terça-feira, 16 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Normalização da violência política ameaça a democracia

Por Correio Braziliense

Tem-se perdido a capacidade de diálogo em detrimento de práticas covardes que abalam um dos pilares da democracia: o pluralismo

Em tempos de polarização exacerbada, os embates políticos ficam limitados aos fatos que "fogem da curva": sejam eles verdadeiros ou não. Assim, a notícia de um golpe bilionário em assistidos pelo INSS e a invenção de que creches públicas recebem mamadeiras eróticas mobilizam agentes políticos e cidadãos comuns da mesma forma, em uma falta de filtros que atravanca a condução de pautas imprescindíveis para o bom funcionamento do país. Essa agenda deslocada vai além: é cáustica para a convivência democrática, levando a uma espécie de normalização da violência política.

A execução a tiros de Charlie Kirk, nos Estados Unidos, na semana passada, é a prova mais recente de como esse fenômeno contamina o Brasil e o resto do mundo. A troca de acusações sobre as motivações do atirador se deu na mesma velocidade com que as imagens do influenciador sendo baleado no pescoço se disseminaram pelas redes sociais. Um suspeito chegou a ser preso logo em seguida ao crime, e o presidente Donald Trump tratou de inflar a disputa ideológica imediatamente. Culpou a "esquerda radical" por "demonizar aqueles de quem se discorda". O desenrolar das investigações evidenciou que veredictos não podem ser instantâneos.

 Políticos brasileiros e formadores de opinião também compartilharam seus pareceres sobre a morte do jovem conservador estadunidense, repetindo posts recheados de irresponsabilidade e superficialidades argumentativas. Os efeitos, contudo, são profundos. Estudiosos alertam que o extremismo político tem levado a um movimento de desumanização de quem pensa o contrário, ao ponto de se comemorar a morte de oponentes.

 "O risco é perdermos a noção do bem comum e naturalizarmos o ódio como linguagem da política. A política deixou de ser vista como vocação ao serviço da comunidade e virou guerra identitária", alertou, em entrevista ao Correio, o mestre em ciência política Felipe Rodrigues. As vítimas estão por toda a parte — dos rincões latinos a democracias mais consolidadas —, expostas em redes sociais que "amplificam o desprezo político mundialmente e criam câmaras de eco que radicalizam posições".

Há de se ressaltar que as questões de gênero e raciais se somam a esse enredo de violências. O Instituto Marielle Franco mapeou 77 casos de violência política de gênero e raça praticados no ambiente digital contra mulheres entre junho de 2021 e julho de 2025. Os resultados do trabalho recém-divulgado indicam que 69% das vítimas se autodeclaram pretas e 71% são parlamentares em exercício. Ameaças e intimidações somam os relatos mais comuns, 71%, sendo a maioria deles ameaças de morte (63%) e de estupro (30%).

Não é exagero, portanto, afirmar que a barbárie toma conta da arena política, impulsionada por quem usa a internet para "interromper trajetórias políticas por meio do terror simbólico, emocional e psicológico", como enfatiza o relatório da pesquisa inédita. Tem-se perdido a capacidade de diálogo em detrimento de práticas covardes que abalam um dos pilares da democracia: o pluralismo.

É preciso estar atento a essa nova roupagem de ameaça aos avanços civilizatórios. Sobretudo no Brasil — que acaba de passar pelo julgamento histórico de um ex-presidente da República, está às vésperas de eleições gerais e vive uma intensa polarização política na última década. Tamanha criticidade exige vigilância à altura.

Projeto acerta ao disciplinar gasto de prefeituras

Por O Globo

Reforma administrativa prevê avaliação de políticas públicas e regras para salário de prefeito e vereador

São muitos os privilégios, distorções e aberrações enraizados na máquina estatal. É, por isso, um alento que o texto da reforma administrativa em debate na Câmara — entre as múltiplas transformações que propõe — se preocupe em melhorar a qualidade do gasto público e em disciplinar regras fiscais que muitas vezes resultam no estouro de orçamentos estaduais e municipais.

Para isso, a principal inovação proposta pelo relator, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), é instaurar o Sistema de Avaliação de Políticas Públicas (Sinap), que será responsável pela revisão periódica dos resultados trazidos pelo gasto de União, estados e municípios, com base em indicadores objetivos. Com isso, haverá subsídio para saber se determinada despesa — em educação, saúde, segurança ou infraestrutura — deve ser mantida, ampliada ou cortada. O projeto ainda prevê enfim criar o Conselho de Gestão Fiscal, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas nunca instalado. Esse colegiado unificará normas, diminuindo ambiguidades na classificação de despesas. “Há uma inventividade contábil que muitas vezes leva estados a estourar gastos de pessoal ou dívida”, diz Pedro Paulo.

A proposta prevê também que, se a arrecadação de alguma prefeitura estiver baixa ou se ela depender de repasses da União, deverá obedecer a restrições. Em cidades de até 10 mil habitantes, o salário de prefeitos, vices e secretários terá como teto o equivalente a 30% do que ganha o governador do estado. Nos municípios com mais de 500 mil habitantes, 80%. Hoje, há enorme liberdade para Câmaras de vereadores incorrerem em abusos. O projeto quer acabar com isso.

Anhanguera (GO) tem mil habitantes, mas paga mais de R$ 18 mil ao prefeito, valor não muito abaixo do contracheque do chefe do Executivo em Bauru (SP), com população de quase 400 mil. Em Jequié, no Semiárido baiano, o prefeito Zenildo Brandão Santana (Progressistas) ganha pouco menos que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB-SP). A capital paulista tem 11,7 milhões a mais de habitantes.

Em Ingazeira, no Sertão pernambucano, dos R$ 47 milhões estimados em receitas correntes para este ano, R$ 44 milhões virão do governo federal. A arrecadação própria será quase toda usada para cobrir o custo dos vencimentos do prefeito (R$ 20 mil mensais), da vice (R$ 10 mil mensais), de secretários e vereadores. No município de 5 mil habitantes, a renda média de 1,6 salário mínimo dá a dimensão de quão distorcida é a remuneração do Executivo e do Legislativo locais.

As regras para o gasto de prefeituras no Brasil não guardam qualquer conexão com a realidade local nem com as finanças públicas. A implantação das propostas da reforma administrativa é essencial não apenas para o controle das despesas, mas sobretudo para melhorar a qualidade da gestão pública e dos serviços prestados ao cidadão. Elas já deveriam ter sido implementadas há muito tempo. É importante que o presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), mantenha a prioridade que tem dado ao tema. A aprovação da reforma seria um dos maiores legados da atual composição do Congresso.

Não há justificativa razoável para tirar a sede da Susep do Rio

Por O Globo

Congresso deve aprovar Projeto de Decreto Legislativo que suspende decisão de mudá-la para Brasília

É oportuno o Projeto de Decreto Legislativo do deputado Hugo Leal (PSD-RJ) que susta decisão do governo federal de transferir a Superintendência de Seguros Privados (Susep) do Rio de Janeiro para Brasília. Leal qualifica a mudança como “grave erro”. Não é o único. “Essa equivocada e inaceitável medida carece de justificativa técnica e compromete a economia, os empregos e a importância da nossa cidade e Estado”, afirmam Associação Comercial do Rio de Janeiro, Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio RJ) e Federação das Indústrias do Estado (Firjan).

A mudança não seria prejudicial apenas ao Rio, mas a todo o país. Apesar da migração do sistema financeiro para São Paulo, o setor de seguros manteve presença relevante no Rio, tradição que vem dos primórdios do Império. O Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), criado em 1939 por Getúlio Vargas, consolidou a cidade como centro de decisões na atividade. Não foi, portanto, por acaso que a Superintendência de Seguros surgiu em 1966 no Rio.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que supervisiona os mercados de ações e títulos financeiros, também fica no Rio, onde mantém sinergia com a Susep. Também estão no Rio as sedes do BNDES, maior financiador de obras de infraestrutura do país, e da Petrobras, uma das maiores empresas do mundo de petróleo e gás — atividades que envolvem riscos e demandam grandes contratos de seguros.

A tradição permite que o Rio forneça às seguradoras profissionais especializados em cálculos atuariais, Direito securitário e regulação da atividade. É evidente que uma transferência forçada acarretaria perda de técnicos qualificados, com impacto negativo no trabalho de supervisão do setor. Seriam elevados os custos de realocação da Susep, devido aos riscos de evasão de funcionários e de interrupções operacionais do órgão. Mantê-la no Rio tem, por fim, a vantagem de preservar a descentralização geográfica de órgãos reguladores pelo país. “É uma prática saudável para reduzir riscos de centralismo e ampliar a presença do Estado em diversas regiões”, afirma a nota das entidades fluminenses.

A Susep tenta justificar a mudança alegando maior eficácia no acompanhamento de pautas legislativas, políticas públicas federais e no desenvolvimento de projetos que considera estratégicos, como o Sistema de Registro de Operações do Open Insurance e outras iniciativas. Ora, todos esses objetivos podem ser alcançados sem a necessidade de levar a Susep para Brasília. Não há justificativa sensata para o Congresso deixar de aprovar o Projeto de Decreto Legislativo de Leal.

Regras da previdência rural precisam ser revistas

Por Valor Econômico

A Previdência Social acumula nos 12 meses até junho um déficit de 2,5% do PIB, sendo 1,7% da previdência rural e 0,8% da urbana

Um dos problemas que o próximo presidente da República terá de enfrentar logo é o da necessidade de nova reforma da Previdência. Os déficits previdenciários se aceleraram com os aumentos reais do salário mínimo, e as mudanças anteriores deixaram passivos relevantes para trás. Entre eles, até agora intocável, está o da aposentadoria rural, um dos mais complexos e uma fonte de buracos relevantes nas contas públicas.

O Regime Geral da Previdência Social (RGPS) acumulou nos 12 meses terminados em junho um déficit de 2,5% do PIB. Desse total, 1,7% é proveniente da previdência rural e 0,8% da urbana, segundo a carta deste mês do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, com dados baseados em estudo de Bráulio Borges, do instituto, e Rogério Nagamine, especialista em políticas públicas (Valor, 11/9). Em 2024, o déficit foi de 1,54% do PIB na rural e de 0,76% na urbana.

Desde 2003, com exceção do primeiro ano da pandemia de covid-19, quando o déficit da previdência urbana praticamente dobrou para 1,54% do PIB, a aposentadoria rural custou duas vezes mais. No primeiro ano do levantamento, o déficit da previdência urbana foi de 0,51% do PIB ante 1,03% da rural. Entre os motivos para a defasagem estão as regras mais favoráveis para os trabalhadores do campo, que quase nada mudaram desde quando foram estabelecidas pela Constituição de 1988.

Uma das regras principais é a idade requerida para fazer jus à aposentadoria. Após a reforma de 2019, o trabalhador das cidades precisa ter 62 anos no caso das mulheres e 65 no dos homens para se aposentar. Já para o trabalhador rural foram mantidas as condições da Constituição, com 55 anos no caso das mulheres e 60 anos no dos homens.

Originalmente, a aposentadoria mais cedo da população rural foi explicada pelas condições de vida mais difíceis no campo. Mas já em 2010, a expectativa de vida média da população rural era de 75,5 anos, maior que a urbana, de 73,2 anos. A transição demográfica verificada no último Censo, que mostrou a tendência de envelhecimento da população, torna crítica a aposentadoria rural mais precoce. Pelo estudo da FGV, em 2020 a soma das mulheres de 55 anos ou mais e de homens com 60 anos ou mais — condições para a aposentadoria rural — representava 17,1% dos brasileiros. Em 2060, as projeções indicam que a proporção subirá para 35,4%.

As regras de contribuição para a aposentadoria rural são mais flexíveis e calculadas sobre o valor da produção comercializada anualmente. Exportadores e pequenos agricultores não contribuem. Assim, o valor total arrecadado pela previdência rural vem caindo, de cerca de 0,12% do PIB na primeira metade da década passada para 0,08% do PIB em 2024. O estudo constata que o número de trabalhadores no agronegócio diminuiu, entre outros fatores, pela mecanização, recuando de 10 milhões de pessoas em 2012 para cerca de 8 milhões no ano passado, ou 7,8% da população ocupada, o que torna o percentual de arrecadação em relação ao PIB irrisório.

Por outro lado, a receita na previdência urbana chegou a 5,38% do PIB em 2024, sustentada pelo aumento do emprego e da renda dos trabalhadores das cidades. Em outro exemplo de diferenças, o trabalhador urbano tem que comprovar no mínimo 20 anos de contribuição para se aposentar se for homem e 15 anos, se for mulher. Já o trabalhador rural precisa ter 15 anos de trabalho, o que pode ser confirmado por autodeclaração, testemunhas ou documentos como posse ou arrendamento de terras.

Os sindicatos podiam dar essa declaração, mas a ocorrência de fraudes levou à determinação, na reforma de 2019, da criação de um cadastramento dos trabalhadores rurais no âmbito do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS). Por pressão dos sindicatos, ficou estabelecido que a autodeclaração seria válida até que o banco de dados abrangesse 50% dos trabalhadores rurais existentes. Seis anos depois, porém, isso não aconteceu. O Ministério da Previdência não sabe sequer informar quantos trabalhadores rurais já estão inscritos (“O Globo”, 23/6). Segue valendo a autodeclaração. A desconfiança é alimentada pelo fato de que há em 9% dos municípios mais gente recebendo benefícios rurais do que população morando no campo. Em 32 cidades, o Censo sequer identificou população no campo, e, ainda assim, há pagamento de benefícios rurais.

Há muito a fazer também do lado das receitas, já que o dinâmico setor do agronegócio poderia contribuir mais com a Previdência. Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) aponta “déficit estrutural significativo” na previdência rural, já que, em 2024, os gastos chegaram a R$ 196,9 bilhões, e a arrecadação líquida foi de apenas R$ 9,8 bilhões. O TCU critica a não implementação do CNIS e recomenda que Previdência, INSS e Receita Federal investiguem a sonegação. Em 2024, ela estimou que o valor não arrecadado com o segurado especial estava entre R$ 1,2 bilhão e R$ 2,6 bilhões.

Um bom ponto de partida para minimizar o rombo da previdência rural seria finalizar o cadastro, que já consumiu seis anos e resta inconcluso. Em seguida, seria preciso igualar a idade mínima com trabalhadores urbanos.

Como Dilma, Lula estimula demanda, inflação e déficits

Por Folha de S. Paulo

Petista faz política econômica mais parecida com a que gerou disparada de preços e recessão há uma década

Governo quer fazer crer que gasto em alta alavancará atividade, como se fosse possível obter prosperidade sem base de poupança e produção

No terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o país se vê novamente submetido a uma política econômica inconsistente, que prioriza o imediatismo eleitoral sobre a sustentabilidade orçamentária e o próprio desenvolvimento a longo prazo.

Por meio de gastos públicos crescentes e crédito oficial, o governo petista retoma a busca por impulsionar a demanda interna além da capacidade produtiva e da geração de poupança.

Até se consegue por algum tempo impulsionar o consumo e a atividade, mas a custo de pressão inflacionária, juros altos que agravam o problema de financiamento da dívida pública e aumento de déficits com o exterior.

Rombos simultâneos nas contas públicas e no saldo de transações correntes com o restante do mundo são chamados de déficits gêmeos. Longe de meros números abstratos, são sintomas de um modelo que financia excessos de demanda com dívida e importações —e que em algum momento está fadado a se esgotar.

Os sinais já se mostram claros. Nos 12 meses encerrados em julho, o déficit do governo federal atingiu 7,12% do Produto Interno Bruto, o que inclui R$ 1 trilhão em pagamentos com juros —o equivalente a 6,84% do PIB, cifra só comparável às dos últimos momentos da administração ruinosa de Dilma Rousseff (PT).

A dívida pública bruta chegou a 77,5% do PIB, um salto de 6 pontos percentuais em pouco mais de dois anos e meio, e deve superar 80% do PIB ao final do próximo ano. Enquanto isso, mesmo com exportações sólidas, o déficit na conta corrente (transações de bens e serviços com o exterior) passou de 1,4% para 3,5% do PIB nos 12 meses até julho.

Práticas e resultados assim são marca registrada dos mandatos petistas. No segundo governo Lula (2007-2010), o intervencionismo estatal começou a plantar sementes de descontrole, com expansão de dispêndios e subsídios que, embora populares, ignoravam os limites orçamentários.

Dilma chegou ao paroxismo: entre 2011 e 2016, a enxurrada de gastos e crédito público acabou com o superávit primário (sem incluir juros) do Tesouro Nacional, elevou o déficit externo e gerou uma inflação mascarada por represamento de preços de combustíveis e de tarifas públicas.

O estouro do modelo descambou para disparada de preços e uma recessão só comparável à do início da década perdida de 1980, ainda na ditadura militar.

Havia de início a dúvida se Lula 3 emularia Lula 1 (2003-2006), mais austero e prudente, ou Lula 2 (2007-2010), que semeou desastres futuros. Hoje, a terceira versão se aproxima mais de Dilma.

O PT, novamente, aposta na política do moto-contínuo: fazer crer que gastos sempre em alta alavancarão da mesma forma a economia, como se fosse possível gerar prosperidade sem base de poupança e produção. Tal como nas ciências naturais, essa abordagem ignora as restrições da realidade e ruma ao esgotamento.

Cautela com o 'SUS da Educação'

Por Folha de S. Paulo

Apesar de objetivos louváveis, sistema precisa evitar o risco de mais burocracia e gastos inviáveis

Banco de dados compartilhados é medida positiva, mas dispositivo que estabelece despesas da União pode se chocar com déficit orçamentário

Câmara dos Deputados aprovou, no começo deste mês, o projeto de lei complementar que cria o Sistema Nacional de Educação (SNE), conhecido como "SUS da Educação".

Um sistema que organize as responsabilidades e estratégias de municípios, estados e União está previsto na Constituição e, segundo o Plano Nacional de Educação (2014-2024), deveria ter sido instituído até 2016.

É preciso cautela ao implementá-lo, contudo. O Estado brasileiro padece do vício de tentar resolver problemas por meio de leis, novas burocracias e aumento de gastos, sem alcançar objetivos.

O projeto é de 2019 e foi aprovado no Senado em 2022. Enviado à Câmara, sofreu alterações e agora retorna à Casa original.

O texto cria a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite), presidida pelo Ministério da Educação e composta por 12 secretários municipais e estaduais. Trata-se de colegiado para promover cooperação entre os entes e estruturar políticas.

A Câmara reduziu o poder da Cite, fazendo com que estados e municípios não sejam obrigados a submeter seus programas ao colegiado. De fato, diferentemente da saúde (o SUS conta com comissão do tipo), a educação exige maior flexibilidade e adaptação a realidades locais.

Num exemplo, dados do Indicador Criança Alfabetizada do MEC mostram que cidades que mais evoluíram no letramento instituíram avaliações próprias.

Ademais, capitais pobres no Nordeste apresentam taxas de alfabetização maiores do que as de algumas ricas no Sudeste, revelando que a administração racional do gasto é mais eficiente do que a mera ampliação de verbas.

Esse é outro ponto delicado. A Cite aprovará um método de cálculo para o Custo Aluno Qualidade (CAQ), dispositivo que aponta a suplementação financeira necessária por parte da União para que escolas atinjam padrões mínimos de qualidade —e que será elevado de forma progressiva.

Há mérito em buscar equidade regional, mas, considerando o déficit orçamentário federal, a viabilidade do CAQ deve ser encarada com ceticismo.

De positivo, o projeto cria a Infraestrutura Nacional de Dados da Educação, um banco de compartilhamento de informações entre os entes que pode ajudar na orientação de políticas.

De todo modo, um sistema nacional não parece ser tão essencial para elevar os indicadores pífios de aprendizagem do país. Já há experiências locais exitosas, indicando que cuidado com dinheiro público e respaldo em evidências constituem caminho promissor.

O que falta para cassar Eduardo?

Por O Estado de S. Paulo

Se tolerar a apologia de uma ação militar dos EUA contra o Brasil feita pelo filho de Bolsonaro, a Câmara dará uma banana para o País e se assumirá como valhacouto de canalhas

A cada dia em que preserva o mandato de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), um impatriota que se homizia nas prerrogativas de deputado licenciado, a Câmara falha miseravelmente em cumprir sua missão de honrar a representação popular, essência da democracia representativa. Sob risco de ser tida como cúmplice das ações de lesa-pátria perpetradas por esse traidor do Brasil, a Casa precisa, de uma vez por todas, livrar-se de um estorvo que trabalha dia e noite para desmoralizá-la.

Por mais óbvia que seja, a pergunta se impõe: afinal, o que falta para a cassação de Eduardo Bolsonaro? Sua mais recente infâmia, que decerto não será a última, foi endossar uma ameaça feita poucos dias atrás pela porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, de que os EUA, pasme o leitor, poderiam enviar “caças F-35 e navios de guerra” ao Brasil em represália à condenação de seu pai, Jair Bolsonaro, por tentativa de golpe de Estado, entre outros crimes. Ora, se a apologia de uma intervenção militar estrangeira contra o País não se enquadra como quebra do decoro parlamentar, o vale-tudo está autorizado e a transformação da Câmara em um valhacouto de canalhas é mera questão de tempo.

As ações de Eduardo Bolsonaro contra o Brasil nos EUA são tão perniciosas que fazem até seu pai, um dos piores deputados que já passaram pela Câmara desde 1824, parecer um bufão. Indagado sobre o risco de brasileiros inocentes serem mortos nessa hipotética ação militar norte-americana para evitar que seu pai vá para a cadeia, o ainda deputado reagiu com absoluto descaso, afirmando que “pessoas inocentes já estão se ferindo” – em referência aos golpistas condenados pelo ataque do 8 de Janeiro, entre eles seu pai. Eduardo Bolsonaro não apenas relativiza o sofrimento real que uma guerra, ainda que hipotética, imporia à população brasileira, como rebaixa a atividade parlamentar a um exercício de má-fé baseado no egoísmo e no desprezo pela vida humana.

Seu caso é o mais aviltante, mas não é exceção. Carla Zambelli (PL-SP), outra criminosa condenada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), fugiu do País para escapar da pena e está presa na Itália, onde aguarda o término do processo de extradição para o Brasil. É mais uma que permanece deputada a despeito do extenso rol de atos que protagonizou contra a dignidade parlamentar. Seu correligionário Alexandre Ramagem (PL-RJ), também um criminoso condenado pelo STF, há de ter o mandato cassado em cumprimento do art. 55, inciso VI, da Constituição assim que a sentença penal condenatória transitar em julgado.

A mera possibilidade de deputados desse jaez seguirem detentores de mandato parlamentar é um atentado contra a dignidade e a credibilidade da Casa de Ulysses Guimarães, de resto já tão abaladas por outra gama de malfeitos de seus membros. A higienização institucional, portanto, não é apenas um dever político da Câmara, é uma necessidade democrática. Nesse sentido, o paralelo histórico é incontornável. Em 1999, o então deputado Jair Bolsonaro escapou da cassação depois de ter defendido o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso e ter pregado, reiteradas vezes, o fechamento do Congresso. A Câmara, à época, trilhou o caminho da indulgência. É ocioso descrever as consequências da pusilanimidade.

A cassação de Eduardo Bolsonaro, portanto, impõe-se como uma questão de honra institucional, apreço pela democracia representativa e respeito pelo Regimento Interno e pela Constituição. Não deve ser objeto de conchavos partidários entabulados nas sombras nem de cálculos eleitorais oportunistas. A Câmara não pode se apequenar diante de comportamentos que atentam contra valores republicanos dos mais comezinhos. A resposta às ignomínias do sr. Eduardo Bolsonaro deve ser clara, pública e altiva: há limites que não podem ser ultrapassados no exercício da representação parlamentar – e a defesa de uma intervenção militar estrangeira é um desses limites intransponíveis.

A sociedade não pode assistir passivamente a seus representantes conspirarem contra o próprio país. Se a Câmara não agir agora, a História cobrará, como já cobrou no passado, o preço dessa inaceitável omissão.

A propaganda eleitoral de Lula no ‘NYT’

O Estado de S. Paulo

Em artigo no ‘NYT’, Lula reafirma princípios, mas evita soluções no entrevero com Trump. Reforçando barricadas ao invés de construir pontes, mira na eleição em prejuízo do interesse nacional

O artigo do presidente Lula da Silva no jornal The New York Times endereçado ao presidente dos EUA, Donald Trump, oferece mais um retrato da subversão da diplomacia de Estado pela estratégia eleitoral. Adornado por apelos ao “diálogo franco” e à “cooperação entre grandes nações”, ele funciona na prática como peça de propaganda política: reafirma princípios óbvios e limites intransponíveis, mas não sugere um único terreno concreto de negociação. Longe de abrir canais, tranca-os.

Não se discute a validade de vários pontos levantados. A independência dos Poderes nacionais – a começar pelo Judiciário – é inegociável. É verdade que os EUA acumulam superávit comercial com o Brasil, o que enfraquece a lógica econômica de tarifas punitivas, ou que instrumentos como o Pix servem à inclusão financeira, não à concorrência desleal. Mas tudo isso já foi enfatizado em comunicados oficiais, entrevistas e discursos. O que caberia agora seria oferecer pistas de solução – entendimentos setoriais, iniciativas conjuntas, formatos de cooperação. Lula optou pelo contrário: enumerou apenas cláusulas pétreas, endurecendo ainda mais as posições.

A escolha do momento revela muito. O artigo saiu dois dias após a condenação de Jair Bolsonaro – transformando uma decisão judicial em combustível para a retórica confrontacional – e a poucos dias da Assembleia-Geral da ONU em Nova York – ocasião que poderia ser usada para estimular contatos de alto nível com os americanos. Um estadista disposto a reduzir tensões teria guardado munição para a mesa de negociações; Lula preferiu gastar palavras na vitrine internacional, reforçar barricadas e dinamitar pontes, ao invés de atravessá-las.

Desde antes da escalada tarifária, o Planalto evitou buscar uma conversa direta e produtiva com Trump. Agora, manipula a crise para inflamar discursos sobre “soberania” e “resistência”. É uma escolha calculada: quanto maior a animosidade com Washington, mais fácil para o governo se vitimar e se retratar como salvador da Pátria. Nessa lógica, empresários brasileiros que lutam para preservar contratos e mercados tornam-se figurantes abandonados à própria sorte por sua diplomacia.

A carta ainda trouxe um elemento que seria cômico, não fosse trágico: o elogio às investidas intervencionistas de Trump, como uma prova, segundo Lula, de que o Brasil (leia-se, o lulopetismo) foi “vingado” ao rejeitar o chamado Consenso de Washington, proposto por instituições multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou o Banco Mundial nos anos 1980: disciplina fiscal e monetária, abertura comercial, privatizações e desregulação. Mas enquanto países que investiram nesse receituário – como Coreia, Chile ou México – avançaram, nós ficamos para trás. O Brasil segue sendo uma das economias mais fechadas do G-20, e o resultado está aí: estagnação da produtividade, preços elevados e exclusão das cadeias globais de valor. Se o governo americano insistir com essas práticas, colherá os mesmos frutos – queda de dinamismo e perda de credibilidade. Os improvisos estatistas de Trump não confirmam nossas virtudes, e sim repetem nossos vícios – e quem sairá vingada, como sempre, é a realidade.

A crise atual tem múltiplos culpados. Trump manipula tarifas e sanções para favorecer um aliado e intimidar instituições brasileiras. O clã Bolsonaro, por sua vez, alimenta essa chantagem em busca de ganhos pessoais. Mas nada disso justifica a má-fé e a má vontade diplomáticas de Lula. Cabe a um chefe de Estado defender interesses permanentes da Nação, não acirrar crises para acumular dividendos eleitorais. O governo poderia propor fóruns técnicos sobre regulação digital, intensificar esforços de lobby em Washington ou sinalizar cooperação em áreas de interesse mútuo. Ao invés disso, prefere multiplicar gestos de confronto retórico.

O Brasil precisa de diplomacia ativa e inteligente, não de provocações em jornais estrangeiros; precisa de portas abertas, não de “cartas abertas”. Mas enquanto Trump joga para sua base e Bolsonaro para a sua sobrevivência pessoal, Lula joga para a plateia doméstica. Todos saem ganhando, menos o Brasil.

Aposentadorias subsidiadas

Por O Estado de S. Paulo

Baixa contribuição de MEIs eleva pressão sobre o deficitário sistema de Previdência

Referência em finanças públicas e no acompanhamento da Previdência Social, o economista Fabio Giambiagi quantificou, em recente coluna publicada no Estadão (MEI: meia-entrada? Quem dera!, de 5/9/2025), o tamanho do subsídio que será concedido pelo Estado aos aposentados pelo regime de contrato de Microempreendedor Individual (MEI). A parte contributiva desses futuros beneficiários corresponderá a apenas 7% de seus benefícios, enquanto os restantes 93% serão bancados pelo erário.

Os benefícios de MEIs se juntarão, assim, às aposentadorias rurais e à assistência social do Benefício de Prestação Continuada (BPC) como instrumento de pressão dos gastos previdenciários com baixíssima ou nenhuma contrapartida da contribuição prévia. Na balança das contas previdenciárias, por enquanto os MEIs estão concentrados no lado das receitas, mas não tardará a pesarem nas despesas, já que o tempo de contribuição para essa categoria é de 15 anos e a lei que criou o regime é de dezembro de 2008.

Na ponta do lápis, Giambiagi demonstrou a falta de compromisso com o equilíbrio das contas públicas de uma política instituída sem levar em conta a realidade. Trouxe a valores presentes o total da contribuição previdenciária de 15 anos de um MEI (5% do salário mínimo ao mês, ou R$ 75,90) e do benefício de um salário mínimo pago durante aposentadoria de 20 anos, período calculado com base na atual expectativa de vida do brasileiro. O resultado foi uma diferença de R$ 129.653 entre o que o INSS terá de pagar e as contribuições que recebeu do microempreendedor (de R$ 10.311).

Calcule-se o que esse saldo prejudicial para a Previdência pode representar diante dos 16,5 milhões de MEIs que já atuam no País, número que só faz aumentar desde o primeiro ano do programa, quando foram registrados 44 mil CNPJs sob essa condição. Ao mesmo tempo em que contribuiu para frear o avanço desbragado da informalidade, a instituição do MEI acabou por criar um novo tipo de “pejotização”, com muitos autônomos trabalhando como se fossem celetistas, mas sem os mesmos direitos trabalhistas.

O economista Rogério Nagamine Costanzi, do Observatório de Política Fiscal da Fundação Getulio Vargas, já havia estimado, em estudo anterior, um déficit previdenciário de R$ 1,9 trilhão nas próximas sete décadas, decorrente da baixa contribuição dos MEIs. A combinação entre aumento de despesas e queda de receita da Previdência corresponde ao rombo de R$ 203,6 bilhões de janeiro a junho deste ano, de acordo com dados divulgados pela Receita Federal em agosto.

Um cenário catastrófico como esse exige medidas para conter o avanço dos gastos, mas o que se vê é exatamente o oposto. Escudando-se em uma narrativa de boas intenções, medidas populistas se sucedem sem qualquer preocupação com as consequências dentro de 10 ou 15 anos. O financiamento da previdência do MEI é um exemplo da falta de responsabilidade e de planejamento, e o próprio modelo previdenciário brasileiro, como bem sabe o governo, exige uma nova reforma para desarmar tantas bombas de efeito retardado.

O primeiro balanço de uma boa medida

Por O Povo (CE)

É animadora a conclusão a que se chega após análise dos primeiros oito meses de vigência de lei federal que, aprovada pelo Congresso Nacional, busca reduzir os efeitos negativos do uso abusivo do aparelho celular em salas de aula pelos estudantes brasileiros. Dirigentes de escolas e professores atestam que a realidade nova que se criou está permitindo, inclusive, uma ação afirmativa importante para os momentos de intervalo, buscando manter o foco das crianças em meio às aparentes facilidades que o mundo virtual e as redes sociais oferecem.

O POVO, através do repórter Kleber Carvalho, colheu uma série de histórias interessantes nascidas da fase inicial de aplicação da mudança. Os depoimentos falam de um novo esforço de buscar a oferta de alternativas para que os momentos de convivência social sejam utilizados na perspectiva de gerar aproximações, troca de experiências e de incentivar o convívio social pleno.

Como resultado de uma situação favorável que a nova legislação fez surgir, unidades escolares passarem a desenvolver programações diferenciadas nos intervalos, registrou-se movimentação maior nos pátios, bibliotecas estão mais frequentadas do que antes no horário etc. Indicações claras de que as crianças muitas vezes fecham-se nos seus mundos, a partir dos aparelhos celulares, mais como resultado da falta de atenção ou de opções do que exatamente como preferência pessoal.

O efeito da mudança vai além do ambiente escolar, segundo é igualmente verificado na reportagem. Estudantes ouvidos atestaram que têm usado mais o aparelho celular na suas vidas em geral, por exemplo, quando estão nas suas casas e já não têm as limitações de uso impostas pelas novas regras escolares.

Especialistas localizam impactos positivos em planos diversos. O nível de concentração cresceu, há relatos dos próprios estudantes e de suas famílias de melhoria na qualidade do sono, tem evoluído a capacidade de desenvolvimento de habilidades básicas, enfim, ganhos os mais diversos são observados como efeito direto de uma mudança que nasce de um movimento correto adotado pelo governo, a partir de uma ideia lançada lá atrás pelo deputado Alceu Moreira (MDB-RS), e que, na ponta do processo, as escolas parecem estar abraçando.

Desde a publicação da Lei 15.100, que aconteceu já neste ano de 2025, a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc), acertadamente, colocou a proibição dos celulares como uma das diretrizes com o objetivo de padronizar as normas em todas as escolas da rede estadual. Uma ação necessária, importante, que os dirigentes e professores têm entendido na dimensão que representam e, por outro lado, que os próprios estudantes demonstram aceitar como parte de um esforço de formação que ajudará a lhes moldar melhor para o futuro. 


 

 

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