O Globo
Ao anunciar demissões, Planalto escancara
fisiologismo na relação com o Congresso
O Planalto avisou: vai punir deputados que
controlam cargos, mas votam contra o governo. As demissões começaram na sexta
passada. Miram indicados do Centrão em ministérios, autarquias e bancos
federais.
Ao justificar as degolas, a ministra Gleisi Hoffmann disse que “quem quer ficar no governo tem que votar com o governo”. Ela comparou os aliados infiéis a visitantes que “vivem na sua casa, comem da sua comida, mas não são leais com você”.
O ministro Celso Sabino preferiu recorrer a uma metáfora conjugal. “Não dá pra ser casado e levar vida de solteiro”, resumiu.
Desde o início do terceiro mandato de Lula,
Planalto e Centrão vivem um relacionamento aberto. Deputados fingem que apoiam
o governo, e o governo finge que acredita no apoio. Enquanto a eleição não
chega, os infiéis se lambuzam na máquina federal.
O caso do ministro do Turismo ajuda a
ilustrar a barafunda. Filiado ao União Brasil, ele nunca evitou que a maioria
dos correligionários votasse com a oposição. Agora resiste a uma ordem
partidária para deixar o governo.
Sabino chegou a entregar uma carta de
demissão, mas alegou ter mudado de ideia após uma conversa com o presidente. Ao
anunciar o recuo, fez um pastiche da fala de Dom Pedro no Dia do Fico. Disse
que permaneceria pelo bem do turismo e pela felicidade do povo do Pará.
O imperador se espantaria com a falta de
cerimônia das autoridades republicanas. Ao vincular as demissões à derrubada de
uma Medida Provisória, a ministra das Relações Institucionais escancarou o
fisiologismo que pauta as negociações do governo com o Congresso.
Gleisi deixou claro que a partilha de cargos
federais obedece à lógica do “toma lá, dá cá”. Não há novidade nisso, mas os
organizadores da farra já foram mais discretos.
Sem base parlamentar estável, o Planalto
agora tenta dosar a extensão da degola. O desafio é evitar que as dispensas
virem pretexto para novas traições na Câmara. O risco é deixar que ameaças de
punição caiam em descrédito.
Até aqui, não houve disposição para cortar cabeças coroadas. A guilhotina só alcançou ocupantes de cargos de segundo e terceiro escalão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.