Valor Econômico
Lula colhe vitórias no Congresso, no STF e arregimenta o empresariado e a finança
O bolsonarismo deu sinais visíveis de
arrependimento em relação ao pedido de ajuda a Donald Trump. Tarcísio Freitas
começou a falar em colaborar com o Itamaraty, o deputado federal Eduardo
Bolsonaro (PL-SP) anunciou ter feito as pazes com o governador de São Paulo, a
quem chamara de “subserviente servil às elites” e até seu pai passou a dizer
que é o governo Lula que deve negociar com o governo americano e não ele.
Tudo em vão. Trump está sem freio e quem pariu seu apoio agora se mostra incapaz de embalá-lo. A investigação aberta pelo escritório de representação comercial dos EUA mostrou que a defesa de Jair Bolsonaro foi apenas pretexto para destampar um pote até aqui de mágoas contra o Brasil. O escopo da investigação, do etanol ao desmatamento, passando pela pirataria, legislação anticorrupção e meios de pagamento, é a soma de embates ancestrais que tem, no arsenal de porretes de Trump, sua janela de oportunidades.
A repercussão política imediata, por óbvio,
recai sobre o ataque ao Pix, usado desde o flanelinha até dono do carrão, e à
rua 25 de Março, maior rua de comércio popular do país. O governo, que começou
seu declínio de popularidade a partir da falsa acusação do bolsonarismo da
taxação do Pix e da real taxação das “blusinhas”, ganha de bandeja mais um
presente para recompor sua popularidade. Por mais que Tarcísio e Bolsonaro
agora queiram se dissociar do aliado, Trump não cansa de dizer que age em sua
defesa.
Se as pesquisas qualitativas sobre o
tarifaço, até aqui, colhiam expressões como “mexeram com os ricos”, pelo
desconhecimento do potencial de dano ao seu bolso da taxação de 50% sobre as
exportações brasileiras aos EUA, a derradeira medida não poderia ser mais
traduzível para o brasileiro comum. É com ele que Trump - e Bolsonaro - querem
mexer.
Se o dano à economia popular é evidente, a
investigação do USTR abre ainda a possibilidade de o governo arrebanhar o setor
financeiro, até aqui mais tímido que o industrial na frente ampla contra a
chantagem americana.
O Pix é uma parceria tecnológica entre
sucessivas gestões do Banco Central com o sistema financeiro. Não apenas
invadiu o mercado de cartões de crédito como expandiu a bancarização no país,
caindo no gosto do povo pela ausência de taxas. Hoje 60 milhões de brasileiros
que não têm cartão de crédito usam Pix. Cerca de 800 instituições financeiras o
utilizam, movimentando, por mês, R$ 2,5 trilhões, com 860 milhões de chaves
cadastradas.
O Pix atingiu de cara dois mercados, o dos
cartões de crédito e dos meios de pagamento digitais. O Brasil é o segundo
maior mercado mundial de ambos - 35% do consumo se dá por cartão de crédito no
país que tem 147 milhões de usuários de WhatsApp, aplicativo cujo meio de
pagamento teve sua autorização atrasada pelo BC em função da operação do Pix.
A postergação foi conduzida pelo presidente
do BC que, escolhido por Bolsonaro, pôs o Pix na rua. Hoje Roberto Campos Neto
é vice-presidente do conselho de administração do Nubank, uma das instituições
financeiras mais agressivas na oferta de produtos a partir do Pix. Todas essas
instituições terão que se unir aos esforços coordenados pelo Estado brasileiro
- Itamaraty, Ministério da Indústria e Comércio e Banco Central - contra a
ofensiva trumpista.
Grassa nesses setores a decepção com
Tarcísio. Até a investigação do USTR havia esforços como o do presidente da
Cosan, Rubens Ometto, que, à saída da reunião de Tarcísio com empresários,
buscou levantar o moral do governador - “Ele e Lula querem a mesma coisa”.
Intramuros, porém, a percepção é a de que, entre a racionalidade e Bolsonaro,
Tarcísio optou pelo segundo.
Um interlocutor chegou a recolocar o nome de
Luciano Huck na praça, mas a palavra de ordem é pragmatismo. Nas finanças ou no
agronegócio a decepção com o bolsonarismo repaginado de Tarcísio não se traduz
em adesão ao palanque lulista, vide a nota da Confederação Nacional da
Agricultura - “O governo atual é muito culpado também”. O fato incontestável,
porém, é que lideranças empresariais e financeiras precisaram se aproximar de
um governo do qual já buscavam distância.
No Palácio do Planalto a ordem também é a do
pragmatismo. A reação traçada por Lula para recuperar as cartas no jogo dos
Três Poderes ganhou concretude com as manifestações de apoio à negociação
brasileira vinda dos presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta
(Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP), ao lado do vice-presidente
Geraldo Alckmin. Nomeações nas agências reguladoras e nos bancos estatais,
inclusive com a criação de novas diretorias, escoarão as mágoas acumuladas.
E, finalmente, Lula também colheu vitórias na
recomposição com o Supremo Tribunal Federal, que também foi agraciado com
nomeações, a partir da validação, por Alexandre de Moraes, do decreto do IOF
que o próprio ministro havia suspendido no início do mês.
Não há nenhuma vantagem assegurada nesse
jogo. Era esperado que até fim desta quarta-feira, o presidente vetasse o
aumento no número de deputados aprovado pelo Congresso e rechaçado por 85% dos
brasileiros segundo a Genial/Quaest. Na jogada mais arriscada até aqui, Lula
resolveu aumentar o cacife para quem quiser permanecer no jogo.
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