terça-feira, 26 de agosto de 2025

Exercícios de poder, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Hugo Motta, ex-presidente em atividade, quer unir a Câmara. Melhor ser expresidente em atividade – servindo à manipulação dos liras – que ex-presidente apenas, devolvido à condição essencial de vereador federal. Adie-se ao máximo o reencontro com a natureza. O Hugo Motta de Ciro Nogueira não quer voltar a ser Hugo Motta somente. Não tão depressa.

Recorrerá para tanto a uma pauta corporativista – corporativista sendo a razão de seu mandato à frente da casa do povo: garantir os bilhões em fundos orçamentários cuja propriedade, na forma de emendas, o Legislativo converteu em direito adquirido.

Atenção à agenda legislativa desta semana, a ser acelerada – assim se armava o horizonte ao fim da última sexta – a tramitação da PEC da Blindagem, o projeto de emenda à Constituição que propõe a exigência de que o Parlamento autorize investigações contra parlamentares. Bom jeito de unir.

O objetivo da rapaziada do chamado Centrão, a galera que manda para valer, não é – não prioritariamente – se defender de Alexandre de Moraes, ainda que essa fosse a intenção dos bolsonaristas no acordo para que encerrassem o sequestro do Congresso. A turma quer se proteger contra Flávio Dino.

É Dino quem os ameaça no mundo real, relator – gestor-senhor – dos inquéritos sobre as várias maneiras, também tipos de golpe, de orçamento secreto. O ministro, que opera xandonicamente, conduz investigações com aquele jeitão de permanentes – apurações que aperta e relaxa não raro em curiosa coincidência com os interesses legislativos do governo Lula. Um cronista maledicente diria que o senador togado é, afinal, uma espécie de tesoureiro das emendas parlamentares, cujos tempos administraria.

Não se sabe o que veio antes neste folhetim, se o ovo ou a galinha. Sabe-se que, à urgência do instrumentalizado Motta pela PEC da Blindagem, corresponderia a resposta dominical de Dino; que mandou a Polícia Federal investigar repasses de quase R$ 700 milhões em emendas Pix, dinheiros públicos privatizados a ponto de serem sacados na boca do caixa.

Será o caso de perguntar por que a emenda Pix ainda é permitida pelo tão (eventualmente) enérgico Dino, dada a inexistência de meia transparência; de meia constitucionalidade. É mesmo da ordem do esculacho à República que cerca de mil disparos nessa forma expressa de emendas não tenham plano de trabalho; grana distribuída a paróquias-prefeituras sem qualquer condicionamento a políticas públicas.

E assim nós vamos, com a perversão emenda Pix autorizada em modalidade puxadinho, com descumprimentos parciais constantes de ordens judiciais, com providências ocasionais contra os descumprimentos parciais constantes de ordens judiciais, com todas as partes exercendo-cultivando poder, com o orçamento secreto ativo e se reinventando, com Flávio Dino ativo e se reinventando. E com o Brasil parado-lesado e cheio de salvadores da pátria.

 

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