Correio Braziliense
O Hamas se recusa a depor suas armas antes do
estabelecimento de um Estado palestino. Netanyahu não aceita nem a presença da
Autoridade Palestina na Faixa de Gaza
O que presidente Donald Trump quereria dizer, no Parlamento israelense, ontem, ao afirmar que Benjamin Netanyahu foi o melhor presidente que Israel já teve para a guerra, enaltecendo sua atuação contra o Hamas e o Irã, mas sem falar que poderia sê-lo também para o futuro? Com certeza, não gostou de saber que seu colega não iria mais à “cúpula da paz em Gaza”, na cidade egípcia de Sharm El-Sheik, organizada no Egito, para assinatura do Acordo de Paz entre Israel e o Hamas, à qual havia se comprometido a comparecer..
São notícias de um cessar-fogo no qual os
últimos reféns israelenses vivos foram trocados por quase 2 mil prisioneiros
palestinos, o que sinaliza uma alteração na conjuntura no Oriente
Médio, em razão da posição de Trump, que mudou pelo fato de Israel ter
bombardeado o Catar, aliado importante dos Estados Unidos no Oriente Médio e
interlocutor privilegiado dos chefes do Hamas. Nos bastidores, sabe-se que o
episódio levou Trump a dar um ultimato a Netanyahu, no Salão Oval da Casa
Branca, para acabar com a guerra, na recente visita do presidente
israelense a Washington.
A trégua entre Israel e o Hamas segue o mesmo
roteiro da anterior, em maio deste ano, que sustou as hostilidades para uma
troca de reféns por prisioneiros, logo seguida de uma escalada ainda maior da
guerra de Gaza. O fato novo é o envolvimento direto de líderes do Oriente Médio
e da Europa na discussão e execução das próximas etapas do acordo. O documento
foi assinado por Trump e pelos presidentes Abdul al-Sisi (Egito) e Recep Tayyip
Erdogan (Turquia), o emir Tamim bin Hamad Al Thani (Catar) e de Mahmoud Abbas,
o presidente da Autoridade Palestina.
Também participaram da reunião a premiê da
Itália, Giorgia Meloni; o premiê do Reino Unido, Keir Starmer; e o presidente
da França, Emmanuel Macron. Entretanto, Israel e o Hamas não compareceram, o
que demonstra um futuro ainda incerto para Gaza. O acordo prevê o fim da
guerra; o estabelecimento de condições para paz duradoura no Oriente Médio; e a
implantação de um conselho que para supervisionar Gaza no primeiro momento do
pós-guerra.
Outros detalhes continuavam vagos, caso do
desarmamento do Hamas, que ontem mesmo demonstrou que ainda tem o controle de
Gaza, apesar das baixas que sofreu, ao entregar ao Comitê
Impasses
O cessar-fogo prevê, também, a entrega dos
restos mortais de 28 israelenses, mas apenas quatro foram efetivados. O Hamas
alegou que ainda não conseguiu localizá-los. Em troca, Israel libertou 1.968
prisioneiros, incluindo 15 menores de idade. Marwan Barghouti e Ahmad Saadat,
importantes líderes palestinos, condenados à prisão perpétua, não foram soltos.
Antes da liberação dos reféns, as tropas israelenses se retiraram até uma linha
que as deixou em controle de 53% da Faixa de Gaza, conforme acertado no acordo.
Uma força multinacional de 200 soldados,
supervisionada pelo Exército dos Estados Unidos, acompanhará o cessar-fogo.
Acredita-se que esta força inclua militares do Egito, do Catar, da Turquia e
dos Emirados Árabes Unidos. Com 20 pontos, o plano afirma que, se as duas
partes concordarem, a guerra "terminará imediatamente". Destaca que a
Faixa de Gaza será desmilitarizada e "toda a infraestrutura militar,
terrorista e ofensiva" será destruída. Gaza será governada por um comitê
temporário de transição, composto por tecnocratas palestinos. Eles serão
supervisionados por um "Comitê da Paz", chefiado por Trump como
presidente, com a participação do ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair.
O governo do território será eventualmente
entregue para a Autoridade Palestina, que administra a Cisjordânia, após passar
por reformas. O Hamas administra a Faixa de Gaza desde 2007 e não terá
participação no futuro governo, seja direta ou indiretamente, segundo o plano.
Os membros do Hamas receberão anistia, caso se comprometam com a coexistência
pacífica, ou receberão passagem livre para outro país. Nenhum palestino será
forçado a deixar a Faixa de Gaza e aqueles que desejarem sair serão livres para
retornar. Um painel de especialistas criará um "plano de desenvolvimento
econômico de Trump para reconstruir e energizar Gaza".
Quais são os principais obstáculos? O Hamas
se recusa a depor suas armas antes do estabelecimento de um Estado Palestino. O
Netanyahu não aceita nem a presença da Autoridade Palestina na Faixa de Gaza
após a guerra. O Hamas também declarou que espera ter alguma participação
futura em Gaza, como parte de "um movimento palestino unificado".
Israel afirma que sua primeira retirada fará
com que o país mantenha o controle de cerca de 53% da Faixa de Gaza. E o plano
da Casa Branca indica novas retiradas, até cerca de 40%, e, em seguida, 15%. A
etapa final seria um "perímetro de segurança", que "permanecerá
até que Gaza tenha segurança adequada contra qualquer ressurgimento da ameaça
terrorista".
A profecia do falecido historiador britânico-judeu Tony Judt, num artigo intitulado O que fazer?, em 2009, é mais atual do que nunca. Sem a solução do Estado Palestino, Israel viverá um drama existencial: continuar sendo um Estado judeu, com um regime de apartheid, e deixar de ser uma democracia liberal; ou se tornar uma democracia multiétnica e deixar de ser um Estado judeu, com a anexação dos territórios palestinos ocupados. A terceira opção seria empurrar os palestinos de Gaza para o deserto do Sinai e promover uma limpeza étnica nos territórios ocupados da Cisjordânia.
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