quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Fundos da tributária valem a pena, diz Appy, por Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Secretário destaca crescimento econômico a ser proporcionado pela reforma e seu impacto sobre a arrecadação

Até mesmo um feito histórico do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a aprovação da reforma tributária, tem repercussão no “fiscal”. No bojo da reforma, foram criados quatro fundos que receberão recursos da União para irrigar os cofres de Estados. A conta começa em R$ 8 bilhões e chega a R$ 60 bilhões ao ano a partir de 2043.

É uma dinheirama. Como já mostramos neste espaço, a conta ultrapassa R$ 1,57 trilhão até 2046. O cálculo é de Cristiane Schmidt, ex-secretária de Fazenda de Goiás.

Os aportes aos fundos ficarão fora do arcabouço fiscal. De 2025 a 2028, as transferências da União deverão ser despesas financeiras. A partir de 2029, quando os fundos estarão funcionando, os gastos passarão a ser primários. Mesmo excetuadas da regra fiscal, as despesas elevarão a dívida pública, aponta o estudo “Exceções e Ampliação do Limite de Despesas Primárias da Lei Complementar nº 200/2023”, elaborado pela consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados.

É, porém, um gasto que vale a pena, argumentou o secretário extraordinário de Reforma Tributária, Bernard Appy, em entrevista a esta colunista e a Jéssica Sant’Ana, deste jornal. “O efeito fiscal agregado é muito positivo”, frisou.

Dos quatro fundos criados pela reforma, dois serão objeto de um projeto de lei ordinária que o governo pretende encaminhar ao Congresso ainda neste ano. Vai propor a regulamentação do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais e do Fundo Desenvolvimento Regional. O texto não conterá grandes novidades, adiantou o secretário. Basicamente, dirá qual vai ser a forma de transferência de recursos. Os valores já são conhecidos.

Os outros dois, o de Diversificação Econômica da Amazônia e o de Desenvolvimento da Amazônia Ocidental e Amapá, serão instituídos por lei complementar, ainda sem prazo de apresentação ao Legislativo. Diferentemente dos outros dois, não têm valor previamente definido.

Como o nome diz, o dinheiro do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais tem como destino as empresas que hoje desfrutam de benefícios tributários concedidos pelos Estados na chamada “guerra fiscal”. São baseados no Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que deixará de existir. Assim, as empresas ganharão um apoio de transição, até 2032.

Já o Fundo de Desenvolvimento Regional é permanente e seu propósito é dar outros atrativos aos Estados que hoje se dinamizam à custa de benefícios fiscais. Os recursos devem ser gastos na melhoria da infraestrutura e na busca de inovações tecnológicas, supostamente base de uma transformação econômica. Também, diz o texto constitucional, podem ser usados em atividades com “elevado potencial de geração de emprego e renda, incluindo a concessão de subvenções econômicas e financeiras”.

“Às vezes, a gente olha só metade da equação”, disse Appy sobre o elevado valor dos fundos.

Na outra metade dela está o crescimento econômico a ser proporcionado pela reforma e seu impacto sobre a arrecadação. “Na hipótese mais conservadora de todas, que considera só os efeitos da desoneração de investimentos e exportações, o aumento é de seis pontos percentuais no PIB potencial”, disse. “Certamente é mais que isso; provavelmente, mais de 10 pontos percentuais a mais no PIB em 10 a 15 anos.”

Só para a União, o aumento da arrecadação deverá ser algo como 2% do PIB, em função da atividade econômica.

Olhando por outro ângulo, os fundos trarão economia em relação ao quadro atual. Numa hipótese conservadora de crescimento do PIB, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional custará de 0,3% do PIB a 0,4% do PIB em 2043, disse Appy. Porém, ele substituirá incentivos fiscais que custam mais de 2% do PIB.

“Então, na verdade, eu estou substituindo um gasto tributário ineficiente de 2% do PIB por um gasto, que vai ser orçamentário, entre 0,3% e 0,4% do PIB”, comparou. É um exemplo de corte de gasto tributário, tema da moda na capital federal.

O Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, por outro lado, tem valor determinado (cerca de 1,3% do PIB no total). É uma despesa que só ocorrerá uma vez.

Appy conclui que, mesmo com os fundos, o resultado de longo prazo da reforma é positivo no longo prazo.

O secretário não mencionou, mas sem a criação dos fundos a reforma dificilmente passaria. No governo de Jair Bolsonaro, ela empacou quando o então ministro da Economia, Paulo Guedes, se recusou a atender esse pleito dos Estados.

A “maior reforma tributária” do país, como definiu ontem o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em reunião da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, traz para cá um formato de imposto já adotado por 170 países. Com uma diferença: no Brasil, o tributo será digital.

Aguardada por 40 anos, a reforma tributária envolveu concessões, como a criação dos fundos bilionários e a criação de uma lista grande de produtos e serviços que pagarão menos do que os outros. Vai também causar muito perrengue na fase de transição. Há, além disso, críticos de peso à concepção do novo sistema. Mas, agora que o navio zarpou, é assegurar que se concretizem a simplificação e o crescimento econômico esperados.

 

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