quinta-feira, 27 de novembro de 2025

A direita depois de Bolsonaro, por Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Os candidatos a substituir o golpista estão muito distantes da moderação

Dificilmente voltaremos, a curto prazo, aos tempos em que o centro conduzia a direita

Ele acabou de vez? O patético episódio da tornozeleira mutilada parece ter precipitado o ocaso da liderança do "mito" —como se derretiam em chamá-lo os seus seguidores—, recém-condenado à prisão por tentativa de golpe.

Enquadrado pelas instituições democráticas, o ex-capitão se expôs agora ao ridículo. Tanto faz se a causa foi um surto psicótico; ou rematada estupidez política, como sugere João Pereira Coutinho em sua imperdível coluna publicada nesta semana; ou ainda por irremediável falta de dignidade e compostura.

É possível que a minoria formada pelos bolsonaristas raiz continue a negar os fatos. Mas é difícil imaginar que, depois de tudo, o seu ídolo mantenha a posição de centro de gravidade política das forças direitistas no plano nacional. Esse lugar está vago e preenchê-lo é desafio ­­—nada trivial— para as hostes da direita.
A vitória de Jair Bolsonaro, em 2018, destruiu a maneira como o campo antagônico ao PT se organizou para fins eleitorais, a contar de 1994, e com que agenda entrou na disputa pelo Executivo federal.

De um lado, o PSDB oferecia um candidato presidencial de centro, vertebrando a coligação de partidos de vários tons de direita, os quais, por sinal, se alinhavam em diferentes palanques estaduais. No plano dos estados se acomodavam as ambições das legendas coligadas, ao se definirem os postulantes ao Executivo subnacional; ao Senado; à Câmara dos Deputados e às Assembleias Legislativas. A eleição presidencial em dois turnos afunilava a competição pelo poder, reduzindo as chances reais de terceiras vias.

Por outro lado, o monopólio tucano da candidatura ao Palácio do Planalto conferia coerência programática ­—social-liberal— à disputa nacional, para além do conservadorismo dos partidos que formavam a coligação antipetista.

A chegada de um populista extremado a Brasília significou o fim desse arranjo no qual o centro organizava o campo da direita na competição pela Presidência e lhe emprestava feição moderadamente liberal e reformista. Sob os auspícios de Bolsonaro, direitistas radicais se mostraram sem disfarces; apropriaram-se de partidos; trouxeram para a agenda política valores reacionários; a contestação aos direitos à diversidade de comportamentos e estilos de vida; o menosprezo pela questão ambiental. Alteraram por completo o espaço da direita, mesmo que os pragmáticos do centrão continuem aí em maioria.

Esse é o estado em que se encontram as forças antipetistas quando Bolsonaro deixa de ser uma bússola funcional para guiá-las. Dificilmente se poderá voltar, a curto prazo, aos tempos em que o centro conduzia a direita. Os candidatos a substituir o golpista estão muito distantes da moderação. A começar pelos governadores presidenciáveis, alguns dos quais eleitos, em 2022, à sombra da popularidade do seu guia e mestre.

Não custa lembrar que, se as nossas instituições democráticas são suficientemente robustas para enquadrar o populismo autoritário, nem por isso este deixa de ser uma demanda latente de grande parcela do eleitorado e, em consequência, uma recorrente tentação para os políticos.

 

 

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