O Globo
Conversas entre ministros do STF,
congressistas e integrantes do governo visam desarticular união entre Centrão e
a extrema direita
Enquanto se
desenrola o julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete integrantes do
núcleo crucial da trama golpista na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal
(STF), uma intensa movimentação que envolve ministros da Corte, deputados,
senadores e integrantes do governo tenta desarmar a bomba da anistia, agindo
para desarticular o consórcio entre PL e Centrão responsável por ela ter
ganhado corpo nas últimas semanas.
O diagnóstico consolidado em Brasília depois da enorme movimentação pró-anistia na semana passada é que a insatisfação de integrantes preeminentes da elite do Congresso com o avanço de investigações da Polícia Federal sobre aliados ou parentes desses caciques fez com que buscassem uma aliança com o bolsonarismo para emparedar o Supremo. Esse grupo, segundo o diagnóstico, fez o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de refém numa tentativa de obter garantias de que essas investigações cessariam ou arrefeceriam.
Desde que a estratégia de chantagem veio à
superfície, no entanto, Motta passou a ser procurado por integrantes dos demais
Poderes, imbuídos de levarem-no a recuar da intenção de pautar as versões mais
delinquentes de anistia a toque de caixa, como ele vinha sendo impelido a
fazer. Os primeiros resultados mostram que a dissuasão pode ter surtido efeito,
ao menos por ora. Motta decidiu baixar a temperatura na Câmara na semana
decisiva do julgamento de Bolsonaro. Esvaziou a pauta de votações e a
necessidade de presença dos deputados.
Enquanto isso, se intensificam as conversas
para demonstrar que será muito ruim para a necessária afirmação de sua
liderança que ele apareça como patrocinador de uma proposta antirrepublicana,
flagrantemente inconstitucional, cujo destino fatal é ser derrubada pelo
próprio STF. Ao mesmo tempo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre
(União-AP), é visto como “bola de segurança” caso fracasse a interlocução com
Motta e ele ceda à tentativa de coação de que vem sendo alvo desde que o
semestre começou.
Alcolumbre é visto como político de couro
mais curtido, mais capaz de resistir à forma como o bolsonarismo empareda seus
alvos: conjugando cobranças de parlamentares e das milícias digitais com máxima
virulência nas duas pontas.
O relator da trama golpista, Alexandre de
Moraes, recebeu mal a ideia de uma “anistia light”, costurada a partir do
Senado, que permitiria a revisão das penas dos condenados pelo 8 de Janeiro com
base numa mudança na lei que substituiu a Lei de Segurança Nacional. Moraes
deixou claro que não gostou nada de se ver rifado em plena vigência do
julgamento mais importante da história recente do STF, e as negociações para
essa versão branda do perdão aos golpistas agora patina numa espécie de limbo.
Os que agem para afastar o Centrão da ala
mais radical do bolsonarismo entendem que essa é uma necessidade de longo
prazo, para que o ar da política não se torne irrespirável até 2026. Lembram
que o governo, mesmo minoritário no Parlamento, tem conseguido bons resultados
na economia e experimenta, agora, recuperação junto à opinião pública, muito
embalada, aliás, pela radicalização da extrema direita em buscar que o Brasil
sofra sanções por parte dos Estados Unidos — agora, até uma inimaginável ameaça
de intervenção militar partiu da porta-voz da Casa Branca.
É preciso, no entendimento desses
articuladores, desfazer o consórcio que uniu interesses diferentes — de um
lado, blindar-se de investigações incômodas da PF e, de outro, salvar a pele de
Bolsonaro — para que as relações entre os Poderes caminhem para uma mínima dose
de normalização. A dúvida é o que será negociado nas cada vez mais agitadas
madrugadas brasilienses para que a bomba da anistia, que esteve prestes a
estourar, seja desarmada.
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