Valor Econômico
Lula viaja para a Malásia sem anunciar sua
escolha para a vaga de Luís Roberto Barroso
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajou
nesta terça-feira (21) para a Malásia sem assinar a indicação do advogado-geral
da União, Jorge
Messias, para a vaga de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal
Federal (STF) . O
adiamento da decisão se dá depois de um jantar
na noite de segunda-feira com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).
É a primeira vez que o preenchimento de uma vaga para o Supremo Tribunal Federal tem a oposição explícita do presidente do Senado e do decano da Corte, o mais vocal de outro jantar com o presidente, na semana passada, ao lado dos ministros Alexandre de Moraes, Flavio Dino, Cristiano Zanin e o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.
Este inédito
contraponto tem menos a ver com o perfil do ministro da AGU, Jorge Messias, do
que com a hipertrofia de Poderes que avançaram sobre a prerrogativa
presidencial prevista pela Constituição.
Com a inconstância do presidente da
Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB),
Alcolumbre virou o avalista das relações do governo com o Congresso. Seu
preferido, o senador Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), foi convidado até para o encontro, na
residência oficial da Presidência do Senado, com os presidentes do STF, Edson Fachin, do STJ, Herman Benjamin, e com o
procurador-geral da República, Paulo
Gonet.
Quando a licença do Ibama para a pesquisa
da Petrobras na Foz do Amazonas foi
anunciada, no final da tarde de segunda-feira, parecia o prêmio-consolação de
Alcolumbre, contumaz defensor da exploração. Só que não. A decisão era iminente
porque o prazo para a devolução da sonda trazida ao Brasil para atender às
exigências da averiguação do Ibama terminou nesta terça.
Pacheco, com quem
Alcolumbre revezou o poder na Casa ao longo dos últimos sete anos, caiu nas
graças do ministro Gilmar Mendes. Ao acolher um nome do Senado, o STF
adquiriria um seguro anti-impeachment. E não apenas. Desde o início do governo,
Messias acumulou desentendimentos em gabinetes do STF por opinar nas indicações
de Lula para os tribunais superiores disputadas por candidatos dos togados.
Com três ex-advogados-gerais da União no STF,
Gilmar Mendes (FHC), Dias
Toffoli (Lula II) e André Mendonça (Bolsonaro), a indicação do
quarto a ocupar a vaga não parecia contrariar a tradição da Corte, mas foi
classificada abertamente por Gilmar Mendes, à jornalista Monica Bergamo, como
“fraca”. A oposição mais definitiva, contudo, foi aquela do Senado.
Preterido nas duas primeiras indicações,
resguardadas para o advogado pessoal de Lula, Cristiano Zanin, e para Dino,
ex-ministro da Justiça, o ministro da AGU teve tempo para trabalhar o apoio da
comunidade evangélica e dos ministros indicados pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro à Corte, Mendonça e Kassio
Nunes.
Advogou por nomes defendidos por Kassio Nunes
para tribunais superiores, contrariando aqueles da preferência de outros
ministros, arguindo pela necessidade de contrabalancear os polos de poder na
Corte. A sabatina e a votação do seu nome no Senado mostrarão o quanto esses
dois ministros retribuirão a política de boa vizinhança do ministro da AGU.
Messias investiu, desde a posse, numa
política agressiva de recuperação de ativos que, graças também às boas relações
do Executivo com o Judiciário, rendeu muitos dos bilhões com os quais Lula pôde
recuperar as políticas públicas de seu governo. Mostrou, ainda, alinhamento a
posições do PT, como a recuperação das cadeiras da União no Conselho de
Administração da Eletrobras.
Pegadas de um possível ministro no STF podem
ser encontradas na oposição à “pejotização” das relações de trabalho e nas
posições “em cima do muro” na condução dada por Dino às ações de
inconstitucionalidade das emendas parlamentares, numa clara tentativa de não
confrontar o Congresso.
Sua indicação é um
aceno do passado, pelo impacto da Lava-Jato no primado da lealdade, e ao
futuro, pelo apelo junto ao eleitorado evangélico, como ficou claro no evento
com Messias e pastores no gabinete presidencial. Para se confirmar, ainda tem
um encontro marcado com o presente.
Lula vive uma boa maré junto à opinião
pública, mas esta força ainda custa a encontrar sua tradução no tripé dos
Poderes. Confrontado com o risco de uma derrota inédita, desde o século 19, no
Senado, Lula recuou em busca de uma equação que lhe permita os 41 votos para
emplacar Messias e contemplar as ambições de Alcolumbre, o futuro eleitoral de
Rodrigo Pacheco e a Casa que, da obsessão pela cassação de ministros, agora se
encantou com a possibilidade de ter um togado para chamar de seu.
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