A justificativa apresentada pela Casa Branca de que o
governo brasileiro representa uma "ameaça incomum e extraordinária" à
segurança nacional dos EUA expõe a paranoia de um império em decadência.
Declarar emergência nacional com base na Lei de Poderes Econômicos de
Emergência Internacional de 1977 contra o Brasil, enquanto simultaneamente
sanciona o ministro Alexandre de Moraes pela Lei Magnitsky, demonstra o
desespero de quem perdeu a capacidade de exercer influência através de meios
diplomáticos convencionais.
Durante décadas, os EUA mantiveram sua posição hegemônica no mundo através de uma combinação de uma diplomacia agressiva, força militar, influência econômica e dominação cultural. No entanto, essa hegemonia já não se sustenta mais, a emergência de novos atores globais e o fortalecimento de blocos alternativos como os BRICS, que buscam consolidação de projetos multilaterais de desenvolvimento e cooperação, têm progressivamente minado o poder unilateral dos EUA. O mundo já não gira em torno de Washington e isso os incomoda profundamente.
O Brasil, ao adotar uma política externa mais autônoma
e orientada para o multilateralismo, naturalmente passa a incomodar essa ordem
em ruínas. As recentes aproximações com a China, com os BRICS+, com países do
Sul Global e a defesa de uma nova governança internacional mais equânime
colocam o Brasil num novo eixo estratégico. E essa guinada, ainda que moderada
e gradual, é percebida por setores do establishment norte-americano como um ato
de desobediência intolerável.
A inclusão de Bolsonaro e Paulo Figueiredo na ordem
executiva revela uma estratégia ainda mais sinistra e antidemocrática: a
instrumentalização de extremistas de direita como pretexto para pressões
geopolíticas devastadoras contra o Brasil. Trump não defende genuinamente os
direitos humanos, muito pelo contrário, o que vemos é a operação clássica da
utilização de seus aliados internos para justificar a destruição econômica de
uma nação soberana.
Essa guerra assimétrica não se dá no campo de batalha
tradicional, já não há tanques, e não há invasões. O que existe é chantagem
comercial, manipulação midiática, operações de desinformação e uso político de
organismos internacionais. A atual administração dos EUA pressiona empresas,
impõe sanções, desestabiliza democracias por dentro e cria narrativas para
justificar suas ações, tudo sob a bandeira da "liberdade" e dos
"direitos humanos", ainda que o que esteja em jogo seja, sempre, o
controle de mercados e recursos alheios.
A tarifa de 50% não é apenas uma medida comercial, é
um recado político. É a tentativa de punir economicamente o Brasil por exercer
sua soberania judiciária e por não se curvar às pressões externas. Quando Trump
afirma que está "protegendo a segurança nacional dos Estados Unidos de uma
ameaça estrangeira", ele revela a rota essência imperial de quem não
tolera que outros países tomem decisões independentes que contrariem os
interesses da velha potência.
Os brasileiros precisam estar cientes disso. Estamos
entrando, pelo nosso crescimento com um ator global extremamente relevante, em
uma disputa geopolítica na qual o país será constantemente provocado, testado e
pressionado. A guerra é comercial, mas também simbólica. Está em jogo a
capacidade do país de construir um projeto nacional soberano, voltado para o
desenvolvimento com justiça social e inserção internacional altiva. E, ao
contrário do que muitos imaginam, isso não será permitido pacificamente pelos
que ainda se imaginam senhores do mundo.
A tentativa do presidente Lula de estabelecer diálogo,
relatada em entrevista ao New York Times quando afirmou que "ninguém dos
EUA quer conversar" sobre o tarifaço, demonstra a maturidade diplomática
brasileira diante da intransigência estadunidense. Enquanto o Brasil busca o
diálogo, eles respondem com ultimatos e chantagens.
Por isso, o caminho do Brasil não pode ser o da
submissão, tampouco o do alinhamento automático com qualquer potência. O país
precisa afirmar sua soberania com lucidez e estratégia, ampliando suas
parcerias sul-sul e aprofundando sua integração com a América Latina e a
África. Além disso, deve fortalecer o papel dos BRICS como alternativa real à
ordem unipolar e apostar em instrumentos financeiros próprios, como o comércio
em moedas locais e o uso de bancos multilaterais independentes.
Ao mesmo tempo, é preciso resistir às tentativas
internas da extrema-direita de sabotagem. Grupos políticos locais alinhados a
interesses estrangeiros atuam como verdadeiros cavalos de Troia, não só aqui,
mas no mundo todo, esses grupos buscam desestabilizar governos democraticamente
eleitos, desacreditar políticas públicas nacionais e semear o caos como
pretexto para restaurar um modelo de dependência que agoniza de morte. A ordem
executiva de Trump foi dirigida a eles, não ao Brasil democrático e soberano.
O império, ao agir dessa forma, apenas confirma sua
decadência terminal e seu desespero crescente. Quando um país precisa recorrer
a sanções econômicas brutais e interferência política descarada para tentar
manter sua influência, isso demonstra a sua falência iminente, o esgarçamento
do seu modelo de liderança global. É o comportamento típico de um predador
acuado, sem capacidade de seduzir ou convencer, resta apenas a tentativa
patética de ameaçar quem ousa desafiá-lo. E, quando um país tenta exportar sua crise
interna para outro, é preciso firmeza.
O Brasil precisa entender que o novo conflito em curso
não é apenas econômico, e sim civilizacional. A disputa é entre um modelo de
mundo multipolar, democrático e respeitoso à soberania nacional de todos os
estados nacionais, e outro que insiste na dominação unilateral através da força
e da chantagem, neste embate, não basta sobreviver é preciso liderar e apontar
o futuro.
Ou o Brasil assume seu papel como ator geopolítico
soberano, com projeto próprio, resistindo às pressões e construindo
alternativas concretas à ordem nati-morta, ou será tragado pela tempestade de
um antigo império que, sem conseguir mais mandar no mundo, tenta arrastá-lo
para o fundo com ele. Este não é mais um debate acadêmico ou uma reflexão
diplomática. Cada brasileiro precisa entender que estamos vivendo o momento
decisivo, não se trata apenas de economia ou política externa, trata-se de
definir se teremos um país verdadeiramente soberano ou se seremos reduzidos de
volta à condição de colônia.
As forças entreguistas internas, aquelas mesmas que
Trump cita em sua ordem executiva, trabalham incansavelmente para sabotar
qualquer projeto nacional autônomo. Elas preferem a subordinação confortável à
dignidade da luta. Precisam ser identificadas, expostas e politicamente
derrotadas em cada espaço de poder que ocupam, carregando para sempre o carimbo
de quinta-colunistas que são.
A batalha não será fácil, um antigo império ferido é
muito mais perigoso, mas nunca na história moderna houve condições tão
favoráveis para quebrarmos definitivamente as correntes da nossa dependência.
China, Índia, Rússia, África, os países árabes, todos enfrentam o mesmo tipo de
chantagem em algum momento de suas trajetórias. A história julgará sem piedade
quem se omitiu nesse momento tão grave. O Brasil tem não apenas a oportunidade,
mas o dever histórico de ser um dos líderes da resistência global contra a
tirania dos EUA sob Trump. O futuro se decide hoje, a neutralidade é
cumplicidade e o colaboracionismo crime! Soberania de verdade só se conquista
com luta.
Advogado, ex-secretário executivo de Direitos Humanos
de Pernambuco.
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