O Globo
Brasil tem a chance de ocupar vácuo deixado
pelos EUA e por outras grandes potências que recuam da agenda climática
A ministra Marina Silva tem usado com
frequência a expressão “mapa do caminho” para designar o que deveria ser o eixo
da COP30: implementar todos os acordos já traçados em conferências anteriores
do clima para frear o aquecimento global e evitar as consequências para o
planeta.
Trata-se de um diagnóstico como sempre
correto, mas que esbarra em dois problemas. Primeiro, não falta um mapa para
saber o que precisa ser feito, mas sim dinheiro para fazer. Segundo, no
caminho, também do Brasil, há vários obstáculos que não se superam apenas com
mapa, mas com vontade política firme e inequívoca.
O plano proposto por Marina, que deverá fazer parte da colaboração do Brasil durante a COP30 em Belém, prevê um cronograma para a redução e, em longo prazo, o fim do uso de combustíveis fósseis, com a definição de setores prioritários que deveriam acabar com a dependência de petróleo, gás e carvão.
Aí se tem a primeira encruzilhada no caminho.
Os Estados Unidos não só anunciaram a saída dos acordos climáticos, como Donald
Trump vem pregando abertamente a intensificação do uso de combustíveis fósseis
na economia americana.
No Brasil, a despeito da disposição de
Marina, o que se tem de concreto vai na direção oposta. Poucos dias antes da
abertura da COP30, o Ibama, órgão subordinado à sua pasta, concedeu, depois de
sucessivas negativas, licença para a Petrobras iniciar a perfuração do Bloco
59, situado na Foz do Amazonas, na Margem Equatorial.
Se levada adiante, a prospecção abrirá uma
nova fronteira de exploração, ideia que conta com a defesa do presidente Lula e
de amplos setores do governo, além de especialistas em política energética.
Até hoje o governo não apresentou o Plano
Clima Brasil, que deveria conter justamente o trajeto claro, com metas e marcos
temporais, para transição energética, além de outros compromissos.
O mapa do caminho de Marina também tem como
eixo a proposta de zerar o desmatamento, algo que Lula já se comprometeu a
fazer até 2030. Nesse capítulo, o Brasil chega a Belém com resultados mais
palpáveis para mostrar.
Outros países com vastas extensões florestais
têm demonstrado interesse em reuniões com integrantes do Ministério do Meio
Ambiente e do Ibama para saber que tecnologias, ações de contenção e controle e
arcabouço legal permitiram a redução significativa dos índices de desmate na
Amazônia e, em menor escala, também noutros biomas, mesmo com alguns percalços
no caminho, como queimadas e incêndios.
Mas a meta ambiciosa de zerar qualquer
redução de cobertura vegetal, e não só a ilegal, depende de avanço também na
restauração e de maior estrutura para Ibama e outras instituições combaterem o
avanço de atividades criminosas que devastam Amazônia, Cerrado e outros biomas.
Por fim, outro flanco do Brasil na busca por
liderar a agenda está no Congresso. Lula conseguiu apenas adiar a análise dos
vetos ao pacote da devastação, que praticamente desmontou o arcabouço de
licenciamento ambiental no país. Tão logo os holofotes saiam de Belém, a
derrubada dos vetos é líquida e certa, e a Medida Provisória editada para fazer
frente ao pacote também deverá ser totalmente desfigurada pelo Legislativo.
Outro grande impeditivo para que se parta
para a implementação da fundamental agenda climática é, como sempre, o
financiamento. O número comumente evocado pelos cientistas, US$ 1,3 trilhão ao
ano para financiar medidas de mitigação e adaptação, está longe de garantido e,
ainda assim, já é considerado defasado por estudiosos.
Enfim, o Brasil tem a chance de ocupar o
vácuo deixado por Estados Unidos e outras grandes potências que recuam da
agenda climática. Mas o caminho entre Belém e Brasília ainda está repleto de
barreiras que o mapa de Marina, sozinho, não é capaz de superar.

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