terça-feira, 14 de outubro de 2025

A escolha é de Lula, mas o aval é de Alcolumbre, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Se pretende emplacar Messias, presidente terá que escolher logo para evitar que resistências se unam contra o AGU

Pelas intrigas que suscita, a indicação presidencial para ministros do Supremo Tribunal Federal é frequentemente associada à escolha de papas. Não há chaminés no Palácio do Planalto, mas sobram reputações a serem queimadas ao longo de processos com alianças inimagináveis e plantação de pretendentes que jamais passaram pela cabeça do presidente. São veiculados para que, num futuro certame, se diga que aquele nome, considerado tantas vezes, já não possa ser preterido.

As convergências param por aí. Nenhum conclave do século 20 chegou aos 58 dias que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva levou para a escolha do ministro Flávio Dino. Desde o início do século passado, a fumaça cinza não demorou mais do que cinco dias para aparecer no telhado da Capela Sistina.

Desta vez, a escolha está mais próxima do modelo vaticanista. Não pela visita que o presidente fez ao papa Leão XIV, mas pela necessidade de agir rápido ante resistências que se acumulam no Senado. Quanto mais demorado o processo, mais tempo as forças contrariadas terão para se unir contra o ministro da Advocacia- Geral da União, Jorge Messias.

Se indicar logo, diz um ministro com trânsito no Palácio e no Senado, Lula tornaria o nome um fato consumado, acomodando o “jus sperniandi”. O presidente se valeria ainda da história de uma Corte que só teve indicações presidenciais rejeitadas no século 19. Assumiria, porém, o risco de completar sua quinta indicação numa Corte de 11, ante a perspectiva de cobranças do presidente americano a quem tem reiterado a afirmação de que não tem ingerência no STF.

Como Lula volta nesta terça e viaja novamente no dia 24, quando partirá para uma cúpula no sudeste asiático, onde deve encontrar Donald Trump, abre-se uma janela de 10 dias para as conversas que antecederão o anúncio. De Roma, disse que conversará com seus ministros, mas são, sobretudo, aqueles do STF e os senadores que ouvirá.

Antes de viajar, deixou togados de sobreaviso para um encontro ao longo desta semana, mas é a conversa que deve ter com o presidente do Senado, a mais conclusiva. Sem a garantia deste para o quórum de aprovação - 41 votos - nenhum nome será enviado. Quanto mais o tempo se passar, mais repleta será a cesta de dificuldades a ser levada pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP) a Lula.

Foi esta garantia que permitiu a apertada aprovação de Dino por seis votos. Cinco meses antes, Cristiano Zanin passara com uma folga de 17 votos. A despeito de carregar o peso de ter sido advogado pessoal de Lula, a litigância de Zanin não era com o bolsonarismo, mas com a Lava-Jato. Já aquela de Dino foi com os golpistas aliados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Na condição de titular da AGU, Messias comandou a recuperação de mais de R$ 150 bilhões de créditos da União e é também quem coordena a defesa de agentes do Estado, da União ao STF, no exterior. A missão levou à cassação do seu visto, mas não o expôs tanto quanto Dino contra o bolsonarismo.

O que mais pesa contra Messias é o fato de Alcolumbre ter outro candidato, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Está claro que trabalhará para emplacá-lo, ao lado de ministros do STF como Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, que já chegou, inclusive, a verbalizar apoio a Pacheco na primeira pessoa do plural - “É nosso candidato. O STF é jogo para adultos”, disse a Mônica Bergamo. O ministro está entre os que advogam prazo maior. De Roma, Lula mandou recado: “No Brasil tem uma coisa muito interessante que as pessoas acham que podem decidir pelo governo. Indicar um ministro para a Suprema Corte é tarefa do presidente da República”.

A dúvida que sobrevém à determinação de Alcolumbre é se ele estará disposto a empenhar todos os seus cartuchos com Lula para emplacar Pacheco face à necessidade de acumulá-los para a renhida disputa pela renovação da Mesa Diretora em 2027. O grupo Alcolumbre/Pacheco está no comando do Senado há sete anos e, se reeleito, chegará a dez.

Como todo poder prorrogado, o deles também acumula desgastes que em 2027 podem se agravar. A bancada bolsonarista que o alavancou à Mesa - e foi “traída” por sua aproximação com o Executivo - tem menos mandatos a serem renovados (14) do que a governista (25). Se o mais importante para Alcolumbre é manter o Senado, o que estará sobre a mesa é qual dos dois nomes lhe será mais leve para carregar. O senador aposta em Pacheco. Lula tentará convencê-lo de que é Messias.

A missão de Lula não é fácil. A filiação religiosa do seu ministro da AGU, embora possa ser um trunfo junto ao eleitorado evangélico, não necessariamente arrebanhará votos de senadores desta denominação. No Senado, mais que a religião, pesa o posicionamento do indicado sobre temas como regulação das redes sociais, por exemplo. André Mendonça, o único evangélico da Corte, passou tão apertado, em 2021, quanto Dino.

Não ser o preferido dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, campeões de pedidos de impeachment da Casa, pode vir a proporcionar mais votos ao ministro da AGU do que a religião. Ao contrário do que aconteceu em 2024, quando não desautorizou uma campanha do Prerrogativas, Messias, desta vez, joga parado.

Quer dizer, ao longo desses últimos dois anos, movimentou-se para se aproximar dos ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, e da comunidade evangélica e equilibrou-se o quanto pôde ao se manifestar sobre as ações contra as emendas parlamentares, mas, desde que o ministro Luís Roberto Barroso anunciou sua saída, recolheu-se. Já Pacheco, nem tanto. Na tarde desta segunda, Alcolumbre recebeu a visita dos presidentes do STF e do STJ, Edson Fachin e Herman Benjamin, e do PGR, Paulo Gonet. A pauta era a discussão do projeto de lei que cuida das custas processuais. O PL está na Comissão de Assuntos Econômicos, presidida pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), mas foi de Pacheco que se fez acompanhar.

 

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