segunda-feira, 15 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Narcogarimpo ameaça segurança da Amazônia

Por O Globo

Apesar das sucessivas operações policiais, garimpeiros ilegais persistem, em aliança com o tráfico

A informação de que o Sul do Pará volta a ser ocupado por balsas do garimpo ilegal, apesar de sete operações realizadas apenas neste ano na região, reflete a dificuldade de estabelecer uma política eficaz de segurança pública para a região. Tal política não pode se resumir às operações, cujo efeito se assemelha a enxugar gelo. As distâncias na Amazônia podem ser maiores, mas, como nas áreas urbanas, o combate à ilegalidade exige informação e estratégia para sufocar os criminosos.

Os alvos mais recentes dos garimpeiros são a Terra Indígena Kayabi e o Refúgio de Vida Silvestre Rio São Benedito e Azul, criado pelo governo do Pará em 2021. A corrida à região é motivada pela duplicação do preço do ouro em apenas um ano, para R$ 630 por grama. A rentabilidade do negócio se tornou tão grande que garimpeiros, ao ser surpreendidos, preferem afundar suas balsas e tentar recuperá-las depois. Em reportagem do GLOBO, um morador da região comparou o que acontece no Sul do Pará à descoberta de ouro em Serra Pelada nos anos 1980, quando era comum habitantes de fora venderem tudo o que tinham para tentar a sorte no garimpo.

A grande diferença — para pior — é que agora o crime organizado está presente. O estudo “Cartografias da violência na Amazônia”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), registra que, em 1990, cinco anos depois da redemocratização, relatório do Serviço Nacional de Informações (SNI), ainda operante, já alertava sobre a possibilidade de o ouro retirado da reserva ianomâmi “servir para lavar rendimentos do narcotráfico, dadas as facilidades para cruzar a fronteira”. Ao longo da última década, a chegada à Amazônia de facções criminosas como Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC), aliadas a grupos locais, sedimentou o vínculo entre garimpo ilegal e crime organizado para formar o “narcogarimpo”. As facções compartilham com os donos de garimpos ilegais toda a infraestrutura, inclusive pistas de pouso clandestinas, usadas para reabastecer aviões que transportam drogas. Tudo é pago com ouro, rendendo lucros para ambas as partes.

Há em Brasília consciência do problema, como mostram a sucessão de operações policiais na região e o número crescente de inquéritos policiais federais. Em cinco anos, houve aumento de 93,5% nessas investigações. Mas é preciso mais. É necessário um plano efetivo de vigilância constante e combate consistente, integrado e permanente da criminalidade ambiental e de sua aliança com o tráfico, com recursos compatíveis com o tamanho do desafio. Há na Amazônia Legal, excluindo a área das vastas reservas indígenas, 260km² para cada policial civil, mais que o dobro da média nacional. Portanto, além da necessária articulação entre União, estados e Forças Armadas — vitais na segurança amazônica —, uma política ampla deve prever os meios necessários para erradicar o domínio do crime na região. Trata-se de uma prioridade, levando em conta a importância da Amazônia para os objetivos ambientais, militares, econômicos e estratégicos do Brasil.

Espionagem digital chinesa levanta preocupação mundial com segurança

Por O Globo

Acusação de 23 agências de 11 governos implica China em operações cibernéticas contra 80 países

A espionagem digital se tornou já há algum tempo preocupação crítica na defesa nacional. Um quinto domínio — o cibernético — já se consolidou como campo de ação militar, além dos quatro consagrados (terra, mar, ar e espacial). Desde que o informante Edward Snowden expôs, em 2013, a extensão assustadora dos sistemas espiões da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos, vários episódios incriminaram outros países (nem o Brasil escapou da exposição negativa quando ficou clara a arapongagem do Paraguai nas negociações sobre Itaipu). São raríssimos, porém, casos com a gravidade da denúncia publicada no início do mês contra a China, pelas principais agências de inteligência mundiais.

Um comunicado assinado por 23 serviços de espionagem ou segurança — de Estados Unidos, Canadá, Austrália, Reino Unido, Nova Zelândia, Alemanha, Japão, Polônia, Itália, República Tcheca e Finlândia — acusa a China de invadir redes globais de governos, transportes, telecomunicações, alojamento e infraestrutura militar. “As agências instam os defensores das redes a enfaticamente caçar atividades maliciosas e adotar as medidas de mitigação deste documento para reduzir as ameaças patrocinadas pelo Estado chinês”, afirma o texto.

Depois de um ano de investigação de um amplo ataque cibernético da China deflagrado por meio de um grupo conhecido como Salt Typhoon, foram identificadas invasões a sistemas de 80 países. Entre os alvos estavam empresas de telecomunicações, com o objetivo de rastrear políticos, espiões e ativistas. “Não consigo imaginar que algum americano tenha sido poupado”, afirmou ao jornal New York Times Cynthia Kaiser, ex-executiva graduada na divisão de cibernética do FBI.

Não se sabe quem foram os alvos do Salt Typhoon, mas a ação marca uma nova fase da espionagem cibernética, caracterizada por ataques por todo o mundo, com “alto nível de sofisticação técnica, paciência e persistência”, nas palavras de Jennifer Ewbank, ex-diretora adjunta de inovação digital da CIA. “A China se posiciona para dominar o campo de batalha digital”, escreveu Anne Neuberger, funcionária de cibersegurança no governo Biden, na revista Foreign Affairs. “O Salt Typhoon foi mais que um sucesso isolado de inteligência da China.” De acordo com ela, a Rússia também traz riscos.

Nem a imprensa está a salvo de invasões. Em abril e maio, a infraestrutura digital do Washington Post foi esquadrinhada por invasores chineses. Eles acessaram contas de e-mail de jornalistas especializados em assuntos de segurança nacional, política econômica e China. O mundo empresarial também é outro espaço visado. Há pouco, foram acessadas informações pessoais da maioria do 1,4 milhão de clientes da subsidiária americana do grupo segurador alemão Allianz. Casos assim já se tornaram rotineiros, como decorrência da digitalização inexorável do cotidiano. Não há como pensar em segurança pessoal, corporativa ou nacional sem encarar a segurança cibernética como prioridade.

Maioria contra anistia é um alento

Por Folha de S. Paulo

Proposta de livrar Bolsonaro de punição é rejeitada por 54% dos brasileiros, segundo Datafolha

Articulação apoiada por Tarcísio e centrão une oportunismo à afronta institucional; STF merece crítica, mas julgamento foi legítimo

É alentadora a constatação de que a maioria dos brasileiros —54%, segundo pesquisa do Datafolha— rejeita a proposta de anistia a Jair Bolsonaro (PL), recém-condenado pelo Supremo Tribunal Federal a 27 anos e três meses de prisão por tentativa de golpe de Estado.

Dado o grau de penetração do bolsonarismo na sociedade, era de esperar que o apoio à anistia não fosse pequeno, e ele é manifestado por 39% dos entrevistados. Os dados sugerem, de todo modo, que esse posicionamento não encontra maior aderência em setores mais moderados.

Na região Sudeste, a mais populosa do país, a proporção de contrários e favoráveis praticamente reproduz a nacional (56% a 39%). No Nordeste, reduto de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), chega-se a 63% a 31%). Bolsonaro tem mais força no Sul (44% a 46%) e Norte/Centro-Oeste (45% a 48%).

Entre os que declaram ter votado em Lula em 2022, apenas 16% defendem a proposta; entre os eleitores de Bolsonaro, há 26% contrários —recorde-se que o eleitorado se dividiu praticamente ao meio no segundo turno do último pleito presidencial.

Ademais, voltou a cresceu o contingente contrário a livrar de punição os bolsonaristas depredadores das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023. O percentual, que havia caído de 63% para 55% entre março do ano passado e julho último, agora é de 61%. Os favoráveis, que chegaram a 37% em abril, são 33% hoje.

Trata-se de maiorias formadas a favor do respeito a decisões judiciais —e, no caso de Bolsonaro, a uma decisão judicial inédita contra um líder golpista na história republicana brasileira.

A articulação de uma anistia por meio de lei a ser aprovada pelo Congresso, à qual aderiram candidatos a herdar os votos de Bolsonaro, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e partidos do centrão, une o pior oportunismo político à afronta institucional.

Com o argumento farsesco de que assim se "pacificaria o país", a empreitada promoveria mais um choque entre Poderes, dado que restaria pouca opção ao Supremo além de considerar inconstitucional o desvario. Caso contrário, estaria desmoralizado, e com ele os mecanismos de defesa do Estado democrático de Direito.

Esta Folha considerou exageradas as penas aplicadas pela corte, tanto a Bolsonaro quanto a boa parte dos condenados pelo 8 de janeiro de 2023. Há um debate relevante a ser travado, no Judiciário e no Legislativo, sobre a redundância dos crimes de tentativa de golpe e tentativa de abolição violenta do Estado de Direito. Daí não se segue que criminosos possam sair impunes.

É a certeza da punição que desencoraja novas tentativas de violação da lei. O STF é certamente merecedor de críticas, mas deliberou sobre fatos incontestáveis em um julgamento legítimo. Espera-se que o entendimento partilhado pela maioria dos brasileiros contribua para refrear o ensaio perigoso de anistia geral.

Salários de servidores são informação pública

Por Folha de S. Paulo

Dificultar acesso a dados sobre pagamentos a juízes e promotores infringe princípio da transparência

Em 2023, conselho do Ministério Público passou a exigir identificação para obter informações; há pedido para que o CNJ faça o mesmo

Como se os supersalários da elite do funcionalismo no país já não fossem um escárnio, juízes e procuradores têm buscado limitar a liberação dos dados sobre as folhas de pagamento do sistema de Justiça.

Trata-se de violação do direito de acesso à informação pela população que custeia os ordenados dos servidores. O Estado tem o dever de fornecer, de modo proativo, dados de interesse público.

Em 2023, o Conselho Nacional do Ministério Público aprovou a Resolução 281, que exige a identificação dos cidadãos para que eles possam obter informações sobre a remuneração de promotores, procuradores e outros profissionais. Neste ano, também limitou a cinco anos o prazo máximo para a permanência dos dados nos portais de transparência do Ministério Público.

A resolução de 2023 distorce tanto o artigo da Constituição que veda o anonimato na manifestação de pensamento quanto as regras da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que tratam de informações pessoais sensíveis para, na prática, limitar a transparência da prestação de contas.

A LGPD tem sido usada recorrentemente para esse fim —como fez o Ministério da Gestão e Inovação em 2024. Em março deste ano, relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou como órgãos públicos vêm diminuindo o controle social sob o pretexto da privacidade.

Há ainda um requerimento para que o Conselho Nacional de Justiça (CNJadote esse tipo de obrigatoriedade anômala, como exigir nome completo, CPF, e-mail e às vezes até foto para acessar pagamentos feitos a magistrados.

Tal proposição enseja assédio contra quem fiscaliza o uso de verbas públicas num país em que o gasto com tribunais em percentual do Produto Interno Bruto é quatro vezes a média de 50 países analisados pelo Tesouro.

Intimidação judicial a jornalistas, por exemplo, ainda é uma triste realidade. Em maio, a Justiça do Rio Grande do Sul condenou o jornal Zero Hora e uma colunista do veículo a pagarem R$ 600 mil de indenização a uma desembargadora por publicar os vencimentos de abril de 2023 no Tribunal de Justiça do estado.

Conselhos Nacionais de procuradores e juízes foram criados como órgãos voltados a aumentar, não restringir, a transparência administrativa e financeira das respectivas carreiras.

Seu papel disciplinar deveria servir para coibir abusos, em vez de autorizá-los. Alegar privacidade para esconder gastos não têm lugar num Estado de Direito, onde ninguém, nem juízes ou promotores, estejam acima da lei.

Condenação de golpistas é vitória da democracia e da lei

Por Valor Econômico

Agora cabe ao Congresso rejeitar uma descabida anistia e se juntar ao Supremo na defesa da democracia e da Constituição

Pela primeira vez na história republicana, a Justiça brasileira condenou um ex-presidente e quatro militares de alta patente por tentativa de golpe de Estado, deixando para trás um longo passado de contemporização com inimigos da democracia. Desde que assumiu a Presidência, Jair Bolsonaro, um parlamentar que teve produção pouco prolífica em 28 anos de Congresso, manifestou seu desejo de continuar no poder, se necessário fosse, com o uso da força. Arregimentou para o governo militares que concordavam com seu projeto continuísta, que foram igualmente condenados pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).

Sob enorme pressão interna, inclusive de boa parcela de parlamentares, e externa, do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que recebe informações distorcidas da família de Bolsonaro e aliados, o STF conduziu um processo jurídico sem sobressaltos, marcado pelo mais amplo direito de defesa dos réus.

O contraponto completo ao voto do relator pelo ministro Luiz Fux - que questionou a competência do tribunal para julgar Bolsonaro, negou que as provas apresentadas atestassem a tentativa de golpe e terminou por absolver o ex-presidente - foi uma prova de que o julgamento não foi um jogo de cartas marcadas para consumar perseguição política, como propagam incessantemente as redes bolsonaristas. Por 4 votos a 1, Jair Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), a 16 anos e perda do mandato, o almirante e ex-comandante da Marinha Almir Garnier e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, a 24 anos, o ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno, a 21 anos, o tenente-coronel Mauro Cid, a 2 anos, Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, a 19 anos, e o ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto, a 26 anos.

A pregação aberta de desejos continuístas, a agressão desabrida ao Judiciário e seus inimigos políticos, a defesa despudorada de um regime militar que sufocou por 21 anos as liberdades no país, tudo facilmente documentado ao longo de quatro anos de governo de Jair Bolsonaro, facilitaram a tarefa dos juízes e tornaram o trabalho da defesa dos réus uma tarefa hercúlea. A maior parte dos documentos incriminando os acusados, como a minuta do golpe e o plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro Alexandre de Moraes, não teve sua existência contestada pelos advogados dos réus, assim como não o foram as reuniões em que Bolsonaro reuniu sua entourage militar, após perder as eleições, para planejar atos que impedissem Lula de voltar à Presidência.

As manifestações antidemocráticas explícitas de Bolsonaro não contam a parte oculta da história, a aceleração dos preparativos para sua permanência na Presidência, após a derrota eleitoral. Sem a delação premiada do ajudante de ordens e tenente-coronel Mauro Cid, condenado a 2 anos em regime aberto, seria muito difícil ao STF desvendar os elos e participantes da trama fracassada. As operações de busca e apreensão recolheram um denso material, de cujo novelo emergiu o fio da meada do golpe. Diante de farto material investigativo, coube à defesa argumentar fragilmente que se tratava de atos aleatórios e puramente especulativos, sem fins práticos.

Apesar da especiosa argumentação jurídica para livrar os réus da condenação por parte da defesa, uma das provas mais poderosas da existência da operação golpista veio de sua confirmação por parte do general de Exército Marco Antonio Freire Gomes e do tenente-brigadeiro da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Junior, que testemunharam o ultimato aos comandos militares para se juntarem à aventura e se recusaram a aderir.

Eles puseram fim aos planos de Bolsonaro, que desandaram para ações anárquicas de seus apoiadores radicais. Ataques à sede da PF em Brasília, atentado abortado no Aeroporto de Brasília, multidões de apoiadores acampados à frente dos quartéis formaram um enredo de muitos atores à procura de um objetivo. Bolsonaro foi para Miami e se recusou a dar posse a Lula. A última esperança do grupo golpista passou a ser que manifestações violentas de bolsonaristas em 8 de janeiro criassem caos suficiente para levar as forças armadas a intervir e interromper o mandato do presidente eleito. Não deu certo. Milhares foram presos, centenas, condenados e depois tratados como “malucos” por Bolsonaro, que negou qualquer participação nos atos que depredaram as sedes dos Três Poderes.

As instituições democráticas venceram a tentativa de golpe do Estado e é do interesse da nação que episódios como esse não se repitam. Punir os responsáveis é o primeiro passo, que já foi dado. Ao Legislativo cabe evitar o avanço dos parlamentares radicais, que prezam mais a subserviência a um apologista da ditadura que a existência da democracia, único regime que pode lhes garantir o mandato. É preciso evitar um choque entre os Poderes que uma eventual aprovação de uma descabida anistia ameaça trazer. O Congresso deve rejeitá-la e se juntar ao Supremo na primeira linha de defesa da democracia e da Constituição.

Um país de escolas inseguras não tem futuro

Por O Estado de S. Paulo

Quase metade dos alunos da rede pública não enxerga a escola como ambiente seguro, diz pesquisa do MEC realizada entre estudantes que estão na transição entre a infância e adolescência

Quem reconhece que a educação é a base de tudo, na certeza de que tal premissa vai muito além de um mantra superficial sem amparo na realidade, sabe que a instituição escolar, se boa e bem estruturada, é a garantia mínima de acesso a chances reais para cada indivíduo e, em consequência, para o Brasil. A escola é o locus da formação intelectual e social de crianças e adolescentes, imprescindível para formar uma nação desenvolvida, decente e sustentável. Sendo assim, imagine-se o que significa para o Brasil quando grande parte dos jovens estudantes enxerga a escola não como um ambiente de aprendizado, convívio, respeito, valorização e crescimento pessoal, e sim um lugar de incerteza e insegurança. É uma tragédia silenciosa e inconcebível.

Pois sabe-se agora, graças a uma pesquisa realizada pelo Ministério da Educação (MEC), que quase metade dos alunos do 8.º e do 9.º ano do ensino fundamental da rede pública diz não encontrar um ambiente seguro na escola. Conforme avança a idade dos estudantes, reduz-se a percepção de que a escola é um espaço de aprendizado, acolhimento, socialização e participação. Enquanto 75% dos alunos do 6.º e do 7.º ano dizem ter pelo menos um adulto em quem confiam e 58% deles afirmam se sentir acolhidos pelos adultos dentro da escola, esse índice cai para 66% e 45%, respectivamente, nas duas séries seguintes. Entre os adolescentes dos 6.º e 7.º anos, 71% consideram que os profissionais da escola respeitam e valorizam os alunos, mas só 39% afirmam que os estudantes valorizam os professores – números que caem para 56% e 26%, respectivamente, entre os alunos dos 8.º e 9.º anos.

relevante pesquisa do MEC foi realizada com o apoio do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e do Unicef, a partir de um processo de entrevistas com uma amostra de 2,3 milhões de estudantes dos anos finais do ensino fundamental de todo o Brasil. As respostas coletadas ancoram a implementação do Programa Escola das Adolescências, uma bem-vinda iniciativa para levar adiante a ideia de uma escola mais conectada com as diferentes formas de viver a adolescência no País.

Há duas frentes centrais de preocupação inspiradas pelos números: primeiro, a ideia de uma escola segura stricto sensu, visão em grande medida tisnada por contextos de violência (doméstica ou na comunidade escolar), bullying, discriminação, gravidez precoce, falta de vagas, problemas de transporte e questões de saúde; segundo, o tipo de escola pública, por vezes desinteressante, que estamos oferecendo aos nossos adolescentes. São dois longevos e mal resolvidos problemas da educação básica. No primeiro caso, registrem-se os relatos negativos apontados num estudo do início deste ano, com base em dados do Atlas da Violência 2024, do Ipea e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No segundo, há a flagrante dificuldade de conter o abandono escolar entre os adolescentes, consumado em particular no ensino médio e motivado sobretudo pela necessidade de trabalhar e pela falta de interesse.

O Brasil universalizou o ensino fundamental só nos anos 1990, desde então continua a expandir lentamente a educação na pré-escola e no ensino médio, e não só patina no freio à evasão escolar como ainda está a anos-luz do que seria o ideal para ofertar uma escola atraente para a formação de um adolescente. Isso passa por currículos atualizados, estrutura adequada, qualidade dos serviços prestados e cumprimento mais pleno dos objetivos de desenvolvimento e aprendizado. Convém sublinhar que a necessidade de adequar melhor a escola aos novos contextos de vida dos jovens estudantes não significa fazer concessões a modismos pedagógicos e políticas demagógicas, e sim ajustar currículos e práticas escolares e tornar os gastos no setor mais produtivos, mediante aprimoramento da formação de professores.

A pesquisa ilustra outros caminhos, como convivência, inovação e participação dos alunos. É eloquente, por exemplo, o reconhecimento do papel das disciplinas tradicionais para ajudar-lhes no desenvolvimento para a vida. Mas, antes de tudo, é um convite à ação, num país onde um a cada cinco jovens não conclui a educação básica, para que cuidemos melhor desse momento tão difícil de transição da infância para a adolescência.

A pá de cal no grau de investimento

Por O Estado de S. Paulo

Agência classificadora de risco expôs o óbvio: enquanto não houver controle da dívida e das contas públicas, a economia brasileira representará risco de especulação para o capital estrangeiro

Os indicadores de crédito do Brasil entre investidores internacionais são piores hoje do que em 2015, ano em que o País perdeu o selo de bom pagador conferido pelas três maiores agências de classificação de risco. A principal mensagem da diretora da Fitch Ratings para Américas e Ásia, Shelly Shetty, em recente passagem por São Paulo, foi de que, nessas condições, a nota brasileira não deixará tão cedo o grupo das economias consideradas especulativas, aquelas em que o investidor corre risco considerável de perder dinheiro.

Depois de a Moody’s ter rebaixado, em maio passado, suas perspectivas para o Brasil – apenas sete meses depois de ter elevado a nota –, o comentário de Shetty joga uma pá de cal nas pretensões do presidente Lula da Silva de retomar até o fim do mandato o grau de investimento – a escala mais alta de graduação das agências para países e empresas. Aqueles que conseguem chegar a um dos dez subníveis dessa classificação são considerados mais seguros para investimentos, e quanto maior o grau, menor o risco para os investidores, o que torna mais favoráveis os juros e condições de financiamento na captação de recursos, além de facilitar empreendimentos diretos.

Não que houvesse esperanças de que o Brasil retomaria no curto prazo o selo de bom pagador perdido há dez anos – a não ser nos planos delirantes de Lula da Silva e sua equipe. É impossível esperar melhora de avaliação em uma economia que se esmera em aumentar as camadas de maquiagem nas contas públicas, tentando disfarçar as fendas abertas por despesas mal computadas. A PEC dos Precatórios, que o Congresso acaba de promulgar, por exemplo, na prática adia por dez anos a incorporação do volume total das dívidas judiciais do governo à meta fiscal, além de ampliar em R$ 12,4 bilhões o limite de gastos federais no ano eleitoral de 2026.

As eleições do ano que vem são o motor do interesse de Lula da Silva em relação ao grau de investimento, que tencionava usar como capital político durante a campanha. Isso torna ainda mais inconsistente a narrativa lulopetista que defende a reavaliação positiva da nota do Brasil. Fosse um esforço real, o País estaria assistindo a mudanças estruturais no planejamento de receitas e despesas na busca por equilíbrio, e não a truques mal ajambrados para criar saldos fictícios. Essa política fiscal não convence nem aqui nem no exterior.

O ano de 2015, citado na explanação da diretora da Fitch, foi um período em que a convicção externa sobre a disciplina fiscal brasileira – que havia chegado a um consenso incomum – foi substituída por desconfiança generalizada conforme eram auferidos os danos das “pedaladas fiscais”, as manobras que melhoravam artificialmente as contas públicas do governo Dilma Rousseff e que terminaram por levar a seu processo de impeachment.

Na exposição de motivos que fez para afastar a possibilidade de o País subir degraus na escala classificatória no curto prazo, a executiva lembrou que naquele ano o déficit brasileiro correspondia a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) e hoje está em 8%, e que a relação da dívida brasileira era inferior a 60% do PIB e atualmente está perto de 80% – e não para de subir.

O Brasil continua no nível especulativo, cinco graus acima do alto risco de inadimplência e dois abaixo da boa avaliação com “qualidade média”, tanto na Fitch quanto na Standard & Poor’s (S&P), que, há três meses, atribuiu a manutenção da nota, com perspectiva estável, ao baixo progresso no enfrentamento do desequilíbrio fiscal à lentidão das reformas. Diante do contexto atual, o empate foi até um bom resultado. A Moody’s, cuja nota brasileira está um degrau acima das outras duas agências, reduziu expectativas também por causa do descontrole de gastos.

Em 2008, quando o Brasil subiu ao primeiro dos dez níveis do grau de investimento, a S&P avaliou que o perfil da dívida havia melhorado e a situação fiscal, ainda que imperfeita, parecia ser conduzida com pragmatismo. Hoje, o único efeito prático da política fiscal de Lula visa a garantir votos. E isso não dá segurança a nenhum investidor.

O valor do tempo em SP

Por O Estado de S. Paulo

Pesquisa mostra que paulistanos se angustiam com o tempo que perdem no trânsito

Uma pesquisa do Instituto Locomotiva revelou a percepção dos paulistanos sobre o tempo. E os resultados mostraram o desconforto da população da cidade de São Paulo na sua relação com os ponteiros do relógio, num sinal de insatisfação com a vida na metrópole, com os atrasos recorrentes em tarefas cotidianas, com a perda de compromissos e com os prejuízos na realização de negócios e na produtividade. Aliás, o título do levantamento, Valorização do tempo em São Paulo: angústias e demandas da população, já é bastante sugestivo da frustração dos moradores da capital paulista.

Segundo o estudo feito em parceria com a Uber, 78% dos entrevistados disseram que o deslocamento é o fator que mais contribui para a sensação de falta de tempo, ficando à frente da demora no transporte público (49%), das filas em serviços (44%) e dos cuidados domésticos (31%). Os 1,5 mil entrevistados deixaram claro como a mobilidade impacta de modo negativo a gestão do tempo: de cada dez paulistanos, sete disseram que o tempo gasto no trânsito atrapalha as atividades importantes, e 76% concordam com a frase “falta tempo no meu dia a dia”. Não à toa, 60% dos entrevistados afirmaram preferir uma hora livre a mais por dia a uma renda 10% maior.

É visível a angústia da população nos ônibus, trens e metrôs e também nos carros parados no congestionamento. E outros indicadores reforçam o problema. A Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, por exemplo, mostrou que os deslocamentos individuais (51,2%) superaram os coletivos (48,8%). Um levantamento da Rede Nossa São Paulo apontou o crescimento do tempo médio de deslocamento no transporte público, que chegou a 2 horas e 47 minutos por dia. E dados da SPTrans constataram a queda da velocidade dos ônibus, mesmo nos corredores e nas faixas exclusivas, com uma média geral de 15 quilômetros por hora. E, para piorar, já há indicativos de que a lentidão no trânsito logo mais voltará aos patamares pré-pandemia de covid.

Os achados do Instituto Locomotiva e todos esses indicadores ilustram a degradação contínua da mobilidade em São Paulo, na contramão do que se espera da maior e mais rica metrópole do País. Por escolhas ou omissões políticas das autoridades públicas, sobretudo as municipais, os paulistanos têm perdido muito tempo para se deslocar, por qualquer modal.

Uma maior qualidade de vida somente será percebida com investimentos em transporte público, a começar por uma rede de ônibus pontual, ágil e confortável, que circule por vias exclusivas, sobretudo corredores, de modo a ganhar a adesão voluntária da população. Faltam ainda uma malha de transporte sobre trilhos capilarizada, ciclovias eficientes e calçadas seguras. Nada disso é realidade em São Paulo.

O direito de ir e vir é, assim, um paradoxo: um ato de liberdade ao mesmo tempo em que se está preso no caminho. Na prática, é um martírio, haja vista que chegar a algum lugar, sabe-se lá como e em quanto tempo, implica perda de qualidade de vida. E tamanho sofrimento leva à infelicidade, como bem se vê nas angústias e demandas identificadas pela pesquisa.

Conscientização para uma sociedade melhor

Por Correio Braziliense

Embora o capacitismo seja uma pauta de debate cada vez mais constante na sociedade, muitos direitos ainda são desrespeitados

Duas discussões relevantes são propostas este mês no Brasil. O Setembro Verde, oficializado em 2005 pelo governo federal, joga luz sobre a inclusão social da pessoa com deficiência e a importância da doação de órgãos. Temas que ainda carregam preconceitos e obstáculos no país.

No próximo domingo é celebrado o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência e, em 27, o Dia Nacional da Doação de Órgãos. As datas, apesar de não terem sido criadas conjuntamente, estabelecem um marco para a realização de campanhas de conscientização da população, além de incentivar ações que tragam benefícios sociais relevantes.

Dados preliminares do Censo 2022 indicam a presença de 14,4 milhões de pessoas com deficiência (PCDs) a partir de dois anos de idade, representando 7,3% dos brasileiros nessa faixa etária. Os PCDs enfrentam múltiplos desafios, que vão desde questões práticas, como a locomoção, até situações abstratas de reconhecimento de suas capacidades. A falta de acessibilidade, sem as adaptações físicas adequadas (rampas, elevadores etc.), a ausência de ajustes tecnológicos e de comunicação dificultam a plena participação desses cidadãos na dinâmica do cotidiano.

A descrença na capacidade das pessoas com deficiência e a subestimação de suas competências são outras barreiras atitudinais significativas. Embora o capacitismo seja uma pauta de debate cada vez mais constante na sociedade, muitos direitos ainda são desrespeitados. O acesso ao ensino de qualidade, por exemplo, é um ponto que precisa avançar. A oferta de empregos de melhor qualificação, com salários mais elevados, é outra questão.

A Lei Brasileira de Inclusão, de 2015, busca assegurar a igualdade de condições. Ela abrange diversas áreas — educação, saúde, trabalho, cultura e tecnologia — de maneira a promover inclusão social e cidadania, além de proteger contra a discriminação e o preconceito. Mas, no dia a dia, a realidade mostra que essa é uma causa que exige atuação mais firme dos governos e das instituições no país.

Da mesma forma, a doação de órgãos demanda maior investimento, apesar de os índices apresentarem melhora. Em 2024, o país ultrapassou 30 mil transplantes de órgãos e tecidos, superando os 28.700 de 2023 e atingindo um recorde histórico. Desse número, cerca de 85% dos procedimentos foram realizados por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo o Ministério da Saúde, em junho deste ano, a fila de transplantes era de aproximadamente 78 mil pessoas à espera de órgãos, principalmente rim, córnea e fígado, e tecidos. O país possui um dos maiores sistemas públicos de transplantes do mundo, e uma mobilização maior da população pode atingir os resultados esperados.

A recusa dos familiares em consentir a doação continua sendo um grande obstáculo, que, na maioria das vezes, é motivada pela falta de informação e pelo desconhecimento do processo. Nesse sentido, incentivar a conversa a respeito do assunto em casa é fundamental para a tomada de decisão.

Um Brasil acessível, independentemente das condições, e consciente das possibilidades de se salvar vidas é a meta das duas datas destacadas neste mês. O que se espera, então, é que as iniciativas sejam desenvolvidas com eficiência para que a sociedade se sensibilize sobre ambos os temas.

Plano Diretor tem nova fase e meio ambiente precisa ser prioridade

Por O Povo (CE)

No sábado, 13, teve início um novo ciclo de debates entre comunidade e especialistas sobre o detalhamento do Plano, que já teve suas grandes áreas de atuação definidas: centralidade urbana, ambiente construído e ambiente natural

Uma nova fase começa na construção de uma das maiores demandas de uma metrópole como Fortaleza: o Plano Diretor da Cidade, norma básica que orientará o planejamento urbano pelos próximos 10 anos. Dirá como deve ser a distribuição do espaço que é consumido e vivido a cada metro quadrado construído, esgoto a céu aberto, floresta destruída e trânsito intenso.

No sábado, 13, teve início um novo ciclo de debates entre comunidade e especialistas sobre o detalhamento do Plano, que já teve suas grandes áreas de atuação definidas: centralidade urbana, ambiente construído e ambiente natural. Tudo interligado e transversal. Agora, as audiências entram em discussões como parâmetros construtivos, IPTU e transferência do direito de construir.

Na última semana, também, a Prefeitura de Fortaleza, responsável por elaborar o documento - que deverá ser aprovado pela Câmara Municipal -, anunciou iniciativas que tentam priorizar as ações de preservação do meio ambiente. A criação de cinco parques urbanos deverá aumentar para 30 o total de equipamentos e o lançamento da Política Municipal de Mudança do Clima traz esperança para o olhar no futuro.

De acordo com o Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza (Ipplan), a Capital só tem 16% de áreas verdes. O Plano Diretor é esperança para que essa porcentagem aumente. Obrigação do Poder Executivo - atrasado há sete anos - mas de responsabilidade também do Legislativo e da sociedade. Um planejamento urbano que tenha participação social e discussões concretas sobre sustentabilidade e meio ambiente é prioritário.

O anúncio de que a Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste (Lubnor) continuaria no Porto do Mucuripe, em Fortaleza, demonstra como as tantas temáticas que regem o funcionamento da Cidade se misturam. Polêmico, o debate sobre a permanência colocou em destaque economia, meio ambiente e social. E a especulação imobiliária.

Decisão foi tomada após a população se posicionar contra a retirada da refinaria do local, dada à integração comunitária e os tantos empregos diretos e indiretos gerados. Parte importante desta decisão é a apresentação, por parte da Petrobras, empresa que mantém a Lubnor, de um projeto para que a população usufrua mais da área.

Com um destaque: o protagonismo da Universidade do Ceará (Uece) e da Universidade Federal do Ceará (UFC). Cabem ao envolvidos fazer do projeto uma realidade não tão longe, envolvendo comunidade, academia, poder público e iniciativa privada. Aliar os tantos interesses que se fazem à margem do eixo ambiental é imprescindível em uma cidade que cresce sem parar. É pilar para mais igualdade e crescimento. 

 

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