraima, Rondônia, Mato Grosso e Maranhão. Também ocupa
trechos da Venezuela, Colômbia, Bolívia, Equador, Suriname, Guiana e Guiana
Francesa. - (crédito: Beyond the Ultimate wikimedia commons).
O Brasil começou 2025 com compromissos na
agenda de governança global, especialmente no que diz respeito ao meio
ambiente. Em novembro, o país terá a responsabilidade de sediar a 30ª edição da
Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30). O evento de
importância mundial será em Belém (PA), e a cada dia sua relevância aumenta
diante do cenário de extremos do clima. No último dia 6, durante a 17ª Reunião
de Cúpula do Brics, realizada no Rio de Janeiro, as lideranças reunidas
destacaram, na Declaração Final, que os integrantes do grupo devem se unir em
torno do tema e cooperar pela promoção de soluções aos desafios ambientais.
No documento chancelado pelos 11 membros
permanentes, reforçou-se o reconhecimento de entendimentos como o Acordo de
Paris — tratado internacional, adotado em 2015, na COP21, com o objetivo de
combater as alterações climáticas por meio da redução de emissões de gases de
efeito estufa — e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima
(UNFCCC), que visa estabilizar as concentrações na atmosfera.
Mas um ponto fundamental neste momento, visto
a urgência do avanço nas decisões internacionais, foi a manifestação de apoio
do Brics à pauta brasileira no encontro em Belém. Os países endossaram o Fundo
Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), proposto pelo
Brasil. "Saudamos os planos para lançar o Fundo Florestas Tropicais para
Sempre em Belém, na COP30, e o reconhecemos como um mecanismo inovador
concebido para mobilizar financiamento de longo prazo, baseado em resultados,
para a conservação de florestas tropicais. Encorajamos potenciais países
doadores a anunciarem contribuições ambiciosas, de modo a garantir a
capitalização do fundo e sua operacionalização em tempo hábil", aponta o
texto.
O Brics também cobrou que as nações mais
ricas ampliem a participação nas metas de financiamento climático. A iniciativa
de captação de recursos — chamada Mapa do Caminho de Baku a Belém US$ 1,3
trilhão — exalta a necessidade de atingir esse valor até a conferência, em
novembro. Mais uma vez, a defesa de capacidades e responsabilidades
diferenciadas entre os países ficou evidenciada. Ao mesmo tempo, a preocupação
da Cúpula de Líderes refletiu o que o planeta vem enfrentando em escalada.
Com o alarmante aquecimento climático, o fim
das discordâncias sobre o investimento para mitigar os efeitos de desastres
consumados e evitar que novos aconteçam não pode mais esperar. Os sinais
deixados pelo encontro do Brics apontam que a jornada da COP30 será
extremamente desafiadora — principalmente com as diplomacias envolvidas em
questões bélicas e conflitos econômicos —, exigindo uma condução eficiente para
que o fracasso da edição anterior, no Azerbaijão, não se repita.
O embate em torno do dinheiro — assim como as discussões sobre o mercado de carbono, o uso de energia limpa e outras discordâncias históricas — não é novidade. Nesse campo, a defesa do emprego de capital privado, em um modelo de financiamento misto, ganha adeptos, porém tem de ser estabelecido com ampla transparência. Como anfitrião da COP30, o Brasil tem o papel de convocar governos e setores diversos para pensar a melhor maneira de se estabelecer um alinhamento capaz de oferecer à natureza respostas sustentáveis depois de tanta exploração indevida.
Celeridade para investigar prefeitos
O Povo (CE)
Deu no O POVO: apenas sete meses após as
eleições, o Ceará contabilizava dois prefeitos presos, um foragido e mais cinco
condenados à cassação. Dos 184 municípios cearenses, oito podem ter novas
eleições.
Não é estatística trivial. Pelo contrário,
demonstra que o dinamismo do crime, seja de que natureza for, precisa encontrar
celeridade na resposta das autoridades do estado, sobretudo do Ministério
Público (MPCE) e da Justiça Eleitoral, duas das principais frentes de combate.
Daí que seja bem-vindo o reconhecimento do
atual procurador-Geral de Justiça, Haley de Carvalho Filho, para quem o MPCE
tem de operar com mais eficiência e rapidez na condução de investigações de
mandatários que comandam Executivos municipais.
É ponto pacífico que a instituição sob
gerência do PGJ desempenha papel crucial nesse campo de batalha. Logo, dela se
esperam inteligência e capacidade de aperfeiçoar as técnicas de apuração e de
análise de dados para concluir em tempo hábil as demandas que lhe cabem cumprir
nessa seara.
Naturalmente, nada disso se faz com atropelo
dos trâmites e do devido processo legal. Não se trata, então, de recair no
populismo penal, mas de exigir que o MPCE efetivamente leve a bom termo as
ações cujo objeto implique prefeitos e prefeitas alvos de investigações.
Tanto para o gestor sob escrutínio quanto
para a sociedade em geral, é sempre positivo, afinal, que esses casos se
encerrem com presteza, quer para restituir a estabilidade para governar do
administrador, quer para afastá-lo da esfera pública, levando-o à eventual
punição por seus atos.
O que se nota, porém, é certa demora na
apreciação de situações mais sensíveis e de forte repercussão, diante das quais
o maior prejudicado é a coletividade. Também aí o MPCE carece de ter
sensibilidade para saber delimitar bem seu quadrante de atuação, concentrando
esforços e manejando seus limitados recursos quando necessário.
À frente da PGJ, Carvalho Filho está
plenamente habilitado para a tarefa, tanto pelo perfil do procurador, com
passagens por municípios cearenses, quanto pelas atividades que desempenhou
dentro do próprio MPCE, notadamente aquelas que dizem respeito aos avanços
tecnológicos.
Embora nada se realize sem investimentos
maciços em recursos humanos, o ferramental técnico é de grande valia nesse
trabalho, principalmente quando se considera que o esclarecimento das condutas
de prefeitos tem de se defrontar com o exame e o cruzamento de um grande volume
de dados.
A essa modernização e a esse avanço em suas
estratégias, portanto, somem-se o investimento na capacitação e a ampliação do
quadro de pessoal do MPCE, medidas sem as quais a intenção de oferecer mais
velocidade no dia a dia do órgão pode ficar somente no território das
pretensões.
Não custa observar que, a cada novo pleito eleitoral, a variedade de estratagemas criminosos se alarga, agora com a possibilidade de adição de um outro elemento que requer ainda mais preocupação: o crime organizado. É em face desse horizonte que os desafios do MPCE se apresentam.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.