segunda-feira, 15 de setembro de 2025

A tragédia e a farsa. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Presidente americano voltou à Casa Branca porque instituições dos EUA não funcionaram

Um presidente de índole autoritária tenta se reeleger, é derrotado nas urnas e se recusa a aceitar o resultado. Inflamados por suas mentiras, extremistas invadem e depredam o Congresso na esperança de mantê-lo no poder.

Aconteceu como tragédia nos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021. Repetiu-se como farsa no Brasil, em 8 de janeiro de 2023.

As semelhanças entre os dois episódios pararam na destruição do patrimônio público. Depois da selvageria, cada país escolheu seu modo de lidar com o ataque às instituições democráticas.

Nos EUA, o candidato a autocrata driblou a Justiça, ficou impune e conseguiu voltar à Presidência. No Brasil, seu imitador acaba de ser condenado a 27 anos e três meses de prisão.

Antes do início do julgamento no Supremo, a imprensa internacional já apontava as diferenças entre os dois países. Em reportagem de capa, a revista The Economist escreveu que os brasileiros ofereciam aos americanos uma “aula de maturidade democrática”.

Nesta sexta, o argumento foi reforçado em artigo dos professores Steven Levitsky e Filipe Campante para o New York Times. No texto, eles criticam as sanções impostas pela Casa Branca para tentar intimidar o Supremo.

“Na prática, o governo americano está punindo os brasileiros por fazerem algo que os americanos deveriam ter feito, mas não fizeram”, afirmam os acadêmicos. “Em vez de minar o esforço do Brasil para defender sua democracia, os americanos deveriam aprender com ele.”

Sem querer, Trump deu razão aos professores que o criticam. Instado a comentar a condenação do aliado golpista, ele admitiu que merecia o mesmo veredito: “É muito parecido com o que tentaram fazer comigo, mas não conseguiram”.

Os ausentes

No voto que selou o destino de Jair Bolsonaro, a ministra Cármen Lúcia lembrou uma frase de efeito da ex-colega Rosa Weber: “Uma vez erguida da Justiça a clava forte sobre a violência cometida em 8 de janeiro, os que a conceberam, os que a praticaram, os que a insuflaram e os que a financiaram serão responsabilizados com o rigor da lei”.

Dos quatro grupos citados pela ministra, falta identificar e punir o último: o dos patrocinadores.

No início do ano, a Procuradoria-Geral da República informou ter denunciado 63 pessoas que bancaram pequenas despesas com comida, passagens e combustível. Num fenômeno intrigante, nenhum dos grandes empresários que bajulavam o capitão e pregavam golpe em grupos virtuais apareceu na lista.

Outro ausente ilustre foi o chefão do PL, Valdemar Costa Neto. Com base em mentiras, ele alegou fraude e pediu a anulação dos votos de cerca de 280 mil urnas após a eleição de Lula em 2022.

Concretizada, a manobra daria vitória a Bolsonaro. O ex-deputado foi indiciado pela Polícia Federal, mas escapou da mira da PGR.

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