Folha de S. Paulo
Despesa fiscal extra é pequena; ameaça é
parlamentares inventarem favores amplos
Como era previsível, Luiz Inácio Lula da Silva
mandou tirar
das contas fiscais o gasto com o pacote
de ajuda às empresas afetadas pelo tarifaço Trump-Bolsonaro. Sim,
melhor seria ter contas arrumadas e arcabouço fiscal melhor. Mas, francamente,
o dinheiro mal vale a discussão, que é outra.
O desembolso direto do governo vai ser limitado, em tese, a R$ 9,5 bilhões até o final de 2026. Em uma conta no guardanapo, o equivalente a 0,05% do PIB em 2025 e de 0,02% do PIB em 2026. É meio nada, ainda menos se o socorro puder conter problemas socioeconômicos sérios, ainda que setoriais.
Além do mais, dado o tamanho do leite
derramado de déficit e dívida pública, o dinheiro do pacote é troco. Enfim, o
plano foi comedido.
Isto posto, a legislação pode ser avacalhada
pelo Congresso. Por exemplo, o governo prevê que vai deixar de arrecadar até R$
5 bilhões, até o final de 2026, com o Reintegra. Em teoria, trata-se de um
programa de devolução de impostos pagos domesticamente pelos exportadores
("crédito tributário").
Ficou mais parecido com um subsídio para
empresas exportadores e seus fornecedores, se prejudicados pelo tarifaço
Trump-Bolsonaro. Nesse Congresso, o plano pode virar um "Reintegra para
Todos" ou um "Reintegra Amado, Brasil", com subsídio maior e
para muito mais gente.
O governo colocou mais dinheiro em fundos
garantidores de crédito, sob gestão de instituições financeiras estatais ou
quase isso (BNDES, BB etc.): mais R$ 4,5 bilhões para empréstimos e garantias,
quantia que em algum momento deve voltar para os fundos, afora desastres de
inadimplência.
No mais, ministros ainda vão definir
critérios de concessão, taxas de juros, prazos etc. Algum subsídio haverá, não
muito. Ainda está para se ver como fica o novo sistema de seguros e garantias
para exportação.
Grosso modo, o pacote é crédito subsidiado, a
maior parte vindo dos dinheiros acumulados no Fundo de Garantia de Exportação
(FGE), além de um quase subsídio tributário (Reintegra) e da postergação do
pagamento de impostos e dívidas com o governo (com algum custo financeiro, o do
atraso do recebimento). O crédito subsidiado do FGE, R$ 30 bilhões, vale para
qualquer exportador.
Vai se exigir alguma garantia de emprego de
quem receber benefício, a definir. Promete-se campanha para que empresas,
afetadas ou outras, achem novos mercados.
Além da ameaça de mamata inventada pelo
Congresso, há mais risco e incerteza. Trump pode fazer ataque maior ao Brasil.
Pode até ser que produtos ainda escapem do tarifaço. Mas algumas empresas
dificilmente acharão novos mercados a tempo de não quebrar ou precisariam de
esteio por tempo longo —não faz sentido.
Meio esquecido, produtos americanos podem
tomar o lugar dos brasileiros em mercados abertos por Trump por meio de assédio
e ameaças. O que fazer?
A fim de encontrar novos mercados, entre
outras coisas o Brasil teria de ter rede de promoção comercial pelo mundo muito
maior (é miúda, mas dá para melhorar) e mais acordos comerciais (demora para
acontecer, o Brasil é protecionista).
O ataque de Trump pode ter acordado o país do
sonho do isolamento. Quem sabe venha mudança. Vai ser mais difícil trocar o
pneu com o carro andando, neste ambiente de confusão mundial e de nacionalismo
econômico crescente. De resto, a grande maioria da esquerda é contra abertura
comercial —é histórico.
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