domingo, 14 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Um roteiro para a pacificação do País

Por O Estado de S. Paulo

Erra quem pensa que a pacificação virá com a anistia a golpistas, mas também quem crê que basta a punição dos inconformados com a democracia para superar as tensões. É preciso mais

“A pacificação do País depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições”, disse o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no introito do julgamento da Ação Penal 2.668, sobre o atentado à ordem constitucional democrática, cujo principal réu era o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Nós precisamos de pacificação. E o Congresso pode fazer gestos por essa pacificação”, pregou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, convertido em principal porta-voz da tese bolsonarista segundo a qual a anistia a Bolsonaro terá o condão de “pacificar” o Brasil.

Como em muitos momentos de tensão observados na história brasileira, fala-se muito em “pacificação”, “união” ou “solução política” como forma de mudar um estado de crispação, virulência e conflito institucional. Não se questiona tal desejo, mas o problema é de outra ordem: nenhuma receita de paz social vai prosperar caso se concentre em um só lado da história. De fato, não há paz fora do império da lei, tampouco sob a confusão premeditada entre pacificação e impunidade. Mas, admitindo-se que seja necessário pacificar o País, o que de resto é discutível, erra quem pensa que essa pacificação virá com a anistia, e erra também quem acredita que a pacificação se resume à punição dos inconformados com a democracia. É preciso mais.

Respeito à lei e às instituições é sem dúvida a primeira exigência. O País precisa de forças políticas que parem de desmoralizar a Justiça, o sistema político e as eleições. Jair Bolsonaro jamais hesitou em dizer que qualquer resultado eleitoral que não fosse sua vitória seria uma prova de fraude nas urnas eletrônicas. Petistas não ficaram atrás, sustentando que uma eleição sem a presença de seu demiurgo, Lula da Silva, também seria ilegítima. A paz social requer o compromisso de aceitar o pluralismo político. O Brasil precisa se afastar de lideranças que alimentam o ódio a outras identidades políticas e criam uma atmosfera de cizânia e desencanto. Bolsonaro e Lula, sabemos, foram pródigos em discursos divisivos, típicos de quem deseja governar apenas para a própria patota ideológica.

Será preciso também despolitizar o STF. Não é de hoje que a Corte tem sido percebida como centro de ação política. Mas o Judiciário não pode ser arena política e ministros do Supremo não podem ser políticos que disputam espaços no debate público. Ao fazê-lo, ameaçam a integridade e a legitimidade de uma instituição que deveria atuar à margem das paixões políticas. Não há “ditadura da toga” – uma narrativa que serve de pretexto para reforçar laços extremistas e justificar ações antidemocráticas –, mas isso não significa deixar de notar e lamentar os muitos erros e abusos do Judiciário. Para evitar novas conflagrações, o STF deve deixar de lado a visão messiânica, preponderante nos últimos tempos, segundo a qual seu papel é “recivilizar” o Brasil.

Convém ainda que a direita que se pretende democrática esconjure o bolsonarismo, redefinindo os limites morais do que é permitido para ganhar uma eleição e se manter no poder. Do mesmo modo, é preciso uma esquerda capaz de ver como legítimas outras forças ideológicas e programáticas, sem se apresentar como detentora exclusiva da virtude pública, sem enxergar seus críticos como artífices de uma conspiração de elites e sem demonizar reformas importantes.

Exige-se, por fim, acreditar que democracia é lugar de conflito e divergência, e para isso é preciso que o Congresso se dê ao respeito. Os parlamentares, por exemplo, devem deixar de se ver como casta privilegiada, acima das leis que demandam transparência no trato do dinheiro público e respeito a adversários políticos. Ultimamente, os mesmos congressistas que falam em “pacificação” são os que vivem de ofender seus adversários, ameaçar a imprensa, destratar ministros do Supremo e xingar o presidente da República. Isso não é política. Sem o mínimo de decência no Congresso, não há base razoável de confiança para diálogo, conciliação e busca de soluções negociadas. Aviltar essa premissa é conceder licença moral para romper com a democracia a pretexto de salvá-la.

Os riscos do ‘SUS da Educação’

Por O Estado de S. Paulo

Cooperação federativa é desejável, mas o perigo é reciclar uma malfadada tradição nacional: mais centralização e burocracia, menos autonomia e inovação, e nenhum ganho de aprendizagem

A Câmara dos Deputados aprovou o Sistema Nacional de Educação (SNE). Em tese, a ideia do chamado “SUS da Educação” soa sedutora: integrar União, Estados e municípios em torno de objetivos comuns, fortalecer a cooperação federativa e criar uma base de dados capaz de acompanhar a trajetória dos estudantes. No papel, parece um marco institucional. Na prática, o risco é reeditar uma velha armadilha brasileira: multiplicar conselhos, instâncias e regulamentos com novos custos e nenhum ganho de aprendizagem.

Não faltam exemplos de como a educação no Brasil prosperou sem a necessidade de “sistemas nacionais” tentaculares. Sobral, no Ceará, tornou-se referência mundial em alfabetização porque lideranças locais assumiram riscos, inovaram e implantaram práticas comprovadas. Regimes federalistas – dos EUA à Alemanha, do Canadá à Austrália – exibem resultados sem um sistema centralizado que submeta escolas e secretarias.

A comparação com o Sistema Único de Saúde (SUS) é inadequada. Na saúde, faz sentido padronizar protocolos e compartilhar prontuários: a vida de um paciente depende de que informações fluam entre hospitais e níveis de governo. Já na educação, cada rede é responsável por gerir suas escolas, contratar professores, definir estratégias. A interdependência operacional não existe. Um “MEC do B”, como alertam alguns críticos, pode gerar só mais burocracia e confusão.

A redação da Câmara mitigou riscos, tornando as diretrizes orientativas e privilegiando a autonomia federativa. Mas, se a versão original for restaurada no Senado, as comissões nacionais poderiam impor obrigações a Estados e municípios, condicionando transferências ao cumprimento de regras definidas por um punhado de tecnocratas, sindicatos e ONGs, em detrimento dos gestores eleitos. Isso abriria brecha a corporativismo, insegurança jurídica e diluição de responsabilidades.

Outro ponto delicado é o chamado Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Em tese, trata-se de estabelecer quanto o Estado deve investir por estudante para garantir padrões mínimos de qualidade. Na prática, corre-se o risco de transformar uma aspiração legítima em obrigação contábil impossível de cumprir. Sem consenso técnico sobre quais insumos considerar e sem lastro fiscal, o CAQ pode virar “letra morta” ou, pior, multiplicar disputas judiciais sobre recursos inexistentes.

Não se trata de negar que a educação brasileira carece de coordenação. O País gasta tanto quanto ou mais que muitos vizinhos, mas segue patinando na zona de rebaixamento dos rankings internacionais. O problema é como usar melhor o dinheiro já disponível, não fabricar novas engrenagens. Incentivos inteligentes funcionam melhor do que padronizações impostas. Experiências internacionais indicam que currículos claros, sistemas de avaliação robustos e políticas de valorização docente são mais eficazes do que multiplicar instâncias colegiadas.

O Brasil precisa de políticas simples e factíveis: atrair jovens talentos para o magistério, formar melhor seus professores, premiar boas práticas e reforçar a autonomia dos gestores locais. O governo federal tem um papel – na avaliação, no financiamento complementar, na compensação das desigualdades. Mas é ilusório imaginar que conselhos em Brasília resolverão problemas que nascem na sala de aula.

O Senado deveria manter o caráter orientativo introduzido pela Câmara. Tornar obrigatórias as diretrizes do novo sistema significaria engessar ainda mais uma máquina já emperrada, sob o risco de desviar o foco do que realmente importa: letramento de qualidade, aprendizado consistente em matemática e ciências, gestão eficiente e professores motivados.

Um banco nacional de dados pode, sim, ser útil para identificar gargalos e compartilhar boas práticas. A criação de instâncias de diálogo entre entes federados – desde que sirva para cooperação voluntária, e não para coerção centralizada – também pode ter valor. Mas, se o SNE consumar a “obra-prima do barroco tecnocrático”, como advertiu neste jornal o especialista em educação Claudio de Moura Castro, terá cumprido apenas a sina de tantas outras reformas educacionais no Brasil: grandes promessas, poucos resultados.

O que cabe ao prefeito

Por O Estado de S. Paulo

Impedido pela Justiça de legislar sobre mototáxis, Nunes tem outros meios de pacificar o trânsito

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) impôs uma derrota ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao decidir que o seu decreto que proíbe o serviço de mototáxi na capital é inconstitucional. Cúpula do Judiciário paulista, o colegiado composto por 25 desembargadores ordenou, por unanimidade, que a Prefeitura regulamente em até 90 dias essa modalidade de transporte oferecida por aplicativos. Os magistrados afirmaram ainda que compete à União, e não aos municípios, legislar sobre a matéria, além de considerarem o veto a esse serviço uma afronta aos princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. Em bom português, o recado foi para que Nunes pare de gastar energia com uma causa perdida e passe a se ocupar do que de fato é de sua competência.

Nunes ganhou, assim, um tempo razoável para respeitar a legislação federal e a Constituição, cumprir a ordem judicial e, sobretudo, trabalhar no que importa para os paulistanos, a começar por desistir de interpor recursos contra a decisão do TJ-SP e, enfim, liberar o serviço de mototáxi na cidade. Já é sabido que há demanda da população por esse tipo de serviço, principalmente na periferia, onde a falta de segurança e a precariedade do transporte coletivo estimulam esse modelo de negócio. Prova da insatisfação dos passageiros com o transporte coletivo é a mais recente Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, que mostrou que os deslocamentos individuais, com 51,2% do total, voltaram a superar, após duas décadas, os feitos por transporte público (48,8%).

Logo, além de se dedicar para melhorar o sistema de ônibus da capital paulista, com a oferta de um serviço confortável, pontual, seguro e eficiente, o prefeito tem a tarefa de estabelecer uma regulamentação dos mototáxis com regras bem definidas, boas condições de atendimento à população, exigência de documentação, equipamentos básicos de segurança e fiscalização. Mas, para isso, Nunes terá de deixar para trás o discurso populista de combate à “indústria da multa” ao qual recorreu durante a eleição e passar a punir, com mais autuações, os maus motociclistas que, ao cometerem tantos abusos pelas ruas da metrópole, colocam sua vida e a de terceiros em risco.

Desde quando baixou o decreto, no começo de 2023, Nunes argumenta que esse serviço oferecido pelos aplicativos é perigoso para passageiros e condutores. Em entrevista recente à TV Globo, o prefeito deu a entender que houve “despreocupação” dos desembargadores “com os acidentes, com as mortes, com os óbitos”, sem citar que, mesmo com a proibição das mototáxis, o número de mortes de motociclistas na cidade cresceu nos últimos anos. De acordo com dados da ferramenta Infosiga, que compila dados do trânsito no Estado de São Paulo, foram 401 óbitos em 2023 e 483 em 2024. A proibição por si só não parece ter sido capaz de conter o avanço da letalidade do trânsito. Se o prefeito está mesmo preocupado com esse quadro – e não há razão para duvidar disso –, é hora, então, de tomar providências concretas, melhorando o transporte coletivo, para desestimular o uso de transporte individual, e apertando a fiscalização sobre motociclistas irresponsáveis.

Alta na popularidade de Lula ainda é frágil

Por Folha de S. Paulo

Aprovação sobe desde junho e chega a 33%, mostra Datafolha; economia e Congresso hostil são obstáculos

A polarização contribui para o resultado medíocre da popularidade, mas degradação começou a ficar evidente com a inflação de alimentos

A avaliação do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou ao nível mais alto deste ano. Para 33% dos entrevistados pelo Datafolha nos dias 8 e 9 de setembro, seu desempenho é ótimo ou bom —alta de 5 pontos em relação a junho (28%).

Mas o fato de que só um terço do eleitorado tenha a opinião mais elevada sobre a atuação do presidente indica fragilidade.

As conspirações da família Bolsonaro contra o Brasil podem ter ajudado a lustrar a imagem do petista. No entanto Lula tem dificuldades crônicas em seu terceiro mandato, e a perspectiva para os próximos meses na economia e na política não parece propícia a saltos em popularidade.

O saldo ainda é negativo, já que o governo é ruim ou péssimo para 38% dos entrevistados —5 pontos percentuais a mais do que ótimo ou bom. Em fevereiro, a diferença chegava aos 17 pontos (41% e 24%, respectivamente).

Apesar da melhora, o indicador positivo está abaixo dos registrados em 2024, sempre entre 35% e 36%; jamais passou da máxima de 38%, atingida em 2023.

A polarização política contribui para esse resultado cronicamente medíocre. A degradação da nota, contudo, começa a ficar evidente no final de 2024, com a inflação de alimentos.

O pânico financeiro de dezembro, com a alta do dólar provocada pelo anúncio de um plano fiscal desastrado e frágil, também pode ter impressionado parcela do eleitorado. Boa parte do desgaste, porém, foi causado por uma campanha de desinformação nas redes sociais a respeito da tributação do Pix e, mais recentemente, pelo escândalo dos descontos fraudulentos no INSS.

O movimento contra o Pix parece atenuado, e as primeiras restituições aos lesados no INSS começaram a ser pagas. O pior da inflação passou, embora ainda pressione orçamentos. O comportamento vil dos Bolsonaros pode ter dado alguns pontos a Lula. Agora, qual é a perspectiva daqui em diante para o presidente?

A atividade econômica desacelera, por enquanto de modo suave. A partir do final do ano, deve ficar um pouco mais difundida a percepção de que é difícil encontrar emprego e de que os salários aumentam menos.

A antecipação da campanha eleitoral deve ter efeitos maiores no Congresso Nacional, com uma oposição ainda mais acirrada pela condenação de Jair Bolsonaro (PL).

A aprovação da isenção do Imposto de Renda seria relevante para Lula, mas mesmo esse projeto popular enfrentará dificuldades.

Por outro lado, a indefinição de candidaturas e projetos no campo da direita tem potencial para facilitar a campanha petista.

Trata-se de cenário cinzento, sem vislumbre de grandes melhoras ou perdas decisivas. A aprovação de Lula 3 nunca foi alta. Perto do final do ano, ainda se recupera da baixa na virada de 2024 para 2025. O ano eleitoral será de economia mais frágil e de ataques da oposição. Até onde se pode ver, o presidente terá dificuldades em recuperar sua popularidade.

Fazenda assimila o pouso da economia

Por Folha de S. Paulo

Projeção do PIB é revisada para baixo; inflação e déficit público reduzem margem para estímulos fiscais

Segundo a pasta, o tarifaço dos EUA pode tirar 0,2 ponto do PIB até o fim de 2026, mas impacto cai com redirecionamento de exportações

Diante dos juros altos e do esgotamento de impulsos fiscais e creditícios, a esperada desaceleração gradual da economia brasileira vem se confirmando nos últimos meses e já afeta as projeções do setor
privado e mesmo do governo.

No setor privado, a estimativa mediana para o crescimento do Produto Interno Bruto neste ano, coletada pelo Banco Central, caiu de 2,23% em julho para 2,16% agora. O Ministério da Fazenda também ajustou sua estimativa de 2,5% para 2,3%, atribuindo o revisão principalmente aos juros do BC de 15%
anuais, os mais altos desde 2006.

Decerto são recuos pequenos. Mas, desde 2021, o padrão vinha sendo elevar as projeções ao longo do ano, à medida que o desempenho do PIB superava expectativas. Não é o que ocorre agora.

Entre os principais fatores de mudança, destaca-se o ritmo mais lento das concessões de crédito e a alta da inadimplência.

Em paralelo, a criação de empregos formais, embora ainda positiva, com quase 149 mil vagas em maio de 2025 e um saldo acumulado de mais de 1 milhão nos primeiros cinco meses do ano, mostra sinais de arrefecimento.

Mesmo com desemprego baixo, em 5,8%, há alguma diminuição no avanço da renda, e os salários de entrada de contratados já não sobem além da inflação.

Um fator externo que se soma a esse quadro é o tarifaço imposto pelos Estados Unidos, com elevação da taxação sobre produtos brasileiros para até 50%.

De acordo com cálculos a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda, a sanção americana pode tirar 0,2 ponto percentual do PIB brasileiro entre agosto deste ano e dezembro de 2026.

Para a SPE, porém, o impacto cai à metade com as medidas adotadas pelo governo para auxiliar setores atingidos e, ao longo do tempo, com o redirecionamento de parte das vendas para outros mercados externos.

De mais positivo, a necessária desaceleração econômica e a valorização cambial recente reduzem pressões sobre os preços. A inflação esperada em 2025, que rondava 5,6% até abril, caiu a 4,85% —ainda acima, ressalve-se, da meta de 3% e do teto de 4,5%.

Não se espera desempenho melhor do PIB no ano eleitoral de 2026. As projeções do mercado não chegam aos 2%, enquanto a da Fazenda é de 2,4%. Será difícil, para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), usar gasto e crédito públicos para obter taxas melhores. Com a inflação ainda não derrubada e contas públicas no vermelho, nem resultados de curto prazo parecem promissores.

Crise diplomática com EUA exige serenidade

Por O Globo 

Dano causado pela família Bolsonaro pode ser reparado quando baixar a poeira do julgamento

A família Bolsonaro infelizmente persiste na cruzada de ataque às instituições brasileiras em defesa de seu patriarca, que tão caro tem custado ao Brasil. Depois da condenação de Jair Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) continua a fazer pressão nos Estados Unidos por represálias. “Dia ruim, mas longe do fim da guerra”, escreveu numa rede social. Também elogiou a declaração do presidente americano Donald Trump, que se disse “surpreso” e “insatisfeito” com o julgamento. Eduardo ainda reproduziu a mensagem do secretário de Estado, Marco Rubio, prometendo resposta ao que descreveu como “caça às bruxas”. No começo da semana, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, chegou a falar até no uso de meios “militares”.

Depois de emitir um comunicado sóbrio em resposta à declaração de Leavitt, o Itamaraty reagiu a Rubio defendendo a independência do julgamento e dizendo que ameaças “não intimidarão nossa democracia”. A manifestação foi correta. Mas o momento não é de alimentar conflitos, e sim de serenidade. Já está evidente que o único interesse dos Bolsonaros é o deles próprios. Eles não dão a mínima para as consequências de seus atos para o Brasil. Também está evidente que pressões de qualquer tipo serão incapazes de mudar o resultado do julgamento, porque assim determina nossa Constituição. As atitudes americanas foram, antes de tudo, resultado da pressão e da desinformação transmitida pelos Bolsonaros. A Justiça brasileira funcionou com independência, como era esperado. Seria bom que nossa diplomacia, para além dos comunicados suscitados pelas declarações oficiais do governo Trump, conseguisse deixar isso claro aos americanos.

O cancelamento dos vistos de ministros do STF e seus familiares, a imposição a Moraes das sanções previstas na Lei Magnitsky não tiveram os resultados esperados pela família Bolsonaro. A decretação de escorchantes tarifas de 50% sobre produtos brasileiros serviu apenas para ferir empreendedores e trabalhadores brasileiros voltados ao mercado americano. As repetidas sanções e ameaças deram fôlego ao discurso antiamericano no Brasil. E, no que diz respeito ao objetivo declarado por Eduardo, as teses alucinadas de anistia no Congresso perderam força. A pauta se tornou radioativa quando ficou claro que lideranças parlamentares a usavam como moeda de troca para fazer avançar a agenda corporativa de autoproteção de investigações e ações na Justiça.

Ao insistir na estratégia do conflito, da guerra e da pressão, a família Bolsonaro continuará prejudicando o Brasil. Para os dois países, a persistência das hostilidades é um jogo de perde-perde. Brasil e Estados Unidos têm uma longa história de interesses comuns. Os dois países partilham objetivos na segurança, na economia e também na geopolítica. Os brasileiros se beneficiam com investimentos, produtos e serviços americanos de qualidade. Ao mesmo tempo, o mercado brasileiro é um dos maiores do mundo para diversas empresas com sede nos Estados Unidos.

À medida que baixar a poeira do julgamento, as lideranças empresariais americanas devem deixar claro ao Departamento de Estado e à Casa Branca como é benéfico para os dois lados resgatar uma relação produtiva. Não dá para uma história de tantos anos continuar refém do interesse mesquinho de um golpista condenado pela Justiça e de seus familiares. Assim que possível, o melhor é virar a página.

Pequena proporção de pós-graduados prejudica desenvolvimento do Brasil

Por O Globo

Entre 41 países, estamos no 39º lugar, segundo OCDE. Universidades não são adequadas à necessidade do país

Apenas 1% dos brasileiros de 25 a 34 anos tem mestrado, segundo relatório recém-divulgado pela Organização para o Desenvolvimento e Cooperação Econômica (OCDE). Esse desempenho coloca o Brasil em 39º lugar entre 41 países, à frente apenas de Indonésia e África do Sul. A média da OCDE, que congrega países ricos e emergentes, é 16%. França (26%), Reino Unido (17%), Alemanha (15%) e Estados Unidos (11%) apresentam números bem melhores.

É certo que o Brasil tem avançado. O aumento no número de mestres é uma das poucas metas atingidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE) de 2024. O ritmo de avanço, porém, ainda é lento. “Há 20 anos a gente formava 35 mil mestres; esse número agora está perto de 60 mil”, diz Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e ex-ministro da Educação (na época ele era diretor da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Capes).

A distribuição dos alunos nos cursos também precisa ser melhorada, a começar pela graduação. O Panorama da Educação, da OCDE, revela que administração de empresas, Direito e formações relacionadas a negócios respondem por 34% dos graduados. Apenas 16% saem dos cursos hoje mais necessários para melhorar a competitividade de qualquer economia, conhecidos pelo acrônimo em inglês STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática). E 8% graduam-se em áreas como artes, humanidades, ciências sociais e jornalismo.

Nos países desenvolvidos, os cursos do grupo STEM atraem 23% dos universitários, com idêntica proporção nas formações em administração e Direito. Artes, humanidades, ciências sociais, jornalismo e informação aparecem com 22%. Há equilíbrio entre os grandes blocos de formação universitária, que se reflete numa distribuição mais adequada na pós-graduação.

Se o Brasil tem mesmo pretensão de ser um país desenvolvido com influência global, poderia se inspirar no salto educacional dado pela China. O investimento em educação de ponta tem sido um dos principais motores da economia chinesa. A formação de bacharéis em ciência e engenharia (S&E) mais que quadruplicou entre 2000 e 2014, de 359 mil para 1,65 milhão (no período, os formandos americanos nas mesmas áreas passaram de 400 mil para 650 mil).

É importante enfatizar, também, que o cuidado com o ensino superior e a pós-graduação não pode se dar à custa da principal prioridade brasileira: melhorar o ensino básico (fundamental e médio). O círculo virtuoso da educação deve começar pela base. Por força de grupos de pressão ligados às universidades públicas, ainda há enorme desequilíbrio nos investimentos do Estado em favor do ensino superior, sem mecanismos de avaliação satisfatórios e sem que os resultados correspondam às necessidades da sociedade, como revela o relatório da OCDE.

Um roteiro para a pacificação do País

Por O Estado de S. Paulo

Erra quem pensa que a pacificação virá com a anistia a golpistas, mas também quem crê que basta a punição dos inconformados com a democracia para superar as tensões. É preciso mais

“A pacificação do País depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições”, disse o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no introito do julgamento da Ação Penal 2.668, sobre o atentado à ordem constitucional democrática, cujo principal réu era o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Nós precisamos de pacificação. E o Congresso pode fazer gestos por essa pacificação”, pregou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, convertido em principal porta-voz da tese bolsonarista segundo a qual a anistia a Bolsonaro terá o condão de “pacificar” o Brasil.

Como em muitos momentos de tensão observados na história brasileira, fala-se muito em “pacificação”, “união” ou “solução política” como forma de mudar um estado de crispação, virulência e conflito institucional. Não se questiona tal desejo, mas o problema é de outra ordem: nenhuma receita de paz social vai prosperar caso se concentre em um só lado da história. De fato, não há paz fora do império da lei, tampouco sob a confusão premeditada entre pacificação e impunidade. Mas, admitindo-se que seja necessário pacificar o País, o que de resto é discutível, erra quem pensa que essa pacificação virá com a anistia, e erra também quem acredita que a pacificação se resume à punição dos inconformados com a democracia. É preciso mais.

Respeito à lei e às instituições é sem dúvida a primeira exigência. O País precisa de forças políticas que parem de desmoralizar a Justiça, o sistema político e as eleições. Jair Bolsonaro jamais hesitou em dizer que qualquer resultado eleitoral que não fosse sua vitória seria uma prova de fraude nas urnas eletrônicas. Petistas não ficaram atrás, sustentando que uma eleição sem a presença de seu demiurgo, Lula da Silva, também seria ilegítima. A paz social requer o compromisso de aceitar o pluralismo político. O Brasil precisa se afastar de lideranças que alimentam o ódio a outras identidades políticas e criam uma atmosfera de cizânia e desencanto. Bolsonaro e Lula, sabemos, foram pródigos em discursos divisivos, típicos de quem deseja governar apenas para a própria patota ideológica.

Será preciso também despolitizar o STF. Não é de hoje que a Corte tem sido percebida como centro de ação política. Mas o Judiciário não pode ser arena política e ministros do Supremo não podem ser políticos que disputam espaços no debate público. Ao fazê-lo, ameaçam a integridade e a legitimidade de uma instituição que deveria atuar à margem das paixões políticas. Não há “ditadura da toga” – uma narrativa que serve de pretexto para reforçar laços extremistas e justificar ações antidemocráticas –, mas isso não significa deixar de notar e lamentar os muitos erros e abusos do Judiciário. Para evitar novas conflagrações, o STF deve deixar de lado a visão messiânica, preponderante nos últimos tempos, segundo a qual seu papel é “recivilizar” o Brasil.

Convém ainda que a direita que se pretende democrática esconjure o bolsonarismo, redefinindo os limites morais do que é permitido para ganhar uma eleição e se manter no poder. Do mesmo modo, é preciso uma esquerda capaz de ver como legítimas outras forças ideológicas e programáticas, sem se apresentar como detentora exclusiva da virtude pública, sem enxergar seus críticos como artífices de uma conspiração de elites e sem demonizar reformas importantes.

Exige-se, por fim, acreditar que democracia é lugar de conflito e divergência, e para isso é preciso que o Congresso se dê ao respeito. Os parlamentares, por exemplo, devem deixar de se ver como casta privilegiada, acima das leis que demandam transparência no trato do dinheiro público e respeito a adversários políticos. Ultimamente, os mesmos congressistas que falam em “pacificação” são os que vivem de ofender seus adversários, ameaçar a imprensa, destratar ministros do Supremo e xingar o presidente da República. Isso não é política. Sem o mínimo de decência no Congresso, não há base razoável de confiança para diálogo, conciliação e busca de soluções negociadas. Aviltar essa premissa é conceder licença moral para romper com a democracia a pretexto de salvá-la.

Os riscos do ‘SUS da Educação’

Por O Estado de S. Paulo

Cooperação federativa é desejável, mas o perigo é reciclar uma malfadada tradição nacional: mais centralização e burocracia, menos autonomia e inovação, e nenhum ganho de aprendizagem

A Câmara dos Deputados aprovou o Sistema Nacional de Educação (SNE). Em tese, a ideia do chamado “SUS da Educação” soa sedutora: integrar União, Estados e municípios em torno de objetivos comuns, fortalecer a cooperação federativa e criar uma base de dados capaz de acompanhar a trajetória dos estudantes. No papel, parece um marco institucional. Na prática, o risco é reeditar uma velha armadilha brasileira: multiplicar conselhos, instâncias e regulamentos com novos custos e nenhum ganho de aprendizagem.

Não faltam exemplos de como a educação no Brasil prosperou sem a necessidade de “sistemas nacionais” tentaculares. Sobral, no Ceará, tornou-se referência mundial em alfabetização porque lideranças locais assumiram riscos, inovaram e implantaram práticas comprovadas. Regimes federalistas – dos EUA à Alemanha, do Canadá à Austrália – exibem resultados sem um sistema centralizado que submeta escolas e secretarias.

A comparação com o Sistema Único de Saúde (SUS) é inadequada. Na saúde, faz sentido padronizar protocolos e compartilhar prontuários: a vida de um paciente depende de que informações fluam entre hospitais e níveis de governo. Já na educação, cada rede é responsável por gerir suas escolas, contratar professores, definir estratégias. A interdependência operacional não existe. Um “MEC do B”, como alertam alguns críticos, pode gerar só mais burocracia e confusão.

A redação da Câmara mitigou riscos, tornando as diretrizes orientativas e privilegiando a autonomia federativa. Mas, se a versão original for restaurada no Senado, as comissões nacionais poderiam impor obrigações a Estados e municípios, condicionando transferências ao cumprimento de regras definidas por um punhado de tecnocratas, sindicatos e ONGs, em detrimento dos gestores eleitos. Isso abriria brecha a corporativismo, insegurança jurídica e diluição de responsabilidades.

Outro ponto delicado é o chamado Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Em tese, trata-se de estabelecer quanto o Estado deve investir por estudante para garantir padrões mínimos de qualidade. Na prática, corre-se o risco de transformar uma aspiração legítima em obrigação contábil impossível de cumprir. Sem consenso técnico sobre quais insumos considerar e sem lastro fiscal, o CAQ pode virar “letra morta” ou, pior, multiplicar disputas judiciais sobre recursos inexistentes.

Não se trata de negar que a educação brasileira carece de coordenação. O País gasta tanto quanto ou mais que muitos vizinhos, mas segue patinando na zona de rebaixamento dos rankings internacionais. O problema é como usar melhor o dinheiro já disponível, não fabricar novas engrenagens. Incentivos inteligentes funcionam melhor do que padronizações impostas. Experiências internacionais indicam que currículos claros, sistemas de avaliação robustos e políticas de valorização docente são mais eficazes do que multiplicar instâncias colegiadas.

O Brasil precisa de políticas simples e factíveis: atrair jovens talentos para o magistério, formar melhor seus professores, premiar boas práticas e reforçar a autonomia dos gestores locais. O governo federal tem um papel – na avaliação, no financiamento complementar, na compensação das desigualdades. Mas é ilusório imaginar que conselhos em Brasília resolverão problemas que nascem na sala de aula.

O Senado deveria manter o caráter orientativo introduzido pela Câmara. Tornar obrigatórias as diretrizes do novo sistema significaria engessar ainda mais uma máquina já emperrada, sob o risco de desviar o foco do que realmente importa: letramento de qualidade, aprendizado consistente em matemática e ciências, gestão eficiente e professores motivados.

Um banco nacional de dados pode, sim, ser útil para identificar gargalos e compartilhar boas práticas. A criação de instâncias de diálogo entre entes federados – desde que sirva para cooperação voluntária, e não para coerção centralizada – também pode ter valor. Mas, se o SNE consumar a “obra-prima do barroco tecnocrático”, como advertiu neste jornal o especialista em educação Claudio de Moura Castro, terá cumprido apenas a sina de tantas outras reformas educacionais no Brasil: grandes promessas, poucos resultados.

O que cabe ao prefeito

Por O Estado de S. Paulo

Impedido pela Justiça de legislar sobre mototáxis, Nunes tem outros meios de pacificar o trânsito

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) impôs uma derrota ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao decidir que o seu decreto que proíbe o serviço de mototáxi na capital é inconstitucional. Cúpula do Judiciário paulista, o colegiado composto por 25 desembargadores ordenou, por unanimidade, que a Prefeitura regulamente em até 90 dias essa modalidade de transporte oferecida por aplicativos. Os magistrados afirmaram ainda que compete à União, e não aos municípios, legislar sobre a matéria, além de considerarem o veto a esse serviço uma afronta aos princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. Em bom português, o recado foi para que Nunes pare de gastar energia com uma causa perdida e passe a se ocupar do que de fato é de sua competência.

Nunes ganhou, assim, um tempo razoável para respeitar a legislação federal e a Constituição, cumprir a ordem judicial e, sobretudo, trabalhar no que importa para os paulistanos, a começar por desistir de interpor recursos contra a decisão do TJ-SP e, enfim, liberar o serviço de mototáxi na cidade. Já é sabido que há demanda da população por esse tipo de serviço, principalmente na periferia, onde a falta de segurança e a precariedade do transporte coletivo estimulam esse modelo de negócio. Prova da insatisfação dos passageiros com o transporte coletivo é a mais recente Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, que mostrou que os deslocamentos individuais, com 51,2% do total, voltaram a superar, após duas décadas, os feitos por transporte público (48,8%).

Logo, além de se dedicar para melhorar o sistema de ônibus da capital paulista, com a oferta de um serviço confortável, pontual, seguro e eficiente, o prefeito tem a tarefa de estabelecer uma regulamentação dos mototáxis com regras bem definidas, boas condições de atendimento à população, exigência de documentação, equipamentos básicos de segurança e fiscalização. Mas, para isso, Nunes terá de deixar para trás o discurso populista de combate à “indústria da multa” ao qual recorreu durante a eleição e passar a punir, com mais autuações, os maus motociclistas que, ao cometerem tantos abusos pelas ruas da metrópole, colocam sua vida e a de terceiros em risco.

Desde quando baixou o decreto, no começo de 2023, Nunes argumenta que esse serviço oferecido pelos aplicativos é perigoso para passageiros e condutores. Em entrevista recente à TV Globo, o prefeito deu a entender que houve “despreocupação” dos desembargadores “com os acidentes, com as mortes, com os óbitos”, sem citar que, mesmo com a proibição das mototáxis, o número de mortes de motociclistas na cidade cresceu nos últimos anos. De acordo com dados da ferramenta Infosiga, que compila dados do trânsito no Estado de São Paulo, foram 401 óbitos em 2023 e 483 em 2024. A proibição por si só não parece ter sido capaz de conter o avanço da letalidade do trânsito. Se o prefeito está mesmo preocupado com esse quadro – e não há razão para duvidar disso –, é hora, então, de tomar providências concretas, melhorando o transporte coletivo, para desestimular o uso de transporte individual, e apertando a fiscalização sobre motociclistas irresponsáveis.

Por uma reforma administrativa

Por Correio Braziliense

Uma efetiva reforma administrativa só ocorrerá quando os Poderes constituídos estabelecerem um pacto para abolir práticas e privilégios que tornam o atual modelo insustentável

Há praticamente um século o Brasil enfrenta o permanente desafio de modernizar a máquina pública. Na história republicana, as tentativas de constituir um Estado que responda adequadamente às demandas da sociedade datam dos anos 1930, no governo de Getúlio Vargas. Nos últimos meses, a imperiosa necessidade de se implantar uma reforma administrativa foi novamente evocada. 

Não faltam razões para esse apelo. São diversos e profundos os problemas acumulados na administração pública, tanto nos três níveis da Federação — União, estados e municípios — quanto nos três Poderes constituídos. Distorções salariais, perpetuação de privilégios, ineficiência e baixa diversidade são algumas das deficiências do Estado brasileiro.

O tema da reforma administrativa voltou à baila após uma divergência que se instalou entre o Executivo e o Legislativo em meados de maio. Inconformado com a proposta enviada pelo Ministério da Fazenda de elevar o Imposto sobre Operações Financeiras, a fim de melhorar a delicada situação das contas públicas, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou a criação de um Grupo de Trabalho sobre a reforma do Estado. A ideia seria dar uma contribuição do Congresso Nacional ao enfrentamento do grave problema fiscal do país.

Chamou a atenção que, pouco tempo depois, o próprio Legislativo aprovou o aumento do número de deputados, passando de 513 para 531 os representantes eleitos. Como ampliar o contingente de parlamentares, assessores, gabinetes e tudo o mais sem acarretar aumento de gastos é um desses enigmas de Brasília. Ao anunciar a intenção de promover uma reforma administrativa, Motta deu um prazo de 45 dias para o Grupo de Trabalho, coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), apresentar sugestões. De lá para cá, ainda não se viu avanço significativo. Há uma expectativa de que as discussões adquiram tração nesta segunda quinzena de setembro — se o movimento pró-anistia a golpistas, em curso no Congresso Nacional, permitir. 

O Executivo, sob comando do presidente Lula, segue a convicção petista de se construir um aparato estatal robusto. É essa visão que justifica a realização do Concurso Público Nacional Unificado, que se encontra na segunda edição. Sob certo aspecto, a reconstrução estatal se justifica, na medida em que os governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro foram marcados seja por uma forte restrição orçamentária, seja porque havia uma clara determinação de desmonte de órgãos públicos. O expansionismo estatal petista explicita, no entanto, o problema existencial do Estado brasileiro: caro demais pelo que oferece.

Somam-se ao atual perfil estadista do Executivo problemas crônicos nos outros Poderes e estruturas da administração pública. O que mais salta aos olhos, sem dúvida, são os supersalários, verbas indenizatórias e toda sorte de bonificações e vantagens que agraciam os rendimentos de uma elite do funcionalismo público. As justificativas de que os abonos estão previstos em lei são moralmente inaceitáveis. Já passou da hora de se realizar um debate franco, transparente e honesto para dar fim a privilégios escandalosos em um país tão marcado pela desigualdade.

Uma efetiva reforma administrativa só ocorrerá quando os Poderes constituídos estabelecerem um pacto para abolir práticas e privilégios que tornam o atual modelo insustentável. É preciso que se entenda, de uma vez por todas, que as mudanças na máquina pública devem ocorrer para fortalecer o Estado, e não o contracheque de poucos. A modernização passa necessariamente na premissa de utilizar com inteligência os recursos disponíveis e buscar o melhor desempenho possível dos servidores públicos. É urgente uma reforma administrativa que faça valer o dinheiro do contribuinte.

 Santa Casa retoma cirurgias

Por O Povo (CE)

É louvável constatar os números que foram divulgados: até o dia 31 de agosto, 108 leitos hospitalares foram reabertos na Santa Casa. Desses, 98 são de enfermaria e 10 de Unidade de Terapia Intensiva (UTI)

Mais de 100 leitos de internação foram reabertos na Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza desde julho deste ano, quando começou a intervenção da Prefeitura de Fortaleza. O anúncio dá mais fôlego à estrutura da unidade tão relevante para o atendimento em saúde na capital cearense, que celebrou 164 anos neste 2025. De acordo com a gestão municipal, cirurgias e acompanhamentos ambulatoriais também foram retomados.

Sob a administração da Prefeitura, a Santa Casa tem várias áreas de atendimento sendo reformadas e reestruturadas a fim de aprimorar a assistência aos pacientes, assim como as estruturas administrativas do hospital. Ressalte-se que todos os serviços prestados pelo hospital passaram a ser totalmente gratuitos, incluindo consultas, exames de imagem, procedimentos cirúrgicos e tratamentos oncológicos.

Em balanço apresentado pelo prefeito de Fortaleza, Evandro Leitão (PT), na semana que passou, informou-se que a Santa Casa Fortaleza voltou a realizar cirurgias neste mês de setembro. Três meses após interromper a regulação de novos pacientes por problemas financeiros, houve 16 operações de urologia realizadas desde o dia 1°, depois da reabertura de nove salas do centro cirúrgico da unidade. Em seguida, devem ser retomadas as cirurgias gerais.

É louvável constatar os números que foram divulgados: até o dia 31 de agosto, 108 leitos hospitalares foram reabertos na Santa Casa. Desses, 98 são de enfermaria e 10 de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Cerca de 200 pacientes foram atendidos desde o início da intervenção - cerca de 45 deles nas UTIs e 155 nas enfermarias.

É válido destacar que, nos últimos anos, a Santa Casa tem sofrido bastante com dívidas. A instituição de saúde suspendeu, em junho deste ano, o recebimento de novos pacientes na unidade por problemas financeiros constantes. Por causa da crise, o hospital tinha dificuldade em manter os atendimentos com a segurança necessária para os pacientes. As frequentes crises se dão devido à diferença entre suas receitas e as despesas realizadas para garantir a assistência a quem não pode pagar por um atendimento médico-hospitalar.

Por mês, milhares de pessoas são atendidas na Santa Casa, com consultas, exames e cirurgias. Diferentemente de uma empresa privada, a aparente contradição é que a cada procedimento realizado, as dívidas aumentam.

Desse modo, é coerente, embora delicada à primeira vista, a iniciativa da intervenção municipal na Santa Casa, entendendo que governos e políticos devem se engajar na busca de soluções, mesmo que emergenciais, a fim de manter os hospitais em funcionamento. A excelência dos serviços prestados pela Santa Casa e o tradicional atendimento a tantos pacientes não podem ser negligenciados.

Assim, espera-se que, em breve, o hospital volte a funcionar regularmente, de modo clínico e administrativo, com todas as condições plenas possíveis de atendimento à população. 

 

 

 

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