Um roteiro para a pacificação do País
Por O Estado de S. Paulo
Erra quem pensa que a pacificação virá com a anistia a golpistas, mas também quem crê que basta a punição dos inconformados com a democracia para superar as tensões. É preciso mais
“A pacificação do País depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições”, disse o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no introito do julgamento da Ação Penal 2.668, sobre o atentado à ordem constitucional democrática, cujo principal réu era o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Nós precisamos de pacificação. E o Congresso pode fazer gestos por essa pacificação”, pregou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, convertido em principal porta-voz da tese bolsonarista segundo a qual a anistia a Bolsonaro terá o condão de “pacificar” o Brasil.
Como em muitos momentos de tensão observados na história brasileira, fala-se muito em “pacificação”, “união” ou “solução política” como forma de mudar um estado de crispação, virulência e conflito institucional. Não se questiona tal desejo, mas o problema é de outra ordem: nenhuma receita de paz social vai prosperar caso se concentre em um só lado da história. De fato, não há paz fora do império da lei, tampouco sob a confusão premeditada entre pacificação e impunidade. Mas, admitindo-se que seja necessário pacificar o País, o que de resto é discutível, erra quem pensa que essa pacificação virá com a anistia, e erra também quem acredita que a pacificação se resume à punição dos inconformados com a democracia. É preciso mais.
Respeito à lei e às instituições é sem dúvida a primeira exigência. O País precisa de forças políticas que parem de desmoralizar a Justiça, o sistema político e as eleições. Jair Bolsonaro jamais hesitou em dizer que qualquer resultado eleitoral que não fosse sua vitória seria uma prova de fraude nas urnas eletrônicas. Petistas não ficaram atrás, sustentando que uma eleição sem a presença de seu demiurgo, Lula da Silva, também seria ilegítima. A paz social requer o compromisso de aceitar o pluralismo político. O Brasil precisa se afastar de lideranças que alimentam o ódio a outras identidades políticas e criam uma atmosfera de cizânia e desencanto. Bolsonaro e Lula, sabemos, foram pródigos em discursos divisivos, típicos de quem deseja governar apenas para a própria patota ideológica.
Será preciso também despolitizar o STF. Não é de hoje que a Corte tem sido percebida como centro de ação política. Mas o Judiciário não pode ser arena política e ministros do Supremo não podem ser políticos que disputam espaços no debate público. Ao fazê-lo, ameaçam a integridade e a legitimidade de uma instituição que deveria atuar à margem das paixões políticas. Não há “ditadura da toga” – uma narrativa que serve de pretexto para reforçar laços extremistas e justificar ações antidemocráticas –, mas isso não significa deixar de notar e lamentar os muitos erros e abusos do Judiciário. Para evitar novas conflagrações, o STF deve deixar de lado a visão messiânica, preponderante nos últimos tempos, segundo a qual seu papel é “recivilizar” o Brasil.
Convém ainda que a direita que se pretende democrática esconjure o bolsonarismo, redefinindo os limites morais do que é permitido para ganhar uma eleição e se manter no poder. Do mesmo modo, é preciso uma esquerda capaz de ver como legítimas outras forças ideológicas e programáticas, sem se apresentar como detentora exclusiva da virtude pública, sem enxergar seus críticos como artífices de uma conspiração de elites e sem demonizar reformas importantes.
Exige-se, por fim, acreditar que democracia é lugar de conflito e divergência, e para isso é preciso que o Congresso se dê ao respeito. Os parlamentares, por exemplo, devem deixar de se ver como casta privilegiada, acima das leis que demandam transparência no trato do dinheiro público e respeito a adversários políticos. Ultimamente, os mesmos congressistas que falam em “pacificação” são os que vivem de ofender seus adversários, ameaçar a imprensa, destratar ministros do Supremo e xingar o presidente da República. Isso não é política. Sem o mínimo de decência no Congresso, não há base razoável de confiança para diálogo, conciliação e busca de soluções negociadas. Aviltar essa premissa é conceder licença moral para romper com a democracia a pretexto de salvá-la.
Os riscos do ‘SUS da Educação’
Por O Estado de S. Paulo
Cooperação federativa é desejável, mas o perigo é reciclar uma malfadada tradição nacional: mais centralização e burocracia, menos autonomia e inovação, e nenhum ganho de aprendizagem
A Câmara dos Deputados aprovou o Sistema Nacional de Educação (SNE). Em tese, a ideia do chamado “SUS da Educação” soa sedutora: integrar União, Estados e municípios em torno de objetivos comuns, fortalecer a cooperação federativa e criar uma base de dados capaz de acompanhar a trajetória dos estudantes. No papel, parece um marco institucional. Na prática, o risco é reeditar uma velha armadilha brasileira: multiplicar conselhos, instâncias e regulamentos com novos custos e nenhum ganho de aprendizagem.
Não faltam exemplos de como a educação no Brasil prosperou sem a necessidade de “sistemas nacionais” tentaculares. Sobral, no Ceará, tornou-se referência mundial em alfabetização porque lideranças locais assumiram riscos, inovaram e implantaram práticas comprovadas. Regimes federalistas – dos EUA à Alemanha, do Canadá à Austrália – exibem resultados sem um sistema centralizado que submeta escolas e secretarias.
A comparação com o Sistema Único de Saúde (SUS) é inadequada. Na saúde, faz sentido padronizar protocolos e compartilhar prontuários: a vida de um paciente depende de que informações fluam entre hospitais e níveis de governo. Já na educação, cada rede é responsável por gerir suas escolas, contratar professores, definir estratégias. A interdependência operacional não existe. Um “MEC do B”, como alertam alguns críticos, pode gerar só mais burocracia e confusão.
A redação da Câmara mitigou riscos, tornando as diretrizes orientativas e privilegiando a autonomia federativa. Mas, se a versão original for restaurada no Senado, as comissões nacionais poderiam impor obrigações a Estados e municípios, condicionando transferências ao cumprimento de regras definidas por um punhado de tecnocratas, sindicatos e ONGs, em detrimento dos gestores eleitos. Isso abriria brecha a corporativismo, insegurança jurídica e diluição de responsabilidades.
Outro ponto delicado é o chamado Custo Aluno-Qualidade (CAQ). Em tese, trata-se de estabelecer quanto o Estado deve investir por estudante para garantir padrões mínimos de qualidade. Na prática, corre-se o risco de transformar uma aspiração legítima em obrigação contábil impossível de cumprir. Sem consenso técnico sobre quais insumos considerar e sem lastro fiscal, o CAQ pode virar “letra morta” ou, pior, multiplicar disputas judiciais sobre recursos inexistentes.
Não se trata de negar que a educação brasileira carece de coordenação. O País gasta tanto quanto ou mais que muitos vizinhos, mas segue patinando na zona de rebaixamento dos rankings internacionais. O problema é como usar melhor o dinheiro já disponível, não fabricar novas engrenagens. Incentivos inteligentes funcionam melhor do que padronizações impostas. Experiências internacionais indicam que currículos claros, sistemas de avaliação robustos e políticas de valorização docente são mais eficazes do que multiplicar instâncias colegiadas.
O Brasil precisa de políticas simples e factíveis: atrair jovens talentos para o magistério, formar melhor seus professores, premiar boas práticas e reforçar a autonomia dos gestores locais. O governo federal tem um papel – na avaliação, no financiamento complementar, na compensação das desigualdades. Mas é ilusório imaginar que conselhos em Brasília resolverão problemas que nascem na sala de aula.
O Senado deveria manter o caráter orientativo introduzido pela Câmara. Tornar obrigatórias as diretrizes do novo sistema significaria engessar ainda mais uma máquina já emperrada, sob o risco de desviar o foco do que realmente importa: letramento de qualidade, aprendizado consistente em matemática e ciências, gestão eficiente e professores motivados.
Um banco nacional de dados pode, sim, ser útil para identificar gargalos e compartilhar boas práticas. A criação de instâncias de diálogo entre entes federados – desde que sirva para cooperação voluntária, e não para coerção centralizada – também pode ter valor. Mas, se o SNE consumar a “obra-prima do barroco tecnocrático”, como advertiu neste jornal o especialista em educação Claudio de Moura Castro, terá cumprido apenas a sina de tantas outras reformas educacionais no Brasil: grandes promessas, poucos resultados.
O que cabe ao prefeito
Por O Estado de S. Paulo
Impedido pela Justiça de legislar sobre mototáxis, Nunes tem outros meios de pacificar o trânsito
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) impôs uma derrota ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao decidir que o seu decreto que proíbe o serviço de mototáxi na capital é inconstitucional. Cúpula do Judiciário paulista, o colegiado composto por 25 desembargadores ordenou, por unanimidade, que a Prefeitura regulamente em até 90 dias essa modalidade de transporte oferecida por aplicativos. Os magistrados afirmaram ainda que compete à União, e não aos municípios, legislar sobre a matéria, além de considerarem o veto a esse serviço uma afronta aos princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. Em bom português, o recado foi para que Nunes pare de gastar energia com uma causa perdida e passe a se ocupar do que de fato é de sua competência.
Nunes ganhou, assim, um tempo razoável para respeitar a legislação federal e a Constituição, cumprir a ordem judicial e, sobretudo, trabalhar no que importa para os paulistanos, a começar por desistir de interpor recursos contra a decisão do TJ-SP e, enfim, liberar o serviço de mototáxi na cidade. Já é sabido que há demanda da população por esse tipo de serviço, principalmente na periferia, onde a falta de segurança e a precariedade do transporte coletivo estimulam esse modelo de negócio. Prova da insatisfação dos passageiros com o transporte coletivo é a mais recente Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, que mostrou que os deslocamentos individuais, com 51,2% do total, voltaram a superar, após duas décadas, os feitos por transporte público (48,8%).
Logo, além de se dedicar para melhorar o sistema de ônibus da capital paulista, com a oferta de um serviço confortável, pontual, seguro e eficiente, o prefeito tem a tarefa de estabelecer uma regulamentação dos mototáxis com regras bem definidas, boas condições de atendimento à população, exigência de documentação, equipamentos básicos de segurança e fiscalização. Mas, para isso, Nunes terá de deixar para trás o discurso populista de combate à “indústria da multa” ao qual recorreu durante a eleição e passar a punir, com mais autuações, os maus motociclistas que, ao cometerem tantos abusos pelas ruas da metrópole, colocam sua vida e a de terceiros em risco.
Desde quando baixou o decreto, no começo de 2023, Nunes argumenta que esse serviço oferecido pelos aplicativos é perigoso para passageiros e condutores. Em entrevista recente à TV Globo, o prefeito deu a entender que houve “despreocupação” dos desembargadores “com os acidentes, com as mortes, com os óbitos”, sem citar que, mesmo com a proibição das mototáxis, o número de mortes de motociclistas na cidade cresceu nos últimos anos. De acordo com dados da ferramenta Infosiga, que compila dados do trânsito no Estado de São Paulo, foram 401 óbitos em 2023 e 483 em 2024. A proibição por si só não parece ter sido capaz de conter o avanço da letalidade do trânsito. Se o prefeito está mesmo preocupado com esse quadro – e não há razão para duvidar disso –, é hora, então, de tomar providências concretas, melhorando o transporte coletivo, para desestimular o uso de transporte individual, e apertando a fiscalização sobre motociclistas irresponsáveis.
Por Folha de S. Paulo
Aprovação sobe desde junho e chega a 33%,
mostra Datafolha; economia e Congresso hostil são obstáculos
A polarização contribui para o resultado
medíocre da popularidade, mas degradação começou a ficar evidente com a inflação
de alimentos
A avaliação do governo Luiz Inácio Lula da
Silva (PT)
chegou ao nível mais alto deste ano. Para 33% dos entrevistados pelo Datafolha nos
dias 8 e 9 de setembro, seu
desempenho é ótimo ou bom —alta de 5 pontos em relação a junho
(28%).
Mas o fato de que só um terço do eleitorado
tenha a opinião mais elevada sobre a atuação do presidente indica fragilidade.
As conspirações da família Bolsonaro contra o Brasil podem ter ajudado a lustrar a imagem do petista. No entanto Lula tem dificuldades crônicas em seu terceiro mandato, e a perspectiva para os próximos meses na economia e na política não parece propícia a saltos em popularidade.
O saldo ainda é negativo, já que o governo é
ruim ou péssimo para 38% dos entrevistados —5 pontos percentuais a mais do que
ótimo ou bom. Em fevereiro, a diferença chegava aos 17 pontos (41% e 24%,
respectivamente).
Apesar da melhora, o indicador positivo está
abaixo dos registrados em 2024, sempre entre 35% e 36%; jamais passou da máxima
de 38%, atingida em 2023.
A polarização política contribui para esse
resultado cronicamente medíocre. A degradação da nota, contudo, começa a ficar
evidente no final de 2024, com a inflação de
alimentos.
O pânico financeiro de dezembro, com a alta
do dólar provocada pelo anúncio de um plano fiscal desastrado e frágil, também
pode ter impressionado parcela do eleitorado. Boa parte do desgaste, porém, foi
causado por uma campanha de desinformação
nas redes sociais a respeito da tributação do Pix e,
mais recentemente, pelo escândalo dos descontos fraudulentos no INSS.
O movimento contra o Pix parece atenuado, e
as primeiras restituições aos lesados no INSS começaram a ser pagas. O pior da
inflação passou, embora ainda pressione orçamentos. O comportamento vil dos
Bolsonaros pode ter dado alguns pontos a Lula. Agora, qual é a perspectiva
daqui em diante para o presidente?
A atividade econômica desacelera, por
enquanto de modo suave. A partir do final do ano, deve ficar um pouco mais
difundida a percepção de que é difícil encontrar emprego e de que os salários
aumentam menos.
A antecipação da campanha
eleitoral deve ter efeitos maiores no Congresso
Nacional, com uma oposição ainda mais acirrada pela condenação
de Jair
Bolsonaro (PL).
A aprovação
da isenção do Imposto de Renda seria relevante para Lula, mas
mesmo esse projeto popular enfrentará dificuldades.
Por outro lado, a indefinição de candidaturas
e projetos no campo da direita tem potencial para facilitar a campanha petista.
Trata-se de cenário cinzento, sem vislumbre
de grandes melhoras ou perdas decisivas. A aprovação de Lula 3 nunca foi alta.
Perto do final do ano, ainda se recupera da baixa na virada de 2024 para 2025.
O ano eleitoral será de economia mais frágil e de ataques da oposição. Até onde
se pode ver, o presidente terá dificuldades em recuperar sua popularidade.
Fazenda assimila o pouso da economia
Por Folha de S. Paulo
Projeção do PIB é revisada para baixo;
inflação e déficit público reduzem margem para estímulos fiscais
Segundo a pasta, o tarifaço dos EUA pode
tirar 0,2 ponto do PIB até o fim de 2026, mas impacto cai com redirecionamento
de exportações
Diante dos juros altos
e do esgotamento de impulsos fiscais e creditícios, a esperada desaceleração
gradual da economia brasileira
vem se confirmando nos últimos meses e já afeta as projeções do setor
privado e mesmo do governo.
No setor privado, a estimativa mediana para o
crescimento do Produto Interno Bruto neste ano, coletada pelo Banco Central,
caiu de 2,23% em julho para 2,16% agora. O Ministério da
Fazenda também ajustou sua
estimativa de 2,5% para 2,3%, atribuindo o revisão principalmente
aos juros do BC de 15%
anuais, os mais altos desde 2006.
Decerto são recuos pequenos. Mas, desde 2021,
o padrão vinha sendo elevar as projeções ao longo do ano, à medida que o
desempenho do PIB superava
expectativas. Não é o que ocorre agora.
Entre os principais fatores de mudança,
destaca-se o ritmo mais lento das concessões de crédito e a alta da
inadimplência.
Em paralelo, a criação de empregos formais,
embora ainda positiva, com quase 149 mil vagas em maio de 2025 e um saldo
acumulado de mais de 1 milhão nos primeiros cinco meses do ano, mostra sinais
de arrefecimento.
Mesmo com desemprego baixo, em 5,8%, há
alguma diminuição no avanço da renda, e os salários de entrada de contratados
já não sobem além da inflação.
Um fator externo que se soma a esse quadro é
o tarifaço imposto pelos Estados
Unidos, com elevação da taxação sobre produtos brasileiros para até
50%.
De acordo com cálculos a Secretaria de
Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda, a sanção americana pode
tirar 0,2 ponto percentual do PIB brasileiro entre agosto deste
ano e dezembro de 2026.
Para a SPE, porém, o impacto cai à metade com
as medidas adotadas pelo governo para auxiliar setores atingidos e, ao longo do
tempo, com o redirecionamento
de parte das vendas para outros mercados externos.
De mais positivo, a necessária desaceleração
econômica e a valorização cambial recente reduzem pressões sobre os preços. A
inflação esperada em 2025, que rondava 5,6% até abril, caiu a 4,85% —ainda
acima, ressalve-se, da meta de 3% e do teto de 4,5%.
Não se espera desempenho melhor do PIB no ano eleitoral de 2026. As projeções do mercado não chegam aos 2%, enquanto a da Fazenda é de 2,4%. Será difícil, para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), usar gasto e crédito públicos para obter taxas melhores. Com a inflação ainda não derrubada e contas públicas no vermelho, nem resultados de curto prazo parecem promissores.
Crise diplomática com EUA exige serenidade
Por O Globo
Dano causado pela família Bolsonaro pode ser
reparado quando baixar a poeira do julgamento
A família Bolsonaro infelizmente persiste na
cruzada de ataque às instituições brasileiras em defesa de seu patriarca, que
tão caro tem custado ao Brasil. Depois da condenação de Jair Bolsonaro pelo
Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP)
continua a fazer pressão nos Estados Unidos por represálias. “Dia ruim, mas
longe do fim da guerra”, escreveu numa rede social. Também elogiou a declaração
do presidente americano Donald Trump, que se disse “surpreso” e “insatisfeito”
com o julgamento. Eduardo ainda reproduziu a mensagem do secretário de Estado,
Marco Rubio, prometendo resposta ao que descreveu como “caça às bruxas”. No
começo da semana, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, chegou a falar
até no uso de meios “militares”.
Depois de emitir um comunicado sóbrio em
resposta à declaração de Leavitt, o Itamaraty reagiu a Rubio defendendo a
independência do julgamento e dizendo que ameaças “não intimidarão nossa
democracia”. A manifestação foi correta. Mas o momento não é de alimentar
conflitos, e sim de serenidade. Já está evidente que o único interesse dos
Bolsonaros é o deles próprios. Eles não dão a mínima para as consequências de
seus atos para o Brasil. Também está evidente que pressões de qualquer tipo
serão incapazes de mudar o resultado do julgamento, porque assim determina
nossa Constituição. As atitudes americanas foram, antes de tudo, resultado da
pressão e da desinformação transmitida pelos Bolsonaros. A Justiça brasileira
funcionou com independência, como era esperado. Seria bom que nossa diplomacia,
para além dos comunicados suscitados pelas declarações oficiais do governo
Trump, conseguisse deixar isso claro aos americanos.
O cancelamento dos vistos de ministros do STF
e seus familiares, a imposição a Moraes das sanções previstas na Lei Magnitsky
não tiveram os resultados esperados pela família Bolsonaro. A decretação de
escorchantes tarifas de 50% sobre produtos brasileiros serviu apenas para ferir
empreendedores e trabalhadores brasileiros voltados ao mercado americano. As
repetidas sanções e ameaças deram fôlego ao discurso antiamericano no Brasil.
E, no que diz respeito ao objetivo declarado por Eduardo, as teses alucinadas
de anistia no Congresso perderam força. A pauta se tornou radioativa quando
ficou claro que lideranças parlamentares a usavam como moeda de troca para
fazer avançar a agenda corporativa de autoproteção de investigações e ações na
Justiça.
Ao insistir na estratégia do conflito, da
guerra e da pressão, a família Bolsonaro continuará prejudicando o Brasil. Para
os dois países, a persistência das hostilidades é um jogo de perde-perde.
Brasil e Estados Unidos têm uma longa história de interesses comuns. Os dois
países partilham objetivos na segurança, na economia e também na geopolítica.
Os brasileiros se beneficiam com investimentos, produtos e serviços americanos
de qualidade. Ao mesmo tempo, o mercado brasileiro é um dos maiores do mundo
para diversas empresas com sede nos Estados Unidos.
À medida que baixar a poeira do julgamento,
as lideranças empresariais americanas devem deixar claro ao Departamento de
Estado e à Casa Branca como é benéfico para os dois lados resgatar uma relação
produtiva. Não dá para uma história de tantos anos continuar refém do interesse
mesquinho de um golpista condenado pela Justiça e de seus familiares. Assim que
possível, o melhor é virar a página.
Pequena proporção de pós-graduados prejudica
desenvolvimento do Brasil
Por O Globo
Entre 41 países, estamos no 39º lugar,
segundo OCDE. Universidades não são adequadas à necessidade do país
Apenas 1% dos brasileiros de 25 a 34 anos tem
mestrado, segundo relatório recém-divulgado pela Organização para o
Desenvolvimento e Cooperação Econômica (OCDE). Esse desempenho coloca o Brasil
em 39º lugar entre 41 países, à frente apenas de Indonésia e África do Sul. A
média da OCDE, que congrega países ricos e emergentes, é 16%. França (26%),
Reino Unido (17%), Alemanha (15%) e Estados Unidos (11%) apresentam números bem
melhores.
É certo que o Brasil tem avançado. O aumento
no número de mestres é uma das poucas metas atingidas pelo Plano Nacional de
Educação (PNE) de 2024. O ritmo de avanço, porém, ainda é lento. “Há 20 anos a
gente formava 35 mil mestres; esse número agora está perto de 60 mil”, diz
Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência (SBPC) e ex-ministro da Educação (na época ele era diretor da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Capes).
A distribuição dos alunos nos cursos também
precisa ser melhorada, a começar pela graduação. O Panorama da Educação, da
OCDE, revela que administração de empresas, Direito e formações relacionadas a
negócios respondem por 34% dos graduados. Apenas 16% saem dos cursos hoje mais
necessários para melhorar a competitividade de qualquer economia, conhecidos
pelo acrônimo em inglês STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática). E
8% graduam-se em áreas como artes, humanidades, ciências sociais e jornalismo.
Nos países desenvolvidos, os cursos do grupo
STEM atraem 23% dos universitários, com idêntica proporção nas formações em
administração e Direito. Artes, humanidades, ciências sociais, jornalismo e
informação aparecem com 22%. Há equilíbrio entre os grandes blocos de formação
universitária, que se reflete numa distribuição mais adequada na pós-graduação.
Se o Brasil tem mesmo pretensão de ser um
país desenvolvido com influência global, poderia se inspirar no salto
educacional dado pela China. O investimento em educação de ponta tem sido um
dos principais motores da economia chinesa. A formação de bacharéis em ciência
e engenharia (S&E) mais que quadruplicou entre 2000 e 2014, de 359 mil para
1,65 milhão (no período, os formandos americanos nas mesmas áreas passaram de
400 mil para 650 mil).
É importante enfatizar, também, que o cuidado
com o ensino superior e a pós-graduação não pode se dar à custa da principal
prioridade brasileira: melhorar o ensino básico (fundamental e médio). O
círculo virtuoso da educação deve começar pela base. Por força de grupos de
pressão ligados às universidades públicas, ainda há enorme desequilíbrio nos
investimentos do Estado em favor do ensino superior, sem mecanismos de
avaliação satisfatórios e sem que os resultados correspondam às necessidades da
sociedade, como revela o relatório da OCDE.
Um roteiro para a pacificação do País
Por O Estado de S. Paulo
Erra quem pensa que a pacificação virá com a
anistia a golpistas, mas também quem crê que basta a punição dos inconformados
com a democracia para superar as tensões. É preciso mais
“A pacificação do País depende do respeito à
Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições”,
disse o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no
introito do julgamento da Ação Penal 2.668, sobre o atentado à ordem
constitucional democrática, cujo principal réu era o ex-presidente Jair
Bolsonaro. “Nós precisamos de pacificação. E o Congresso pode fazer gestos por
essa pacificação”, pregou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas,
convertido em principal porta-voz da tese bolsonarista segundo a qual a anistia
a Bolsonaro terá o condão de “pacificar” o Brasil.
Como em muitos momentos de tensão observados
na história brasileira, fala-se muito em “pacificação”, “união” ou “solução
política” como forma de mudar um estado de crispação, virulência e conflito
institucional. Não se questiona tal desejo, mas o problema é de outra ordem:
nenhuma receita de paz social vai prosperar caso se concentre em um só lado da
história. De fato, não há paz fora do império da lei, tampouco sob a confusão
premeditada entre pacificação e impunidade. Mas, admitindo-se que seja
necessário pacificar o País, o que de resto é discutível, erra quem pensa que
essa pacificação virá com a anistia, e erra também quem acredita que a pacificação
se resume à punição dos inconformados com a democracia. É preciso mais.
Respeito à lei e às instituições é sem dúvida
a primeira exigência. O País precisa de forças políticas que parem de
desmoralizar a Justiça, o sistema político e as eleições. Jair Bolsonaro jamais
hesitou em dizer que qualquer resultado eleitoral que não fosse sua vitória
seria uma prova de fraude nas urnas eletrônicas. Petistas não ficaram atrás,
sustentando que uma eleição sem a presença de seu demiurgo, Lula da Silva,
também seria ilegítima. A paz social requer o compromisso de aceitar o
pluralismo político. O Brasil precisa se afastar de lideranças que alimentam o
ódio a outras identidades políticas e criam uma atmosfera de cizânia e
desencanto. Bolsonaro e Lula, sabemos, foram pródigos em discursos divisivos,
típicos de quem deseja governar apenas para a própria patota ideológica.
Será preciso também despolitizar o STF. Não é
de hoje que a Corte tem sido percebida como centro de ação política. Mas o
Judiciário não pode ser arena política e ministros do Supremo não podem ser
políticos que disputam espaços no debate público. Ao fazê-lo, ameaçam a
integridade e a legitimidade de uma instituição que deveria atuar à margem das
paixões políticas. Não há “ditadura da toga” – uma narrativa que serve de
pretexto para reforçar laços extremistas e justificar ações antidemocráticas –,
mas isso não significa deixar de notar e lamentar os muitos erros e abusos do
Judiciário. Para evitar novas conflagrações, o STF deve deixar de lado a visão
messiânica, preponderante nos últimos tempos, segundo a qual seu papel é
“recivilizar” o Brasil.
Convém ainda que a direita que se pretende
democrática esconjure o bolsonarismo, redefinindo os limites morais do que é
permitido para ganhar uma eleição e se manter no poder. Do mesmo modo, é
preciso uma esquerda capaz de ver como legítimas outras forças ideológicas e
programáticas, sem se apresentar como detentora exclusiva da virtude pública,
sem enxergar seus críticos como artífices de uma conspiração de elites e sem
demonizar reformas importantes.
Exige-se, por fim, acreditar que democracia é
lugar de conflito e divergência, e para isso é preciso que o Congresso se dê ao
respeito. Os parlamentares, por exemplo, devem deixar de se ver como casta
privilegiada, acima das leis que demandam transparência no trato do dinheiro
público e respeito a adversários políticos. Ultimamente, os mesmos
congressistas que falam em “pacificação” são os que vivem de ofender seus
adversários, ameaçar a imprensa, destratar ministros do Supremo e xingar o
presidente da República. Isso não é política. Sem o mínimo de decência no
Congresso, não há base razoável de confiança para diálogo, conciliação e busca
de soluções negociadas. Aviltar essa premissa é conceder licença moral para
romper com a democracia a pretexto de salvá-la.
Os riscos do ‘SUS da Educação’
Por O Estado de S. Paulo
Cooperação federativa é desejável, mas o
perigo é reciclar uma malfadada tradição nacional: mais centralização e
burocracia, menos autonomia e inovação, e nenhum ganho de aprendizagem
A Câmara dos Deputados aprovou o Sistema
Nacional de Educação (SNE). Em tese, a ideia do chamado “SUS da Educação” soa
sedutora: integrar União, Estados e municípios em torno de objetivos comuns,
fortalecer a cooperação federativa e criar uma base de dados capaz de
acompanhar a trajetória dos estudantes. No papel, parece um marco
institucional. Na prática, o risco é reeditar uma velha armadilha brasileira:
multiplicar conselhos, instâncias e regulamentos com novos custos e nenhum
ganho de aprendizagem.
Não faltam exemplos de como a educação no
Brasil prosperou sem a necessidade de “sistemas nacionais” tentaculares.
Sobral, no Ceará, tornou-se referência mundial em alfabetização porque
lideranças locais assumiram riscos, inovaram e implantaram práticas
comprovadas. Regimes federalistas – dos EUA à Alemanha, do Canadá à Austrália –
exibem resultados sem um sistema centralizado que submeta escolas e
secretarias.
A comparação com o Sistema Único de Saúde
(SUS) é inadequada. Na saúde, faz sentido padronizar protocolos e compartilhar
prontuários: a vida de um paciente depende de que informações fluam entre
hospitais e níveis de governo. Já na educação, cada rede é responsável por gerir
suas escolas, contratar professores, definir estratégias. A interdependência
operacional não existe. Um “MEC do B”, como alertam alguns críticos, pode gerar
só mais burocracia e confusão.
A redação da Câmara mitigou riscos, tornando
as diretrizes orientativas e privilegiando a autonomia federativa. Mas, se a
versão original for restaurada no Senado, as comissões nacionais poderiam impor
obrigações a Estados e municípios, condicionando transferências ao cumprimento
de regras definidas por um punhado de tecnocratas, sindicatos e ONGs, em
detrimento dos gestores eleitos. Isso abriria brecha a corporativismo,
insegurança jurídica e diluição de responsabilidades.
Outro ponto delicado é o chamado Custo
Aluno-Qualidade (CAQ). Em tese, trata-se de estabelecer quanto o Estado deve
investir por estudante para garantir padrões mínimos de qualidade. Na prática,
corre-se o risco de transformar uma aspiração legítima em obrigação contábil
impossível de cumprir. Sem consenso técnico sobre quais insumos considerar e sem
lastro fiscal, o CAQ pode virar “letra morta” ou, pior, multiplicar disputas
judiciais sobre recursos inexistentes.
Não se trata de negar que a educação
brasileira carece de coordenação. O País gasta tanto quanto ou mais que muitos
vizinhos, mas segue patinando na zona de rebaixamento dos rankings
internacionais. O problema é como usar melhor o dinheiro já disponível, não
fabricar novas engrenagens. Incentivos inteligentes funcionam melhor do que
padronizações impostas. Experiências internacionais indicam que currículos
claros, sistemas de avaliação robustos e políticas de valorização docente são
mais eficazes do que multiplicar instâncias colegiadas.
O Brasil precisa de políticas simples e
factíveis: atrair jovens talentos para o magistério, formar melhor seus
professores, premiar boas práticas e reforçar a autonomia dos gestores locais.
O governo federal tem um papel – na avaliação, no financiamento complementar,
na compensação das desigualdades. Mas é ilusório imaginar que conselhos em
Brasília resolverão problemas que nascem na sala de aula.
O Senado deveria manter o caráter orientativo
introduzido pela Câmara. Tornar obrigatórias as diretrizes do novo sistema
significaria engessar ainda mais uma máquina já emperrada, sob o risco de
desviar o foco do que realmente importa: letramento de qualidade, aprendizado
consistente em matemática e ciências, gestão eficiente e professores motivados.
Um banco nacional de dados pode, sim, ser
útil para identificar gargalos e compartilhar boas práticas. A criação de instâncias
de diálogo entre entes federados – desde que sirva para cooperação voluntária,
e não para coerção centralizada – também pode ter valor. Mas, se o SNE consumar
a “obra-prima do barroco tecnocrático”, como advertiu neste jornal o
especialista em educação Claudio de Moura Castro, terá cumprido apenas a sina
de tantas outras reformas educacionais no Brasil: grandes promessas, poucos
resultados.
O que cabe ao prefeito
Por O Estado de S. Paulo
Impedido pela Justiça de legislar sobre
mototáxis, Nunes tem outros meios de pacificar o trânsito
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de
São Paulo (TJ-SP) impôs uma derrota ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao decidir
que o seu decreto que proíbe o serviço de mototáxi na capital é
inconstitucional. Cúpula do Judiciário paulista, o colegiado composto por 25
desembargadores ordenou, por unanimidade, que a Prefeitura regulamente em até
90 dias essa modalidade de transporte oferecida por aplicativos. Os magistrados
afirmaram ainda que compete à União, e não aos municípios, legislar sobre a
matéria, além de considerarem o veto a esse serviço uma afronta aos princípios
constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. Em bom português,
o recado foi para que Nunes pare de gastar energia com uma causa perdida e
passe a se ocupar do que de fato é de sua competência.
Nunes ganhou, assim, um tempo razoável para
respeitar a legislação federal e a Constituição, cumprir a ordem judicial e,
sobretudo, trabalhar no que importa para os paulistanos, a começar por desistir
de interpor recursos contra a decisão do TJ-SP e, enfim, liberar o serviço de
mototáxi na cidade. Já é sabido que há demanda da população por esse tipo de
serviço, principalmente na periferia, onde a falta de segurança e a
precariedade do transporte coletivo estimulam esse modelo de negócio. Prova da
insatisfação dos passageiros com o transporte coletivo é a mais recente
Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, que mostrou que os deslocamentos individuais,
com 51,2% do total, voltaram a superar, após duas décadas, os feitos por
transporte público (48,8%).
Logo, além de se dedicar para melhorar o
sistema de ônibus da capital paulista, com a oferta de um serviço confortável,
pontual, seguro e eficiente, o prefeito tem a tarefa de estabelecer uma
regulamentação dos mototáxis com regras bem definidas, boas condições de
atendimento à população, exigência de documentação, equipamentos básicos de
segurança e fiscalização. Mas, para isso, Nunes terá de deixar para trás o
discurso populista de combate à “indústria da multa” ao qual recorreu durante a
eleição e passar a punir, com mais autuações, os maus motociclistas que, ao
cometerem tantos abusos pelas ruas da metrópole, colocam sua vida e a de
terceiros em risco.
Desde quando baixou o decreto, no começo de 2023, Nunes argumenta que esse serviço oferecido pelos aplicativos é perigoso para passageiros e condutores. Em entrevista recente à TV Globo, o prefeito deu a entender que houve “despreocupação” dos desembargadores “com os acidentes, com as mortes, com os óbitos”, sem citar que, mesmo com a proibição das mototáxis, o número de mortes de motociclistas na cidade cresceu nos últimos anos. De acordo com dados da ferramenta Infosiga, que compila dados do trânsito no Estado de São Paulo, foram 401 óbitos em 2023 e 483 em 2024. A proibição por si só não parece ter sido capaz de conter o avanço da letalidade do trânsito. Se o prefeito está mesmo preocupado com esse quadro – e não há razão para duvidar disso –, é hora, então, de tomar providências concretas, melhorando o transporte coletivo, para desestimular o uso de transporte individual, e apertando a fiscalização sobre motociclistas irresponsáveis.
Por uma reforma administrativa
Por Correio Braziliense
Uma efetiva reforma administrativa só
ocorrerá quando os Poderes constituídos estabelecerem um pacto para abolir
práticas e privilégios que tornam o atual modelo insustentável
Há praticamente um século o Brasil enfrenta o
permanente desafio de modernizar a máquina pública. Na história republicana, as
tentativas de constituir um Estado que responda adequadamente às demandas da
sociedade datam dos anos 1930, no governo de Getúlio Vargas. Nos últimos meses,
a imperiosa necessidade de se implantar uma reforma administrativa foi
novamente evocada.
Não faltam razões para esse apelo. São
diversos e profundos os problemas acumulados na administração pública, tanto
nos três níveis da Federação — União, estados e municípios — quanto nos três
Poderes constituídos. Distorções salariais, perpetuação de privilégios,
ineficiência e baixa diversidade são algumas das deficiências do Estado
brasileiro.
O tema da reforma administrativa voltou à
baila após uma divergência que se instalou entre o Executivo e o Legislativo em
meados de maio. Inconformado com a proposta enviada pelo Ministério da Fazenda
de elevar o Imposto sobre Operações Financeiras, a fim de melhorar a delicada
situação das contas públicas, o presidente da Câmara, Hugo Motta
(Republicanos-PB), anunciou a criação de um Grupo de Trabalho sobre a reforma
do Estado. A ideia seria dar uma contribuição do Congresso Nacional ao
enfrentamento do grave problema fiscal do país.
Chamou a atenção que, pouco tempo depois, o
próprio Legislativo aprovou o aumento do número de deputados, passando de 513
para 531 os representantes eleitos. Como ampliar o contingente de
parlamentares, assessores, gabinetes e tudo o mais sem acarretar aumento de
gastos é um desses enigmas de Brasília. Ao anunciar a intenção de promover uma
reforma administrativa, Motta deu um prazo de 45 dias para o Grupo de Trabalho,
coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), apresentar sugestões. De lá para
cá, ainda não se viu avanço significativo. Há uma expectativa de que as
discussões adquiram tração nesta segunda quinzena de setembro — se o movimento
pró-anistia a golpistas, em curso no Congresso Nacional, permitir.
O Executivo, sob comando do presidente Lula,
segue a convicção petista de se construir um aparato estatal robusto. É essa
visão que justifica a realização do Concurso Público Nacional Unificado, que se
encontra na segunda edição. Sob certo aspecto, a reconstrução estatal se
justifica, na medida em que os governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro
foram marcados seja por uma forte restrição orçamentária, seja porque havia uma
clara determinação de desmonte de órgãos públicos. O expansionismo estatal
petista explicita, no entanto, o problema existencial do Estado brasileiro:
caro demais pelo que oferece.
Somam-se ao atual perfil estadista do
Executivo problemas crônicos nos outros Poderes e estruturas da administração
pública. O que mais salta aos olhos, sem dúvida, são os supersalários, verbas
indenizatórias e toda sorte de bonificações e vantagens que agraciam os
rendimentos de uma elite do funcionalismo público. As justificativas de que os
abonos estão previstos em lei são moralmente inaceitáveis. Já passou da hora de
se realizar um debate franco, transparente e honesto para dar fim a privilégios
escandalosos em um país tão marcado pela desigualdade.
Uma efetiva reforma administrativa só ocorrerá quando os Poderes constituídos estabelecerem um pacto para abolir práticas e privilégios que tornam o atual modelo insustentável. É preciso que se entenda, de uma vez por todas, que as mudanças na máquina pública devem ocorrer para fortalecer o Estado, e não o contracheque de poucos. A modernização passa necessariamente na premissa de utilizar com inteligência os recursos disponíveis e buscar o melhor desempenho possível dos servidores públicos. É urgente uma reforma administrativa que faça valer o dinheiro do contribuinte.
Santa Casa retoma cirurgias
Por O Povo (CE)
É louvável constatar os números que foram
divulgados: até o dia 31 de agosto, 108 leitos hospitalares foram reabertos na
Santa Casa. Desses, 98 são de enfermaria e 10 de Unidade de Terapia Intensiva
(UTI)
Mais de 100 leitos de internação foram
reabertos na Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza desde julho deste ano,
quando começou a intervenção da Prefeitura de Fortaleza. O anúncio dá mais
fôlego à estrutura da unidade tão relevante para o atendimento em saúde
na capital cearense, que celebrou 164 anos neste 2025. De acordo com a
gestão municipal, cirurgias e acompanhamentos ambulatoriais também foram
retomados.
Sob a administração da Prefeitura, a Santa
Casa tem várias áreas de atendimento sendo reformadas e reestruturadas a fim de
aprimorar a assistência aos pacientes, assim como as estruturas
administrativas do hospital. Ressalte-se que todos os serviços prestados pelo
hospital passaram a ser totalmente gratuitos, incluindo consultas, exames de
imagem, procedimentos cirúrgicos e tratamentos oncológicos.
Em balanço apresentado pelo prefeito de
Fortaleza, Evandro Leitão (PT), na semana que passou, informou-se que a Santa
Casa Fortaleza voltou a realizar cirurgias neste mês de setembro. Três meses
após interromper a regulação de novos pacientes por problemas
financeiros, houve 16 operações de urologia realizadas desde o dia 1°, depois
da reabertura de nove salas do centro cirúrgico da unidade. Em seguida, devem
ser retomadas as cirurgias gerais.
É louvável constatar os números que foram
divulgados: até o dia 31 de agosto, 108 leitos hospitalares foram
reabertos na Santa Casa. Desses, 98 são de enfermaria e 10 de Unidade de
Terapia Intensiva (UTI). Cerca de 200 pacientes foram atendidos desde o início
da intervenção - cerca de 45 deles nas UTIs e 155 nas enfermarias.
É válido destacar que, nos últimos anos, a
Santa Casa tem sofrido bastante com dívidas. A instituição de saúde suspendeu,
em junho deste ano, o recebimento de novos pacientes na unidade por problemas
financeiros constantes. Por causa da crise, o hospital tinha dificuldade em
manter os atendimentos com a segurança necessária para os pacientes.
As frequentes crises se dão devido à diferença entre suas receitas e as
despesas realizadas para garantir a assistência a quem não pode pagar por um
atendimento médico-hospitalar.
Por mês, milhares de pessoas são atendidas na
Santa Casa, com consultas, exames e cirurgias. Diferentemente de uma empresa
privada, a aparente contradição é que a cada procedimento realizado, as dívidas
aumentam.
Desse modo, é coerente, embora delicada à
primeira vista, a iniciativa da intervenção municipal na Santa Casa,
entendendo que governos e políticos devem se engajar na busca de soluções,
mesmo que emergenciais, a fim de manter os hospitais em funcionamento. A
excelência dos serviços prestados pela Santa Casa e o tradicional atendimento a
tantos pacientes não podem ser negligenciados.
Assim, espera-se que, em breve, o hospital
volte a funcionar regularmente, de modo clínico e administrativo, com
todas as condições plenas possíveis de atendimento à população.
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